Recursos e instrumentos atuais no campo da gestão contratual

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Sumário. 1. Correlação histórica entre o direito administrativo aplicado e a teoria da administração no Brasil. Lições para a área de gestão contratual. 2. Dificuldades e disfunções relacionadas à gestão contratual: o caso “Brubaker”. 3. Soluções e recursos para otimizar a relação contratual. 3.1 A seqüência produtiva da licitação ao contrato: a importância do projeto básico e da orçamentação. 3.2 A efetividade da relação encargo-remuneração. 3.3 O trabalho doutrinário e jurisprudencial na interpretação do contrato. 3.4 A interpretação contratual segundo os usos locais e a boa fé. 3.5 Os novos conceitos sobre arbitramento contratual. 3.6 A segurança jurídica dos contratos de grande vulto e longo prazo. 3.7 Fiscalização dos contratos de obras pelo controle externo: Legislativo e Tribunais de Contas. 3.8 O trabalho de adequação legislativa. 3.9 A gestão documental e a liquidação da despesa. 4. A hipótese da contratação de terceiros para exercer as atividades de acompanhamento, fiscalização, supervisão e gerenciamento. 5. A correta aplicação de sanções por atraso, inexecução ou ilicitude cometidos pelo contratado.6. Considerações finais.


1. Correlação histórica entre o direito administrativo aplicado e a teoria da administração no Brasil. Lições para a área de gestão contratual.


Os pressupostos de objetividade e aplicabilidade do moderno direito administrativo aportam a essa disciplina responsabilidades não apenas teóricas, mas, concretamente, direcionadas ao aperfeiçoamento de institutos jurídicos relacionados ao ordenamento das ações da Administração Pública.


Um postulado básico nesse estudo remete à tese de Almiro Couto e Silva de que o contrato público é o instituto jurídico que permite ao Estado realizar os fins a que se propõe, constituindo-se o instrumento por excelência da ação administrativa.[1] A gestão contratual passa a constituir, portanto, um aspecto relevante e decisivo do direito administrativo aplicado.


Ao atentar para a administração dos contratos formalizados e para a necessária otimização de sua execução, é interessante notar como o direito administrativo estende definidas pontes conceituais para outros ramos do direito (como o direito civil e o comercial), e vai mais além, incorporando elementos teóricos de disciplinas como a filosofia e a sociologia e, mais visivelmente, a ciência da administração.


Especificamente, os marcos teóricos da ciência da administração, em longa e histórica colaboração com o direito administrativo, têm proporcionado concepções e soluções perfilhadas pela legislação brasileira.


Houve períodos em que o avanço industrial induziu ao aperfeiçoamento da burocracia administrativa que lhe serviria de suporte. À dinamização da economia correspondeu, por exemplo, a criação do DASP em 1938, inaugurando a fase weberiana e taylorista da Administração Pública. A partir dos anos 50/60 foi instilada entre nós a fase chamada “psico-sociológica” da teoria administrativa norte-americana, mesclando-se ao caráter do regime político então vigente, em um contexto cultural marcado por elementos peculiares. Salientem-se, entre estes, o ethos autoritário da organização administrativa brasileira (tanto pública, quanto empresarial) e o conceito de desenvolvimento calcado em modelos de países já “desenvolvidos”, caracterizando-se pelas defasagens e pela queima de etapas que buscavam superar o “atraso” de nossa sociedade.[2]


Reafirmando ainda os princípios clássicos da teoria administrativa, foi editado, em 1967, um texto pioneiro de organização da burocracia pública: o Decreto-lei 200, que representava tipicamente a orientação institucional-legal que sempre prevaleceu como diretriz de reforma administrativa. O referido Decreto-lei estendia suas ramificações a diversas áreas da Administração e sua repercussão foi significativa no campo das licitações e contratos públicos, atualizando o vetusto Código de Contabilidade da União, de 1922, no qual a gestão contratual encontrava-se regulada, até mesmo com minudência, nos arts. 764 a 802.


O tema da operacionalização dos contratos públicos foi retomado periodicamente nos anos subseqüentes, marcados pelo autoritarismo do Estado, mediante normas de iniciativa do Executivo vinculadas a esforços de modernização e racionalização da burocracia pública: o Decreto 73.140, de 1973, abordava a gestão contratual nos arts. 49 a 90; o Decreto-lei 2.300, de 1986, nos arts. 44 a 70.


Cabe assinalar que o mencionado Decreto-lei 2.300/86 teve amplamente reconhecida sua qualidade técnica e funcionalidade, por ter absorvido a colaboração de dois renomados juristas: Hely Lopes Meirelles e Saulo Ramos.[3] Todavia, só então (em 1986) foram revogadas as “disposições em contrário” do Código de Contabilidade Pública de 1922, texto que havia conseguido a façanha de vigorar por nada menos que sessenta e quatro anos…


Em 1993, a sanção da Lei 8.666 – até hoje em vigor – significou finalmente a adoção de um diploma legislativo com legitimidade democrática, o que aportou sensível avanço político-institucional. Essa Lei tem hoje quinze anos de aplicação, embora sua existência jamais tenha sido pacífica: desde sua sanção, tem sofrido uma bateria contínua de alterações, visando sucessivas adequações à complexidade sempre crescente da Administração Pública brasileira.


Nesse percurso, cumpre enfrentar a constatação de que o direito positivo, consubstanciado na letra legal e sua evolução – apesar do permanente e meritório esforço de mudança legislativa – não chega a solucionar a questão da distância entre a lei e a realidade.


Não por acaso, é um sociólogo-antropólogo brasileiro que, em entrevista a um periódico, vem oferecer acessível síntese da questão, mencionando a dificuldade existente no Brasil de “lidar com leis, e fazer leis que sejam adequadas ao nosso comportamento”. Ele analisa essa conhecida falácia do legislador que produz um diploma legal para “corrigir uma situação”; e postula que as leis “estão dissociadas da ralidade”, tanto na linguagem jurídica, quanto no apelo às autenticações e certificações desvinculadas das necessidades do povo, e sobretudo na submissão aos “problemas políticos do dia-a-dia”. A conclusão é óbvia: “a lei deve acompanhar as verdadeiras práticas sociais”.[4]


Entretanto, se a ciência jurídica há muito terá absorvido essa afirmativa, os próprios legisladores certamente ainda não a incorporaram em sua atividade. A observação da realidade administrativa, os relatos de casos concretos, por vezes intrincados, de gestão contratual evidenciam o fato de que convivemos com uma superabundância de normas, cuja sistematização é falha e cuja origem, em muitos casos, é o próprio Executivo. Torna-se um problema para o aplicador do direito, e para o destinatário deste incansável fluxo normativo, distinguir o essencial do acidental, o casuístico do geral.


Entendemos que a lição essencial dessa evolução histórico-legislativa é a noção de que o contrato administrativo deve ser contextualizado nos novos conceitos do direito administrativo contemporâneo, que enfatizam a flexibilidade (souplesse no direito francês) e a adaptabilidade em face da incerteza.[5] Nesse sentido deve ser visualizado, não como uma relação de antagonismo, mas de colaboração e acordo negociado e construtivo. O contratado, sob tal perspectiva, é o colaborador que corresponde a uma demanda editalícia com uma oferta definida. Ofertas e demandas equacionam-se a partir de riscos e resultados. O risco, correndo por conta do contratado, toma por base fatores de mercado, em uma expectativa de horizonte temporal previsível.


A previsibilidade básica que constitui o alicerce de qualquer planejamento não é, contudo, absoluta. A rapidez das mudanças, a interveniência de fatores temporais, econômicos, políticos, tecnológicos amplia as margens de incerteza das avenças públicas e justifica a afirmativa do clássico Gaston Jèze de que “toda teoria que não se acomoda aos fatos leva em si mesma sua condenação”.[6]


Para lidar com essas contingências, a Administração poderá e deverá, em princípio, utilizar os instrumentos de análise proporcionados tanto pelo direito administrativo como pela ciência da administração, no sentido de melhor compreender as questões colocadas pelo quotidiano das organizações; a partir daí, testar objetivamente, em situações concretas, as técnicas e mecanismos operacionais viáveis na gestão contratual.


2. Dificuldades e disfunções relacionadas à gestão contratual: o caso “Brubaker”


Os prezados participantes deste encontro de estudos terão, talvez, assistido a um filme clássico, de 1980, que versa sobre os problemas ligados ao controle e à reforma administrativa em uma instituição pública, e focaliza questões relevantes relacionadas com a gestão contratual. O filme tem o nome de seu personagem principal: “Brubaker”.[7] Baseado em um caso real ocorrido em uma penitenciária estadual norte-americana, o filme poderia ser ambientado em qualquer das unidades administrativas (escolares, assistenciais, penitenciárias, hospitalares etc) integrantes da vasta rede de instituições públicas em nosso próprio País.


Cabe utilizar o filme como metáfora dos temas aqui abordados, porque trata-se de um verdadeiro compêndio sobre as dificuldades e disfunções com que se depara o gestor, em contato com a realidade administrativa na qual deverá exercer sua função.


O episódio se passa na penitenciária estadual de Wakefield, instalada em uma enorme fazenda produtiva na qual trabalham os presidiários. Henry Brubaker, o novo diretor, é especialista em direito penal e foi designado pelo Conselho de Justiça para “corrigir” e “sanear” a a instituição, notoriamente mal administrada, cuja reforma agora faz parte do programa eleitoral do novo governador do Estado. Optou por entrar ali anonimamente, disfarçado como um preso comum, para observar e sentir na própria pele as disfunções e mesmo ilicitudes que terá que enfrentar.


Ingressando no estabelecimento penal como um dos presidiários, o novo diretor coloca-se no papel de usuário. Precisamente, o usuário de todo o aparato penal é o indivíduo condenado pela Justiça a cumprir uma pena. O objetivo final da instituição é confiná-lo, reabilitá-lo e novamente reintegrá-lo à sociedade. Portanto a instituição possui dois públicos relevantes: o preso e a sociedade em geral.


Aqui, um parêntese: essa básica definição aplica-se a todas as áreas da gestão contratual. Em qualquer caso, seja qual for o órgão público ou entidade controlada onde se situe o administrador, ele terá que trabalhar em função dos públicos relevantes que constituem a “razão de ser” da organização pública e formatam sua missão institucional.


Com base nessa elementar equação definidora do interesse público, Brubaker terá que enfrentar inúmeros impasses inerentes à própria função administrativa – exacerbados em um estabelecimento onde não há menção a qualquer controle interno ou externo.


