O instituto da desapropriação e seus aspectos gerais

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Resumo: este artigo tem o objetivo de abordar o instituto da desapropriação. Para que essa finalidade seja cumprida, mesmo que de maneira simples, algumas das principais características do tema foram abordadas. Além disso, o tema é de extrema relevância no meio acadêmico e na prática jurídica, de forma geral. Portanto, durante o trabalho, o leitor terá uma visão global do instituto da desapropriação.

Palavras-chaves: Desapropriação; Direito Administrativo; Aspectos Gerais; Evolução; Conceito Jurídico.

Abstract: this article intends to address the institution of expropriation. For this purpose is fulfilled, even if simply, some of the main features of the theme were addressed. Moreover, the theme is extremely relevant in academia and legal practice in general. Therefore, during the work, the reader will have an overview of the institute expropriation.

Keywords: Expropriation; Administrative Law; General aspects; evolution; Legal Concept.

Sumário: Introdução. 1. Panorama histórico-evolutivo. 1.2. Conceito. 1.3. Fundamentos da desapropriação. 1.4. Natureza jurídica. 1.5. Pressupostos. 1.6. Objeto da desapropriação. 1.7. Sujeito ativo e passivo da desapropriação. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

A desapropriação é um instituto do direito público, sendo o meio pelo qual é exercitado o direito constitucional de prevalência do interesse coletivo sobre o do indivíduo (LEITE, 1967).

Historicamente, este instituto foi introduzido no direito brasileiro por influência do direito português, derivando, assim, a primeira regra constitucional sobre o tema na Constituição Imperial de 1824, a qual dispunha em seu artigo 179, XXII:

“É assegurado o direito de propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem público, legalmente verificado, exigir o uso e emprego da propriedade privada do cidadão, será ele previamente indenizado do valor dela. A lei marcará os casos em que terá lugar esta única exceção e dará as regras para se determinar a indenização”.

Assim, nos primeiros momentos em que o Estado começou a se utilizar dos instrumentos de intervenção na propriedade privada, percebe-se que muitos atos de autoritarismo foram cometidos, tendo a própria desapropriação, sua origem pautada no confisco estatal. Nesse contexto, o instituto da desapropriação se consagrou no ordenamento jurídico brasileiro e no advento das constituições seguintes.

Atualmente, pode-se dizer que a desapropriação ou expropriação é a mais agressiva forma de intervenção do Estado na propriedade privada, pois se trata de um procedimento excepcional de transformação compulsória de bens privados em públicos, mediante o pagamento de indenização, o qual varia conforme a modalidade expropriatória realizada.

Dessa maneira, para dirimir eventuais conflitos nos atos de intervenção realizados pela Administração Pública, a figura do Poder Judiciário mostra-se de suma importância.

Contudo, o citado instituto não deve ser confundido com a denominada desapropriação privada, prevista no artigo 1.238, parágrafo 4°, do Código Civil, que na verdade representa uma hipótese de usucapião, instituto do Direito Civil, enquanto o instituto da desapropriação, aqui estudado, representa uma figura tradicional do Direito Administrativo.

Nesse diapasão, a intervenção do Estado na propriedade privada é assunto de elevada importância no Direito Brasileiro, vez que se trata de matéria corriqueira dentro da Administração Pública, sendo assim, um tema cotidiano e de extrema relevância para a vida do Estado e dos particulares afetados por suas condutas.

1.1. Panorama histórico-evolutivo

No contexto histórico, a propriedade caracterizava-se por ser coletiva, alterando-se esta situação com o fim do nomadismo, quando se transformou paulatinamente em propriedade privada.

Assim, no século XVIII, nos primórdios da Revolução Francesa, o Estado iniciou intensas restrições à propriedade, como forma de rejeição ao sistema feudal então vigente. Enquanto isso, em 1789 a “Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão” trazia uma concisa proteção à propriedade, ao tratá-la como um “direito inviolável e sagrado”.

Já no Brasil, a proteção à propriedade privada iniciou-se com uma lei de 21 de maio de 1821, a qual dispunha que à propriedade não seria retirada pelo Estado, quaisquer que fossem suas necessidades, se antes não fosse ajustado o preço a se pagar ao proprietário pelo Estado, pagamento este que deveria ser feito no ato da entrega do bem.

