Incongruências e aproximações entre o estado de bem estar social e a globalização

Resumo: O estudo é uma revisão analítica sobre o Estado de Bem Estar Social e sua relação com a Globalização da Economia, onde se realiza um estudo sobre a compatibilidade de ambas as estruturas da economia, procurando demonstrar se o crescimento social e econômico podem ocorre de maneira sustentável e equilibrada. A pesquisa é documental, cujo campo de investigação dá-se em doutrinas internacionais e nacionais e no ordenamento jurídico brasileiro. O referencial teórico dá-se por intermédio da inferência de doutrinas especializadas. enfatiza-se na pesquisa, algumas questões como o neoliberalismo, as políticas de desenvolvimento econômico e, especialmente, a grande concentração de renda somada às desigualdades sociais tornam o Brasil  propício para o fenômeno da super-exploração do trabalho assinalado pelos fatores da ilegalidade e baixo custo da mão-de-obra. No neoliberalismo a busca de lucros e a ausência das garantias sociais mínimas na ordem constitucional ferem as relações da dignidade humana, principalmente, em face da desigualdade econômica entre os países. A aplicação de um Estado de Bem Estar Social seria a solução para os problemas sociais nos países capitalistas. A conscientização no consumo e maior atuação do Estado nas políticas sociais seriam de vital importância para a compatibilidade entre os sistemas socioeconômicos.

Palavras-chave: Estado de Bem Estar Social. Globalização. Neoliberalismo.  Política Social.

Abstract: The study is an analytical review on the State of Social Welfare and its relationship to economic globalization, where he conducts a study on the compatibility of both the structures of the economy, seeking to demonstrate the social and economic growth can occur in a sustainable manner and balanced. The research is documentary, whose field research takes place in international and national doctrines and the Brazilian legal system. The theoretical occurs through specialized inference doctrines. emphasizes on the research, some issues such as neoliberalism, the economic development policies and, especially, the large concentration of income plus social inequalities make Brazil conducive to the phenomenon of super-exploitation of labor marked by lawlessness and factors of low cost of hand labor. Neoliberalism in the pursuit of profit and the absence of minimum social guarantees in constitutional relations injure human dignity, especially in the face of economic inequality between countries. Applying a Social

Welfare State would be the solution to social problems in the capitalist countries. The awareness on consumption and higher performance of the State in social policies, it would be of vital importance to the compatibility between socioeconomic systems.

Keywords: Welfare State; Globalization. Neoliberalism. Social Policy.

Sumário: Introdução. 1 O estado de bem estar social. 2 A economia globalizada. 3 A política do Bem-estar social na sociedade globalizada. 4 Do desenvolvimento econômico e social equilibrado. Conclusão.

Introdução

O desenvolvimento econômico auferido com o fim da segunda guerra mundial apresenta nova forma de economia, onde países industrializados impõem novas sistemáticas de regras gerais aos países em desenvolvimento, com o objetivo de proporcionar aumento de produção e mercado consumidor. Desenvolve, portanto, crescente aumento da competição dos mercados produtores em busca de maior produtividade e redução de custos, gerando nos países em desenvolvimento elevados níveis de superexploração do trabalho e desemprego.

Nesse contexto nasce o Welfare State ou o Estado do Bem Estar Social, que aqui serão usados indiscriminadamente, onde se usa a organização estatal para modificar e tentar equilibrar as forças de mercado para eu seja garantido aos indivíduos com renda mínima a diminuição da insegurança ou contingencias sociais com o fim de amenizar as consequências que o mercado em sua estrutura globalizada poderia causar as pessoas inseridas nesse contexto. Podemos afirmar que um dos fundamentos do Welfare State seria a existência de um padrão mínimo de renda, alimentação, saúde, alojamento que deveria ser garantido pelo Estado a qualquer cidadão (WILENSKI, 1975). Não poderia ser entendido como caridade do Estado, mas como a existência de um padrão mínimo garantido ao cidadão.

A economia implantada nos países em desenvolvimento, com o objetivo de obter lucros e reduzir seus custos pelo aumento da exploração dos trabalhadores, por meio da redução de salários, aumento das jornadas de trabalho e eliminação dos direitos dos trabalhadores, cria ambiente propício a desigualdades sociais e desemprego e é justamente nesse contexto que o Welfare State deve haver a interveniência do Estado.