Para abordar nosso tema, cabe selecionar, entre todos os problemas levantados no filme, os que se relacionam diretamente com a gestão contratual. Os desafios daí decorrentes podem ser sintetizados na dicotomia entre o “interesse público” e o “interesse do contratado”.


No caso da penitenciária focalizada no filme, os contratos vigentes de obras, serviços e compras foram formalizados há anos e sistematicamente prorrogados, com os mesmos executores, mediante propinas ao ordenador de despesa. Em síntese:


– Quanto a obras, os projetos básicos ficaram defasados ao longo do tempo; a execução é precária; o material utilizado é muito inferior ao pactuado; não há manutenção nas instalações; não há garantia das obras (o telhado de um dos dormitórios simplesmente desaba sobre os ocupantes, e não há como responsabilizar o construtor).


– Quanto a fornecimentos e suprimentos, embora se trate de uma fazenda excepcionalmente produtiva que conta com trabalho forçado dos presos (mal remunerado, praticamente escravo) – e portanto deveria haver abundância e boa alimentação –, todavia os produtos são contrabandeados e vendidos ilicitamente, para o lucro de alguns dirigentes; apenas as sobras são repassadas aos presos.


– Os equipamentos e utilidades eventualmente adquiridos com recursos públicos e mediante licitação não ficam no estabelecimento: são desviados para residências dos dirigentes e membros influentes do esquema de poder estabelecido.


3. Soluções e recursos para otimizar a relação contratual


Cumpre lembrar que o bloco de artigos 66 a 80 da Lei 8.666/93 reflete as normas mais específicas relativas à gestão contratual, área estratégica do direito administrativo aplicado, hoje intercalada por questões relevantes que se evadem do campo teórico e se reportam imediatamente à experiência concreta do intérprete da lei.


No campo da gestão contratual, identificam-se alguns dos mais sólidos pontos de contato entre a Lei de Licitações e Contratos e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Floriano de Azevedo Marques Neto destaca, com propriedade, o elo entre os dois importantes diplomas, observando:


“não basta ter um contrato bem elaborado e adaptado às necessidades da Administração e aos interesses do contratado. É imperioso que haja uma gestão atenta e competente das atividades contratuais, visando a tornar efetivas as condições nele inscritas.” [8]


E acentua um aspecto que nunca perdemos ocasião de salientar como fator inicial e essencial da boa gestão: a capacitação do servidor público. Nessa linha, o mesmo autor enfatiza que “a gestão atenta e competente implicará em ganhos e na redução de custos, evitando descabidos e inaceitáveis prejuízos para o erário”.[9] Nos tópicos a seguir, serão arrolados outros instrumentos e mecanismos viabilizadores de soluções no sentido da boa gestão contratual.


3.1 A seqüência produtiva da licitação ao contrato: a importância do projeto básico e da orçamentação


Diogo de Figueiredo Moreira Neto entende a eficiência como a “melhor realização possível da gestão dos interesses públicos, em termos de plena satisfação dos administrados com menores custos para a sociedade”.[10]


Sob a égide desse relevante conceito, verificamos que tal realização, no tocante aos contratos públicos, só será viável mediante uma seqüência produtiva, a ser resumida como: (a) projeto básico adequado ao objetivo; (b) licitação regularmente realizada; (c) projeto executivo fidedigno; (d) contratação vantajosa; (e) controle da execução e da liquidação da despesa.


O elemento desencadeador dessa seqüência produtiva é um bom projeto básico. O PB é vinculativo para realização de licitações para obras e serviços, constituindo anexo obrigatório do edital (art. 40, § 2o, I) “com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos”. No tocante a obras e serviços de engenharia, a adequação do PB depende, entre outros requisitos, da realização de estudos técnicos preliminares de sondagem e topografia do terreno.[11]


O elaborador do PB deve, ademais, estar consciente da necessidade de consignar o fundamento técnico das exigências de qualificação técnica e operacional, consideradas as parcelas de maior relevância para o objeto licitado. Uma vez definidos na fase interna da licitação, bem motivados e aprovados pela autoridade competente, tais requisitos sobreviverão incólumes a eventuais questionamentos.[12] Cabe advertir: a maioria dos problemas encontrados na execução de obras/serviços de engenharia têm sua origem em PBs incompletos ou deficientes.


No que se refere à distinção entre os projetos básico e executivo, a letra legal é clara a respeito da possibilidade de desenvolvimento do Projeto Executivo após encerrada a licitação, e em concomitância com a execução do objeto contratual, ao contrário do que ocorre no caso do Projeto Básico, indicado pela Lei como requisito limítrofe da legalidade da própria defla­gração das licitações de obras e serviços.


Evidencia-se, portanto, o caráter determinante do PB com relação às demais fases do procedimento, bem como à contratação. Em importante decisão, o TCU adverte contra o desvirtuamento do projeto básico pelo executivo e alerta para punições a serem aplicadas aos responsáveis pelos erros do projeto.[13] Constata-se, atualmente, significativa incidência de equívocos e vícios nos PBs, justificando a expressa determinação do art. 23, § 4º da Portaria Interministerial 127/08, de que os vícios sanáveis devem ser comunicados ao contratado ou convenente, para correção.


Outro importante elemento, também acentuado pelo art. 7º da Lei 8.666/93 e também pelos arts. 15 e 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal é uma boa orçamentação, especificada em planilhas de custos unitários. O TCU alerta, em inúmeras decisões, contra os perigos do chamado “jogo de planilha” e seus reflexos na gestão contratual.[14]


3.2 A efetividade da relação encargo-remuneração


O equilíbrio da relação encargo-remuneração é um dos principais fatores de solução para eventuais confrontos entre o interesse público e o interesse do contratado.


Conforme o § 1º do art. 54 da Lei 8.666/93, os contratos devem dizer com clareza e precisão as condições de execução, concretizadas estas em cláusulas que explicitem direitos, obrigações e responsabilidades, de acordo com a proposta a que se vinculam. A síntese estrutural das condições do contrato pode ser formulada com base na relação entre suas principais realidades: o encargo e a remuneração.[15]


É de se notar a extensão da aplicabilidade dos arts. 112, 113 e 423 do novo Código Civil à interpretação de contratos administrativos. O art. 112 do referido Código, asseverando que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”, vem reiterar consagrado princípio interpre­tativo dos contratos administrativos, já visualizado pela perspicácia do mestre Hely Meirelles:


“Outra regra de interpretação é a de que as disposições do regulamento, do caderno de obrigações e do edital, pertinentes, consideram-se incorporadas ao contrato mesmo que não transcritas em seu texto, como são tidas por não escritas as cláusulas que contrariem aquelas disposições, quando prejudiciais à Administração. Nulas são as cláusulas que afrontem a Constituição ou a lei.


Finalmente, na interpretação dos contratos administrativos deve-se levar em consideração as ordens de serviços e as instruções para sua execução, bem como as manifestações do contratado, porque tais documentos expressam concretamente a intenção e a vontade das partes.[16]


Em sentido análogo, adverte Arnoldo Wald:


“entende a lei que o comportamento posterior das partes é a melhor prova do sentido que deram às respectivas cláusulas, aplicando-se, por analogia, na matéria, o disposto no art. 131, III, do C.Com., de acordo com o qual: ‘O fato dos contraentes posterior ao contrato, que tiver relação com o objeto principal, será a melhor explicação da vontade que as partes tiveram no ato da celebração do mesmo contrato’.”[17]


Cumpre, entretanto, sopesar com a máxima cautela as circunstâncias concretas que cercam cada caso. Sabemos que a LNL firmemente estabelece que os contratos devem estar estritamente vinculados às determinações do respectivo instrumento convocatório. Essa circunstância já evita, de si, maiores veleidades interpretativas em favor do contratado.


Outra ressalva fundamenta-se na principal característica da avença, que é o seu objeto definido em função do interesse público. Assim, não se poderiam,­ em princípio, interpretar sob o foco do atendimento ao direito do particular cláusulas, em essência, direcionadas ao direito da coletividade. Esta é a opinião de Hely Meirelles:


“Não se nega a aplicação das regras de hermenêutica comum à interpretação dos contratos administrativos, mas nessa operação não se pode olvidar que o objeto da contratação é, sempre, o atendimento ao interesse público. Diante dessa realidade, a busca da intenção das partes há de partir da premissa de que a finalidade precípua do ajuste é a satisfação de necessidades coletivas.”[18]


3.3 O trabalho doutrinário e jurisprudencial na interpretação do contrato


Uma ilustração interessante para esse tema é a figura jurídica da cessão do contrato. Na vigência do Decreto 73. 140/73, seu art. 56 expressamente admitia tal instituto. A doutrina e mesmo a prática administrativa, registrando ao longo do tempo episódios de disfuncionalidade e mesmo abusos, acabou por “satanizar” as soluções que implicassem em subrogação ou cessão total do contrato a terceiros. A legislação (Decreto-lei 2.300/86 e Lei 8.666/93) correspondeu, em tempos sucessivos, à visão negativa das formas de compartilhamento da execução contratual por terceiros: tais figuras jurídicas (subcontratação, subrogação, cessão), embora basicamente admissíveis, foram abordadas predominantemente de forma invertida, como causas presumíveis de rescisão contratual (arts. 78 a 80 da Lei Nacional de Licitações).


Entretanto, cabe constatar: a complexidade atual dos contratos está compelindo a própria norma à incorporação crescente de fórmulas mais modernas de subcontratação parcial – inclusive com pagamento direto e ágil ao subcontratado (com o devido suporte em documentação cautelar), providência destinada a evitar a interpretação fiscalista e a bitributação. Destarte, após a tese e a antítese, parece estar em curso uma síntese legislativa:[19] louvem-se, nesse sentido, os arts. 48, § 2º da LC 123/2006, c/c o art. 7º, § 6º do Decreto 6.204/07, e ainda, o art. 5º, § 2º, inc. II, da Lei de parcerias público-privadas 11.079/2004, que incorporam decisivamente tal concepção. A doutrina já sinaliza também no sentido de absolvê-la.[20] A jurisprudência do Tribunal de Contas da União, a nosso ver, apresenta certa ambivalência nesse sentido, com decisões contrárias[21] e, em casos concretos, favoráveis.[22]


3.4 A interpretação contratual segundo os usos locais e a boa fé


Assinalando o fator “comportamento administrativo”, coloque-se em destaque o teor do art. 113 do Código Civil, que preconiza, como parâmetros de interpretação dos negócios jurídicos, a “boa-fé” e os “usos do local de sua celebração”.


O princípio da boa-fé é reiterado no art. 422 do mesmo Código, no Título V, dedicado aos contratos, devendo inquestionavelmente servir de referência no relacionamento entre a Administração (contratante) e o contratado.[23] Mais ainda: a inovação do art. 113, ao estabelecer que os negócios jurídicos devem ser interpretados segundo os usos locais reitera, a nosso ver, a afirmativa de que, em licitação e contrato, o intérprete não deve ficar adstrito à mera leitura mecânica da norma.