No âmbito constitucional, logo em nossa primeira Constituição, na Imperial de 1824, o tema ganhou amparo, garantindo-se o direito de propriedade em sua plenitude, devendo-se indenizar, previamente, o valor do imóvel, caso o Estado necessite utilizar-se deste, conforme estabelecia o artigo 179, inciso XXII, da Imperial.

Dessa maneira, as seguintes Constituições brasileiras deram guarida ao tema, passando-se a exigir, com a Constituição de 1934, indenização prévia e justa do Estado. 

Ainda na vigência desta Constituição de 1934, foi editado o Decreto-Lei n° 3.365, de 21 de junho de 1941, que disciplina as desapropriações por utilidade pública até os dias atuais.

Já a Emenda Constitucional n° 10, de 9 de novembro de 1964, instituiu a modalidade de desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, permitindo-se a indenização em títulos da dívida pública, quando o imóvel a ser desapropriado tratar-se de um latifúndio, tal como definido em lei, porém as benfeitorias necessárias e úteis realizadas no bem deveriam ser pagas em dinheiro (DI PIETRO, 2010, p. 157 a 159).

Com a Ditadura Militar, através do Ato Institucional n° 9, de 24 de abril de 1969, deixou-se de exigir que a indenização fosse prévia na desapropriação por reforma agrária. Chegando a nossa atual Constituição, esta acrescentou uma nova modalidade de desapropriação por interesse social, a ser realizada pelo Município, e o pagamento desta deve ser feito em títulos da dívida pública, pois incide sobre imóveis que não atendam a função social da propriedade, conforme versa o artigo 182, parágrafo 4°, inciso III, da Constituição Federal de 1988:

“A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.(…)

§ 4º – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:(…)

III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais”.

No tocante a nossa Carta Magna, esta ainda trouxe a previsão de uma hipótese de desapropriação sem indenização, quando as terras forem utilizadas para o cultivo de plantas psicotrópicas legalmente proibidas, nos termos do artigo 243, da Constituição Federal de 1988, disciplinada pela Lei n° 8.257, de 26 de novembro de 1991:

“As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”.

Ainda no âmbito da Constituição, em seu artigo 5°, inciso XXIII, logo após consagrar o direito à propriedade, estabelece que esta, deve atender a função social. Logo, ansiando o bem comum através da função social da propriedade, o Estado criou diversos instrumentos de intervenção sobre a propriedade privada, dentre elas a desapropriação.

1.2. Conceito

Podemos conceituar desapropriação como forma de aquisição compulsória e originária da propriedade pelo Estado ou por quem esteja fazendo às vezes dele, para implementação de interesses públicos ou sociais mediante indenização, via de regra em dinheiro e previamente ou fruto de aplicação de sanção.

Nesse contexto, a origem da palavra desapropriação é latina (propriu), sendo um vocábulo parassintético, ou seja, formado pela adição simultânea do prefixo e sufixo ao radical próprio: a) desprefixo que apresenta ideia de afastamento; b) a – que indica passagem de estado; c) cão – sufixo formador de nomes de ação ou resultado de ação em palavras derivadas de verbo; e d) próprio – radical (SALLES, 1980).

Assim, desapropriação significa privar alguém de sua propriedade, possuindo natureza jurídica de procedimento administrativo, de acordo com Maria Sylvia Zanella di Pietro:

“Desapropriação é o procedimento administrativo pelo qual o Poder Público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização, sendo que desse conceito abstrai-se cinco características do instituto: a) aspecto formal, com a menção de um procedimento; b) o sujeito ativo: Poder Público ou seus delegados; c) os pressupostos: necessidade pública, utilidade pública ou interesse social; d) o sujeito passivo: o proprietário do bem; e) o objeto: perda de um bem; f) a reposição do patrimônio expropriado por meio de justa indenização” (DI PIETRO, 2010, p.153).

1.3. Fundamentos da desapropriação

Podemos subdividir os fundamentos da desapropriação em jurídico, político, normativo constitucional e normativo infraconstitucional. Dessa forma, o fundamento jurídico da desapropriação consiste no reflexo dos princípios políticos acolhidos pelo ordenamento normativo.