A busca de um novo modelo econômico e social é necessária para exista o equilíbrio entre mercado e social. Portanto, é indispensável análise sobre o assunto, pois se trata de interesse de toda a sociedade, sendo essencial verificar como o Estado, a sociedade e a economia estão reagindo frente a esta realidade. O debate em torno do tema é importante para demonstrar que crescimento econômico não pressupõe a exploração do trabalho e nem o retrocesso social.

1. O Estado de Bem Estar Social

Definir o que vem a ser um Estado de Bem-Estar Social é fator primordial para melhor compreensão bem como fazer uma revisão de modo a alcançar a melhor compreensão do termo e entender as tendências suas tendências e características que lhe são próprias.

O Welfare State, no entendimento de Aureliano e Draibe como sendo:

“Uma particular forma de regulação social que se expressa pela transformação das relações entre o Estado e a economia, entre o Estado e a sociedade, a um dado momento do desenvolvimento econômico. Tais transformações se manifestam na emergência de sistemas nacionais públicos ou estatalmente regulados de educação, saúde, previdência social, integração e substituição de renda, assistência social e habitação que, a par das políticas de salário e emprego, regulam direta ou indiretamente o volume, as taxas e os comportamentos do emprego e do salário da economia, afetando, portanto, o nível de vida da população trabalhadora” (DRAIBE e AURELIANO, 1989, p. 24)

Benevides (2011) reporta que o Welfare State  faz referencia a ação do Estado na organização e implementação das políticas de provisão do Bem-Estar, sendo na redução dos riscos sociais ou mesmo nos resultados adversos do mercado, vejamos:

“A ação estatal na organização e implementação das políticas de provisão de bem-estar, independentemente do grau em que se efetiva a participação do Estado, reduzindo os riscos sociais aos quais os indivíduos estão expostos, baseando-se em uma noção de direito social.. Também estão ligadas a uma determinada relação entre o Estado e o mercado, na qual o segundo tem alguns de seus movimentos modificados pelo primeiro de modo a se reduzir os resultados socialmente adversos do mercado. Além disso, há a noção de substituição da renda, quando esta é perdida temporária ou permanentemente, dados os riscos próprios aos quais as economias capitalistas estão expostas. Vale mencionar ainda, a busca da presença da manutenção da renda em pelo menos um patamar mínimo de modo a que as necessidades dos indivíduos sejam atendidas, mesmo a dos que se encontram fora do mercado”. (BENEVIDES, 2011, p. 12)

Brigss (2006) apresenta o Welfare State como sendo um Estado onde deliberadamente o poder organizado faz um esforço para que seja modificado o jogo de forças do mercado em pelo menos três direções, quais sejam a primeira garantindo uma renda mínima para os indivíduos e suas famílias, posteriormente diminuindo o grau de insegurança em casos e contingências socais e por fim um conjunto de serviços sociais independente da classe a qual faça parte, vejamos:

“A welfare state is a state in which organized power is deliberately, used (through politics and administration) in an effort to modify the play of market forces in at least three directions – first, by  guaranteeing individuals and families a minimum income irrespective of the market value of their work or their property; second, by narrowing the extent of insecurity by enabling individuals and families to meet certain “social contingencies ” (for example, sickness, old age unemployment) which lead otherwise to individual and family crises; and third, by ensuring that all citizens without distinction of status or class are offered the best standards available in relation to a certain agreed range of social services”. (BRIGGS, 2006. p. 16).

Devemos, entretanto observar que o Welfare State como bem lembra Andersen ( 1991) que o Estado de Bem Estar Social não é só compreendido em termos de direitos  garantias, mas deve-se considerar o conjuntos de atos que se entrelaçam com o papel do mercado:

“O welfare state não pode ser compreendido apenas em termos de direitos e garantias. Também precisamos considerar de que forma as atividades estatais se entrelaçam com o papel do mercado e da família em termos de provisão social”. (1991)

Nesse sentido Winckler e Moura (1992), demonstram que com o crescimento econômico após a Segunda Guerra Mundial a foram manifestadas preocupações distributivas cm fundamento nas responsabilidades social do empregador e do Estado, vejamos:

“Após a II Guerra Mundial, manifestam-se preocupações distributivistas, fundadas na concepção do trabalho como atividade social e na responsabilidade social do empregador e do Estado. O aparecimento do Welfare State associa-se à emergência de burocracias e trabalhadores organizados em sindicatos e partidos, precondição ao desenvolvimento da cidadania social. A escolha estratégica do movimento operário, segundo Przeworski, de aceitar mecanismos parlamentares como instrumentos legítimos para ampliar reformas construiu uma quase- identidade entre o Welfare State e a social-democracia. Ressalve-se que, até a I Guerra Mundial, a solução para os problemas capitalistas era vista na socialização e/ou na nacionalização e que, pelo menos até a década de 30, o movimento operário não tinha nenhum tipo de política econômica própria, afora a experiência sueca de Wicksell e a forma bastarda do New Deal, que conciliou políticas sociais e investimentos para a guerra”. (WINCKLER, e MOURA, 1992, p. 111)

Verifica-se portanto,  que o conjunto de políticas de entrelaçamento entre garantias individuais e o mercado em busca de equilíbrio, como forma de evitar comportamento do mercado que possa ser inadequado ao desenvolvimento social.

2. A Economia Globalizada

Falar de globalização não é simples. É um tema amplo, complexo, envolto de contradições. Dispõe Nardi (2006, p. 54): “A globalização é caracterizada, essencialmente, pela política de abertura dos mercados, cujos fundamentos éticos seguem, imperativamente, os ditames do livre mercado em detrimento das questões sociais”.

Com o surgimento da economia neoliberal e o desenvolvimento econômico ocorrido na segunda metade de século XX, os países industrializados descentralizaram a produção a países periféricos e subdesenvolvidos, impondo uma nova ideologia já devidamente formatada aos interesses econômicos dos países desenvolvidos, como fórmula a ser seguida para o caminho do desenvolvimento.

O neoliberalismo tem como princípio a redução do Estado como instrumento político e econômico, onde o próprio mercado trataria de realizar o equilíbrio desejado. A  tendência de substituir a ordem espontânea e complexa por planejamentos realizados pelo homem como forma de controle social e econômico acabaria por resultar em um empobrecimento e na servidão (HAYEK, 1990). O Estado neoliberal defende, dessa forma, a livre atuação do mercado como forma de auto-regulação, crescimento econômico e consequentemente o crescimento social.

A redução do controle do Estado como instrumento de gestão econômica e política faz parte da proposta neoliberal, e o fracasso de sucessivos planos econômicos para combate a inflação gera severas desconfianças na capacidade do Estado em relação à sua função sobre a economia, onde deve reduzir o controle, como forma de estimular as reformas necessárias que surgiriam pela a livre competição (SODRÉ, 1995).

Avelãs Nunes (2003) afirma que a globalização é também um fenômeno de cunho cultural e ideológico, onde o imperialismo industrial tenta submeter ao mundo uma ditadura de pensamento único, onde deveriam ser aplicadas como produtos prontos para que pudessem ter nível de desenvolvimento equiparado aos países industrializados. A racionalização dos interesses dos países dominantes em busca de maior controle estratégico do poder econômico sustentava a necessidade de diminuir o Estado e cortar as suas gorduras, com a menor intervenção na economia (NETTO; BRAZ, 2010).

A proposta neoliberal é o Estado mínimo, normativo e administrador, onde não realize interferência na regulação do mercado, pois a intervenção que deforma os mercados geraria espirais inflacionárias (ADOLFO, 2001). A idéia neoliberal não é deixar as coisas sem controle, mas as forças da concorrência no mercado criariam o equilíbrio necessário para orientar os esforços individuais. Mas para que essa concorrência funcione de forma benéfica é condição primordial a criação de estruturas legais bem elaboradas, criando condições essenciais à concorrência leal, tornando desnecessário um controle social consciente, liberado, portanto, da intervenção coercitiva do Estado (HAYEK, 1990). O modelo adotado nas relações de trabalho mantém as características coerentes com os princípios de não interferência do Estado na ordem econômica e social para que os indivíduos tenham liberdade como interlocutores sociais e ajustem as suas normas trabalhistas e as formas de solução de seus conflitos (NASCIMENTO, 2011. p.139).