3.5 Os novos conceitos sobre arbitramento contratual


O atual Código Civil, notadamente em seus arts. 840 a 843, veio lançar novas luzes a uma enorme polêmica que se trava hoje entre os publicistas, que opinam quanto à extensividade desses dispositivos ao contrato público, por força do art. 54 da Lei 8.666/93.


Por exemplo, o juízo arbitral na gestão dos contratos administrativos tem sido um tema de grande interesse para a relação negocial entre a Administração e o particular, no âmbito da qual pode ser criado um foro imparcial, autônomo, independente, eleito pelas partes com a finalidade de explicitar e dirimir pendências, com compromisso de mútua e pacífica aceitação.


O instrumento jurídico facilitador do juízo arbitral é a própria transação, que consiste em concessões recíprocas com a finalidade de entendimento e superação dos pontos de divergência, tratada não apenas pelo Código Civil (art. 840 citado), mas, notadamente, calcada nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio. Ocorre atualmente grande evolução nessa matéria, já identificada na legislação, mormente nas Leis 8.987/95, 11.097/04 e 9.307/96.


A primeira, Lei de concessões e permissões, insere em seu art. 23, como cláusula obrigatória no contrato, a referente “ao foro e ao modo amigável de solução nas divergências contratuais” (inciso XV). A segunda, Lei federal de parcerias público-privadas, em seu art. 11, inciso III, confirma o emprego dos “mecanismos pri­vados de resolução de disputas, inclusive arbitragem, nos termos da Lei 9.307/96. E a terceira, chamada Lei da Arbitragem, deixa claro, em seu art. 1º, que “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios referentes a direitos patrimoniais disponíveis.” Essa expressão “pessoas capazes de contratar”, como se observa, é deliberada­mente ampla, embora, in fine, o objeto da transação se restrinja a “direitos patrimoniais disponíveis”.


Cabe verificar que o tema não possui unanimidade e é objeto de decisões contraditórias dos Tribunais e da Corte de Contas, situando-se basicamente em duas linhas. A primeira estende-se em manifestações contrárias ao arbitramento em contratos administrativos e, implícita ou explicitamente, abordam a questão dos chamados “direitos indisponíveis” da Administração Pública.[24] A segunda coloca-se favoravelmente à adoção da transação e, por via de conseqüência, do juízo arbitral. Destaca-se a decisão referente ao caso da Ponte Rio-Niterói.[25] O tema, remanesce passível de estudo e considerações dialeticamente válidas. Significativo trabalho doutrinário existente é predominantemente favorável ao arbitramento concertado de controvérsias contratuais.[26] No direito comparado, Agustín Gordillo é um dos que preconizam o juízo arbitral como cláusula obrigatória nas minutas contratuais, fazendo parte integrante dos editais de licitação pública.[27]


Pensamos poder afirmar que a transação efetiva o conceito de consen­sualidade, que, segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto, “é um enriquecimento do Direito Administrativo que a ele se incorpora permanentemente”.[28] Constata-se pois, a nosso ver, na realidade político-administrativa brasileira, uma visível tendência – tanto normativa como jurisprudencial e doutrinária – que pode ser representada pela orientação do STF:


“Poder Público. Transação. Validade. Em regra, os bens e interesse público são indisponíveis, porque pertencem à coletividade. É, por isso, o Administrador, mero gestor da coisa pública, não tendo disponibilidade sobre os interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade do interesse público deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução ado­tada pela Administração é a que melhor atenderá à ultimação deste interesse.”[29]


3.6 A segurança jurídica dos contratos de grande vulto e longo prazo


É sabido que o contrato administrativo pode ser rescindido unilateral, amigável ou judicialmente, segundo as regras do art. 79 da Lei 8.666/93. Diversas causas, atos ou fatos induzem à extinção do contrato (art. 78 da mesma Lei).[30]


Tais contratos, ao curso do Decreto-lei 2.300/86 e a Lei 8.666/93, sobretudo os referentes a obras, com prazo de vigência alongado, enfrentam tradicionais vicissitudes em sua gestão. Vários fatores intervêm nesse quadro recorrente, entre os quais agravantes como o superfaturamento, a elevação do valor contratual,[31] a quebra da equação financeira e o atraso de pagamentos pela entidade contratante, com sediços expedientes protelatórios, aliás arrolados com acurácia pela mestra Alice Gonzalez Borges.[32] Tais circunstâncias geralmente acompanham, envolvem, caracterizam, definem ou acarretam a sustação, a extinção e até a rescisão das avenças.


Constata-se, até mesmo historicamente através de fatos e da jurisprudência, que a segurança jurídica de contratos de longo prazo e grande vulto encontrou-se freqüentemente comprometida em razão de certa atitude discricionária, e quase sempre arbitrária, da Administração, representada pela figura da rescisão unilateral; esta, de modo geral, explicada ou justificada pela alegação, vaga e inconsistente, de “razões de interesse público.” Em exame, pelo STF, de leading-case sobre a questão da rescisão unilateral, o então Ministro Décio Miranda, Relator, assim se pronunciou:


“Se o contrato tem prazo, mas se, ao lado desse prazo, há supremacia da administração, que a ela permite, a qualquer momento, rescindir o contrato, o prazo é letra morta.”[33]


Tal síndrome se repete na área de concessões, registrando-se casos de rescisão unilateral em razão de concreta recusa do poder concedente à manutenção da equação financeira da avença.[34] O consagrado mestre Hely Lopes Meirelles reitera, em seus pareceres, o direito do contratado à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro; e, “no caso de rescisão unilateral do contrato, por interesse da Administração, tem o particular contratado direito à indenização pela prematura extinção do ajuste, ao pagamento de todo o serviço até então executado, com valores reajustados, revisado e até atualizados monetariamente, se for o caso.”[35] Refere-se especificamente ao detalhamento das responsabilidades contratuais:


“A execução de um contrato administrativo refere-se não só à realização do seu objeto e ao pagamento do preço estipulado, mas também aos prazos convencionados, à entrega do local da obra ou serviço, à efetivação das desapropriações e servidões administrativas necessárias, às condições de pagamento e a tudo o mais que for estabelecido no ajuste ou constar de regulamento como encargo de qualquer das partes. Os prazos, principalmente, têm fundamental importância na vida e cumprimento do contrato administrativo, tanto para a Administração Contratante como para o contratado, cujas atividades e lucros dependem de sua fiel observância.”[36]


O consagrado autor caracteriza a seguir o chamado fato da administração, conceituando-o, em sentido amplo, como toda ação ou omissão do Poder Público que, incidindo direta e especificamente sobre o contrato, retarda, agrava ou impede a sua execução. E, citando Marienhoff e Laubadère, equipara o fato da Administração à força maior, que produz os mesmos efeitos excludentes da responsabilidade do contratado pela inexecução do ajuste, ensejando, ainda, as indenizações correspondentes. “Tal ocorre quando a Administração Contratante deixa de entregar o local da obra ou do serviço, não providencia as desapropriações necessárias, não expede a tempo as competentes ordens de serviço ou pratica qualquer ato impediente dos trabalhos a cargo da outra parte.”[37]


Também Arnoldo Wald analisa acuradamente um rol de dificuldades incidentes em pactos de longo prazo, relativas à manutenção da equação financeira, citando reiteradas decisões dos Tribunais Superiores que condenam os atos administrativos atentatórios à segurança jurídica de tais avenças.[38] E Carlos Ari Sundfeld arrola alguns riscos contingenciais, decorrentes de políticas públicas mal conduzidas, de quebra de contratos de PPP: o comprometimento de recursos públicos futuros (assunção de compromissos impagáveis, escolha de projetos não prioritários); o mau planejamento das contratações de longo prazo; o “abuso populista” no patrocínio estatal das concessões; o desvio no uso da concessão administrativa.[39]


Nas parcerias público-privadas, na hipótese de atraso ou inadimplência da Administração relativos à contraprestação pactuada (art. 6º da Lei 11;079/04), o contratado não precisa mais, a nosso ver, ficar à espera da resolução de eventual ação de cobrança, e do pagamento do correspondente título precatório: ele poderá valer-se do disposto no art. 40, XIV da Lei 8.666/93, c/c o art 63 da Lei 4.320/64, requerendo judicialmente, por cautelar ou mandado de segurança, que a Administração dê efetividade a dois princípios: o da ordem cronológica de pagamentos (art. 5º da LNL), e o da vinculação legal de recursos (arts. 8º, I da LRF e 8º, I da Lei 10.079/04).


Ressaltando ainda a importância do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, lembraríamos que as parcelas que se devem agregar à indenização devem restringir-se ao necessário e suficiente para cobrir, na íntegra, toda a lesão ocorrida.


O conceito de lesão é dado pelo art. 157 do Código Civil. No art. 944 do mesmo Código está expresso que “a indenização mede-se pela extensão do dano.” Vejam-se ainda, do Código Civil, correlatamente, os arts. 884 (enriquecimento ilícito); 478 (onerosidade excessiva); 625 (condições de suspensão da obra: exemplo, dificuldades imprevisíveis). São, ademais, relevantes: o art. 35 da Lei 8.987/95, sobre hipóteses de extinção do contrato; e o art. 57, § 1º da Lei 8.666/93, sobre fatos da Administração.[40]


As disposições da Lei 11.079/04 sobre parcerias público-privadas, notadamente seu art. 5º, incisos e parágrafos, conduzem à necessidade implícita de identificação dos gestores responsáveis, de ambos os lados da parceria: do lado do empreendedor privado, o responsável pela execução; do lado do ente público signatário do contrato, o responsável pela fiscalização da conformidade com os termos do ajuste.


No art. 67 da Lei 8.666/93 enfatiza-se a obrigatoriedade da Administração acompanhar e fiscalizar a execução contratual, por um representante do Poder Público especialmente designado. Ademais, cabe observar que a implantação de auditorias e sistemas cada vez mais acurados de controle vem contribuindo para a racionalização da administração contratual e a detecção de irregularidades. Sendo tais contratos destinados a efetivar serviços, empreendimentos e atividades de interesse público, com prazo de duração projetado para ultrapassar vários mandatos governamentais, torna-se imperioso fixar parâmetros bem claros, referentes a um cabível sistema de auditoria permanente da execução.