Já o fundamento político do poder de suprimir compulsoriamente a propriedade privada decorre, em primeiro lugar, do domínio eminente (dominium eminens) que o Estado exerce sobre todos os bens situados em seu território.  Além disso, a competência expropriatória encontra respaldo, também, no supraprincípio da supremacia do interesse público sobre o particular, quando ocorrer uma incompatibilidade entre eles, bem como na necessidade de que todo imóvel atenda a função social da propriedade.

Quanto ao fundamento normativo constitucional temos diversos dispositivos na Constituição Federal de 1988 que tratam do tema desapropriação:

a) artigo 5°, inciso XXIV: define os três fundamentos ensejadores da desapropriação : necessidade pública, utilidade pública e interesse social. Somado a isso, determina que, como regra geral, a indenização deve ser prévia, justa e em dinheiro;

b) artigo 22, inciso II: fixa a competência privativa da União para legislar sobre o assunto;

c) artigo 182, parágrafo 4°, inciso III: permite ao Município que promova desapropriação sancionatória urbanística do imóvel não edificado, subutilizado ou não utilizado, com pagamento mediante títulos da dívida pública com prazo de resgate em até dez anos;

d) artigo 184: defini a competência exclusiva da União para desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, resgatáveis no prazo de até vinte anos;

e) artigo 184, parágrafo 5°: embora o dispositivo fale em “isenção”, na verdade a referida norma delimita a imunidade tributária de impostos federais, estaduais e municipais sobre operações de transferência de imóvel desapropriado para fins de reforma agrária;

f) artigo 185: impede que a desapropriação para reforma agrária recaia sobre a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra e em caso de propriedade produtiva;

g) artigo 243: prevê o confisco de glebas utilizadas para o plantio ilegal de plantas psicotópicas empregadas na produção de drogas, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções.

     Agora, no plano infraconstitucional, temos diversos diplomas sobre o tema, sendo eles:

a) Decreto-Lei n° 3.365/41: disciplina as desapropriações por necessidade e utilidade pública, sendo considerada a lei básica sobre o tema;

b) Lei n. 4.132/62: disciplina desapropriações por interesse social;

c) Decreto-Lei n° 1.075/70: dispõe sobre imissão na posse initio litis em imóveis desapropriados urbanos;

d) Lei Complementar n° 76/93 combinada com a Lei n° 8.629/93: disciplina desapropriações de imóveis rurais para fins de reforma agrária;

e) Lei Complementar n° 101/00: artigo 46 – torna nula de pleno direito o ato de desapropriação de imóvel urbano expedido sem atender o disposto no artigo 182, parágrafo 3º, da Constituição Federal ou sem prévio depósito judicial do valor da indenização;

f) Lei n° 8.257/91: expropriação de terras usadas para cultivos ilegais, sem indenização;

g) Lei n° 3.833/60: disciplina a desapropriação por utilidade pública para execução de obras no Polígono da Seca, adotando regime especial para fins do pagamento da indenização;

h) Lei n° 10.257/01 (Estatuto da Cidade): regulamenta a desapropriação urbanística, de competência do Município, como importante instrumento de política urbana;

i) Lei n° 10.406/02 (Código Civil): este diploma possui diversos dispositivos tratando do tema desapropriação, entre eles: 1) artigo 519 (defini um caso de tresdestinação lícita, ao permitir que o bem expropriado receba destinação diversa daquela inicialmente prevista no decreto expropriatório); 2) artigo 1.228, parágrafo 3° (refere-se à desapropriação como forma de privação da propriedade); 3) artigo 1.257 (inclui a desapropriação entre os institutos de perda da propriedade).

Não obstante, ainda tratam do assunto diversas súmulas do Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, quais sejam:

a) Súmulas do STF: 164 (juros compensatórios); 345 (desapropriação indireta); 416 (indenização); 561 (correção monetária); 618 (juros compensatórios);

b) Súmulas do STJ: 12 (juros compensatórios e moratórios); 56 (juros compensatórios); 67 (correção monetária); 69 (juros compensatórios); 70 (juros moratórios); 102 (juros moratórios e compensatórios); 113 (juros compensatórios na desapropriação direta); 114 (juros compensatórios na desapropriação indireta); 119 (prazo prescricional da desapropriação indireta); 131 e 141 (honorários advocatícios); 408 (juros compensatórios).

