Deep web e privacidade de dados na internet

Resumo: Atualmente o direito a privacidade de dados de cunho pessoal vem sofrendo com a propagação de informação na internet, razão da imprescindibilidade da proteção constitucional nos termos de seu artigo 5º inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Por outro lado, a invasão de dados pessoais na internet, muitas vezes, decorre da atuação do próprio Estado, a título de proteção do interesse público ou da coletividade. Fato, por outro lado, que vem levando muitos usuários a utilizar camadas ou setores da internet invisíveis, a chamada deepweb, em que poderiam exercer com completude seu anonimato; razão, também, de fortes e novas reações por parte do Estado.

Palavras-chave: Privacidade; Dados; Internet; Deepweb.

Abstract: Currently the right to privacy of personal data has been suffering from the spread of information on the internet, reason for the indispensability of constitutional protection under the terms of its article 5, paragraph X: “privacy, privacy, honor and image are inviolable of the persons, assured the right to compensation for material or moral damage resulting from their violation “. On the other hand, the invasion of personal data on the Internet often results from the action of the State itself, as a protection of public interest or collectivity. Fact, on the other hand, has led many users to use invisible layers or sectors of the internet, the so-called deepweb, in which they could exercise their anonymity with completeness; reason, also, of strong and new reactions on the part of the State.

Keywords: Privacy; Data; Internet; Deepweb.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo realizar uma pesquisa acerca do direito da privacidade e de proteção de dados na internet do ponto de vista constitucional; estudo, ainda, que compreende especificamente a internet invisível, a chamada deepweb, com conteúdo não indexado em sites de buscas tradicionais e legais.

Para tal, primeiramente será realizada uma definição do instituto da privacidade e suas divergências no que concerne à vida íntima; no segundo momento serão retratadas as garantias fundamentais que incide sobre a proteção de dados especificamente; e, por fim, em terceiro tópico, serão tratadas as camadas da internet que não estão acessíveis tradicionalmente, chamadas de deepweb.

Tem-se como metodologia uma pesquisa bibliográfica, para definir os limites e as garantias da privacidade quando incidida em dados indexados e não-indexados na internet. E, também, o pesquisa empírica da internet invisível.

Como hipótese, a internet sofre relativização no que diz respeito a privacidade de dados frente ao interesse público alegado pelo Estado; sendo que, os usuários utilizam a internet chamada de invisível como uma forma de exercer sua privacidade de forma completa.

1. DO DIREITO À PRIVACIDADE

A privacidade é um termo bastante subjetivo, justo porque sua concepção depende do contexto em que é inserida. No que concerne ao brocardo jurídico, intimidade e vida privada são termos distintos. Uma das definições para a palavra privacidade, pelo próprio dicionário da língua portuguesa, é a habilidade de uma pessoa em controlar a exposição de informações acerca e si e exercer esse controle de forma consciente com seus interesses e valores pessoais.

Pertinente ao subjetivismo do termo intimidade, cerceada por institutos jurídicos, Maria Helena Diniz (2011) elucida que a privacidade concede ao sujeito de direito o poder de impedir intromissões, vedando qualquer invasão em sua esfera privada ou íntima. O direito exposto acima remete a tipificação dos chamados “direitos da personalidade”, que são inerentes ao próprio homem e têm por objetivo resguardar a dignidade da pessoa humana.

Não muito distante de Diniz, Omar Kaminski (2000), relacionando a privacidade à internet, conceitua privacidade como “o direito das pessoas de controlar quais detalhes sobre suas vidas devem permanecer no interior de suas moradas, e quais podem ser exteriorizados aos demais”. Logo, temos de um lado a vida privada, ligeiramente mais ampla que a intimidade da pessoa, posto que, além de abranger essa intimidade, é composta de informações em que somente o indivíduo pode escolher se as divulga ou não. E em si, a intimidade que se refere a esfera do modo de ser de cada indivíduo, o mundo intrapsíquico aliado aos sentimentos identidários próprios como a autoestima e a autoconfiança.