Como que em resposta concreta às preocupações acima expostas, em todo o texto da Lei 11.079/04, e notadamente no corpo do art. 5º, podem ser destacados dispositivos que visam efetivar a segurança jurídica das avenças formalizadas envolvendo parceiros públicos e privados:


– a duração dos contratos por prazo de vigência, incluindo eventual prorrogação (art. 5º, I);


– penalidades aplicáveis à Administração e ao parceiro privado, em caso de inadimplemento contratual, fixadas de forma proporcional à gravidade da falta (art. 5º, incisos II e VI);


– compartilhamento dos riscos (art. 5º, III) e ganhos (art. 5º, IX);


– atualizações automáticas de valores baseadas em índices e fórmulas matemáticas (art. 5º, IV e § 1º);


– prestação de garantias pelo parceiro privado (art. 5º, VIII);


– contraprestação do parceiro público devidamente detalhada (art. 6º);


– contratação de seguro-garantia com companhias não-controladas (art. 8º, III);


– mecanismos privados de resolução de disputas (art. 11, III);


– disciplina fiscal (arts. 4º, I; 10, I a IV; 4º, IV e outros).


Esperemos, por conseguinte, que as alterações produzidas pela Lei 11.079/04 na estrutura da contratação representem um efetivo fortalecimento, no sentido de que os contratos possam ultrapassar incólumes e eficazes as mudanças político-administrativas. “A eficiência das parcerias dependerá do cumprimento rigoroso dos contratos que, uma vez firmados, proporcionarão benefícios para todos: poder público, empresários e principalmente para a sociedade.”[41]


3.7 Fiscalização dos contratos de obras pelo controle externo: Legislativo e Tribunais de Contas


O papel dos Tribunais de Contas como auxiliar do Poder Legislativo na fiscalização dos contratos (por força dos arts. 70 e 71 da Constituição) tem revelado, cada vez mais, a importância desse colegiado que, sem dúvida, teve sua repercussão institucional notavelmente acrescida após a Lei de Responsabilidade Fiscal.


Sabemos que, nos dias atuais, as competências do Tribunal de Contas não se exercem unicamente diante do fato consumado, mas em auditorias governamentais do mais amplo alcance. A auditoria governamental, de fato, “desponta como instrumento de fiscalização capaz de reinaugurar o sistema de controle externo, fortalecendo-o ainda mais.”[42]


Muitos autores, com pena de ouro, fizeram justiça à ampla dimensão do acervo contributivo dos TC’s e à solidez de seus subsídios ao Poder Judiciário e às mais decisivas questões de Estado.[43] A exemplo, Diogo de Figueiredo Moreira Neto focalizou, com propriedade, os avanços e as verdadeiras “mutações” que se têm processado nos órgãos de controle externo, afirmando:


“Em suma… os órgãos de contas alcançaram indubitavelmente sua maturidade e máxima prestância deixando de ser apenas órgãos de Estado para serem órgãos da sociedade no Estado, pois a ela servem não apenas indiretamente, no exercício de suas funções de controle externo, em auxílio da totalidade dos entes e dos órgãos conformadores do aparelho do Estado, como diretamente à sociedade, por sua acrescida e nobre função de canal de controle social, o que os situa como órgãos de vanguarda dos Estados policráticos e democráticos que adentram o século XXI.”[44]


A tendência de ampliação das competências e atribuições dos Tribunais de Contas tem-se revelado oportuna, em razão da complexificação e crescimento da própria Administração Pública. Em âmbito federal, a primeira LDO sancionada após a LC 101/00, 9.995/00, no art. 86, perfilhava o incremento do controle externo pelo Poder Legislativo e pelo Tribunal de Contas da União. Daí em diante, as leis orçamentárias da União vêm consistentemente seguindo essa linha,[45] em várias ilustrações: no estímulo à ação fiscalizadora da Corte de Contas na disponibilização de dados de contratos e convênios ao SIASG, na classificação dos resultados do governo, na auditoria nas obras públicas etc. Especificamente, as auditorias empreendidas pelo TCU agregam à praxis legal uma nítida vertente, constituída pelos resultados de processos de fiscalização de obras licitadas e em andamento.


A mais recente LDO da União reitera as determinações precedentes, destacadamente nos arts. 101[46] e 102, insistindo na obtenção de dados conclusivos referentes à forma com que está sendo aplicada, concretamente, a lei; e como estão sendo conduzidos os contratos dela decorrentes.


É sabido que o contrato, gerando despesas, depende do efetivo poder de gasto estabelecido nas leis orçamentárias (PPA, LDO e LOA, arts. 165, § § 1º, 2º e 5º da Constituição). Destarte, a legislação orçamentária tem avançado no sentido de, consagrando a atuação dos órgãos de controle, definir os indícios de irregularidades graves como os atos e fatos que recomendem a suspensão cautelar das execuções física, orçamentária e financeira do contrato, convênio ou instrumento congênere, ou de etapa, parcela, trecho ou subtrecho da obra ou serviço; e que, sendo materialmente relevantes, “tenham potencialidade de ocasionar prejuízos significativos ao erário ou a terceiros”; “possam ensejar nulidade de procedimento licitatório ou de contrato”; e “configurem graves desvios relativamente aos princípios a que está submetida a administração pública” (art. 101, § 1º, IV da Lei 11.514/07).[47] Solidificando esse entendimento, o Regimento Interno do TCU, Resolução n. 155, de 4/12/02, prevê no art. 276 a adoção de medida cautelar determinando a suspensão do ato ou procedimento, de ofício ou por provocação, “em caso de urgência, de fundado receio de grave lesão ao erário e ao direito alheio, ou risco de ineficácia da decisão de mérito”.


A consulta aos resultados da auditoria do TCU revela quatro grupos distintos de processos. O primeiro grupo designa obras “com indícios de irregularidade grave”; o segundo, obras detentoras de “outras irregularidades”; o terceiro grupo caracteriza-se por “falhas e impropriedades”; o quarto é constituído de situações em que não se apresentam irregularidades ou falhas, designadas pela expressão “sem ressalvas.” Em 2002, as informações relativas aos levantamentos de auditoria foram consolidadas na Decisão nº 1.239/2002 TCU – Plenário. A íntegra dessa Decisão pode ser obtida na home-page do TCU (www.tcu.com.br).[48]


Um bom exemplo de acompanhamento dos processos de concessão para a exploração de rodovias federais, inclusive trechos rodoviários delegados pela União a Estados, ao Distrito Federal, a Municípios ou a Consórcio entre eles, é a Instrução Normativa nº 46, de 25/8/04, do Tribunal de Contas da União.[49]


Registre-se ainda, ilustrativamente, a posição da mesma Corte na emissão de parecer prévio conclusivo acerca das contas prestadas pelo Presidente da República no exercício de 2006. Foram aprovadas pelo TCU nada menos que trinta ressalvas, que comprovam ocorrências definidoras da necessidade de correção de metas e programas.[50]


3.8 O trabalho de adequação legislativa


A adequação legislativa, ao longo do tempo, pôde eliminar detalhes legais dificultadores da gestão contratual. Como exemplo, bastaria citar uma diretriz que vigorou durante muito tempo pela letra do art. 775 do Código de Contabilidade de 1922: o contrato administrativo só teria validade após registro no Tribunal de Contas. A Constituição de 1967 dispensou, enfim, esse registro prévio, desburocratizando as contratações.[51]


Em outros casos, ocorre o inverso: as alterações legais necessárias tardam… e faltam, consoante inúmeros exemplos extraídos da evolução legislativa. O Decreto 73.140/73 instituiu, corretamente, mecanismos procedimentais para fiscalização dos contratos, como o Diário de Ocorrências; entretanto muitas de suas diretrizes foram descontinuadas pelo Decreto-lei 2.300/86, cujas meritórias intenções não impediram a ocorrência de distorções e patologias na gestão contratual (devidas também, presumivelmente, à inflação que grassava em seu período de vigência). A Lei posterior, 8.666/93, mostrou-se também impotente para coibir abusos como a elevação irregular dos preços pactuados.[52]


No sentido de solucionar as distorções de preços durante a execução contratual, surgem propostas interessantes como o chamado “ajustamento de conduta”, que sem dúvida será brevemente institucionalizado na letra legal. O “Termo de Ajustamento de Conduta Administrativa” e a “Comunicação Espontânea de Irregularidade Administrativa” são documentos de compromisso a serem instituídos por Resolução (proposta pelo Ministro do TCU Augusto Nardes), no sentido de acrescentar dispositivos ao Regimento Interno do TCU. Têm ambos como objetivo promover correções administrativas para o atendimento às orientações técnicas do Tribunal, ajustando a conduta das pessoas jurídicas em face de irregularidades detectadas.


Os instrumentos propostos, ainda em trâmites para aprovação, possuem o mérito de evitar a medida radicalmente punitiva da paralisação de obras nas quais tenha havido detecção de irregularidades. O ajustamento de conduta é solução menos drástica e igualmente eficaz.


3.9 A gestão documental e a liquidação da despesa


Tanto a liquidação da despesa, como a gestão documental, são atribuições condicionantes de uma boa gestão contratual. O art. 63 da Lei 4.320/64 determina:


 “A liquidação de despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor, tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.


§ 1º Essa verificação tem por fim apurar:


I – origem e objeto de que se deve pagar;


II – importância exata a pagar;


III – a quem se deve pagar a importância para extinguir a obrigação”.


Segundo J. Teixeira Machado Jr. e Heraldo da Costa Reis, liquidação é a “verificação do implemento de condição. Trata-se de verificar o direito do credor do pagamento, isto é, verificar se o implemento de condição foi cumprido. Isto se faz com base em títulos e documentos.”[53] E a liquidação da despesa, nos termos do § 2º do art. 63 da Lei 4.320/64, é realizada com base em: (i) contrato, ajuste ou acordo; (ii) nota de empenho; (iii) comprovantes da entrega do material ou da prestação do serviço.


O § 3º do art. 55 da Lei 8.666/93 determina aos serviços de contabilidade que, no ato da liquidação da despesa, elaborem expediente comunicando aos órgãos incumbidos da arrecadação e fiscalização de tributos da União, Estados e Municípios as características e valores pagos. O TCU reitera essa determinação nos itens 8.2.1 e 8.2.2 da Decisão 88/2002, na relatoria do Min. Lincoln Magalhães da Rocha, recomendando aos órgãos ou entidades contratantes:


“8.2.1 comunicar aos órgãos incumbidos da arrecadação e fiscalização de tributos da União, Estados e Municípios, as características e valores pagos em suas contratações, conforme previsto no § 3º do art. 55 da Lei 8.666/93;


8.2.2 conferir nas notas fiscais o correto lançamento tributário, incluindo neste procedimento a verificação da adequabilidade das alíquotas de ICMS, notificando o fornecedor na hipótese de incorreção para que este promova a retificação.”[54]


Vejam-se, a propósito, o art. 116, XIII, da Lei 8.122/90; o art. 10, inciso X, da Lei 8.429/92; e o art. 14, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal. Na contratação de serviços continuados, pontue-se que a Instrução Normativa nº 2/2008, do MPOG, explicita regras relativas à fiscalização a ser feita mensalmente, antes do pagamento da fatura (Anexo 4, item 2 e seus sub-itens).


