Refugiados ambientais: o triste cenário dos haitianos e a proteção dada pelo Brasil

Resumo: O estudo buscou as tendências de proteção aos refugiados ambientais no Brasil, especificamente dos migrantes haitianos que devido aos impactos do terremoto ocorrido no Haiti, resultou o cenário de grave violação aos direitos humanos.

Palavras-chaves: Refúgio Ambiental; Migrantes Haitianos; Defensoria Pública da União.

Abstract: The study sought the protection of environmental refugees trends in Brazil, specifically of Haitian migrants that due to earthquake impacts occurred in Haiti resulted in the setting of severe human rights violations.

Keywords: Environmental Refuge; Haitian migrants; Union Public Defender.

Sumário: Introdução 1. A definição de “refugiados ambientais”. 2. O tratamento aos haitianos no Brasil. 4. Dados e Estatísticas. 5. Estudo de caso. 5.1 Exposição de Caso: A Atuação da Defensoria Pública da União. 5.2 Considerações do Caso Exposto. 5.3 Conclusão do Caso Estudado. 6. Considerações Finais.

Introdução

Refugiado é todo indivíduo que devido a fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontra-se fora de seu país de nacionalidade ou de sua residência habitual e não possa ou não queira retornar ao seu país de origem. Individualmente ou massivamente as suas vidas, segurança ou liberdade encontram-se ameaçadas em razão de conflitos armados, violência generalizada e violação de direitos humanos[1].

O instituto de refúgio é regulamentado pelos principais tratados internacionais, com destaque ao marco da Convenção de Genebra de 1951, e, no âmbito nacional, vale mencionar que a proteção aos refugiados é tratada pela Lei n.º 9474/97, considerada inovadora por muitos doutrinadores.

A situação dos “refugiados ambientais” vem ganhando destaque pelo terremoto ocorrido no Haiti em 2010, que em caráter de urgência tomou grande impacto social e econômico nos países de acolhida, levando a uma preocupação quanto ao fluxo migratório e ao tratamento adequado que se deve oferecer. Por consequência, as correntes doutrinárias suscitam também sobre a inadequada definição de “refugiados ambientais”, que será abordada mais a frente.

Em conexão, verificou-se que não há norma específica para aqueles que são forçados a deixar o seu país ou residência por motivos ambientais, uma vez que os instrumentos normativos reconhecem como refugiados um rol delimitado de pessoas. Assim, propôs-se, inclusive, o uso da terminologia “migrantes ambientais” para classificação dessas pessoas.

Além disso, através de mecanismos jurídicos foi possível a criação de normas complementares no Brasil e até mesmo a concessão de um visto humanitário para garantir os direitos básicos a essa categoria específica de migrantes.

É certo que o drama humanitário sofrido pelos haitianos resultou em números caóticos num contexto pós-catástrofe, resultando em uma situação de grave e generalizada violação de direitos humanos.

Serão examinadas neste trabalho, as tendências protetivas aos cidadãos haitianos, abordando as causas do crescente fluxo de migração com destino ao Brasil, assim como, as dificuldades enfrentadas a partir do desastre ambiental ocorrido no Haiti no ano de 2010, até a proteção complementar formulada pelos principais órgãos responsáveis em território nacional. As saídas jurídicas contribuem para a criação das condições básicas para acolhida digna frente às tragédias humanitárias ocorridas em solo haitiano.

Os estudos de casos sobre migrantes haitianos, experimentados no âmbito da Defensoria Pública da União de São Paulo, mostram a relevância do tema, tendo em vista a emergente preocupação com os eventos de natureza ambiental e os seus possíveis impactos no mundo.

A definição de “refugiados ambientais”

Nos dizeres de Claro (2011), desde os primórdios da existência humana ocorrem migrações por motivos ambientais, visto que sempre foi uma maneira do ser humano se adaptar ao meio ambiente. Por certo, também, sabe-se que as mudanças ambientais têm afetado a vida de milhares de pessoas em todo o mundo. Segundo a Organização Internacional para Migrações (OIM – na sigla em inglês), no ano de 2009 estimou-se que o número de “refugiados ambientais” será entre 200 milhões e um bilhão de pessoas em 2050.

A proteção internacional não tem acompanhado essa tendência crescente de fluxos migratórios. No campo internacional, a governança é quase inexistente ao passo que aos Estados pelo fundamento de soberania há uma restrição ao reconhecimento dos refugiados, especialmente, após os eventos de 11 de setembro de 2001, bem como em razão da crise econômica mundial de 2008.

Ainda não há um instrumento normativo específico que proteja essa categoria de refugiados, porém há todo o respaldo complementar encontrado em matéria de direitos humanos, sobretudo, basilar na esfera internacional.

O artigo 13 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como o artigo 12 do Pacto internacional dos Direitos Civis e Políticos dispõe sobre a liberdade de locomoção e ao direito de deixar o país de origem. Já o artigo 22º da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) menciona quanto a liberdade de locomoção e ressalta o princípio da não-devolução, ou non-refoulement[2], proibindo a prática de expulsões coletivas no inciso 9º.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, se atenta para tais vetores, reconhece a dignidade da pessoa humana como fundamento da República (art. 1º, II), estabeleces os princípios que regem relações internacionais (art. 4º e incisos), e o parágrafo único deste mesmo artigo fala sobre a integração com os povos da América Latina. Em sequência, a Constituição Federal também garante a igualdade a todos (artigo 5º).

Por outro lado há de se destacar uma discussão sobre a terminologia dos refugiados ambientais, uma vez que parte da literatura jurídica propõe a substituição para o uso da expressão “migrantes ambientais”[3].

O conceito de “refugiado ambiental” gerou muitas polêmicas quanto às definições doutrinárias, sendo a primeira delas desenvolvida por Lester Brown do World Watch Institute, na década de 1970.

A publicidade da expressão se deu em 1985 com o trabalho científico do professor Essam El-Hinnawi, do Egyptian National Research Center[4]. Essa definição corre no sentido de que “refugiado ambiental” é todo aquele que devido às mudanças e catástrofes ambientais teve que forçadamente abandonar o seu país de origem ou residência habitual para encontrar refúgio e abrigo em outra região.

Ainda, nas explicações da Pereira (2011), o PNUMA[5] em 1972 conceituou como “refugiados ambientais” as pessoas obrigadas a abandonar temporária ou definitivamente a zona onde tradicionalmente viviam, devido ao visível declínio do ambiente, perturbando a sua existência ou qualidade da mesma de tal maneira que a subsistência dessas pessoas entrasse em perigo.