A privacidade configurada por Túlio L. Vianna, em sua tese para obtenção do título de Doutor em Direito, (VIANNA, 2006), é esboçada como uma tríade de direitos, direito de não ser monitorado, direito de não ser registrado e direito de não ser reconhecido (direito de não ter registros pessoais publicados), transcendendo, nas sociedades informacionais, os limites de mero direito de privacidade para um fundamento do Estado Democrático de direito, devendo ser buscado por todos como elementos essenciais ao alicerce dos indivíduos, consoante as garantias fundamentais.

Permeando o pensamento acerca do direito de não ser registrado, acima citado, não se exprime a ideia unicamente de uma garantia à liberdade de associação, mas também, como uma garantia contra o totalitarismo seletivo (tal como regimes autoritários), é, nas sociedades informacionais, novamente, um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Compreende ainda garantias ao direito de liberdade e manifestação de pensamento.

Analisando uma teoria difundida pelo direito germânico, chamada “Teoria dos Círculos Concêntricos da Esfera da Vida Privada” ou “Teoria das Esferas da Personalidade”, a qual alude em diferenciar o privado, o íntimo, o secreto e o público, encontra-se a particularização em 3 níveis de acordo com a intensidade de cada um: especificamente o instituto da privacidade (circunferência externa); intimidade ou confidencialidade (círculo intermediário); e remanescendo a esfera mais interna e o menor dos círculos se observa exatamente as opções sexuais, filosóficas e religiosas (círculo do segredo).

Estrinchando as camadas, a mais externa que abrange uma série de variáveis, compreende-se o instituto da intimidade, abrangendo um grande número de relações interpessoais, inclusive aquelas mais raras e superficiais. Nos pormenores, pode-se cogitar em possível interesse público à informação de tais dados, na medida em que algumas circunstâncias do indivíduo podem ser consideradas relevantes para a sociedade. Tratam-se, então, de fatos e informações que o indivíduo almeja, em uma primeira análise, excluir do conhecimento alheio, como a sua imagem, seus hábitos e costumes.

Já no círculo intermediário, encontra-se a intimidade ou confidencialidade. Aqui são protegidos o sigilo domiciliar, o sigilo profissional e algumas comunicações pessoais. Justo porque, são aquelas informações mais restritas sobre o ser humano, compartilhadas com reduzido número de pessoas de confiança, isto é, ambiente familiar e amigos íntimos.

Por derradeiro, tem-se o círculo do segredo, o menor e mais oculto deles. São aqueles fatos ou informações cujo conteúdo o sujeito não deseja dividi-lo, apenas em restritas circunstâncias. À guisa de exemplos, podemos destacar as opções sexual, filosófica e religiosa.

Apesar das diversas definições, ainda vigora a dificuldade conceitual em delimitar a fronteira entre os círculos da privacidade, da intimidade e do segredo. Inclusive, no Direito Alemão, houve superação desta tese na medida em que, para a devida proteção jurídica, não se pode levar em consideração somente a natureza das informações, mas também a necessidade e finalidade da utilização destes dados.

Partindo do pressuposto de encontrarmos o contexto mais íntimo e interno do homem, basta inquirir de maneira minuciosa se existe uma conduta do homem que em nenhuma dimensão refira-se ou lese a esfera de outros ou os interesses do corpo social. Assim, determinadas situações e formas de comportamento do indivíduo conduziriam a uma prioridade absoluta do princípio da liberdade negativa conjuntamente com o princípio da dignidade da pessoa frente a quaisquer princípios opostos concebíveis.

Entretanto, vale lembrar que não há direito absoluto, podendo ceder em inúmeras ocasiões, como frente ao direito à liberdade, mas ainda que assim consideremos, não resta afastado o âmbito mais interno da personalidade do indivíduo a ser assegurado por regras ou princípios.