Colocam-se freqüentes questionamentos sobre o prazo para manutenção dos documentos em arquivo da Administração Pública. Como é matéria afeta à organização interna de cada órgão ou entidade da Administração, não há prazo estrito delimitado na lei.


Entretanto, como é sabido, tanto nas licitações regidas pela LNL como no pregão da Lei 10.520/02, o processo deve abrigar todos os dados das fases interna (no pregão, “preparatória”) e externa. Tais dados constituem importantes subsídios e em muito auxiliam a gestão contratual (arts. 66 a 80 da LNL). Também são indispensáveis para a prestação de contas (art. 70 da Constituição Federal). Portanto, em nosso entender não basta arquivar o processo corretamente. O essencial é extrair dos autos os informes necessários à administração (supervisão, fiscalização, avaliação) do desempenho do contratado na execução do objeto.


O prazo de arquivamento deve, portanto, cobrir os períodos de execução e de prestação de contas, e é sugerido um período adicional de pelo menos cinco anos. Após esse período, caso não seja a dotada a microfilmagem, o órgão/entidade deve conservar pelo menos os extratos contratuais. A equipe de consultores da NDJ, no Boletim de Licitações e Contratos, assim justifica a conveniência desse prazo:


1º – em razão do disposto no art. 21, § 1º, da Lei nº 8.443/92 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União), este será o prazo para eventual chamamento das contas para averiguação pela Corte de Contas;


2º – é este o prazo prescricional para propositura de ações populares contra atos lesivos ao patrimônio público (Lei nº 4.717, de 19/6/65, art. 21);


3º – coincidentemente, este é também o prazo prescricional de dívidas passivas da Fazenda Pública (Dec. nº 20.910, de 6/1/32, art. 10; e Dec.-lei nº 4.597, de 19/8/42, art. 2º);


4º – este é o prazo em que prescreve a ação correspondente ao direito de pleitear a restituição de tributos pagos indevidamente (Código Tributário Nacional, art. 168);


5º – finalmente, para o caso de obras públicas, este será o prazo para garantia de solidez e segurança das construções a que o empreiteiro está obrigado (Código Civil, art. 1245)”.[55]


A matéria abordada no BLC inclui ainda a seguinte recomendação: a leitura do Decreto 1.799/96 e da Resolução 7/97 do Conselho Nacional de Arquivos – Conarq. Cabe ainda, a nosso ver, a leitura do art. 20 da Instrução Normativa do TCU nº 47, de 2004, que em seu art. 20 determina que “as unidades jurisdicionadas deverão manter, para fins de fiscalização, os documentos comprobatórios, inclusive de natureza sigilosa, pelo prazo mínimo de cinco anos, a partir da decisão definitiva de julgamento das contas pelo Tribunal de Contas da União.”


4. A hipótese da contratação de terceiros para exercer as atividades de acompanhamento, fiscalização, supervisão e gerenciamento


O art. 67 da LNL apresenta uma inovação relativamente à legislação anterior, ao admitir a contratação de terceiro para assistir à execução e prestar informações e subsídios ao representante do órgão ou entidade contratante, tendo em vista o fiel cumprimento do avençado. É significativa essa inovação do artigo, que atribui a devida relevância à missão do administrador e confere nova dimensão à gestão contratual. A recorrência à terceirização é alternativa para desobstruir a organização pública tendo em vista melhores resultados.


Ilustrativamente, na área de obras rodoviárias, recomenda o TCU que se faça por licitação a contratação de terceiros para a coordenação, supervisão e controle de melhoramentos e restauração de rodovias.[56]


No contrato tur n key, no qual a contratada é responsável pela entrega da obra para pronta utilização, é comum a terceirização de serviços especializados, de forma que mesmo que partes da obra tenham sido efetivamente executadas por terceiros, o seu gerenciamento global ensejaria a absorção, pela gerenciadora, na condição de integradora, da capacitação dos terceiros contratados.


Pressupõe-se a distinção entre os conceitos, de um lado, das atividades de gerenciamento e, de outro lado, daquelas de fiscalização e supervisão. Todas estas, por sua vez, são radicalmente distintas da execução, tanto do ponto de vista jurídico, quanto operacional; e, especialmente, sob o prisma da anotação de responsabilidade técnica. É o que se observa da abalizada doutrina de Hely Lopes Meirelles, em comentário sobre o contrato de gerenciamento:


 “O gerenciamento é, pois, atividade técnica de mediação entre o patrocinador da obra e seus executores, visto que o profissional ou a empresa gerenciadora não executa materialmente o empreendimento, mas propicia a sua execução indicando os meios mais eficientes e econômicos para sua realização. E, após a celebração dos contratos necessários com os respectivos executores, firmados diretamente pelo dono da obra, o gerenciador passa a programar, supervisionar, controlar e fiscalizar todos os serviços contratados. […]


O gerenciador é, assim, o condutor do empreendimento na sua globalidade.


Para esse desiderato o gerenciador pode ser encarregado de elaborar as diretrizes básicas do empreendimento ou mesmo os seus projetos executivos, e de promover a sua implantação nas condições aprovadas pelo patrocinador da obra, como pode receber os projetos já elaborados por outrem e incumbir-se de selecionar os seus executores, que contratarão diretamente com o dono da obra. Em ambos os casos a missão do gerenciador é a de orientar a realização do empreendimento e assegurar sua correta conclusão, mas nem por isso o gerenciamento se confunde com empreitada, ainda que em regime turn key em que o empreiteiro recebe o package e se incumbe de executá-lo materialmente, entregando a obra concluída, com seus equipamentos e serviços em funcionamento, consoante os projetos recebidos. O empreiteiro é o executor dos projetos aprovados; o gerenciador é o condutor do empreendimento projetado.”(g.n.)[57]


Ainda Hely Meirelles, na citada obra, destaca, mais especificamente, a distinção da responsabilidade técnico-contratual do gerenciador, e técnico-executiva do executor, reforçando a argumentação relativa à anotação da responsabilidade técnica e seu titular, mesmo no contrato turn key:


“O contrato de gerenciamento objetiva a realização de uma obra de engenharia na sua expressão global. Isto não significa que o gerenciador deva executar diretamente todos os elementos e serviços do empreendimento. Absolutamente, não. Suas atribuições são globais no sentido de que lhe incumbe preparar todos os documentos necessários, programar e coordenar o desenvolvimento da obra, supervisionar, controlar e fiscalizar todos os trabalhos requeridos para implantação do empreendimento, indicando os meios e agentes aptos a realizá-los eficiente e economicamente nas condições e prazos fixados pela entidade ou órgão interessado. […]


O gerenciador — empresa ou profissional capacitado — como vimos, não é o construtor material da obra, e pode até mesmo não ser o autor do projeto que vai se executar, mas será sempre o seu condutor, responsável pela regular implantação do empreendimento projetado. Sua responsabilidade é eminentemente técnica, mas diversa e independente da dos construtores, que respondem pelas obras e serviços que executarem e pelos danos que causarem ao proprietário ou a terceiros. Diversamente, o gerenciador só responde pela realização global do empreendimento, nos termos do contrato de gerenciamento, pois que sua missão é a de propiciar o normal desenvolvimento da obra e assegurar a perfeição dos trabalhos sujeitos à sua programação, supervisão, controle e fiscalização.


Já dissemos, e convém repetir, que a missão do gerenciador não é a de construir direta e materialmente as obras projetadas; é a de promover a sua construção de acordo com os projetos e cronogramas aprovados pelo dono do empreendimento, e nas condições técnicas e financeiras ajustadas com as partes executantes. O gerenciador é o impulsionador das obras e serviços necessários à implantação do empreendimento, para o que deve propor os meios e medidas convenientes à sua consecução no tempo e nas condições prefixadas.


Assim sendo, a responsabilidade do gerenciador restringe-se às suas atividades técnicas na condução do empreendimento, incidindo apenas sobre as suas recomendações, propostas, verificações e demais atos de acompanhamento das obras e serviços gerenciados, visando à correta execução dos projetos. É uma responsabilidade técnico-contratual firmada entre o gerenciador e o dono do empreendimento, sem se estender a terceiros, a executores de obras e serviços, a fornecedores de material ou equipamento para construções. Não há, assim, identidade ou solidariedade alguma entre a responsabilidade dos construtores e a do gerenciador visto que cada um atua em área própria, com profissional ou empresa independente, respondendo cada qual pelo seu trabalho.” (g.n.)[58]


Sob outro ângulo de análise, Floriano Azevedo Marques Neto conceitua o contrato de gerenciamento como um contrato meio, distinto do contrato de execução, este, sim, um contrato fim. Afirma que, como tal, o gerenciamento compreende essencialmente a prestação de um “serviço de direção”.[59] Essa observação é confirmada pelo teor da Resolução n. 1.010/CONFEA, em seu “Glossário”. No verbete “direção”, esta é definida como “atividade técnica de determinar, comandar e essencialmente decidir na consecução de obra ou serviço”, deixando claro que não envolve, portanto, necessariamente, a execução.


O autor afirma então, conclusivamente, que os contratos de gerenciamento “são essencialmente acessórios, retirando sua razão de existir e suas condicionantes internas dos contratos fim que se pretende gerenciar”; e que “não produzem um objeto material, mensurável, só atingindo seu escopo por meio da realização (dentro de um padrão de racionalidade e eficiência) do(s) objeto(s) de outro(s) contrato(s) fim;”[60]


A jurisprudência vem corroborar consistentemente as definições arroladas. Manifesta-se o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais sobre a delimitação da responsabilidade do executor, e do gerenciador da obra, tendo como Relatora a ilustre Desembargadora Heloísa Combat:


“Ação de indenização – Danos causados em propriedade particular decorrentes de construção de rodovia – Responsabilidade pelo gerenciamento da obra – Termo Indenizatório – Contradição – Prova no sentido de que a ré realizou e supervisionou a obra – Dever de indenizar.


– Diante da contradição havida nas cláusulas contratuais (Termo Indenizatório) e da alegação do autor de que a obra foi supervisionada pela ré, corroborada pelo laudo pericial, caberia à requerida comprovar que não executou as obras, a teor do que dispõe o art. 33, II, do CPC.