De acordo com Pereira (2011) o autor William B. Wood, geógrafo do Departamento de estado dos Estados Unidos da América, em seu artigo Ecomigration: Linkages Between Environmental Changes and Migration, utiliza a terminologia “ecomigrante”, incluindo ao conceito qualquer pessoa cujo motivo originário da migração advenha de fatores ambientais.

O primeiro fundamento consiste sob a impropriedade do uso da expressão – refugiado ambiental – visto que o Direito Internacional não contempla hipóteses de concessão de refúgio às pessoas obrigadas a se deslocar em virtude de questões ambientais. A segunda justificativa para o termo ecomigrante vem embasada no prefixo “eco”, pois, este faz referência tanto aos motivos ecológicos que resultam na migração forçada, bem como à natureza econômica que consequentemente acompanham a situação dessas pessoas e similarmente se equiparam aos migrantes forçados por questões econômicas. Por tais justificativas, a expressão “ecomigrantes” abarca tanto os migrantes econômicos, os deslocados internos ambientais, bem como os atualmente intitulados “refugiados ambientais”.

A Conferência Internacional sobre Meio Ambiente, Migração Forçada e Vulnerabilidade, ocorrida entre 9 e 11 de outubro de 2008 na cidade alemã de Bonn, na Universidade das Nações Unidas, lançou os chamados “pontos de Bonn[6]”, que entre outras questões, também procurou modular as seguintes classificações terminológicas:  “Migrantes ambientais de emergência”, são pessoas afetadas pelos mais fortes impactos ambientais e que fogem para salvar suas vidas; “migrantes ambientais forçados”, são pessoas que migram para evitar graves consequências da degradação ambiental, e; “migrantes ambientalmente motivados”, aqueles que em razão de uma degradação contínua ambiental, buscam um ambiente sadio para a sua sobrevivência.

A Conferência também chegou ao consenso de que é desnecessário o debate interminável sobre qual expressão utilizar, para que não se desvie o foco central, ou seja, as questões de cunho prático que merecem atenção. Deve-se ir além da análise linguística e observar a efetiva proteção.

Aos que deixam o seu país ou se deslocam por fatores ambientais, a expressão “refugiados ambientais”, apesar de revelar-se inapropriada pelos estudiosos do assunto, ainda é utilizada como referência para proteção.

O Tratamento aos haitianos no Brasil

Seguindo Godoy (2014), com base no suporte jurídico de âmbito nacional e internacional que o Brasil detém, foram consideradas três situações iniciais objetivando recepcionar os migrantes haitianos. A primeira situação versa sobre aqueles que desejam trabalhar regularmente no Brasil. A segunda medida, foi a aplicação da Lei de Refugio por caracterizar migração forçada, conforme orientação na Declaração de Cartagena. A terceira providência foi a proteção humanitária complementar.

A chegada dos haitianos no Brasil fugiu de um trâmite normal, definido pelo artigo 4º do Estatuto do Estrangeiro[7], uma vez que não os tratou como migrantes econômicos, mas como migrantes por questão humanitária. Uma nova percepção sobre os casos ainda não regulados pela legislação migratória foi formada.

É necessário lembrar que o Brasil enfrentava uma ditadura militar quando promulgado o Estatuto do Estrangeiro em 1980, em que se primava pela segurança nacional, restringindo direitos migratórios. Posto isto, tendo em vista um atraso histórico configurado na legislação, foi proposta um novo Projeto de Lei chamado “Lei do Estrangeiro”, que ainda está em trâmite de aprovação pelo número 566/2009, buscando melhor mobilidade do migrante e outras providências[8].

Godoy (2011) também ressalta que regras restritivas não têm eficácia para conter os fluxos migratórios, e que inclusive gera um efeito inverso, incentivando as máfias internacionais de tráfico de pessoas.

Os Haitianos têm solicitado o pedido de refúgio já em território nacional, o que leva ao Brasil analisar o fluxo de Haitianos não como uma mera migração voluntária, mas como uma migração forçada.

Neste ponto, o artigo 31 da Convenção de 1951[9] dispõe que os refugiados não devem ser penalizados por ingressar ilegalmente ou por estarem em situação irregular no país em que se refugiam, isto porque nem sempre é possível realizar a solicitação de refúgio antes de ingressar em território nacional.

Também, segundo o Manual do ACNUR de Procedimentos e Critérios para Determinar a Condição de Refugiado, o fundado temor de perseguição é necessário para o reconhecimento do instituto.

Mais adiante, o mesmo manual afirma que os casos de fome e desastres naturais não entram na definição de refugiado, com exceção dos casos em que haja fundado temor de perseguição por algum dos motivos expressos no artigo 1ª da Convenção de 1951.

Godoy (2011) esclarece que O Comitê Nacional para Refugiados (CONARE) do Ministério da Justiça é o órgão competente para decidir sobre o reconhecimento da condição de refugiado no Brasil, assim no caso dos haitianos, analisou três aspectos para aplicação do inciso III da Lei 9.474/1997: a incapacidade total da ação do Estado de origem; a carência da paz duradoura; e o reconhecimento da comunidade internacional sobre a grave e generalizada violação de direitos humanos no estado em questão. Em outro ponto, caberia ao solicitante de refúgio demonstrar o fundado temor de perseguição, ameaça contra sua vida, segurança ou sua liberdade.

O CONARE resolveu por não incluir no conceito de refugiado as vítimas de desastres naturais sem que haja o devido fundado temor de perseguição.

Em caráter especial, com a finalidade de preencher a lacuna legislativa em que se encontram os haitianos, criou-se no Brasil, o chamado “visto humanitário”, por meio da Resolução 97 do Conselho Nacional de Imigração (CNIg), o tratamento tem se revelado uma importante forma de proteção.

Quando o CONARE nega um pedido de refúgio, mas reconhece a necessidade de ajuda humanitária, o caso pode ser encaminhado ao Conselho Nacional de Imigração (CNIg). Soluções alternativas de encaminhamento (quando não houver enquadramento a lei de refúgio brasileira), na verdade, tornaram-se possíveis a partir da resolução normativa n.º 13 do CONARE[10]. A medida favorece a integração social, permitindo ao migrante que expeça documento de identidade, carteira de trabalho, e acesso aos serviços públicos de saúde e educação fundamental.

