O princípio da continuidade no licenciamento ambiental

Resumo: O licenciamento ambiental é um processo administrativo complexo e encadeado, comportando em regra três etapas distintas. Apesar desta diferenciação em fases, trata-se de um procedimento uno, ao qual se aplicam os princípios do direito, em especial o princípio da continuidade, sob o risco de restrição à tutela de direitos e retrocessos lógicos.

Palavras-chave: Continuidade Administrativa; Licença Ambiental; Licenciamento Ambiental; Processo Administrativo; Segurança Jurídica.

Abstract: The environmental licensing is an administrative process complex and chained, behaving in a rule three distinct steps. Despite this differentiation in phases, it is a procedure, which applies the principles of law, in particular the principle of continuity, under the risk of restricting the protection of rights and logical kickers.

Keywords: Continuity; Environmental Permission; Environmental Licensing; Administrative Process; Legal Security.

Sumário: 1. Apresentação; 2. O Licenciamento Ambiental como Instrumento Jurídico-administrativo; 3. O Princípio da Continuidade Administrativa no Licenciamento Ambiental; 4. Considerações Finais; Referências.

1. Apresentação

O tema do licenciamento ambiental no Brasil não é uma novidade. Convalidado pela Constituição Federal de 05 de outubro de 1988, o assunto foi introduzido em nosso sistema jurídico ainda no século passado, por meio da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente.

Apesar dessa longa existência no mundo jurídico, muitas controvérsias permeiam a política ambiental brasileira, inclusive com o alargamento de competências traçado pela Carta Magna. Além disso, considerando a gama crescente de documentos internacionais que foram sendo acolhidos por nosso ordenamento desde a Conferências das Nações Unidas de Estocolmo em 1972 e, principalmente, pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, deve ser admitido que somente neste século foi construída uma maior clareza sobre a dimensão de vários temas relativos à gestão ambiental, inclusive sobre os seus princípios e a sua aplicação.

Da mesma forma, desde a sua gênese a política ambiental convive com um conflito permanente entre as concepções cartesianas e pós-modernas de mundo ou as discussões entre antropocêntricos e biocêntricos.

“[…], considerando a complexidade das questões ambientais, deve-se analisar o enfoque a ser dado para a proteção do meio ambiente, questionando se é possível privilegiar aquilo que interessa ao homem, em uma visão estritamente antropocêntrica” (FIORILLO, 2012, p. 83).

Certa, e isto é inquestionável, é a dimensão transindividual do meio ambiente como direito fundamental, a ser protegido em favor das presentes e das futuras gerações, como está consagrado no caput do art. 225 da Constituição.

Em razão do predomínio da solidariedade como valor basilar da proteção do meio ambiente, o sempre inovador Enrique Leff (2006) vai buscar na obra de Emmanuel Levinas o conceito de “outridade” para tratar das questões ambientais, um novo modelo ético centrado no outro, conhecido ou desconhecido, presente ou futuro, humano ou não humano, em contraposição ao domínio ético liberal da “alteridade”.

Sob o ponto de visto jurídico, analisando as interfaces entre o modelo constitucional português contemporâneo e o brasileiro, José Joaquim Gomes Canotilho cita a emergência de um Estado de Direito Ambiental, o qual compreende as seguintes dimensões essenciais da juridicidade:

“a) dimensão garantístico-defensiva, no sentido de direito de defesa contra ingerências ou intervenções do Estado e dos demais poderes públicos;

b) dimensão positivo-prestacional, pois cumpre ao Estado e a todas as entidades públicas assegurar a organização, procedimento e processos de realização do direito ao ambiente;

c) dimensão jurídico irradiante para todo o ordenamento, vinculando as entidades privadas ao respeito do direito dos particulares ao ambiente;

d) dimensão jurídico-participativa, impondo e permitindo aos cidadãos e à sociedade civil o dever de defender os bens e direitos ambientais” (CANOTILHO, 2011, p. 24-25).