Sendo assim, levando em consideração a teoria das esferas concêntricas, a jurisprudência constitucional germânica enseja a esfera da intimidade para o conteúdo essencial dos direitos de personalidade, o que torna a colisão dos direitos à livre expressão e à intimidade, insusceptível de qualquer ponderação proporcional. Desta forma, a informação que colidisse com o direito constitucionalmente tutelado da Intimidade, nem sequer estaria sujeita à observância de exigências mínimas de razoabilidade e proporcionalidade. Prevaleceria sempre o direito à Intimidade.

Avançando com a problemática, direito à intimidade é aquele que nos preserva do conhecimento alheio, reserva-nos a nossa própria vivência.

Para denominar esse direito, juristas ofertaram-lhe terminologias diversas, conforme nos lembra Edilsom Pereira de Farias: Nos E.U.A. é denominado de Right of Privacy; na França, Droit a la Priveé e Droit a I’intimité; na Itália, Diritto Allá Riservatezza. Na Alemanha, a Corte Constitucional, com base na Lei Fundamental daquele país, reconheceu a existência de um direito fundamental à autodeterminação sobre as informações de caráter pessoal – Recht Auf Informationelle Selbstbestimmung.

Entre a alçada brasileira, distinguem-se René A. Dotti classificando o direito à privacidade como Direito à Vida Privada e José Afonso da Silva, enunciando o Direito à Privacidade.

No direito à privacidade estão abrangidos os direitos à intimidade, o direito à honra, à imagem, a inviolabilidade do domicílio, o sigilo de correspondência e das comunicações telegráficas, de dados das comunicações telefônicas.

O artigo 11 do Pacto de San José da Costa Rica, recepcionado no Brasil pelo Decreto 678 de 1992, assegura a Proteção da honra e da dignidade:

“1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade;

2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação;

3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas”.

A Constituição Federal, promulgada em 1988, tornou a dignidade da pessoa humana, um de seus fundamentos, designando garantias e direitos fundamentais. Estritamente no âmbito da vida privada, o Art. 5º, inciso X, enuncia:

“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”, ou seja, esse dispositivo da Constituição, estabelece a devida importância e proteção a intimidade e a vida privada do homem, alocando esse direito como garantia fundamental e instituindo um princípio constitucional dentro do Estado Democrático de Direito”.

Segundo Celso Ribeiro Bastos, o inciso acima apontado:

“Oferece guarida ao direito à reserva da intimidade assim como ao da vida privada. Consiste ainda na faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos na sua vida privada e familiar, assim como de impedir-lhe o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial do ser humano.”

Esta seria a finalidade da adoção da regra contida naquele inciso.

Os direitos de personalidade, como um todo, comportam limites e relativizações, tendo em vista o confronto de interesses do próprio indivíduo. A vontade deste permitirá a limitação quando intenta, por exemplo, negociar algum de seus atributos, através da cessão de direitos para o uso de sua imagem por terceiros, para a transmissão de sua voz e obra de sua autoria.

Rui Stoco (2014) expressa a seguinte convicção:

“O ser humano é um ser político e, como tal, integra-se na sociedade, dela sendo célula e parte integrante. Do estado social politicamente organizado recebe concessões ou direitos e a ele compromete-se com obrigações. Dentre os direitos que recebe e tem assegurados pela Constituição Federal, o mais importante, depois do direito à vida, é a liberdade, que envolve e assume aspetos pluridimensionais, desde a concepção de uma liberdade entendida no plano individual, até evoluir para um conceito maio do ser humano.”

Desta forma, ninguém está obrigado ou compelido a exibir o que lhe é íntimo. Justo porque, dispondo de direitos de privacidade além da esfera constitucional, tais direitos são abrangidos de mesmo modo na esfera civil gerando resguardos maiores, como podemos explanar no Código Civil de 2002, determina-se a proteção da vida privada em seu Artigo 21:

“A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.”

Tendo em vista que o direito à privacidade não se exprime de forma absoluta, os direitos à privacidade podem estar em conflito. Nesse caso pode-se fazer a ponderação com a análise do caso concreto. E nesse caso analisa-se qual vai prevalecer. Robert Alexy propôs um critério que é o seguinte:

“Quanto maior for a intervenção num determinado direito, maiores terão que ser os motivos que justifiquem o afastamento desse direito. E lembrando que os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade devem sempre pautar a ponderação”.