É em atenção ao apelo internacional e aos órgãos de proteção internos do Brasil, que se mostra inadequado à devolução dos estrangeiros ao país de origem e expulsões coletivas (primazia do princípio da não-devolução).

A concessão de visto humanitário que permite aos refugiados a reconstrução de suas vidas em território nacional é coerente com os princípios intrínsecos da Constituição Federal. O encaminhamento do caso ao CNIg  é uma medida protetiva que impulsiona a proteção complementar e o reconhecimento de direitos fundamentais dessas vítimas.

A proteção permeada nos direitos humanos busca também por efetividade, por isso é necessário avaliar os fatos e traçar um panorama concreto para viabilizar implementações jurídicas e modular as práticas globais, como será abordado no tópico a seguir.

Dados e estatísticas

No dia 12 de janeiro de 2010, um terremoto fortíssimo devastou o Haiti. A situação foi caótica. Ribeiro (2011) pontua que pelo menos 200 mil pessoas morreram, 300 mil ficaram feridas e quatro mil foram amputadas, resultando no total 1milhão de desabrigados. Segundo Godoy (2011):

 “(…)estimou-se que no ano de 2009, cerca de 55% dos haitianos viviam com menos de 1,25 dólar por dia, por volta de 58% da população não tinha acesso à água limpa e em 40% dos lares faltava alimentação adequada. Mais de meio milhão de crianças não frequentava a escola e 38% da população acima de 15 anos era analfabeta. Por volta de 173 mil crianças foram submetidas à exploração como trabalhadoras domésticas e pelo menos 2.000 eram traficadas anualmente pela e para República Dominicana.”

Ainda como descrito por Godoy (2011), passado oito meses da tragédia, o relatório do ACNUR divulgou os seguintes dados: 1,3 milhões de pessoas deslocadas internamente vivendo em situação caótica nos 1,354 mil acampamentos e assentamentos improvisados; cerca de 60% da infraestrutura governamental, administrativa e econômica foi destruída; 180.00 mil casas desabaram ou foram danificadas, ao passo que 105.000 mil foram destruídas; em torno de 23% de todas as escolas foram afetadas, sendo 80% o percentual apenas na capital do país – Porto Príncipe.

No ano de 2011, a ONG Human Rights Watch confirmou que três milhões de pessoas foram afetadas pelo terremoto de 2010. O efeito impactante do terremoto gerou o deslocamento interno para além das fronteiras da capital em pelo menos 160.000 mil só na República Domicana.

Segundo Godoy (2011), além dos altos índices de pessoas portadoras do vírus HIV, se agravou a violência contra mulheres e crianças, bem como houve um aumento significativo de sequestros, o que levou a comunidade Latino-Americana adotar mecanismos legislativos e administrativos para regularização dessas pessoas não enquadradas nas hipóteses de refúgio.

Conforme o Estudo Sobre a Migração Haitiana ao Brasil (2014), além do terremoto ocorrido no ano de 2010, também houve um surto de cólera que matou mais de 8.000 pessoas. Em 2012, novamente em situação de adversidade climática, o país sofreu com a passagem de dois furacões, Isaac e Sandy, que devastaram duramente a produção agrícola, fonte de recurso econômico. As estimativas apontam que:

 “O Banco Mundial (2011) estima que aproximadamente 10% da população do país tenham emigrado (1.009.400 pessoas), mas outras fontes indicam que a diáspora haitiana já teria ultrapassado a casa de 3.0 milhões de pessoas.” (HATIAN DIÁSPORA, 2011)

O Serviço Jesuíta para Refugiados demonstrou o impacto da migração dos haitianos para a América Latina, principalmente em direção a Guiana Francesa, Venezuela, Equador, Bolívia, Colômbia, Peru, Chile, Argentina e Brasil.

Apesar da situação dramática ocasionada por fatores socioambientais (terremoto e pobreza extrema) que desequilibraram o país, não foi possível a condição de reconhecimento de refúgio aos cidadãos haitianos pelo Estado brasileiro, como se verá mais adiante.

Em outros apontamentos, o Estudo Sobre a Migração Haitiana também fez menção sobre a escolha do destino dos migrantes, levantando-se hipótese de que o Brasil, visto como “o país das oportunidades”, surgiu com a presença das tropas brasileiras no Haiti, considerando também o grande fator do baixo índice nacional da taxa de desemprego.

Deve se notar as dificuldades encontradas no caminho dos haitianos ao Brasil. O mapa a seguir representa as principais rotas das migrações haitianas, com exceção daqueles que expediram o visto antecipadamente nas repartições diplomáticas brasileiras, optando por viajar do Haiti diretamente para algumas cidades do Brasil, o que totalizou a porcentagem de 19,7%.

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 Fonte: (Estudos sobre a Migração Haitiana ao Brasil e Diálogo Bilateral, 2014).

A maioria escolheu uma rota já conhecida, chegando ao Equador por via aérea, seguindo ao Peru e ingressando no Brasil pelas cidades de Tabatinga ou Brasiléia. Os demais caminhos, passando pela Argentina, Bolívia ou Chile antes de chegar ao Brasil, resultaram em não mais que 5,0% do total.

Nada obstante, 43,8% dos haitianos afirmaram que no trajeto percorrido surgiu alguma dificuldade no caminho. Os depoimentos colhidos no estudo incluem desde a discriminação e o cansaço pela longa jornada até ocorrência de roubos. Dos que sofreram alguma dificuldade, 69,7% as tiveram com as autoridades de migração. Ademais, 20,6% relatam problemas com os habitantes locais. Dificuldades com policiais e companheiros de viagem foram reportadas, respectivamente, por 4,9% e 4,8% dos entrevistados.

Ainda com as oportunidades que tendem a oferecer, nenhum desses países tornou-se o destino final para uma significativa parte de migrantes haitianos, incluindo-se o Brasil. Tal fato indica que a migração não é movida somente pelas facilidades de entrada no país, como refutam os que criticam as medidas tomadas pelo governo brasileiro. O que determina o destino final é a intenção de se estabelecer residência no território, por isso importante observar os seguintes dados, segundo (COSTA, 2012; SILVA, 2013) apud Estudos sobre a Migração Haitiana ao Brasil e Diálogo Bilateral:

“Durante o ano de 2010 pequenos grupos de haitianos, que não somavam duas centenas de imigrantes, chegaram à fronteira brasileira com o Peru. Ao final de 2011 havia indicações da presença de mais de 4.000 haitianos no Brasil (COSTA, 2012; SILVA, 2013), número esse que não cessou de aumentar, sendo que ao final de 2013 estimava-se que o montante já teria ultrapassado a casa dos 20.000 imigrantes, com indicações de que o número total poderia chegar a 50.000 ao final de 2014.”