– Se a única prova produzida nos autos (laudo pericial) é no sentido de que a requerida é que cuidou da realização e gerenciamento da obra, deve prevalecer essa tese, ante a falta de prova em contrário.”[61]


O TCU fixa claramente a distinção entre os serviços de gerenciamento (ao lado da supervisão e fiscalização), daqueles de execução (obras propriamente ditas).[62] Cite-se, da mesma Corte, sobre as atribuições do gerenciador, os Acórdãos 442/2000, Segunda Câmara;[63] e 1332/2006, Plenário, este versando sobre Representação formulada contra a Infraero, em que houve questionamento sobre a vedação editalícia da aceitação de atestado de fiscalização, gerenciamento ou supervisão e/ou coordenação de execução de obras/serviços. Na análise, posicionou-se o TRIBUNAL:


“A lei n. 8.666/93, ao permitir exigência de provas de capacitação técnica, procura propiciar a segurança necessária para as contratações realizadas pelo Poder Público, com vistas a evitar que o objeto licitado seja adjudicado a empresas não capacitadas. Uma vez que, conforme a Resolução n. 218 do CONFEA, a fiscalização, a supervisão e a execução são atividades distintas, entendemos cabível a exigência feita pela Infraero, pois a experiência em fiscalização ou supervisão não necessariamente comprova aptidão para a execução propriamente da obra ou do serviço, devendo esse ponto da Representação ser considerado improcedente.”[64]


5. A correta aplicação de sanções por atraso, inexecução ou ilicitude cometidos pelo contratado


Tem sido debatida a questão da ilicitude dos atos, no âmbito da Administração Pública. Inúmeras ações, em todas as instâncias administrativas, estão vinculadas à autodetecção de focos de irregularidades e ilícitos.[65] Segundo José Cretella Júnior,


“o ilícito é sempre fato não per­mitido, proibido por lei, concretizando-se ora no delito civil – fato ilícito danoso, cometido com a intenção de prejudicar – ora no delito penal – ato humano antijurídico, doloso ou culposo, sancionado por uma pena – ora no delito administrativo, ação ou omissão do agente público que causa perturbação nos serviços públicos ou atenta contra a hierarquia.”[66]


Entretanto a esfera administrativa se distingue da jurisdição penal; e coloca-se ainda a questão do ilícito penal e civil. A doutrina manifesta-se no sentido de não haver distinção “ontológica” entre o delito penal e o delito civil: a ilicitude é uma só, e o problema seria antes valorativo. Caberia, então ao legislador “a valorização do bem jurídico, determinando quais os que devem ficar sob a égide da sanção extrema que é a pena”.[67]


O tema é extenso e proporcionaria certamente infindáveis análises. A abordagem de Paulo Roberto Coimbra Silva, a propósito do objeto da tutela penal e da repressão à evasão fiscal ilícita, traz elementos de reflexão:


“No Estado Democrático de Direito, não tem o legislador liberdade para escolher, ao seu talante, os bens jurídicos a serem tutelados, incriminando qualquer conduta humana ao seu alvedrio, mas tão-somente aquelas que, revestidas de relevância social, lesionem ou exponham a perigo um bem jurídico insculpido na Constituição como digno de proteção penal, em virtude de sua importância para o indivíduo e/ou para a coletividade.”[68]


Um conceito essencial à abordagem dessa questão é o de sanção, dado por Daniel Ferreira (2001) e citado por Fernando Araújo de Novaes: “sanção administrativa é a direta e imediata conseqüência jurídica, restritiva de direitos, de caráter repressivo, a ser imposta no exercício da função administrativa, em virtude de um comportamento juridicamente proibido, comissivo ou omissivo”.[69]


O artigo 86 da LNL sujeita o contratado, incurso em atraso injustificado na execução da avença, à multa de mora, prefixada no instrumento convocatório ou no contrato. A multa é um exemplo de sanção administrativa, dentre outras determinadas pela Lei 8.666/93, e não impede a rescisão contratual, bem como outras sanções abordadas, notadamente, no art. 87 dessa Lei, devidas à inexecução total ou parcial do pactuado: a advertência, a multa por inadimplemento, a suspensão temporária de licitar ou contratar com a Administração, por prazo de até dois anos e a declaração de inidoneidade enquanto perdurarem os motivos da sanção ou até a reabilitação.


Atente-se para a diferença entre a multa por eventual inadimplemento – sendo definida essencialmente como compensação – e a multa moratória, que tem finalidade coercitiva e visa evitar retardamento ou atraso no cumprimento do objeto contratual.[70]


A suspensão temporária do direito de licitar ou contratar, segundo a Lei 8.666/93, não pode ultrapassar a dois anos. Todavia o art. 46 da Lei 8.443/92, que dispõe sobre a Lei Orgânica do TCU, consigna:


“Verificada a ocorrência de fraude comprovada à licitação, o Tribunal declarará a inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco anos, de licitação na Administração Pública.”(g.n.)


Também o art. 7º da Lei 10.520/02, Lei do pregão, estabelece o prazo de até cinco anos, em que o infrator ficará impedido de licitar e contratar com a Administração.


Os Tribunais insistem, iterativamente, na necessidade de se comprovar a inexecução ou inadimplemento da obrigação contratual mediante processo bem fundamentado, para que se possa legitimamente declarar a suspensão.[71] Esta sanção restringe-se ao âmbito do órgão em que teria sido cometido o ilícito e ao nível da competência do agente que aplicar a sanção.[72] A jurisprudência predominante coloca-se nesse sentido,[73] embora o STJ tenha professado entendimento no sentido contrário;[74] este, devidamente discutido no campo doutrinário.[75]


Reafirma-se o direito à ampla defesa;[76] e é admitida pela lei a figura algo inovadora da reabilitação, a ser concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes, e após decorrido o prazo da sanção.


Ainda no tocante ao poder do Estado de aplicar sanções, cabe relembrar clássica advertência de Orosimbo Nonato sobre o poder de tributar, citada no contexto de relatório do Ministro Celso de Mello, no STF. Analogamente à afirmativa de que “o poder de tributar não pode chegar à desmedida do poder de destruir”,[77] diríamos que o poder de sancionar há de ser exercido na medida exata da falta ou ilícito cometido pela empresa, e jamais direcionado no sentido de inviabilizar a atividade econômica produtiva da pessoa jurídica. A prerrogativa estatal traduz pois, em essência, “um poder que somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade de trabalho, de comércio e de indústria e com o direito de propriedade”.[78]


Cabe registrar orientação do TCU, advertindo, em princípio, que “eventuais sanções de suspensão temporária e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública são aplicáveis à pessoa jurídica inadimplente e não às pessoas físicas dos sócios”.[79] Como se vê, tal assertiva tem caráter genérico e deve ser submetida às contingências específicas determinadas pelo art. 88 da LNL. Vale dizer: caso os sócios, como os profissionais que prestam serviços à empresa, tiverem incorrido em fraude fiscal dolosa ou ato ilícito na licitação, a eles se estenderão, em virtude do ordenamento legal em tela, as sanções de suspensão e de declaração de inidoneidade.


6. Considerações finais


Para encerrar nossa exposição, cumpre voltar ao filme que utilizamos como metáfora, e que nos proporcionará a seguinte conclusão: por mais complexa que seja a tarefa do administrador, não lhe faltarão técnicas e mecanismos auxiliares à boa gestão das avenças públicas. Em sua maioria, tais instrumentos são definidos em lei e, por conseguinte, obrigatórios ao dirigente público, cuja ação é pautada pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência preconizados pelo art. 37 da nossa Constituição.


Indagarão os caros participantes como termina o filme.


Na situação ali relatada, Brubaker, como novo diretor da penitenciária, terá como objetivo o interesse público e o cumprimento da lei. Tendo ingressado no estabelecimento na pele de um presidiário anônimo, poderá assim observar e detectar os focos de irregularidades. Ao assumir sua própria identidade e tomar posse do cargo de dirigente, tomará as decisões necessárias no sentido de sanear os contratos, punir os responsáveis pela corrupção administrativa e pelos ilícitos penais cometidos e, enfim, melhorar as condições de vida dos presidiários.


Suas ações, entretanto, acabarão por ferir uma extensa rede de interesses, que tangenciam o próprio Conselho de Justiça que o designou. Brubaker será exonerado de suas funções e substituído por outro diretor comprometido com o status quo anterior.


Finalmente, em sua partida, os presos amontoam-se na cerca para aplaudi-lo: é uma cena de evidente simbolismo, que remete ao público destinatário e usuário dos serviços públicos, bem como, ao reconhecimento da “boa administração” de que fala a doutrina jurídica.


O esforço de Brubaker não restará perdido. A médio prazo, Wakefield será desativada; os dirigentes acabarão por perder seus mandatos e seu poder; a desídia administrativa será, a final, erradicada e punida.


Cabe, pois, recomendar aos agentes públicos, porventura aqui presentes, que assistam ao filme como ilustração do que ficou exposto neste breve encontro. Certamente, terão oportunidade de repetir as palavras da venerável escritora Cora Coralina:


 “De uma estou certa. Muitos dirão: essas coisas também se passaram comigo.”


Em 6 de junho de 2008.


 


Notas:

* Publicado em: Direito Administrativo: BLC n. 11, 2008, p. 1035-1055; BDA n. 1, 2009, p. 1-21; FCGP, dez 2008, p. 7-23; Revista Zênite de Licitações e Contratos, ano 16, n. 179, jan. 2009, p. 5-23.

[1] COUTO E SILVA, Almiro. Os indivíduos e o Estado na realização de tarefas públicas. RDA n. 209, 1997, p. 64. Vide ainda, do mesmo autor: Controle das empresas estatais. RDP n. 55/56, p. 119.

[2] A influência da teoria administrativa norte-americana no contexto cultural brasileiro foi analisada por BERTERO, Carlos Osmar. A função de Recursos Humanos na empresa brasileira. Revista Contexto, n. 4, nov. 1977, p. 133-125.

[3] Vide RAMOS, Saulo. Código da vida. 6. impressão, São Paulo: Planeta, 2007, p. 156.

[4] DAMATTA, Roberto. A solução é a sociedade pressionar. Entrevista a Andréa FATTINI. Estado de Minas, Caderno Política, 3/9/2000, p. 6-7.

[5] WALD, Arnoldo. Novas tendências do direito administrativo: a flexibilidade no mundo da incerteza. RDA n. 202, out./dez. 1995, p. 45. Vide ainda: GARCEZ, Jèze Maria Rossani. Modernização dos sistemas jurídicos. Gazeta Mercantil, 13/3/96, p. 13.