1.4. Natureza jurídica

A desapropriação possui natureza jurídica de procedimento administrativo, que consiste em um conjunto ordenado de atos administrativos. Por este motivo, a desapropriação não pode ser tratada como um ato jurídico isolado ou um fato administrativo, nem mesmo como processo administrativo. Somado a isso, ao afirmar que a desapropriação é um processo administrativo, reforça-se a ideia de que a referida sequência de atos encontra-se submetida diretamente à incidência dos princípios e normas do Direito Administrativo, e não de outro ramo jurídico.

Dessa maneira, entende Hely Lopes Meirelles e Maria Sylvia Zanella di Pietro, que ao conceituar o instituto da desapropriação, a ele se refere como procedimento administrativo:

“Desapropriação é o procedimento administrativo pelo qual o Poder Público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização” (DI PIETRO, 2002, p. 153).

Contudo, Marçal Justen Filho possui entendimento diverso, lecionando ser a desapropriação um ato estatal unilateral que produz a extinção da propriedade:

“A desapropriação não é um procedimento, mas um ato. Esse ato pressupõe, de modo inafastável um procedimento prévio. A desapropriação é o ato final desse procedimento” (JUSTEN FILHO, 2011, p. 612).

1.5. Pressupostos

De acordo com os artigos 5˚, inciso XXIV e 184 da Constituição Federal, são pressupostos da desapropriação: necessidade pública, utilidade pública e interesse social.

Nesse contexto, as hipóteses de necessidade pública envolvem situações de emergência, que tornam imprescindível a transferência de bens de terceiros para o domínio público, propiciando o imediato uso pela Administração Pública.

Entretanto, não há em nosso ordenamento jurídico uma lei disciplinando especificamente os casos de desapropriação nesta modalidade, porém o artigo 5˚, alíneas “a”, “b” e “c”, do Decreto-Lei n° 3.365/41, prevê algumas hipóteses que melhor se enquadrariam como necessidade pública, tais como: segurança nacional, defesa do Estado e socorro público em casos de calamidade.

Importante ressaltar, que nos casos de desapropriação por necessidade pública, o pedido de imissão provisória na posse é indispensável, diante da urgência da situação concreta. Quanto aos casos de desapropriação por utilidade pública, tais ocorrem quando a aquisição do bem for conveniente e oportuna, mas não indispensável, como se dá na hipótese anterior.

Dessa forma, as hipóteses de utilidade pública para fins de desapropriação estão previstas no artigo 5˚, do Decreto-Lei n° 3.365/41, sendo elas:

a) segurança nacional;

b) defesa do Estado;

c) socorro público em caso de calamidade;

d) salubridade pública;

e) criação e melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência;

f) aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica;

g) assistência pública, as obras de higiene e decoração, casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes medicinais;

h) exploração ou a conservação dos serviços públicos;

i) abertura, conservação e melhoramento de vias ou logradouros públicos; a execução de planos de urbanização; o parcelamento do solo, com ou sem edificação, para sua melhor utilização econômica, higiênica ou estética; a construção ou ampliação de distritos industriais;        

j) funcionamento dos meios de transporte coletivo;

k) preservação e conservação dos monumentos históricos e artísticos, isolados ou integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas necessárias a manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a proteção de paisagens e locais particularmente dotados pela natureza;

l) preservação e a conservação adequada de arquivos, documentos e outros bens móveis de valor histórico ou artístico;

m) construção de edifícios públicos, monumentos comemorativos e cemitérios;

n) criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronaves;

o) reedição ou divulgação de obra ou invento de natureza científica, artística ou literária;

p) demais casos previstos por leis especiais.

Convém mencionar, que embora o citado artigo seja considerado como rol legislativo das hipóteses de utilidade pública, as três primeiras hipóteses nele referidas (segurança nacional, defesa do Estado e socorro público em caso de calamidade) são doutrinariamente consideradas hipóteses de necessidade pública, como dito anteriormente.

Já a desapropriação por interesse social, esta será decretada, de acordo com o artigo 1˚, da Lei n° 4.132/65, para promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar o seu uso ao bem estar social.