Adam Smith (1981. v. 1) reconhece que a especialização econômica e de cooperação foi a chave para melhorar os padrões de vida, quebrando velhas formas de pensar sobre negócios, do comércio e das políticas públicas, e levando à fundação de um novo campo de estudo: a economia (BUTLER, 2010). Smith, como defensor da liberdade da economia, e criador da teoria da “mão invisível”, argumenta que a economia tem condições de se autorregular e acredita na liberdade de pactos, ou seja, que nas relações de trabalho a liberdade de contrato não necessitava serem iguais para todos, dessa forma cada trabalhador tinha liberdade para celebrar conforme sua conveniência, onde “os operários pretendem obter o máximo possível, os patrões procuram pagar-lhes o mínimo possível” (SMITH, 1981. v. 1).

Friedman (1984) deu sustentação científica para o pensamento neoliberal em contraponto que a atuação do Estado intervencionista promoveria o bem-estar social. Sustentava, ainda, que no neoliberalismo o bem-estar social poderia ser preservado e ampliado. Friedman define o papel do Estado, onde “um governo que mantenha a lei e a ordem; defina os direitos de propriedades; sirva de meio para a modificação dos direitos de propriedade e de outras regras do jogo econômico; julgue disputas sobre a interpretação das regras; reforce contratos; […] forneça uma estrutura monetária” entres outros, mas que não intervenha na economia a ponto de prejudicar a livre concorrência. Avelãs Nunes (2003) demonstra, ainda, que Friedman “defendeu mesmo que esses países (em desenvolvimento) nem sequer precisavam ter banco central, sendo preferível alinhar a sua moeda pela moeda de outro dominante”.

Uma das estratégias do capital para enfrentar uma conjuntura que lhe era desfavorável foi a desconcentração industrial, promovendo a desterritorialização da produção, onde unidades produtivas eram deslocadas para novos espaços, preferencialmente em áreas periféricas e com dificuldades sociais e econômicas, com a finalidade de realizar a exploração do trabalho de forma mais intensa, países estes onde não houvesse tradição com movimentos sociais ou que as políticas de proteção ao trabalhador fossem frágeis (NETTO; BRAZ, 2010).

Dessa forma, a reabertura dos mercados entre países e a maior integração econômica e tecnológica são fatores primordiais para a política neoliberal, pois os defensores do neoliberalismo afirmam que a solução para eliminação da pobreza está na liberdade da economia e não na intervenção estatal.

3.  A política do bem-estar social na sociedade globalizada

Nogueira (2001) lembra que as teorias explicativas sobre a gênese e desenvolvimento do Walffare State são diversas, mas que se constitui como elemento  estrutural do capitalismo como um esforço para a reconstrução econômica  e da democracia liberal:

“O Welfare State, como padrão de política social, surge como um fenômeno do século XX e as teorias explicativas sobre sua gênese e desenvolvimento são inúmeras. Há um consenso, entretanto, que se constitui como um elemento estrutural ao capitalismo contemporâneo, sendo que significou mais do que um incremento nas políticas sociais. Representou um esforço de reconstrução econômica, moral e política do mundo industrial desenvolvido e um anteparo à possível ampliação de propostas comunistas. Economicamente significou o abandono da “ortodoxia do mercado”. Moralmente significou a defesa das idéias de justiça social solidariedade e universalismo. Politicamente foi parte de um projeto de construção nacional da democracia liberal em reação às ditaduras fascista e bolchevista” (NOGUEIRA, 2001, p. 99)

Vale ressaltar, conforme lembra Giddens (1996) que os objetivos estruturais do Estado do Bem Estar Social seriam:  

“Definir um papel central para o trabalho nas sociedades industriais, como uma forma de viver; promover a solidariedade nacional, sendo os sistemas previdenciários parte de um processo mais global de construção do Estado-nação; administrar os riscos de “uma sociedade criadora de riquezas e orientada para o futuro – em especial, é claro, aqueles riscos que não são subordinados na relação trabalho-salário” (GIDDENS, 1996, p. 156).

Draibe (1998) demonstra a dificuldade entre o equilíbrio das politicas econômicas com a aplicação das políticas sociais, principalmente nos casos dos países latino-americanos.

“Versões mais matizadas insistiram no argumento de que, com certa independência das orientações político-ideológicas, os governos contemporâneos tornaram-se todos eles prisioneiros do difícil dilema entre  a nova política econômica e a política de proteção social, produzindo o desmantelamento ou, no mínimo, um recuo, da proteção social. No caso dos países latino-americanos, sob forte pressão financeira internacional, esses teriam optado radicalmente por um lado da balança – o do ajustamento fiscal e as reformas comerciais e patrimoniais pró-mercado. Ao fazê-lo, teriam dado passos mais significativos naquela mesma direção. Privatizações de serviços sociais públicos, quedas significativas do gasto social, reduções importantes dos graus de proteção social anteriormente oferecidos teriam sido os resultados mais palpáveis desses processos “(DRAIBE, 1998, p. 64).