Numa análise mais direta do licenciamento ambiental, como será visto mais adiante, todas as dimensões citadas por Canotilho são observadas transversalmente neste instrumento, cabendo ao Estado pesar de forma equilibrada as suas obrigações essencias, que são os seus “deveres de proteção ambiental”, “a proibição do excesso” e a “proibição da insuficiência de proteção”:

“[…] Posto de outra forma, se, por um lado, o ente estatal não pode atuar de modo excessivo, intervindo na esfera de proteção de direitos fundamentais a ponto de desatender aos critérios da proporcionalidade ou mesmo a ponto de violar o núcleo essencial do direito fundamental em questão, também é certo que o Estado, por força dos seus deveres de proteção aos quais está vinculado, também não pode omitir-se ou atuar de forma insuficiente na promoção e proteção de tal direito, sob pena incorrer em violação da ordem jurídico-constitucional” (SARLET, FENSTERSEIFER, 2012, p. 193).

Desta forma, por maiores que sejam as exigências contemporâneas, inclusive com mudança de paradigma ético, a atuação do Estado na proteção ambiental deve ser realizada de forma imperativa mas proporcional, fincando adstrita às normas, regras e princípios que instrumentalizam a matéria. Muitas vezes é a insuficiência ou o excesso dessa atuação acaba gerando controvérsias insolúveis, notadamente quanto à aplicação de normas comuns aos demais ramos do direito.

2. O Licenciamento Ambiental como Instrumento Jurídico-administrativo

O licenciamento ambiental das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras foi instituído como instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente pelo art. 9º, IV, da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Como se observa, está expressa na própria redação normativa o princípio da precaução, tendo em vista que as atividades são obrigatoriamente licenciáveis apenas pela sua potencialidade poluidora.

Mais adiante, já com a redação firmada pela Lei Complementar nº 140, de 08 de dezembro de 2011, o art. 10 define o campo de aplicação do licenciamento, reforçando a precaução estabelecida pelo artigo anterior:

“Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental”.

É importante destacar que desde a gênese do sistema ambiental brasileiro, conforme artigo 12 da Lei 6.938/1981, o licenciamento é condição para o recebimento de financiamento e incentivos governamentais, muito embora tal exigência tenha se tornado mais evidente apenas no final da década de noventa do século passado, demonstrando o crescimento da relevância que vem sendo dada ao assunto.

O conceito normativo de licenciamento ambiental é estabelecido pelo inciso I, do art. 1º, da Resolução nº 237, de 19 de dezembro de 1997, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), como “procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso”.

A ideia de processo e procedimento está sempre presente no licenciamento. Celso Antônio Pacheco Fiorillo, por exemplo, afirma que este é “o complexo de etapas que compõem o procedimento administrativo, o qual objetiva a concepção da licença ambiental. Dessa forma, não é possível identificar isoladamente a licença ambiental, porquanto esta é uma das fases do procedimento” (FIORILLO, 2012b, p. 222).

Diferenciam-se, assim, licenciamento de licença ambiental. O primeiro, como observado anteriormente, é um conjunto de etapas e procedimentos administrativos encadeados. A Licença, por seu turno, é um ato administrativo que, apesar do debate doutrinário conceitual sobre este ponto, no entendimento do signatário deste artigo “é um ato administrativo de natureza especial, definitivo, por tempo determinado e vinculado mediante discricionariedade técnica”.

É importante fazer uma pequena revisão sobre uma confusão que muitos autores fazem ao introduzir o antigo conceito de licença ao modelo ambiental. Em termos gerais, a licença é vista como ato meramente declaratório, definitivo e vinculado, tal qual as licenças urbanísticas e de atividade. Como a licença ambiental difere em suas características, pela existência de decisões discricionárias, pela restrição temporal na sua vigência e pela possibilidade de modificações ou até cancelamento em razão de mudanças tecnológicas ou ambientais, parte da doutrina classifica a licença ambiental mais como autorização, especialmente porque este modelo de licença apresenta uma certa precariedade.

Este é um debate equivocado e superado, pois a licença ambiental em momento algum assume o caráter de mera autorização pelo simples peso discricionário. Na verdade, adota-se um modelo de discricionário derivado de estudos técnicos imperativos, os quais são fornecidos pelo próprio empreendedor, com a participação deste e dos seus responsáveis técnicos, inclusive com a possibilidade de responsabilização civil e penal pelas informações que são prestadas ao órgão licenciador. Logo, a concessão da licença ambiental não é um ato de mera vontade da autoridade administrativa, como a autorização, mas o resultado de uma série de procedimentos, condicionados por um parecer técnico interdisciplinar, que limitam a esfera de decisão dos órgãos administrativos do Estado.