Na visão de Fernanda Borghetti, os direitos da personalidade são direitos inerentes ao ser, que justamente encontram fundamento e tutela geral no princípio da pessoa humana, pode-se dizer que essencialmente são direitos irrenunciáveis. Irrenunciável no que toca à proteção de seu núcleo essencial.

Por outro lado, o caráter absoluto no que tange aos direitos da personalidade reside em sua oponibilidade. Em relação aos sujeitos passivos, gera uma obrigação de não fazer, um dever de abstenção. Diferentemente, gera ao estado uma obrigação positiva, um dever de proteção aos direitos de personalidade. Compreendidos em competências constitucionais, como em direitos e garantais fundamentais, provendo mecanismos e instrumentos de garantais para assegurar tais direitos.

De todos os conceitos sobre a privacidade, sobre tudo se extrai que, o fundamental é o respeito que cada um deve manter em face do outro, do nível de liberdade que ele estabeleceu em relação a terceiros e a si. Com isso, é possível estabelecer que ninguém tem direito de sem consentimento, invadir coisas materiais e espirituais de outro, com sua vida, a sua família, suas amizades e inimizades. A invasão anormal e ofensiva a esta privacidade acarreta reparação por parte de quem causou.

Até este ponto, tratou-se do direito de privacidade, suas divergências em relação a intimidade, partindo do pressuposto que direito à privacidade abrange a intimidade tendo em vista sua amplitude. Foi igualmente exposto, garantias constitucionais e cíveis frente aos direitos de privacidade. Dada toda a elucidação necessária para a compreensão da proteção dos dados, partimos agora do ponto incipiente para designarmos os direitos de proteção aos dados atribuídos à internet.

2. DO DIREITO À PROTEÇÃO DE DADOS E O CONTEXTO DA WEB

Hodiernamente, a área tecnológica vem sofrendo avanços exorbitantes em ritmo demasiado. Portanto, muitas vezes, percebe-se a falta do direito na área específica condizente a internet, devido a precariedade do mesmo não suportar caminhar atualizado com tais avanços. Todavia, o fato do direito não estar sempre atualizado, não diminui a primordialidade do acompanhamento, muito pelo contrário, apenas aumenta a imprescindibilidade de as novas tecnologias implantadas receberem legislações regulares referente ao seu uso, pondo em análise riscos e proveitos para a sociedade.

Independentemente das tecnologias partirem de uma origem de livre criação, devem se adequar ao direito existente, afim de prevenir problemas decorrentes de sua criação, como por exemplo, a criação de um mecanismo de busca que pode ir além das esferas legais (a exemplo, deep web, a ser explanada subsequente), trazendo riscos aos indivíduos que não tenham a qualificação ideal, ou em palavras mais simples, não tenham a capacidade de se submeterem as leis que impõe o limite legal, frente a um determinado mecanismo, que possibilite uma vasta área de pesquisas consideradas malignas ao objeto ideal social.

Diversos países, particularmente Inglaterra e Estados Unidos, em suas Faculdades de Direito, já possuem centro de estudos sobre normas jurídicas e internet, oferecendo disciplinas tais como Cyberlaw.

No Brasil, já se observa os pequenos passos desse novo objeto, integrando em alguns cursos de direito, matérias que abordem o tema da internet e sua relação com o Direito, existindo também, diversos cursos de pós-graduação destinados a este tema. Todavia, tanto no Brasil como em outros países, o obstáculo preponderante envolve o encontrar de soluções eficazes e práticas diante de atuais realidades em relação ao Direito.

Podemos observar aqui, um conceito de internet, abrangido pelo dicionário Aurélio:

“Qualquer conjunto de redes de computadores ligados entre si por roteadores e gateways, como por exemplo, aquela do âmbito mundial, descentralizada e de acesso público, cujos principais serviços oferecidos são o correio eletrônico, o chat e a web, é constituída por um conjunto de rede de computadores interconectados por roteadores que utilizam o protocolo de transmissão”.