[6] JÈZE, Gaston. Los principios generales de derecho administrativo. Trad. Garcia Oviedo. Madrid: Reus, 1928, p. 20-21. Vide, ainda, nosso: Experiências na interpretação do contrato administrativo. BLC n. 1, 1998, p. 3.

[7] Brubaker, filme de Stuart Rosenberg baseado em livro de Joe Hyams e Thomas O. Murton sobre fatos reais. Com Robert Redford, Yaphet Kotto, Morgan Freeman. Dados disponíveis em www.imdb.com.

[8] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Licitações públicas e responsabilidade na gestão fiscal. Revista Consulex, ano IV, n. 40, out. 2001, p. 11; vide ainda: AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Gestão de contratos de obras e serviços. FCGP, ano 5, n. 59, nov. 2006, p. 8033-8039; FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Manual de gestão de contratos administrativos na Justiça Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2005; FURTADO, Madeline Rocha e VIEIRA, Antonieta Pereira. Gestão de contratos administrativos. Importância do art. 67 da Lei 8.666/93. ILC n. 148, jun. 2006, p. 489; GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Gestão dos contratos administrativos – a figura do gestor contratual: perfil e atribuições típicas. BDA n. 4, 2007, p. 409-416; HUPSEL, Edite. Controle de execução dos contratos administrativos pela Administração Pública. ILC n. 163, set. 2007, p. 872-878; PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Gestão dos contratos administrativos. A figura do gestor contratual. BLC n. 1, 2008, p. 1-12; TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Obras públicas: recomendações básicas para contratação e fiscalização de obras. Edificações públicas. TCU: Brasília, 2002; e, nosso: Leis de licitação e de responsabilidade fiscal em seus aspectos de transparência, controle e fiscalização. FCGP, ano 3, n. 36, 2004, p. 4717.

[9] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Licitações públicas…cit., p. 11.

[10] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. A Lei de Responsabilidade Fiscal e seus princípios jurídicos. RDA n. 221, p. 84.

[11] TCU, Acórdão 2438/05, DOU de 19/10/05.

[12] Vide TCU, Acórdãos 1891/2006, DOU de 16/10/06, 1617/2007, DOU de 11/6/07. Doutrinariamente: ALTOUNIAN, Cláudio Sarian. Obras públicas: licitação, contratação, fiscalização e utilização. Belo Horizonte: Fórum, 2007.

[13] TCU, Acórdão 1874/07, Plenário, DOU de 14/9/07; Acórdão 486/06, Plenário, DOU de 7/4/06; vide ainda o art. 23, § 4º da Portaria Interministerial 127, de 29/5/08, dos Ministérios do Planejamento, da Fazenda e do Controle.

[14] Vide TC 005.528/2003; Decisão 1028/2001; Decisão 1640/2002; Acórdão 1755/2004.

[15] Vide MENDES, Renato Geraldo. Aspectos fundamentais do contrato administrativo – Relação entre encargos e remuneração. ILC n. 155, jan. 2007, p. 5-18.

[16] MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 7. ed., 1987., p. 171; vide ainda DALLARI, Adilson Abreu. Alteração dos contratos administrativos – economicidade, razoabilidade e eficiência. FCGP, ano 4, n. 48, dez. 2005, p. 6431.

[17] WALD, Arnoldo. Juros contratuais Contratos administrativos. Revista dos Tribunais, ano 2, n. 5, p. 156, out./dez. 1993.

[18] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 14. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 195-196.

[19] Sobre a aplicação da dialética hegeliana, vide PADUANI, Célio César. Filosofia do Estado em Hegel. Belo Horizonte: Mandamentos, 2005.

[20] Vide ALENCAR, Dilermando Gomes. Legalidade de contrato de cessão de crédito. FCGP, ano 6, n. 72, 2007, p. 65-68.

[21] TCU, Acórdãos 502/2008, 375/2002, 448/2002, 282/2007, 2046/2006.

[22] TCU, Acórdão 1915/2003, DOU de 23/12/03.

[23] Vide nosso: Aplicação do Código Civil às licitações e contratos. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 133-135. Sobre controvérsias e soluções na interpretação do contrato, vide MUKAI, Ana Cândida de Mello Carvalho. Aspectos controvertidos dos contratos administrativos. BLC n. 8, 2006, p. 734-747.

[24] TC 005.250/2002-5, DOU de 28/4/03, p. 304; Acórdão 584/2003, 2ª Câmara, DOU de 28/4/2003; Decisão 286/93 (TC 008.217/93).

[25] TCU, Decisão 763/94, DOU de 22/5/95. Vide a Decisão 245/92, mencionando o Decreto-lei 1.312/74, art. 11; cite-se ainda o judicioso voto do Min. Lincoln Magalhães da Rocha, em ponderações adicionais, no TC 015.333/97, DOU de 27/9/02.

[26] A propósito, vide: ARAGÃO, Alexandre Santos de. A consensualidade no direito administrativo, acordos regulatórios e contratos administrativos. BLC n. 9, 2006, p. 827; BARBI FILHO, Celso, Execução específica de cláusula arbitral. In: CORRÊA LIMA, Osmar Brina. Atualidades Jurídicas, vol. 3, Belo Horizonte: Del Rey, 1993, p. 91/102; BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Transações administrativas. São Paulo: Quartier Latin, 2007; DALLARI, Adilson Abreu. Arbitragem na concessão de serviço público. BDA n. 9, set. 1996; COELHO, Inocêncio Martins. Arbitragem, mediação… RDA n. 219, p. 11; GRINOVER, Ada Pellegrini. Arbitragem e prestação de serviços públicos. RDA n. 233, 2003, p. 377-385; LEMES, Selma Ferreira. A jurisprudência brasileira sobre uso da arbitragem. Valor Econômico, E2 – Legislação e Tributo, 26/8/03; LIMA, Cláudio Viana. Arbitragem e solução. Rio. Forense, 1994; MARTINS, Pedro Antônio Batista. Anotações sobre arbitragem no Brasil e o projeto de lei do Senado 78/92. Revista de Processo, jan./mar. 1995, p. 25; MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Arbitragem nos contratos administrativos. Direito administrativo, Contabilidade e Administração Pública, n. 9, set. 1997; idem, Políticas públicas e parcerias: juridicidade, flexibilidade negocial e tipicidade na Administração consensual. BLC n. 1, 2008, p. 34-42; ; MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Arbitragem nos contratos administrativos. BDA n. 10, 1997; idem, Licitude de compensação transacionada da dívida decorrente de contrato administrativo. ILC n. 100, jul. 2002, p. 462-473; SILVA, José Anchieta da. Arbitragem dos contratos comerciais no Brasil. BH, Del Rey, 1997; SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Arbitragem nos contratos administrativos. BDA n. 11, 1997; idem, A justiça na sociedade moderna: a lei de arbitragem no seu décimo aniversário. Revista Consulex, ano XI, n. 240, jan. 2007, p. 52; TÁCITO, Caio. Arbitragem nos litígios administrativos. RDA n. 210, p 211 e 274; TIBÚRCIO, Carmen. A lei de arbitragem e a pretensa inconstitucionalidade do art. 7º da Lei 9.307. RDA n. 218, p. 174; idem, A atbitragem envolvendo a Administração Pública: REsp 606.345-RS. RDE, ano 2, n. 6, abr./jun 2007, p. 341-350; WALD, Arnoldo et al. O direito de parceria e a nova lei de concessões. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1996, p. 140.

[27] GORDILLO, Agustín. Tratado de Derecho Administrativo. Tomo 2. 5. ed., Belo Horizonte: Del Rey e Fundación de Derecho Administrativo, 2003, p. XII-21.

[28] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Administrativo. Rio de Janeiro / São Paulo: Renovar, 2000, p. 48.

[29] STF, RE 253.884-MG, Rel Min. Ellen Gracie. Informativo STF n. 273, jun. 2002.

[30] Vide GASPARINI, Diógenes. Extinção, susteção e suspensão do contrato administrativo. ILC, ano XI, n. 125, jul. 2004, p. 609.

[31] Judiciosa análise do Prof. Ivan Barbosa Rigolin focaliza diversas razões que induzem ao aumento do valor contratual: Contratos administrativos na Lei 8.666/93: nove causas para elevação do seu valor. BLC n. 7, 2004, p. 495.

[32] BORGES, Alice Gonzalez. O equilíbrio econômico-financeiro nos contratos administrativos. BDA n. 2, 1997, p. 82 et seq.

[33] STF, RE 89.217: Contrato administrativo. Arrendamento. Rescisão. RDA n. 137, 1979, p. 179, cit. p. 201.

[34] Vide GARCIA, Flávio Amaral. Regulação jurídica das rodovias concedidas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 204: o autor comenta, como exemplo, a demagógica alegação da “redução de pedágios” no setor rodoviário, “perpetrada por chefes do Executivo logo após sua posse, visando à obtenção de dividendos políticos, ainda que, juridicamente, estejam certos de que o concessionário restaurará o valor original do pedágio quando recorrer ao Poder Judiciário, em função da intangibilidade do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.” Refere-se ainda a “leis que brotam do Legislativo, conferindo isenção a determinada categoria de usuários de rodovias sem indicar a respectiva fonte de custeio, o que denota o cunho meramente eleitoreiro da norma.”

[35] MEIRELLES, Hely Lopes. Estudos e pareceres de direito público. Vol 11, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991, p. 88.

[36] Ibid., p. 88.

[37] Ibid, p. 90-91.

[38] WALD, Arnoldo. O direito de regulação, os contratos de longo prazo e o equilíbrio econômico-financeiro. Palestra no VII Congresso Brasiliense de Direito Constitucional “Soberania da Constituição no contexto das entidades supranacionais”, Brasília, 22/10/04, mimeo. Entre várias decisões citadas: STF, RE 183.180-4, DJ de 1/8/97, RDA n. 224, 2001, p. 392; STF, RE 91.142, DJ de 19/12/85; STJ: Recursos em MS: nº 1.681-0, RSTJ n. 52, p. 305; nº 3.161-6, RSTJ n. 55, p. 378; nº 582, RDA nº 186, p. 133. Vide STJ, Agravo Regimental no AI 2004.04.017706-PR, trecho da Ementa: “Impossibilidade de o Poder Público, unilateralmente, alterar as cláusulas do contrato de concessão do serviço público sem compensar o concessionário.” RDA n. 241, 2005, p. 273; e ainda, doutrinariamente, MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. O novo papel do Estado na economia. RDA n. 241, jul./set. 2005, p. 17.

[39] SUNDFELD, Carlos Ari. Guia jurídico das parcerias público-privadas. In: Parcerias Público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 25-26.