Na verdade, a doutrina que sustenta os conceitos de licença e autorização ainda está baseada em uma visão estática e patrimonialista do Estado que vigorava nos períodos anteriores ao regime da Constituição de 1988. Portanto, superada. Da mesma forma, a moderna concepção administrativa não aceita mais a lógica formalista das antigas licenças, cada vez menos necessárias para a administração do interesse público considerando a crescente abrangência do processo ambiental. Mas esta é uma discussão longa, que merece tratamento próprio.

Hoje, quando se fala em discricionariedade é imperativo reconhecer a sua limitação pela Lei e pelos princípios do direito, especialmente o da impessoalidade, o da finalidade, o da motivação e o da razoabilidade. Não se admite mais a expedição, pelo Estado, de atos que interfiram na vida de cidadãos e cidadãs, no meio ambiente ou na atividade econômica sem a devida motivação e ponderação das medidas adotadas, sob o risco da declaração de abuso de poder. Logo, a licença ambiental é, sim, uma licença.

Já o licenciamento ambiental, por seu turno, é um conjunto de procedimentos. Desta forma, “não é ato administrativo simples, mas sim um encadeamento de atos administrativos, o que lhe atribui a condição de procedimento administrativo” (FIORILLO, 2012b, p. 223).

Logo, mesmo que existam três fases, em regra, de licenciamento ambiental – Licença Prévia (LP), Licença de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO) –, estas sofrem um encadeamento lógico e contínuo, pois representam etapas de um mesmo procedimento que é o licenciamento ambiental, sujeitas, assim, à imperativa aplicação dos demais princípios do processo administrativo, incluindo o da continuidade e o da segurança jurídica, como será visto mais adiante. Não pretendemos, obviamente, ingressar no debate sobre a diferenciação que parte da doutrina faz em relação ao processo e ao procedimento administrativo, motivo pelo qual os dois termos são tratados aqui sempre como sinônimos.

3. O Princípio da Continuidade Administrativa no Licenciamento Ambiental

Conforme disposição expressa da Resolução nº 237/1997 do CONAMA, em regra, o procedimento de licenciamento ambiental ocorre em três fases, os quais resultam na expedição de três licenças distintas:

“I – Licença Prévia (LP) – concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação;

II – Licença de Instalação (LI) – autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante;

III – Licença de Operação (LO) – autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.”

As licenças poderão ser expedidas de forma isolada ou sucessivamente ou, ainda, em procedimento simplificado ou unificado, conforme as fases, características e porte do empreendimento. No entanto, ordinariamente, essas três fases são observadas e se caracterizam, respectivamente, pela definição da viabilidade, da autorização para a implantação e para o funcionamento efetivo da atividade. Em alguns casos, como nos processos de parcelamento do solo, o licenciamento ambiental vai apenas até a fase de implantação, tendo a Licença de Operação caráter meramente confirmatório.

Apesar de compreender um procedimento lógico, sequencial e encadeado, muitas vezes surgem dúvidas sobre a possibilidade ou não de discussão de assuntos tratados nas fases anteriores do licenciamento ambiental na etapa subsequente. Daí a importância da discussão sobre a aplicação dos princípios da continuidade administrativa e da segurança jurídica.

Tanto a segurança jurídica, como a continuidade são princípios que vêm ganhando espaço no direito administrativo no período posterior à promulgação da Constituição de 1988, uma decorrência da derrocada legal-doutrinária do modelo patrimonialista e de concentração de poder que vigorava nos períodos anteriores. Como já dito anteriormente, o pensar do direito administrativo atual no âmbito da política ambiental considera a importância da participação direta de cidadãos e cidadãs na construção das decisões adotadas pelo poder público, isto sem contar a imperatividade de princípios fundantes do estado, como legalidade, moralidade e o da ampla publicidade, o que afasta o domínio do arbítrio patrimonialista.