Logo, tendo a diáspora haitiana ultrapassado a casa de 3 milhões de pessoas, os número apontados acima demonstram que apesar de um aumento migratório relevante, o Brasil não é almejado como destino final.

Outros dados revelam que vários são os destinos escolhidos. Assim, tem chamado atenção a numerosa comunidade migrada para os Estados Unidos, seguida pela República Dominicana. Outros países da América e Caribe também recebem um massivo deslocamento de haitianos com destaque para o Canadá, Cuba e Venezuela. Na Europa, o país de maior afluência é a França[11].

Além das inúmeras dificuldades inicialmente enfrentadas, no que toca a integração, também foi construída uma percepção negativa dos haitianos por parte da sociedade, onde são vistos com certa desconfiança e descriminação, incluindo órgãos da imprensa nacional, noticiando por vezes a migração como uma “invasão haitiana”[12].

A recepção dos haitianos nas esferas governamentais também foi pauta importante do Estudo de Migrações Haitianas. Em relação aos governos estaduais foi revelada certa disparidade. No Acre, foi elaborada uma estratégia de força-tarefa para o atendimento dos haitianos, na cidade de Brasileia. No Amazonas, de início, especificamente nas cidades de Tabatinga e Manaus, não se deu tanta atenção ao fluxo migratório, mas, posteriormente foram realizadas contribuições do Estado à sociedade civil para o desenvolvimento do trabalho assistencial.

O governo federal atuou de forma mais eficaz em torno de suas competências, apesar de não haver solução no que toca ao planejamento, ainda que de curto prazo, para atendimento às crescentes demandas de fluxos migratório dos haitianos, o que por certo é necessário tendo em vista a projeção numérica que se pode alcançar.

Ocorre que, no ano de 2013 houve algumas alterações por conta da crescente demanda em busca de visto humanitário, resultando na superlotação do abrigo construído na cidade de Brasiléia. Havia, na cidade de Porto Príncipe, filas gigantescas e precariedade, conforme considerações do Estudo de Migrações Haitianas.

Para contornar a situação foi necessário implementar a resolução normativa n.º 102, que retirou uma limitação de 1200 vistos humanitários por ano, assim como permitiu que o visto também fosse obtido nas repartições consulares do Brasil no Peru, no Equador, na Bolívia e na República Dominicana.

Medidas como essas são necessárias para combater a ação de coiotes (prática de tráfico de pessoas) e ainda dão oportunidade às pessoas que já se encontram em trânsito de regularizar sua situação. Em reunião extraordinária do CNIg, foi abordado o debate, conforme explanação do Sr. Luiz Paulo Barreto, à época Secretário-Executivo do Ministério da Justiça:

“Recentemente, se tem registrado a atuação dos chamados coiotes nessa rota migratória, facilitando a entrada não só de haitianos, mas também de nacionais de outros países, configurando tráfico de pessoas, atividade abominada pelas autoridades brasileiras e pela comunidade internacional. Em busca de soluções para o enfrentamento ao tráfico de pessoas, foram feitas diversas tentativas, que vão do fechamento da fronteira ao ingresso irregular – o combate aos coiotes – à cogitação da abertura de um canal formal de migração partindo diretamente do Haiti com destino ao território brasileiro.”[13]

Para melhor elucidação dos apontamentos expostos, interessante compreender na prática as dificuldades que ocorrem, utilizando para tanto os estudos de casos apresentados a seguir.

Estudo de Caso

Os estudos de caso propõem a discussão de mecanismos que explorem as soluções jurídicas dadas aos migrantes haitianos em paralelo ao trâmite de atendimento prestado pela unidade da Defensoria Pública da União em São Paulo[14].

A Defensoria Pública da União – DPU é instituição essencial à defesa dos interesses individuais e coletivos de grupos sociais em situação de vulnerabilidade, previsão expressa na Lei Complementar 80/94. Além disso, o órgão firmou acordo de cooperação técnica com o Ministério da Justiça e o CONARE[15] para defesa da população migrante, assim como estabeleceu parceria com diversas entidades da sociedade civil. 

Como demonstrará no Estudo do Caso, o atendimento é realizado de modo que as pretensões dos assistidos são colhidas através de uma entrevista e todas as informações processuais e pessoais são cadastradas no sistema interno para análise do Defensor Público Federal competente à matéria.

Na Defensoria Pública da União o assistido recebe orientação jurídica em atendimento por funcionários capacitados, sendo competente ao(à) Defensor(a) Púbico(a) Federal analisar a viabilidade da pretensão e adotar as providências jurídicas que entenda cabíveis.

No caso da assistida A.A, em 08.10.2013, Paj 2013/020-15877[16], nacional do Haiti, em ocasião de atendimento inicial respondeu alguns quesitos pré-estabelecidos para melhor identificação da pretensão, conforme transcrição a seguir.

Exposição de Caso: A Atuação da Defensoria Pública da União

1-   Atendente: Quando ingressou em território nacional?

A.A: Em 30/11/2011.

2-   Atendente: Entrou em território nacional por onde?

A.A.: Acre.

3-    Atendente: Está em situação migratória irregular: 

A.A.: Não.

a)   Atendente: Ingressou clandestinamente no território nacional?

A.A.: Não.

b)   Atendente: Admitido regularmente em território nacional, encontra-se com prazo de estada vencido?

A.A: Não. O prazo de validade do RNE(Registro Nacional de Estrangeiros) é até 23/12/2020.

c)    Atendente: Tentou a regularização migratória de alguma maneira?

A.A: Sim, chegando ao Brasil (Acre), solicitou CPF (Cadastro de Pessoas Físicas) e RNE. O documento de CPF foi recebido no Acre mesmo, junto com um protocolo para retirada do RNE, o qual foi recebido em São Paulo.

Atualmente, aguarda a expedição de CIE (Carteira de Identidade de Estrangeiro) pelo CONARE.

d)   Atendente: Qual o fundamento da situação migratória irregular?

A.A.: A situação migratória já esta sendo regularizada e o fundamento para tanto é o filho brasileiro.[17]

4 – Atendente: Chegou a ir à Polícia Federal verificar a situação? Houve imposição de multa? Com base em que fundamento legal?