No Art. 5º, inciso I, do Projeto de Lei nº 2.126/2011, em análise no Congresso Nacional, também conhecido como “Marco Civil da Internet”, a referida rede está proposta como a acepção de:

“O sistema constituído de conjunto de protocolos lógicos, estruturado em escala mundial para uso público e irrestrito, com a finalidade de possibilitar a comunicação de dados entre terminais por meio de diferentes redes”.

Podemos assim pronunciar, objetivamente, que Internet, é o conjunto de recursos tecnológicos, Hardware (servidores, modems, roteadores) e softwares (browsers/navegadores, aplicativos, plug-ins) interconectados por meios de comunicação (linha telefônica, linha dedicada, fibra ótica, satélite, redes locais), que colocam a disposição uma gigantesca quantidade de dados e informações, e probabilidades de acesso a serviços diversificados por meio de páginas de Web Sites.

O mesmo projeto de lei acima citado, conhecido como o “Marco civil da internet”, tem como o objetivo regular o funcionamento da Internet no país. O projeto dispõe no seu artigo 1º:

“Esta Lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria.”

Todavia, a falta de acordo sobre o texto final do Marco Civil da internet impede a sua aprovação.

Partindo do pressuposto lógico, que a enorme e massiva difusão de acesso a essa tecnologia de comunicação global, não possui nenhum governo ou qualquer entidade que exerça o controle absoluto da internet. Diversos países, tais como o Brasil, não possuem regulamentações específicas para o uso da internet, causando déficit na área da proteção de dados e insegurança jurídica, posto que, frente a ausência de regulamentação e limites de atividades realizada por usuários, o principal bem atingido é a privacidade de outros usuários da rede.

Essa omissão de dispositivos que regulem especificamente sobre o tema, garante uma sensação de anonimato e impunidade a quem por ato de má-fé, utiliza da internet para invadir propositalmente a privacidade de outrem, tomando conhecimento de intimidades, adulterado ou destruindo informações privadas, e até possivelmente, tornando a situação ainda mais grave, divulgando conteúdos de extremo segredo do indivíduo afetado.

O simples caso do grande embaraço em determinar exatamente de onde foi inicialmente vinculada uma determinada informação, dado ou imagem privada, e pela demasiada velocidade em que se propaga respectivos dados em amplitude mundial, muitas práticas que atentam contra o direito à privacidade permanecem impunes, já que os fatos, podem partir de países que não regulem e não dispõe de legislação para determinada matéria, não punirão a ocorrência, sobrevindo o caráter de impunibilidade à conduta delituosa.

Hackers (indivíduo que se dedica, com intensidade incomum, a conhecer e modificar os aspectos mais internos de dispositivos, programas e redes de computadores), atualmente, usam de métodos e meios astutos para burlar o sistema legal e fraudar usuários. Os mais corriqueiros e sutis procedimentos são conhecidos como e-mails ou apresentações de websites fictícios, que visam instalar pequenos programas maliciosos (malware), por meio de arquivos ou links anexados ao e-mail, pretendendo ter acesso aos dados dos usuários da rede. Dentre os mais frequentes mecanismos empregues pelos famosos Hackers, podemos citar alguns tais como; cavalos de troia (trojan), worms e spywares.

“Cavalos de troia: formados por malwares, liberam de alguma forma, o acesso remoto ao computador, após a infecção. Esse tipo de vírus, captura dados para transmiti-los a outras máquinas.

Worms: julgado como um vírus mais inteligente que a maior parte. Sua supremacia concentra-se na forma em que podem espalhar-se rapidamente para outros computadores de maneira automática. Processa-se quando o usuário realiza o “apoio” ao vírus, abrindo links infectados ou websites falsos.

Spywares: programas que dispõe de mecanismos “espiões”, para vigiar a atividade dos usuários, ou, capturar informações sobre eles. Realizam a contaminação do computador por meio de softwares duvidosos.”