Assim, esta modalidade de desapropriação possui caráter eminentemente sancionatório, sendo uma punição ao proprietário do imóvel que descumpre a função social da propriedade, podendo incidir, portanto, apenas sobre bens imóveis. Nesta esteira, os bens desapropriados por interesse social não são destinados a Administração Pública, mas à coletividade ou a determinados destinatários legalmente definidos, sendo que a indenização não é paga em dinheiro, é paga em títulos da dívida pública, sendo resgatável em dez anos, se for urbana e em vinte anos se for rural.

O artigo 2˚, da Lei n° 4.132/62, considera-se interesse social:

I. aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros de população a que deve ou possa suprir por seu destino econômico;

II. estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas de povoamento e trabalho agrícola;

III. manutenção de posseiros em terrenos urbanos onde, com a tolerância expressa ou tácita do proprietário, tenham construído sua habilitação, formando núcleos residenciais de mais de 10 (dez) famílias;

IV. construção de casa populares;

V. terras e águas suscetíveis de valorização extraordinária, pela conclusão de obras e serviços públicos, notadamente de saneamento, portos, transporte, eletrificação armazenamento de água e irrigação, no caso em que não sejam ditas áreas socialmente aproveitadas;

VI. proteção do solo e a preservação de cursos e mananciais de água e de reservas florestais;

VII utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características, sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas.

Cumpre ainda destacar, que a Lei Complementar n° 76/93 estabelece procedimento contraditório especial de rito sumario para a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária.

Devemos ainda colocar em pauta, as diferenças entre desapropriação por utilidade pública e por interesse social. Assim, além das diferentes hipóteses legais que autorizam o poder expropriatório, temos ainda diversos prazos de caducidade, que no caso de utilidade e necessidade pública será de cinco anos, enquanto por interesse social, o prazo será de dois anos, e por fim a competência para desapropriar também diverge, pois podem desapropriar por utilidade e necessidade pública a União, Estados, Municípios e Distrito Federal, já por interesse social a competência será exclusiva da União, se o proprietário descumprir a função da propriedade rural (artigo 186, da Constituição Federal) ou exclusiva dos Municípios, se o proprietário descumprir a função social da propriedade urbana (artigo 182, parágrafo 2˚, da Constituição Federal).

1.6. Objeto da desapropriação

O artigo 2˚, caput, do Decreto-Lei n° 3.365/41 estabelece como objetos suscetíveis  de desapropriação:

“Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios”.

Dessa maneira, todo bem, imóvel ou móvel, corpóreo ou incorpóreo, pode ser objeto da desapropriação, inclusive o espaço aéreo e o subsolo.

Quanto aos bens públicos, estes também poderão ser desapropriados, porém deve se observar algumas condições, quais sejam: a União é competente para desapropriar bens dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios; já os Estados, Distrito Federal e Territórios poderão desapropriar bens dos Municípios, devendo preceder, em qualquer caso, de autorização legislativa, conforme dispõe o artigo 2˚, parágrafo 2˚, do Decreto-Lei n° 3.365/41.

Há ainda uma vedação legal para que os Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios desapropriem ações, cotas e direitos representativos do capital de instituições e empresas cujo funcionamento dependa de autorização do Governo Federal e se subordine à sua fiscalização, salvo mediante prévia autorização, por decreto do Presidente da República, segundo versa o parágrafo 3˚, do já citado artigo 2˚, do Decreto-Lei n° 3.365/41.

No tocante aos bens pertencentes às entidades da Administração Indireta, deve se aplicar, por analogia, o mesmo artigo 2˚, do Decreto-Lei n° 3.365/41 sempre que se trate de bem afetado a uma finalidade pública, sendo assim, insuscetível de desapropriação por entidade política menor.

Nesse sentido, quando se trata de desapropriação para fins de reforma agrária, o objeto da mesma será o imóvel rural que não atenda a sua função social definida pelo artigo 186, da Constituição Federal, sendo vedada esta modalidade de desapropriação, nos termos do artigo 185, da Constituição Federal, sobre:

a) Pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;

b) Propriedade produtiva.

Já quanto à modalidade expropriatória prevista no artigo 182, parágrafo 4˚, da Constituição Federal, esta somente incidirá sobre o solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, e desde que seu proprietário não tenha cumprido as exigências previstas no mesmo dispositivo legal.