Fiori (1997) destaca que o processo de reorganização na economia mundial tem criado um ambiente instável para a aplicação do Welfare State, principalmente onde os países seguindo  a cartilha da política neoliberal, reduz as atividades sociais o Estado como forma de combate à crise:

“Ainda mais quando se tem presente que o próprio processo de reorganização da economia mundial afeta estas periferias de maneira a exponenciar seus traços anteriores mais perversos do ponto de vista social. Ali, as crises fiscais e financeiras dos Estados adquiram caráter crônico e vêm sendo enfrentadas pelo receituário neoliberal com a proposta pura e simples de cortes cada vez mais profundos no gasto público, sobretudo o de natureza social. De maneira tal que é possível prever uma “transição” dos welfare states mais desenvolvidos para formas inferiores de atenção, situadas em algum ponto entre o modelo liberal norte-americano e o modelo corporativo alemão. No caso dos países periféricos fica difícil imaginar que seja em cenário resultante da liberalização radical de sistemas que já eram basicamente de tipo liberal e assistencial tenham tido ilhas de universalidade.” (FIORI, 1997, p. 17)

A ligação do Welfare State com o capitalismo é histórica, onde as demandas democráticas atuam com um papel estailizador na tensão  entre a democraia e o mercado (WINCKLER, e MOURA, 1992):

“Pode-se afirmar que o Welfare State é uma forma histórica de relacionamento da economia de mercado capitalista e das demandas democráticas; é justamente esse tipo de Estado que cumpre um papel estabilizador na tensão entre democracia e mercado. Políticas de bem-estar surgem com a expansão capitalista e a generalização das relações salariais no século XIX. A mercantilização crescente exigiu para sua universalização a ingerência do Estado. O ingresso da mulher na força de trabalho, por exemplo, exigiu a criação de instituições de amparo à criança. Por outro lado, a tentativa de regular o mercado de trabalho, através da limitação da jornada de trabalho ou da seguridade social, expressa os limites da mercadoria-trabalho que, se entregue ao livre fluxo mercantil, seria tendencialmente destruída”. (WINCKLER, e MOURA, 1992, p. 112).

No Brasil podemos verificar a aplicação de medidas redistributivista na Constituição Federal, conferindo ao Estado um papel de mantenedor social mínimo alicerçado no principio da dignidade da pessoa humana, Draibe (1990), demonstra o maior comprometimento do Estado no financiamento do sistema social:

"(…) a ampliação e a extensão dos direitos sociais (novos direitos, assim como sua homogeneização, a novas categorias sociais), a universalização do acesso e a expansão da cobertura, um certo afrouxamento do vínculo contributivo como princípio estruturante do sistema, a concepção de seguridade social como forma mais abrangente de proteção, a recuperação e redefinição de patamares mínimos dos valores dos benefícios sociais e, enfim, o maior comprometimento do Estado e da sociedade no financiamento de todo sistema" (Draibe, 1990, p. 29).

O'connor demonstra que o Estado capitalista tem duas funções que necessitam desempenhar, mas que são antagônicas entre ou seja acumulação e legitimação com o objetivo de criar juntamente com o Estado a harmonia social:

"(…) o Estado capitalista tem de tentar desempenhar duas funções básicas e muitas vezes contraditórias: acumulação e legitimação (…). Isto quer dizer que o Estado deve tentar manter, ou criar, as condições em que se faça possível uma lucrativa acumulação de capital. Entretanto, o Estado também deve manter ou criar condições de harmonia social. Um Estado capitalista que empregue abertamente sua força de coação para ajudar uma classe a acumular capital à custa de outras classes perde sua legitimidade e, portanto, abala a base de suas lealdades e apoios. Porém, um Estado que ignore a necessidade de assistir o processo de acumulação de capital arrisca-se a secar a fonte de seu próprio poder, a capacidade de produção de excedentes econômicos e os impostos arrecadados deste excedente (e de outras formas de capital). (O'Connor, 1977, p. 19)

Do exposto verifica-se que as estruturas sociais equilibradas são pressupostos básicos para o desenvolvimento econômico, por mais que pareça ser antagônico o sistema globalizado liderado pelo capitalismo deve coexistir com o Estado do Bem Estar social, como engrenagem de um sistema complexo.