A.A: A questão que traz a assistida a esta DPU é que esta foi furtada e perdeu seus documentos, os quais estavam regulares. Quando foi até à Polícia Federal cobraram uma taxa de R$ 305,03 para emissão de segunda via de RNE, bem como uma taxa de R$ 35,00 por se tratar de refugiada.

A imposição de taxa se deu pelo procedimento padrão da Polícia Federal, que solicita diversos documentos para solicitação de 2ª via do RNE – documento anexo.

5- Atendente: Houve pedido de isenção? Foi negado? Há prova escrita?

A.A.: O pedido de isenção foi negado sem prova escrita. O próprio funcionário da Polícia Federal encaminhou a requerente para a Defensoria Pública do Estado e lá, direcionaram-na para esta unidade da Defensoria Pública da União.

6- Atendente: Qual a situação econômica do requerente?

A.A.: A requerente trabalha como faxineira e recebe o valor líquido de R$ 514,00, com o qual sustenta a sua família (marido, que está desempregado, e filho).

7- Atendente: O requerente é idoso?

A.A.: Não.

8- Atendente: A CIE (Carteira de Identidade de Estrangeiro) tinha prazo determinado ou indeterminado?

A.A: Alega a requerente que, segundo protocolo fornecido pelo CONARE, falta 8 (oito) anos para a emissão do CIE.

9 – Atendente: Outras informações relevantes.

Como informado, a requerente foi furtada e perdeu diversos documentos originais. Entre eles: CTPS; RNE; RG em nome de seu filho e passaporte.

Em relação à CTPS e RG, recomendei que se dirigisse a um Posto do Poupatempo para emissão de 2ª Via; em relação ao RNE, a encaminhei à Polícia Federal, agora com a declaração de pobreza para solicitação de 2ª via com isenção de taxas; por fim, em relação ao passaporte haitiano, a Polícia Federal tinha informado que a assistida deveria entrar em contato com a Embaixada do Haiti, ocorre que esta está localizada no Distrito Federal e requerente não tem condições de se dirigir até lá.

Em suma, esta Defensoria Pública da União acompanhará a solicitação de RNE junto à Polícia Federal para, eventualmente, em caso negativo, atuar judicialmente. Ainda, poderá fazer o intermédio entre a assistida e a Embaixada do Haiti ([email protected]) para solicitar 2ª via de seu passaporte.

Ainda, por precaução, indiquei que a requerente se dirigisse ao CONARE *Cáritas para relatar o ocorrido, bem como para, se for o caso, solicitar 2ª via de seu protocolo.

Anexei ao PAJ os seguintes documentos: (i) boletim de ocorrência; (ii) cópia do CPF da requerente; (iii) cópia do passaporte da requerente; (iv) cópia do RNE da requerente e de seu marido; (v) certidão de nascimento de seu filho; (vi) demonstrativo de pagamento de salário; (vii) informativo da Polícia Federal acerca dos documentos necessários para solicitação de 2ª via de RNE; (viii) informativo do contato da Embaixada do Haiti.

Sai a parte requerente ciente que a questão será levada ao membro da Defensoria Pública responsável pelo PAJ, o qual entrará em contato para informar qual medida deve ser tomada.”

O Defensor Público Federal que atuou no caso, do recebimento da pretensão determinou a seguinte providência[18]:

“Ciente. O caso já teve o devido encaminhamento pelo atendimento com a utilização de ofício de encaminhamento acrescido da pesquisa socioeconômica, para fins de obtenção da gratuidade da 2ª via do RNE; encaminhamento à Cáritas para aferição de protocolo, apesar da mudança da sistemática de emissão de protocolo ser feita na própria PF, o procedimento em referência é anterior a mencionada mudança, motivo pelo qual à Cáritas poderá atuar. No tocante a intermediação com a Embaixada pertinente o encaminhamento de ofício, tendo em vista que o e-mail é acessível a própria parte assistida. Gabinete: (Bianca)[19] para encaminhamento de ofício para a Embaixada do Haiti, nos termos do seguinte registro: "Em relação à CTPS e RG, recomendei que se dirigisse a um Posto do Poupatempo para emissão de 2ª Via; em relação ao RNE, a encaminhei à Polícia Federal, agora com a declaração de pobreza para solicitação de 2ª via com isenção de taxas; por fim, em relação ao passaporte haitiano, a Polícia Federal tinha informado que a assistida deveria entrar em contato com a Embaixada do Haiti, ocorre que esta está localizada no Distrito Federal e requerente não tem condições de se dirigir até lá. Em suma, esta Defensoria Pública da União acompanhará a solicitação de RNE junto à Polícia Federal para, eventualmente, em caso negativo, atuar judicialmente. Ainda, poderá fazer o intermédio entre a assistida e a Embaixada do Haiti ([email protected]) para solicitar 2ª via de seu passaporte. Ainda, por precaução, indiquei que a requerente se dirigisse ao CONARE *Cáritas para relatar o ocorrido, bem como para, se for o caso, solicitar 2ª via de seu protocolo. Anexei ao PAJ os seguintes documentos: (i) boletim de ocorrência; (ii) cópia do CPF da requerente; (iii) cópia do passaporte da requerente; (iv) cópia do RNE da requerente e de seu marido; (v) certidão de nascimento de seu filho; (vi) demonstrativo de pagamento de salário; (vii) informativo da Polícia Federal acerca dos documentos necessários para solicitação de 2ª via de RNE; (viii) informativo do contato da Embaixada do Haiti."

Considerações do Caso Exposto

Em síntese, a interessada foi furtada e perdeu seus documentos de identificação, razão pela qual pleiteou a isenção de taxa para a emissão da segunda via do passaporte imposta pela Polícia Federal, bem como, requereu demais orientações acerca de emissão de novos documentos.

Logo em atendimento inicial algumas providências lhe foram passadas, tal como a diligência perante aos órgãos competentes (portando ofício de encaminhamento da Defensoria Pública da União), para obter novos documentos. Especificamente quanto à segunda via do passaporte foi determinado pelo Defensor Público Federal que fosse expedido ofício ao Consulado do Haiti para emissão da segunda via do documento.

A Defensoria Pública valendo-se de suas prerrogativas esculpidas na Lei 80/94[20], pôde requisitar na esfera administrativa as providências necessárias para a solução do problema. Nas demandas que envolvem a população migratória, por muitas vezes, o problema é solucionado pela via administrativa, sem necessidade de judicializar a demanda. A atuação na esfera administrativa é benéfica ao assistido, principalmente em termos de celeridade.