Embora possam ser os mais frequentes métodos, não é apenas por invasões a computadores que ocorrem a violação à privacidade e a intimidade da rede. A posse de material ou fatos privados obtidos por qualquer meio (câmeras fotográficas e celulares roubados) e sua propagação pela internet sem consentimento da vítima, também se caracterizam como violação ao direito de privacidade do cidadão. A título de exemplo, exteriorizar uma fotografia ou até mesmo um vídeo de determinado sujeito, que coloque a pessoa em situação embaraçosa e desagradável, sem seu consentimento.

Retomando, portanto, a linha de raciocínio, citada anteriormente, no tocante ao projeto de lei que delimita o “Marco Civil da Internet” que tem como objetivo, regular o funcionamento da internet no pais. O art. 1º dispõe:

“Esta lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria.”

Em consequência da falta de acordo sobre o texto final do Projeto de Lei da Câmera nº 2.126, interdita-se sua aprovação. Porém, outro Projeto de Lei em análise é o PCL nº 2.793, que tem como escopo a tipificação criminal dos delitos informáticos, assim incluindo penas para invasões a respectiva privacidade, tratada no presente artigo. Elucida em seu artigo 154 A.

“154 A – Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não a rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades:

Pena – detenção, 3 (três) meses a 1(um), ano e multa”.       

Inferimos dessarte, que o Brasil, dá passos preambulares em direção a regularização da Internet no país. Em sequência, o poder judiciário, em situação análoga, vem revelando progressos no que concerne a este direito à privacidade, como expõe-se no Acórdão a seguir:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. INTERNET. PERFIL FALSO. IMAGENS VEXATÓRIAS. DEMORA NA EXCLUSÃO. RESPONSABILIDADE DA PROVEDORA DO SERVIÇO. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. Prolongação injustificada de divulgação de fotos íntimas e dados pessoais da autora em perfil de rede social. Insurgência contra sentença de procedência. Manutenção. Ilicitude verificada diante da inércia da provedora em excluir o perfil falso quando comunicada. Danos morais evidentes. Fotos com apelo sexual. Suficiência e razoabilidade do quantum indenizatório. Condenação às verbas da sucumbência mantida. Recurso não provido”.

Isto posto, pode-se concluir que, a Internet, embora seja um mecanismo que possibilite o lazer e meios para produção de projetos e empreendimentos, compreende numerosos riscos em sua rede, e para garantir ao indivíduo a possibilidade de navegar sem qualquer tipo de perigo ou ameaças, é indispensável uma atitude ativa por parte do estado para interceptar e eliminar tais ameaças.

3 A INTERNET INVISÍVEL – DEEP WEB

A questão a ser arguida a partir deste momento, consiste moderadamente a desenvolver observações e apontamentos sobre as camadas da internet, explanando exclusivamente a camada da web chamada Internet Invisível, ou, mais conhecida como, Deep Web. Assim como, evidenciar os regulamentos e jurisdições que controlam tais mecanismos, ou que, imprescindivelmente deveriam normatizar.

Preliminarmente, podemos começar explicitando o que retrata tal mecanismo de busca não indexado em buscadores comuns, a razão de sua existência e porque sua função carece tanto de regulamento.

O termo deep web, é atribuído a Michael K. Bergman, CEO e cofundador da Structured Dynamics LLC. Michael se refere, a todo conteúdo que não pode ser indexado pelos sites de busca, não estando assim, disponível para quem navega na internet.

Ao elaborar um site, ou blog, o editor do conteúdo pode definir nas configurações se deseja ou não que o site seja indexado nos mecanismos de busca, habilitando as funções “follow” e “nofollow”. Caso opte pela segunda, quando os robôs dos mecanismos de busca vasculham a web em busca de conteúdo, ao passar pelo seu site eles encontrarão a mensagem para que o buscador “não siga” as páginas disponíveis. O resultado disso são milhares de sites que nunca ganharam as páginas dos buscadores, um conteúdo secreto e invisível que sempre esteve ali, mas que dificilmente um dia será visualizado por você (Deep web… 2011).