4. Do desenvolvimento econômico e social equilibrado. 

O desenvolvimento econômico deve vir acompanhado de desenvolvimento social, devendo haver o equilíbrio entre os interesses. Ora, se não for assim, qual seria o objetivo de estimular a produção, criar um Estado menos intervencionista, flexibilizar os direitos sociais? Certamente deve haver um objetivo nessa ação, pois em análise realizada por Bresser (2005) verifica-se o papel do Estado na promoção da riqueza das nações e concentra-se a atenção na própria organização ou aparelho Estatal, e na forma que é gerido.

O interesse econômico é o que impulsiona a atuação do ser humano na sociedade (SENTO-SÉ, 2001) e atrai para si todos os meios possíveis para realizar a atividade de forma eficaz e lucrativa. Dessa forma Furtado (2000) observa que o desenvolvimento alcançado por meio das novas técnicas não pode ser alheio ao desenvolvimento social: “não é condição suficiente para que sejam mais bem satisfeitas as necessidades elementares da população”, não bastando somente o incremento tecnológico e sim beneficiar o maior número de pessoas possíveis.

O subdesenvolvimento é resultado das relações do sistema econômico mundial o qual integra, em um mesmo padrão de transformação, diferentes formações sociais, com capacidades assimétricas de introduzir e de difundir progresso técnico, (ALMEIDA, 2009), as regras padronizadas do neoliberalismo não oferecem a solução para o desenvolvimento social dos países periféricos causando dependência e crise social e econômica. Furtado (1975), mostra que as “causas da dependência dos países subdesenvolvidos estariam ligadas ao controle do progresso tecnológico dos países centrais”.

Os Estados periféricos necessitam conciliar os interesses humanos, sociais e econômicos da população priorizando os interesses públicos em detrimento dos interesses privados (POMPEU, 2009). Tal importância se verifica, pois o Estado tem o dever de garantir o mínimo, ou seja, são necessárias políticas sociais efetivas protegendo o cidadão de forma aceitável com a condição humana, com a dignidade humana já alicerçada no ordenamento jurídico nacional. O conhecimento é fator preponderante para uma nação desenvolver-se, o desenvolvimento social deve estar em equilíbrio, o rompimento com o individualismo é fundamental para assumir uma posição de igualdade coletiva (POMPEU 2009).

O desenvolvimento social equilibrado deve vir acompanhado de políticas de proteção, não somente para a coletividade que sofre os efeitos das políticas de mercado, mas para “salvar o sistema de mercado de suas tendências antropofágicas, criar mais espaço doméstico para a política e permitir ao mundo uma taxa de crescimento mais elevada (KUTTNER, 2004)

A evolução do neoliberalismo como forma de política econômica deve sofrer ajustes, de maneira que a ordem se estabeleça de racionalmente, livre e humana (CHOMSKY, 2003). O desenvolvimento deve ocorrer com políticas sociais e econômicas voltadas para o desenvolvimento do mercado, mas a presença do Estado é inevitável como forma de equilíbrio entre lucros e distribuição de riquezas, “conciliando por fim o humano ao nacional” (POMPEU, 2009). O Estado enfraquecido não pressupõe desenvolvimento humano, cria um campo apropriado para o abuso e a exclusão social (POMPEU, 2009).

  O desenvolvimento não é acúmulo e aumento da produtividade macroeconômica “mas principalmente o caminho de acesso a formas sociais mais aptas a estimular a criatividade humana e responder às aspirações da coletividade” (FURTADO, 2004). Verifica-se, ainda, para que os ideais de desenvolvimento cultural, econômico e social tenham os seus fins alcançados é necessária a participação de toda uma geração:

“Não é por arrogância que me atrevo a falar a meus colegas economistas em tom conselheiro. A idade não nos outorga direitos, mas a experiência nos arma para enfrentar muitos dissabores. Sabemos que uma luta dessa magnitude só terá êxito com a participação entusiástica de toda uma geração. A nós, cientistas sociais, caberá a responsabilidade maior de velar para que não se repitam os erros do passado. Ou melhor, para que não voltem a ser adotadas falsas políticas de desenvolvimento cujos benefícios se concentram nas mãos de poucos” (Furtado, 2004, p 486)