Conclusão do caso estudado

Entre tantos casos de migração ambiental, o exposto acima demonstra minimamente o enfrentamento de dificuldades. O que se pode observar são os obstáculos iniciais para que se tenha acesso aos direitos básicos, como o ingresso no mercado de trabalho e acesso aos serviços públicos. A regularização migratória, ainda que provisória, permite a expedição de documentos essenciais para exercício dos direitos civis.

Importante delinear que trata-se de uma demanda individual que foi resolvida com a mera expedição de ofícios aos órgãos competentes e respectiva orientação jurídica, desnecessário judicializar a demanda para se obter a tutela jurídica pretendida.

Em outra perspectiva, também é notável que muitas questões se resolvem sem a necessidade da intervenção judicial. Além disso, a celeridade é importante e ainda mais viável quando se trabalha em conjunto com o principal interessado, o cidadão. No atendimento inicial, foi elaborado ofício para que a própria parte providenciasse a expedição de documentos nos órgãos competentes, com o mero ofício de encaminhamento.

A solução dada é simples, mas de grande valia aos cidadãos que chegam nas unidades das Defensorias sem a devida orientação, e que por muitas vezes não sabem falar a língua portuguesa.

A dificuldade de adaptação é suprida com encaminhamento para órgãos da sociedade civil, que em geral oferecem programas de integração local, onde poderão receber apoio social e psicológico. Para tanto são realizados atendimentos individuais; atendimentos multiprofissionais; reuniões com migrantes; visitas domiciliares; divulgação sobre a temática do refúgio em instituições de saúde, educação, empresas e na mídia em geral com fim de combater o preconceito e possibilitar o acesso a seus direitos[21].

Apesar de tratar-se de demanda individual, identifica-se por muitas vezes que o migrante desconhece seus direitos básicos ou mesmo se encontra obstado por inúmeras razões, o que leva as Instituições buscarem a tutela coletiva, como por exemplo: Mutirão de expedição de documentos; cartilha de Informações; Acordos de Cooperação entre entidades; Regularização Migratória; Combate ao tráfico de pessoas. Portanto, a tutela coletiva à população migratória é uma tendência atual carregada de soluções duradouras.

Em nível institucional e estrutural o trabalho desenvolvido pela Defensora Pública da União de São Paulo, em especial os Ofícios de Direitos Humanos, Tutela Coletiva e Migrações, além de merecer notável destaque, vêm buscando a efetivação e o acesso dos migrantes aos direitos e serviços públicos no Brasil.

Considerações finais

Por todas as dificuldades, a migração decorrente de desastres ambientais têm chamado atenção dos órgãos protetores e a comunidade internacional. Como afirmado por Claro (2011), as migrações ambientais são vivenciadas pela humanidade desde os primórdios devido às variabilidades climáticas, mas as projeções atuais do fluxo migratório revelam certa preocupação pelos estudiosos que desconhecem a amplitude que os eventos climáticos podem alcançar, para efetivar a proteção da população migrante necessário que os Estados acompanhem essa tendência latente.

Pereira (2011) revelou a polêmica doutrinária em torno da expressão inadequada dos “refugiados ambientais”. Sabendo que o debate terminológico interminável não combate os principais problemas, mas, tratando-se os haitianos de migrantes ambientais não se pode ignorar a discussão sobre a designação.

A Lei Nacional 9497/98 e a Convenção de 1951 reconhecem como refugiados aqueles que em razão de fundados temores de perseguição devido à sua raça, religião, nacionalidade, associação a determinado grupo social ou opinião política, encontram-se fora de seu país de origem e que, portanto não possam ou não queiram regressar ao mesmo, enquanto os deslocados pelas mudanças climáticas não têm status ou proteção específica.

É certo que a situação dramática experimentada pelos haitianos, vivenciada até hoje, comoveu a comunidade internacional e o Estado brasileiro a buscar um aparato jurídico específico.

No Brasil, o CONARE em resposta a demanda, publicou a Resolução 13/2007, que permitiu o encaminhamento dos casos humanitários ao CNIG. Neste passo, foi pela Resolução 97/2012 do CNIG que se possibilitou a concessão do “visto humanitário”. A medida favorece a integração social, permitindo ao migrante que expeça documento de identidade, carteira de trabalho, e acesso aos serviços públicos de saúde e educação fundamental.

A partir do terremoto ocorrido em 2010, pode-se notar as dificuldades enfrentadas pela população haitiana, fatores de instabilidade política, social e econômica perpetuada até os dias de hoje, assim como o árduo trajeto escolhido tornando-se necessário medidas concretas que combatam as ações de coiotes (prática de tráfico de pessoas), e por fim a recepção que os migrantes haitianos encontram quando chegam ao Brasil.

Os estudos de casos possibilitaram uma análise jurídica da proteção em prol dos migrantes ambientais no âmbito da Defensoria Pública da União de São Paulo, órgão institucional que atua na defesa dos necessitados. As primeiras dificuldades que os haitianos enfrentam é fruto da ausência normativa específica, que obstam o acesso aos direitos mais básicos, incluindo nessa esfera até mesmo os direitos civis.

Os órgãos que deferem os pedidos de refúgio atuam com os instrumentos jurídicos existentes, mas ainda com muita fragilidade e burocratização. Neste, passo, os desafios atuais clamam pela observância dos direitos humanos nas políticas migratórias para que não vertam a um retrocesso social.

Sendo assim, os estudos de casos demonstram que prezar pela tutela coletiva em seus diversos aparatos jurídicos, é uma tendência protetiva e resulta em soluções de alta efetividade.

A tutela coletiva também possibilita a celeridade na solução dos casos, bem como o aperfeiçoamento de normas complementares para a devida proteção. Ressalta-se necessária a atuação da Defensoria Pública da União para garantir a efetiva proteção dos direitos fundamentais, em apoio aos migrantes.

A cooperação entre os órgãos de proteção, assim como a sociedade civil, é essencial para a integração local e assistência das vítimas. A parceria permite um estudo mais aprofundado da situação vivenciada pelos migrantes ambientais.

Ademais, conforme o entendimento de Jubilut, (2014), as ações que buscam a proteção integral podem se concentrar na busca do cumprimento dos Estados ao quanto celebrado nos tratados internacionais, no aperfeiçoamento de normas internas de proteção, na conscientização da sociedade ao acolhimento dos migrantes, e na efetivação dos direitos assegurados das pessoas nessas condições.