Com relação ao princípio da segurança jurídica, é importante observar que este se refere à própria lógica de estabilidade do direito, pois determina a “busca dos ideais de cognoscibilidade, confiabilidade e calculabilidade do direito” (ÁVILA, 2012, p. 95). Assim,

“pode-se conceituar a segurança jurídica como sendo uma norma-princípio que exige, dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, a adoção de comportamentos que contribuam mais para a existência, em benefício dos cidadãos e na sua perspectiva, de um estado de confiabilidade e de calculabilidade jurídicas, com base na sua cognoscibilidade, por meio da controlabilidade jurídico-racional das estruturas argumentativas reconstrutivas de normas gerais e individuais, como argumento garantidor do respeito à sua capacidade de – sem engano, frustração, surpresas e arbitrariedade – plasmar digna e responsavelmente o seu presente e fazer um planejamento estratégico juridicamente informado do seu futuro” (ÁVILA, 2012, p. 690).

Neste sentido, é relevante a análise de Humberto Ávila sobre a da segurança jurídica pois visa demonstrar toda a complexidade deste princípio, que ultrapassa os limites das decisões direcionadas apenas aos indivíduos e do mero formalismo. Tal segurança visa evitar o arbítrio e fazer com que os destinatários do direito, individuais ou coletivos, sejam vitimados por decisões e medidas surpreendentes do Estado.

Por lógico, mesmo garantindo a estabilidade da gestão essa segurança não é um valor absoluto e incapaz de sofrer alterações no processo administrativo ambiental, especialmente quando confrontado com a finalidade que se objetiva com a Lei ou o trâmite processual. Deste modo, em contraposição ao “absolutismo das formas”, a segurança jurídica também sofre mitigações (OLBERTZ, 2010). Dado o elevado grau de participação dos administrados no licenciamento ambiental e a crescente preponderância do princípio do informalismo em favor do administrado, este é um campo do direito administrativo onde a formalidade é sempre mitigada por conceitos técnicos. Aliás, esta também é uma consequência da predominância de discricionariedade técnica no licenciamento ambiental. Todavia, qualquer mudança de interpretação jurídica que possa prejudicar os administrados não retroage e a sua aplicação deve observar o princípio do contraditório, mesmo que em situações de risco, sujeitas a medidas de controle e tutelares de urgência.

A segurança jurídica no licenciamento ambiental é obtida exatamente em função da aplicação de um outro princípio jurídico de domínio recente, que é o da continuidade. Herdado do ramo da administração dos serviços públicos, os quais não podem sofrer interrupção sob pena de colocar em risco a segurança e direitos fundamentais de cidadãos e cidadãs, o princípio da continuidade eleva a sua importância no âmbito do processo administrativo ambiental como garantia de encadeamento lógico de cada uma das fases e procedimentos que o compõem, contribuindo, deste modo, também, para evitar a perda de um acúmulo de dados obtidos ao longo do trâmite licenciatório.

Logo, a continuidade do processo administrativo de licenciamento ambiental consiste na compreensão lógica do encadeamento de cada uma das suas etapas como um todo uniforme destinado ao atingimento da sua finalidade precípua que a conservação do patrimônio ambiental e o controle administrativo das atividades potencialmente lesivas ao ambiente. Desta forma, a aplicação de tal princípio garante tanto que não se percam informações das etapas anteriores, como eventuais correções de rumo em caso de falha das fases anteriores ou de novas informações inexistentes anteriormente.

Mesmo que cada uma das etapas do procedimento de licenciamento ambiental possua uma característica própria, não significa dizer que as próximas fases estejam isentas do surgimento de fatos novos que promovam mudanças no curso do licenciamento e, nestes casos, não é razoável retomar as fases anteriores para fazer as correções devidas. Isto vale tanto para a proteção do patrimônio ambiental, em homenagem ao princípio da precaução, como para validar pretensões dos empreendedores que não observadas nas etapas anteriores por falha, erro ou insuficiência das informações colhidas.