A deep web, conhecida como internet invisível ou web oculta, pauta-se em conteúdos da World Wide Web (www) que por não serem indexados em mecanismos de busca padrão, não fazem parte da Surface Web. Por não fazer parte de sites e buscadores comuns, apresenta maior complexidade de exploração e acesso, bem como simultaneamente está fora de limites legais, revelando uma ausência de fiscalização por parte de autoridades competentes.

Por conseguinte, frente ao objeto da internet invisível, nos deparamos com a comprovação que nos resta, do porque a presença de legislação deve se fazer perante tal mecanismo.

O conteúdo identificável não é apenas descobertas notórias ou de qualidade. Em meio a conteúdos ocultos, é plausível de se esbarrar em páginas que, somente podem ter acesso de forma anônima, colocando o internauta à beira do risco de uma série de cometimento de crimes.

O acesso é feito por um aplicativo chamado TOR (The Onion Router), que provê uma rede de túneis virtuais que dificulta a identificação e o rastreamento dos equipamentos. Em si, o acesso não é ilegal, porém, o anonimato torna crescente o conteúdo macabro nesse verdadeiro submundo do cybercrime.

As páginas colocadas à disposição do usuário com um pouco de conhecimento sobre criptografia podem conter conteúdos tais quais; compra e venda de drogas (como o caso Silk Road, descoberto pelo FBI em 2013); venda de produtos roubados e contrabandeados; fotos eróticas proibidas (incluindo pedofilia), anúncios de assassinos de aluguel, venda de armas, violação de direitos autorais, vídeos com experimentos científicos realizados em humanos entre outras coisas que sem sombra de dúvidas levam consigo uma carga de fatores ilícitos, proibidos, imorais e repulsivos.

Por enquanto, não há tutela jurisdicional e impera o “estado de natureza” nesta parte do ciberespaço. Nas palavras de Pierre Levy, ciberespaço é “o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores”

Desta forma, novamente comprovada a série de conteúdos antijurídicos, é indispensável se fazer presente na esfera de pesquisas, a legislação pública vigente, com a finalidade de regular e organizar conteúdos e ainda censurar objetos de análise que possam apresentar riscos e ofensas a dignidade da pessoa humana, bem como aos indivíduos que tenham contato com tais fatores.

Devido ao pouco recurso tecnológico que o país tem, o Brasil não tem se mobilizado para sanar os crimes cometidos na deep web, que apresenta uma tecnologia tão nova, que poucos países estão aptos para alcança-la. Todavia, há de se esclarecer, que, o Marco Civil na Internet e algumas leis internacionais do direito comparado, juntamente com a polícia federal, investigam casos concretos onde a ação dos usuários ultrapassou todos os limites legais e morais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atualmente a proteção à privacidade tem-se mostrado mais complicada no âmbito virtual, da rede mundial de computadores (internet). Ora, dados pessoais de tem sido lançados indiscriminadamente na rede, com alto poder de propagação, e com intervenção ou monitoramento estatal. Contexto que fez com que a chamada internet invisível tivesse uma larga expansão.

Quer dizer, a hipótese posta em discussão – que os usuários utilizam a internet chamada de invisível como uma forma de exercer sua privacidade de forma completa – apresenta-se confirmada.

Observa-se que a intenção com que o usuário acessa a deepweb é fortemente voltada para a proteção de sua privacidade, para impedir que certas informações sobre ele tenham conhecimento coletivo ou do Estado; sejam informações de atividades lícitas como também de atividades ilícitas.

Ocorre que o pressuposto envolto pelo anonimato torna crescente o conteúdo ilícito (ou macabro) nesse submundo da deepweb, concedendo uma sensação de impunidade. Porém, o Marco Civil na Internet e algumas leis do direito comparado tem se apresentado como solução.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

 

Diogo Lopes Cavalcante

 

Procurador da Fazenda Nacional. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Mestre em Processo Civil pela UNIPAR. Especialista em Direito Público pela Unb. Graduado em Direito pela UFPR

 


 

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