Por todo exposto, desde a perspectiva histórica, normativa e orgânica, discorrida em atenção aos migrantes haitianos, o que se pretende construir é uma acolhida efetiva e protetora.

As reformas são sempre necessárias e os direitos humanos permitem essa visão acolhedora capaz de proporcionar saídas jurídicas para a proteção desses indivíduos e reforçam as conquistas obtidas até os dias de hoje.

 

Referências
ACNUR. 30 anos da declaração de Cartagena sobre refugiados no Brasil. Disponível em: <http://www.acnur.org/cartagena30/pt-br/>. Acesso em: 12/11/2014.
Andrade, José H. Fischel de; Marcolini, Adriana. A política brasileira de proteção e de reassentamento de refugiados: breves comentários sobre suas principais características. Rev. bras. polít. int.,  Brasília,  v. 45, n. 1, Junho  2002.
BRASIL. Conselho Nacional de Imigração (CNIg), Ministério do Trabalho e Emprego do Brasil, e a Organização Internacional para a Migração (OIM) Projeto “Estudos sobre a Migração Haitiana ao Brasil e Diálogo Bilateral”. 2014. Disponível em <http://portal.mte.gov.br/cni/>. Acesso em: 29/10/2014.
BRASIL. Lei n.º 6.815, de 19 de agosto de 1980. Republicada pela determinação do artigo 11, da Lei nº 6.964, DE 09.12.1981.  Define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, cria o Conselho Nacional de Imigração. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6815.htm>. Acesso em: 23/10/2014.
BRASIL. Lei n.º 9474/97 e Coletânea de Instrumentos de Proteção Internacional de Refugiados e Apátridas. Convenção de 1951 relativa ao estatuto dos refugiados.4ª Ed., Brasília, 2012.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Projeto “Estudos sobre a Migração Haitiana ao Brasil e Diálogo Bilateral”. Belo Horizonte, 2014.
BRASIL. Resolução normativa do CONARE nº 13, de 23 de março de 2007. Dispõe sobre o encaminhamento, a critério do Comitê Nacional para Refugiados – CONARE, ao Conselho Nacional de Imigração, de casos passíveis de apreciação como situações especiais. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/asilos-refugiados-e-apatridas/resolucao-normativa-conare-no-13-2007>. Acesso em: 25/10/2014.
BRASIL. Resolução normativa n.º 18 do CONARE, de 30 de abril de 2014. Estabelece os procedimentos aplicáveis ao pedido e tramitação da solicitação refúgio e dá outras providências. Disponível em: <http://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=270129>. Acesso em: 27/10/2014.
BRASIL. Resolução normativa nº 97 do CONARE, de 12 de janeiro de 2012. Dispõe sobre a concessão do visto permanente previsto no art. 16 da Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, a nacionais do Haiti. Disponível em: <http://portal.mte.gov.br/data/files/>. Acesso em: 25/10/2014.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus: 87585 TO, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 03/12/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 26/06/2009
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário: 466343 SP, Relator: Ministro CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 03/12/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 05/06/2009.
Claro, Carolina de Abreu Batista. O aporte jurídico do direito dos refugiados e a proteção internacional dos “refugiados ambientais”. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro .Ed. Cla. São Paulo, 2011.
D’Urso, Luiz Flávio Flizzola. É preciso resguardar os direitos dos haitianos. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-mai-30/luiz-durso-preciso-resguardar-direitos-haitianos-refugiados> . Acesso em 15/10/2014.
Delfim, Rodrigues Borges. Em coletiva, Missão Paz faz apelo urgente por política pública nacional. Migra Mundo. Maio/2014. Disponível em: <http://migramundo.com/2014/05/22/em-coletiva-missao-paz-faz-apelo-urgente-por-politica-migratoria-nacional/>. Acesso em: 15/10/2014.
Godoy, Gabriel Gualano de. O caso dos haitianos no Brasil e a via da proteção humanitária complementar. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro. Ed. Cla. São Paulo, 2011.
Haydu, Marcelo. A integração de refugiados no Brasil. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro. Ed. Cla. São Paulo, 2011.
Jubilut, Liliana Lyra. A Judicialização do Refúgio. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro. Ed. Cla. São Paulo, 2011.
Leão, Renato Zerbini Ribeiro. CONARE: Balanço de seus 14 anos de existência. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro. Ed. Cla. São Paulo, 2011.
Manual de Procedimentos e Critérios para a Determinação da Condição de Refugiado (de acordo com a convenção de 1951 e o protocolo de 1967 relativo ao Estatuto dos Refugiados – ACNUR.P.12.Genebra,2011.
Pereira, Luciana Diniz Durães. Uma visão brasileira do conceito “refugiado ambiental”. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro. Ed. Cla. São Paulo, 2011.
Ramos, André de Carvalho. Asilo e Refúgio: semelhanças, diferenças e perspectivas. 60 anos de ACNUR – Perspectivas do Futuro. Ed. Cla, São Paulo, 2011
STOCHERO, Tahiane; MARCELO, Yuri. Triplica em 2013 número de haitianos ilegais que entram pelo Acre. São Paulo. Disponível em: <http://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2013/09/triplica-em-2013-numero-de-haitianos-ilegais-que-entram-pelo-acre.html> Acesso em: 21/10/2014.
 
Notas:
[1] Lei 9474/97: Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:
I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;
II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;
III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.

[2] O Art. 7º da Lei n.º 9.474/97 prevê que em hipótese alguma será efetuada a deportação do migrante para fronteira do território em que sua vida ou liberdade esteja ameaçada, em virtude de raça, religião nacionalidade, grupo social ou opinião política. É importante ressaltar que o princípio da não devolução está expresso em muitas outras convenções internacionais, entre eles, além do artigo 33 da Convenção de 1951, também o artigo 3º da Convenção contra tortura e outros tratamentos ou penas cruéis desumanas ou degradantes, e o artigo 7º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.

[3] Cabe diferenciar, segundo o ACNUR, que ainda sobre o uso da expressão de migrantes ou refugiados, estes não se confundem com os Deslocados Internos ou Apátridas. A título de esclarecimento os deslocados internos são pessoas deslocadas dentro de seu próprio país, pelos mesmos motivos de um refugiado, mas que não atravessaram uma fronteira internacional para buscar proteção, enquanto, os apátridas são as pessoas que não têm sua nacionalidade reconhecida por nenhum país.

[4] Localizado em: http://escola.mpu.mp.br/dicionario/tiki-index.php?page=Refugiado+Ambiental. Dicionário de Direitos Humanos da Procuradoria da República. Acesso em: 24/10/2014.