A evolução econômica e social é uma constante na história mundial; os diversos modelos econômicos que surgiram não permaneceram eternizados, sendo criadas novas formas de desenvolvimento econômico. E certamente não será diferente com o neoliberalismo: cada vez mais é exigido do Estado, da empresa, o fortalecimento econômico e social, não se admitindo o retrocesso social, não se consentir ferir conquistas tão duramente alcançadas, a sociedade exige um novo modelo, um modelo onde exista o lucro, o desenvolvimento tecnológico, e o respeito ao cidadão, o respeito ao consumidor, fazendo parte de uma nova realidade. “O novo desenvolvimento é obra coletiva nacional que conta com instituições políticas e econômicas voltadas para o funcionamento dos mercados, mas que promovem desenvolvimento econômico e social (POMPEU, 2009, 145), onde “o desenvolvimento tem de estar relacionado, sobretudo com a melhoria da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos” (SEN, 2000, p. 29).

Fukuyama (2005) demonstra que, para a existência de equilíbrio entre desenvolvimento social e econômico, é necessário que as instituições econômicas sejam fortes e o Estado seja eficaz no desempenho de suas atividades. Dessa maneira as possibilidades de êxito entre o desenvolvimento econômico e social serão maiores.

Conclusão

O Welfare State ou o Estado de Bem Estar Social utilizado como ferramenta para se alcançar a paz social. O equilíbrio entre o social e as forças de mercado era necessário um modelo que garantisse aos indivíduos uma pequena garantia ou amenizar as contingências sociais. A redução do Estado realizado pelas politicas liberais e neoliberais tinha com fim reduzir o Estado e deixar que o mercado regulasse a economia e consequentemente o crescimento social.

A doutrina econômica neoliberal, foi implantada em diversos países com promessas de desenvolvimento econômico e social, mas a realidade ocorreu de forma diferente, criando desemprego e retrocesso social, onde países desenvolvidos se utilizavam da fragilidade do Estado para ampliar os lucros e o mercado consumidor.

O Estado Democrático de Direito tem o dever de proteger e garantir que seja respeitada e efetivada a proteção do ser humano, contra as diversas formas de aviltamento deste. Tem a obrigação de proteger contra as ações que possam reduzir a pessoa a um objeto, sem valor algum, sem dignidade.

O Estado deve agir de forma a regular o mercado, protegendo-o da autofagia do neoliberalismo, posto que, as idéias neoliberais não conseguiram cumprir a sua promessa de desenvolvimento e que a ausência de uma estrutura institucional adequada deixou os países que implantaram essa política em situação econômica gravemente comprometida. O Estado como regulador da economia e as instituições econômicas fortalecidas apresentam uma saída para a crise. A economia deve crescer, mas respeitando o Estado como ente regulador.

O lucro, objetivo base das empresas deve sempre ser seguido, mas e a responsabilidade social das empresas deve ocorrer simultaneamente. O Estado regulador da economia e as empresas conscientes de sua responsabilidade social são fomentadores do desenvolvimento econômico e social de um país.

Observamos que o welfare state e elemento chave para o capitalismo conseguir seus objetivos, pois com as politicas sociais a solução de conflitos são reduzidos trazendo a paz social para a sociedade e realizando a redistribuição dos ganhos do trabalho social e a população terá a proteção contra riscos da vida social, proteção essa criada como um direito de cidadania.

Do exposto entende-se que a globalização é perfeitamente compatível com o Estado de Bem Estar Social, com já foi dito são elementos, engrenagens de algo maior, não se concebe o crescimento econômico sem o crescimento social.

 

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SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000
SMITH, Adam. Riqueza das nações. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1981. v. 1, p.176.
SODRÉ, Nelson Wernek. A força  do neoliberalismo. São Paulo: Graphia Editorial, 1995.
WILENSKY, Harold. The Welfare State and Equality. Berkeley, University of California, 1975.

Informações Sobre os Autores

Marcus Mauricius Holanda

Doutorando em Direito Constitucional; Mestre em Direito Constitucional pela UNIFOR. Especialista em Direito do Trabalho e Processual Trabalhista pela Faculdade Christus. Advogado.

Felipe Meira Marques

Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza, Advogado, Psicólogo graduado pela UFC. Especialista em Processo Civil pela Unichristus


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