Pelas características próprias deste sistema de controle administrativo, muitas informações sobre as atividades podem surgir no curso do processo. Assim, como a Licença de Instalação compreende o detalhamento de projetos, nesta fase podem surgir dados não conhecidos no momento anterior (Licença Prévia), o que pode resultar na complementação ou no abrandamento de condicionantes definidas documentalmente. Da mesma forma, como na fase de Operação, quando a atividade está em desenvolvimento, podem ser identificados limitações ou excessos nos sistemas de controle, estes também podem ser revisados, contrariando definições da Licença de Instalação ou da própria Licença Prévia. O certo, como já dito anteriormente, as medidas de controle ambiental não podem pecar nem pelo excesso, nem pela insuficiência, devem sempre se adequar às condições de fato identificadas caso a caso e na própria execução dos empreendimentos ou atividades.

É necessário notar que o início de uma nova fase do licenciamento dentro do prazo de vigência da Licença anterior não resulta na extinção da vigência do antigo documento por questões óbvias, e sim em avanço técnico de um processo que, por natureza, é contínuo.

Ocorre que muitos técnicos, fiscais e empreendedores veem o processo de licenciamento ambiental como algo estanque, como ocorria nos antigos modelos de licenciamento, insuscetíveis de aprimoramento ou aperfeiçoamento ao longo do tempo.

Em termos de política ambiental, tudo pode sofrer atualizações conforme o grau dos estudos, de conhecimento e das informações disponíveis. Tecnologias adotadas no controle de atividades em determinada época, podem perfeitamente sofrer aprimoramento, reduzindo custos  para a execução de empreendimentos. Já outras, ao contrário, podem vir a demonstrar inconsistências com o passar dos anos. No mesmo sentido, informações colhidas na fase da Licença Prévia podem se mostrar inadequadas na fase de Instalação ou na de Operação. Em todas estas hipóteses, em razão da continuidade administrativa do licenciamento, existe a possibilidade de revisão de condicionantes técnicas pelo órgão licenciador, garantindo-se plenamente os direitos fundamentais tanto da coletividade, quanto do agente econômico. Em última instância, o que se objetiva garantir com o licenciamento ambiental é um equilíbrio entre os interesses, valores e bens tutelados pelo Estado.

4. Considerações Finais

O licenciamento ambiental é um instrumento complexo adotado pela política ambiental para o controle das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras ou degradadoras do ambiente, razão pela qual é objeto de grande debate sobre a sua amplitude, características e mecanismos de aplicação.

Como instrumento jurídico administrado pelo Estado, sofre limitações tanto pela Lei, como pelos princípios do direito e pelos direitos fundamentais tutelados, não podendo pecar pelo excesso ou pela insuficiência na sua condução.

Não se confunde, também, com a Licença Ambiental. Esta é um ato administrativo decorrente da análise técnica desenvolvida pela administração com base nas informações prestadas pelos interessados. Já o licenciamento é o conjunto de todos os procedimentos observados na obtenção das licenças ambientais e, como tal, compreende, em regra, três fases encadeadas, conexas e contínuas, permitindo a sua revisão técnica ao longo do tempo, em conformidade com o conhecimento, as informações, os estudos e as tecnologias disponíveis no momento da sua realização.

Desta forma, mesmo que ocorra o vencimento das licenças das etapas anteriores, inclusive por razões lógicas como, por exemplo, o decurso do tempo, as condicionantes e restrições estabelecidas em cada uma das fases do licenciamento podem ser revistas nos próximos estágios, seja para abrandar as exigências fixadas, seja para estabelecer medidas de maior controle.

 

Referências
ÁVILA, Humberto. Segurança Jurídica: entre permanência, mudança e realização no Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2012.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional Português e da União Europeia. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (orgs). Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 21-31.
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo, Editora Saraiva, 2012b.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Princípios do Direito Processual Ambiental. São Paulo, Editora Saraiva, 2012.
LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2006.
OLBERTZ, Karlin. O Princípio do Formalismo no Processo Administrativo. In: MEDAUAR, Odete. SCHIRATO, Vitor Rhein. Atuais Rumos do Processo Administrativo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 215-240.
SARLET, Ingo Wolfgang. FENSTERSEIFER. Direito Constitucional Ambiental: Constituição, Direitos Fundamentais e Proteção do Ambiente. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

Informações Sobre o Autor

Sandro Ari Andrade de Miranda

Advogado no Rio Grande do Sul, mestre em ciências sociais, responsável pelo Blog Sustentabilidade e Democracia


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