[5] Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA define-se como a principal autoridade global em meio ambiente, é a agência do Sistema das Nações Unidas (ONU) responsável por promover a conservação do meio ambiente e o uso eficiente de recursos no contexto do desenvolvimento sustentável. Disponível em: http://www.onu.org.br/onu-no-brasil/pnuma/. Acesso em: 27/10/2014.

[6] Disponível em: http://www.efmsv2008.org/article/780?menu=103. Acesso em: 31/12/2014.

[7]A Lei 6.815/80, também chamado de estatuto do Estrangeiro define no seu art. 4º – Ao estrangeiro que pretenda entrar no território nacional poderá ser concedido visto: I – de trânsito; II – de turista; III – temporário; IV – permanente; V – de cortesia; VI – oficial; e VII – diplomático.

[8]Apresentação do Projeto Lei 5655/2009, do Poder Executivo, que "dispõe sobre o ingresso, permanência e saída de estrangeiros no território nacional, o instituto da naturalização, as medidas compulsórias, transforma o Conselho Nacional de Imigração em Conselho Nacional de Migração, define infrações e dá outras providências. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=443102. Acesso em 03/11/2014.

[9]Convenção de 1951, Art. 31 – Os Estados Contratantes não aplicarão sanções penais, devido a entrada ou estada irregulares, aos refugiados que, chegando diretamente do território onde a sua vida ou liberdade estavam ameaçadas no sentido previsto pelo artigo 1., entrem ou se encontrem nos seus territórios sem autorização, desde que se apresentem sem demora às autoridades e lhes exponham razões consideradas válidas para a sua entrada ou presença irregulares.

[10]A resolução normativa n.º 13 do CONARE dispõe sobre: O encaminhamento, a critério do Comitê Nacional para Refugiados – CONARE, ao Conselho Nacional de Imigração, de casos passíveis de apreciação como situações especiais, nos termos da Resolução Recomendada CNIg nº 08, de 19 de dezembro de 2006.

[12] O grupo NIEM (Núcleo Interdisciplinar de Estudos Migratórios), publicou um protesto contra ao uso da expressão “invasão haitiana”.
http://www.ippur.ufrj.br/index.php?option=com_content&view=article&id=864:sobre-o-uso-irresponsavel-do-termo-invasao-de-haitianos-pela-imprensa&catid=67:outros&Itemid=7. Acesso em 05/11/2014.

[13] TEM. Ministério do Trabalho e Emprego. Reunião extraordinária realizada em janeiro de 2012, conforme ata disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A36A27C140137E0DAB22838B5/Ata%20Reuni%C3%A3o%20Extraordin%C3%A1ria%20janeiro-2012%20v2.pdf. Acesso em 05/11/2014.

[14] O caso foi pesquisado pela Autora em período de estágio do curso de Direito na Defensoria Pública da União de São Paulo, o que possibilitou o acesso aos trâmites internos que serão analisados. Não serão divulgadas informações confidencias, em respeito à preservação da identidade e resguardo das vítimas.

[15] Nº PROCESSO: 08018.011143/2012-10 ESPÉCIE: Acordo de Cooperação Técnica. PARTICIPANTES: A SECRETARIA NACIONAL DE JUSTIÇA CNPJ: 00.394.494/0102-80, o COMITÊ NACIONAL PARA OS REFUGIADOS e a DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, CNPJ: 00.375.114/0001-16.
OBJETO: O presente Acordo de Cooperação Técnica tem por objeto estabelecer e aprofundar a temática de proteção e reconhecimento de direitos da população migrante, solicitante de refúgio e de refugiados no Brasil, especialmente no âmbito dos pedidos administrativos de reconhecimento da condição de refugiado e demais procedimentos relativos à expulsão de estrangeiros do País e processos de transferência de pessoas condenadas. Disponível em:

[16] A sigla “PAJ” e a respectiva numeração denominam “Processo de Assistência Jurídica” para controle interno.

[17] O não enquadramento ao instituto de refúgio não afasta a hipótese de outras situações permissíveis de permanência no Brasil. O Ministério da Justiça informa que: “A permanência no Brasil poderá ser concedida com base nas disposições da Lei nº 6.815/80 e nas Resoluções Normativas do Conselho Nacional de Imigração – CNIg, que estabelecem os critérios para a concessão de residência definitiva àqueles que se encontrem no País, nas hipóteses descritas abaixo:
– ao refugiado ou asilado (RN nº 06/97 e nº 91/2010- CNIg);
– ao cônjuge de brasileiro ou genitor de prole brasileira (Art. 75, II da Lei nº 6.815/80 c/c RN nº 36/99 – CNIg); 
– ao dependente legal de brasileiro ou de estrangeiro permanente ou temporário residente no País, maior de 21 anos (RN nº 36/99 – CNIg);
– ao companheiro de brasileiro ou estrangeiro permanente, sem distinção de sexo (RN nº 77/08 – CNIg); 
– ao titular de visto temporário na condição de professor, técnico ou pesquisador de alto nível ou cientista estrangeiro (RN nº 01/97- CNIg);
– à vítima de tráfico de pessoas (RN nº 93  do CNIg), e
– ao estrangeiro que perdeu a condição de permanente por ausência do País por prazo superior a dois anos (RN nº 05/97 – CNIg).”
 Disponível em:

[18] Dr. Marcus Vinícius Rodrigues Lima, titular do 1º Ofício de Direitos Humanos, Tutela Coletiva e Migrações, atuou no presente caso.

[19] Refere-se à Autora do trabalho, quando desenvolvido estágio do curso de Direito.

[20] Art. 8º São atribuições do Defensor Público-Geral, dentre outras:
XVI – requisitar de qualquer autoridade pública e de seus agentes, certidões, exames, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e demais providências necessárias à atuação da Defensoria Pública;

[21]A título exemplificativo a Cáritas Arquidiocesana é uma entidade comprometida com os direitos humanos e dedicada aos projetos especiais dentro do contexto social da Igreja, mantêm um convênio com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) e com o Ministério da Justiça, por meio do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE) para acolher, apoiar e orientar os solicitantes de refúgio e refugiados que chegam ao Brasil. Informações constantes em: http://caritas.org.br/projetos/programas-caritas/refugiados. Acesso em 06/11/2014.


Informações Sobre o Autor

Bianca Mariá Dornelles Rotta

Advogada graduada pela Universidade Paulista


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