Por fim, resta mencionar os bens insuscetíveis de desapropriação, que são os direitos personalíssimos, tais como à honra, a imagem, a liberdade, à vida, dentre outros; são ainda insuscetíveis ao dinheiro, moeda corrente no País, por ser este o próprio meio de pagamento da indenização pela perda da propriedade, porém se admite que moedas raras sejam desapropriadas; e ainda as pessoas não são desapropriáveis, mas apenas bens e direitos acionários relativos a elas, bem como os bens móveis comuns, por significar tal conduta fraude ao dever de licitar.

Nesse sentido, assim leciona Diogo de Figueiredo Moreira Neto sobre os bens objeto deste instituto:

“A doutrina inclui, ainda, acertadamente, bens das missões diplomáticas, os que se tornarem inalienáveis por ato jurídico, os bem móveis temporariamente situados no estrangeiro, as ações de sociedades anônimas e os direitos autorais; por outro lado, exclui o cadáver e o dinheiro” (moeda corrente do País) (MOREIRA NETO, 1976, p. 294).

1.7. Sujeito ativo e passivo da desapropriação

O sujeito ativo da desapropriação é aquele que, nos termos da Constituição e da legislação ordinária, é atribuído o direito subjetivo de expropriar, o que se faz pela declaração de utilidade pública ou interesse social do bem.

Assim, o Decreto-Lei n° 3.365/41, em seu artigo 2˚, estabelece como sujeitos ativos da desapropriação por utilidade pública a União, Estados, Distrito Federal, Municípios e Territórios.

Já a desapropriação por interesse social, se possuir fundamento no artigo 182, parágrafo 4˚, da Constituição Federal, regulamentada pela Lei n° 10.257/01 (Estatuto da Cidade), será de competência exclusiva dos Municípios. Agora, se for fundamentada no artigo 184, da Constituição Federal, que é a modalidade de desapropriação para fins de reforma agrária, disciplinada pela Lei n° 4.504/64 e pela Lei Complementar n° 76/93, será de competência exclusiva da União. Porém, se for a hipótese do artigo 5˚, inciso XXIV, da Constituição Federal, regulamentada pela Lei n° 4.132/62, será competente a União, Estados, Distrito Federal, Municípios e Territórios.

Outrossim, nada impede que uma lei federal atribua o mesmo poder expropriatório a outras entidades da Administração Indireta, tal como ocorreu com a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, o Departamento de Estradas de Rodagem – DNER e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT (MAZZA, 2013).

No tocante ao sujeito passivo da desapropriação, este é o expropriado, que pode ser pessoa física ou jurídica, pública ou privada.

Importante ressaltar, que em princípio a desapropriação se faz em favor de pessoas de Direito Público ou de Direito Privado delegados ou concessionárias de serviço público, possuindo caráter excepcional a desapropriação em favor de pessoas de Direito Privado que não reúna tais características, mas desempenhem atividade considerada de interesse público.

CONCLUSÃO

Podemos concluir que o instituto da desapropriação é um instituto complexo que abrange diversas esferas do direito público, abarcando extensa legislação sobre o tema, bem como diversas súmulas e posicionamentos dos mais diversos nos tribunais. Pode-se notar, também, que o instituto tem amplo impacto social e econômico, pois interfere de forma contunde nas atuações dos poderes públicos em suas diversas esferas. Além disso, as esferas públicas podem desapropriar bens de acordo com sua hierarquia e finalidade jurídica. Isso significa que o tema afeta sempre uma quantidade muito grande entes e participantes.

Portanto, podemos concluir que a desapropriação guarda uma quantidade enorme de possibilidades e modificações sociais muito diversas. Em todo caso, o estudo do tema deve ser feito, sempre, com base em pressupostos legais e constitucionais, que determinam e acabam por delinear todo o desenrolar das administrações públicas em suas diversas esferas.

 

Referências
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23 ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.
LEITE, Yára Muller. Da desapropriação. 2 ª ed. – São Paulo: Livraria Freitas Bastos S.A., 1967.
MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. 3 ª ed.. São Paulo: Saraiva., 2013.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 37ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010.
MOREIRA NETO, Diego de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 3 ª ed. São Paulo: Forense, 1976.
SALLES, José Carlos de Moraes. A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 1ª ed.. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1980.

Informações Sobre os Autores

Juliana Giovanetti Pereira da Silva

Advogada Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP. Bolsista CAPES. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas

Apolo Antunes Filho

Advogado


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