[40] Vide, nosso: Aplicação do Código Civilcit., p. 110-119.

[41] SIMÃO, Paulo Sáfady. Parceria pressupõe segurança jurídica. Correio Braziliense, 9/3/05; vide ainda PEREZ, Marcos Augusto. O risco no contrato de concessão de serviço público. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 135 e ss.

[42] O novo Tribunal de Contas. Conferência do Conselheiro Flávio Régis de MOURA E CASTRO, proferida no Encontro Luso-Brasileiro de Tribunais de Contas em Portugal, Estoril, 19-21 de março de 2003, mimeo. Vide ainda: FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência. Belo Horizonte: Fórum, 2003; GUERRA, Evandro Martins. Os controles externo e interno da Administração Pública e os Tribunais de Contas. Belo Horizonte: Fórum, 2003; CASTRO, Rodrigo Aguirre. Sistema de controle interno: perspectiva gerencial e o princípio da eficiência. Jam-Jurídica, ano XIII, n. 1, jan. 2008, p. 9-20.

[43] Essa afirmativa é fortalecida pela monografia do Ministro Benjamin Zymler: A visão dos Tribunais de Contas sobre os contratos administrativos. FCGP, ano 3, n. 30, jun. 2004, p. 3863-3878.

[44] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. O parlamento e a sociedade como destinatários do trabalho dos Tribunais de Contas. In: SOUSA, Alfredo José de, et al.. O novo Tribunal de Contas – Órgão protetor dos direitos fundamentais. Belo Horizonte: Fórum, 2003, p. 85-86.

[45] Vide Comunicação do Presidente do TCU, Min. Valmir Campelo, Ata n. 25, de 2/7/03, quando informou ao Plenário as novas atribuições dadas pela Lei 10.707/03. Vide ainda: O controle externo e a nova Administração Pública – uma visão comparativa. TCU, Brasília/DF, 2002; e Relatório de atividades do TCU. 2º trimestre 2003. Brasília/DF.

[46] Art. 101. O Projeto de Lei Orçamentária de 2008 e a respectiva Lei poderão contemplar subtítulos relativos a obras e serviços com indícios de irregularidades graves informados pelo Tribunal de Contas da União, permanecendo a execução física, orçamentária e financeira dos contratos, convênios, etapas, parcelas ou subtrechos em que foram identificados os indícios, condicionada à adoção de medidas saneadoras pelo órgão ou entidade responsável, sujeitas à prévia deliberação da Comissão Mista de que trata o art. 166, § 1o, da Constituição. § 1o Para os efeitos desta Lei, entende-se por: I – execução física, a realização da obra, fornecimento do bem ou prestação do serviço; II – execução orçamentária, o empenho e a liquidação da despesa, inclusive sua inscrição em restos a pagar; III – execução financeira, o pagamento da despesa, inclusive dos restos a pagar; e IV – indícios de irregularidades graves, os atos e fatos que recomendem a suspensão cautelar das execuções física, orçamentária e financeira do contrato, convênio ou instrumento congênere, ou de etapa, parcela, trecho ou subtrecho da obra ou serviço, que sendo materialmente relevantes enquadrem-se em alguma das seguintes situações, entre outras: a) tenham potencialidade de ocasionar prejuízos significativos ao erário ou a terceiros; b) possam ensejar nulidade de procedimento licitatório ou de contrato; e c) configurem graves desvios relativamente aos princípios a que está submetida a administração pública. […] § 7o Os processos que tenham por objeto o exame de obras ou serviços nos quais foram constatados indícios de irregularidades graves serão instruídos e apreciados prioritariamente pelo Tribunal de Contas da União, com vistas a garantir decisão que indique, de forma expressa, se as irregularidades inicialmente apontadas foram confirmadas e se o empreendimento questionado poderá ter continuidade sem risco de prejuízos ao erário, no prazo de até seis meses contado da comunicação prevista no § 5o do art. 102 desta Lei. § 8o Caso o empreendimento não possa ter continuidade, a decisão mencionada no § 7o deste artigo deverá relacionar todas as medidas a serem adotadas pelos responsáveis, com vistas ao saneamento das irregularidades graves. § 9o Após a apresentação das medidas corretivas pelo órgão ou entidade responsável, o Tribunal de Contas da União deverá se pronunciar sobre o efetivo cumprimento dos termos da decisão, no prazo de até três meses. […]

[47] Vide: Brasil. Tribunal de Contas da União. Auditoria em Obras Públicas – Sumário Executivo. Brasília: TCU, SECOB, 2002, p. 17; e ainda: Brasil. Tribunal de Contas da União. Obras públicas – recomendações básicas para a contratação e fiscalização de obras públicas. Brasília: TCU, SECOB, 2002; BRASIL. Tribunal de Contas da União. Anais do VII Simpósio Nacional de Auditoria de Obras Públicas. Brasília, 25-29 de novembro de 2002. E, ainda, a importante decisão da e. Corte de Contas, no contexto de auditoria operacional acerca da qualidade das obras rodoviárias federais: TC 015.719/2001-5, Acórdão 938/2003, DOU de 31/7/03, p. 270.

[48] TC 001.819/2002-7, Decisão 1239/02, itens 54 a 73 do Relatório do Min. Lincoln Magalhães da Rocha, DOU de 27/9/02.

[49] DOU de 27/8/04.

[50] Vide Anexo I da Ata n. 22, de 1/6/06, DOU de 2/6/06, especificamente p. 177-178. E ainda: TCU, TC 015.271/2003, Acórdão 102/2004, DOU de 10/2/04. Outras decisões sobre patologias contratuais: Acórdãos 1440/2003, 819/2002, 1725/2003, 97/2002, 1239/2002, 1731/2006, 950/2008; Decisões 1044/2000; e 1239/2002.

[51] Vide FRANCO, J. Nascimento e GONDO, Nisske. Concorrência pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1969, p. 115, nota 112.

[52] Nesse sentido, têm sido editadas pelo Executivo normas regulamentares com boa repercussão nas áreas de gestão contratual e convenial: vide Decreto 6.170, de 25/7/07 – Dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, e dá outras providências; Instrução Normativa do Ministério dos Transportes 1/07, de 4/10/07 – Uniformiza os procedimentos e rotinas a serem observados pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT na instrução de processos licitatórios, e dá outras providências; Instrução Normativa do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão 2/08, de 30/4/08 – Dispõe sobre regras e diretrizes para a contratação de serviços, continuados ou não; Portaria Interministerial (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Ministério da Fazenda e Ministério do Controle e da Transparência) 127, de 29/5/08 – Estabelece normas para execução do disposto no Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, e dá outras providências; Resolução do CONFEA 1023, de 30/5/08 – Dispõe sobre a Anotação de Responsabilidade Técnica e o Acervo Técnico Profissional e dá outras providências (entrará em vigor em 1º de janeiro de 2010).

[53] MACHADO JR., J. Teixeira; REIS, Heraldo de Costa. A Lei 4.320 comentada. 30. ed. Rio de Janeiro: IBAM, 2000/2001, p. 144-145.

[54] Primeira Decisão do TCU sobre o § 3º do art. 55 da LNL: 088/2002, DOU de 19/03/02.

[55] “Questões Práticas”, BLC n. 7, 1999, p. 359. No Código Civil de 2002, o artigo é o 618.

[56] TCU, Decisão 505/93, DOU de 29/11/93, p. 18.032. Vide ainda Acórdão 829/04, DOU de 8/7/04: orientação do TCU ao DNIT para que, nos contratos de conservação e restauração rodoviárias, exija como condição de pagamento das medições, “que os quantitativos medidos sejam espe­cificados em relatório de fiscalização que identifique, com previsão de centenas de metros, os trechos concernentes aos serviços efetuados, acompanhados por arquivos de fotos digitais […] de forma a registrar inequivocamente a realização das atividades”. Outras orientações: Acórdãos 213/2006, DOU de 1/3/06, e 1162/2006, DOU de 17/7/06.

[57] MEIRELLES, Hely Lopes. Estudos e Pareceres de Direito Público, vol. III. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 4. Veja-se, a propósito, decisão do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro sobre contrato de gerenciamento, no qual coube à contratada a programação, a supervisão, o controle e a fiscalização do empreendimento de engenharia. No caso específico, por força de lei, foi delegado à entidade gerenciadora o poder de contratar com terceiros, em nome do Estado, a execução da obra, mediante processo licitatório e nos termos da legislação vigente. Ementa: “Obras Públicas – Contrato de Gerenciamento – Contratada atuando em nome do Estado – Considerações”. BLC n. 9, 2001, p. 579.  

[58] MEIRELLES, Hely Lopes. Estudos…cit., p. 6-8.

[59] MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Contratos Administrativos – Gerenciamento de Obras e Programas de Obras Públicas – Conceito e Características – Pertinência de Gerenciamento Externo. ILC nº 164, out. 2007, p. 998 e ss.

[60] MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Contratos …cit., p. 998.

[61] TJMG, 2.0000.00.511946-8/000(1), julgamento 09/06/05, publicação 01/07/05.

[62] Decisão 90/2001 – Plenário Câmara – DC-0090-14/01-1, Rel. Min. Marcos Vinicios Vilaça, DOU de 17/05/01; vide ainda Acórdão 1162/2006 – Plenário, Rel. Min. Augusto Nardes, DOU de 17/07/06.

[63] TCU, Acórdão 442/2000 – 2ª. Câmara, Rel. Min. Valmir Campelo, DOU de 04/09/00.

[64] TCU, Acórdão 1332/2006 – Plenário, Rel. Min. Walton Alencar, DOU de 07/08/06.

[65] Nesse sentido vide TCU, Decisão 497/93, DOU de 29/11/93.

[66] CRETELLA JÚNIOR, José. Dicionário de direito administrativo. São Paulo: Bushatsky, 1972, p. 152.

[67] NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva, 1965, p. 121.

[68] SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito tributário sancionador. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 173.

[69] NOVAES, Fernando Araújo de. O princípio da proporcionalidade nas sanções administrativas da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. FCGP, ano 5, n. 56, ago. 2006, p. 7597-7605.

[70] Vide “Questões Práticas”, BLC n. 5, 2002, p. 341.

[71] TRF 2a. Região, Ap MS 2001.02.01.003253-8, DJ de 30/5/06; vide ainda STJ, REsp 914.087-RJ, DJ de 29/10/07.

[72] MUKAI, Toshio. Pena de suspensão do direito de participar de licitação, imposta pelo Estado. BLC n. 12, dez. 1994, p. 571; do mesmo autor: A pena de suspensão temporária de licitar… Fórum Administrativo, ano 1, n. 3, maio 2001, p. 264, e BLC n. 7, 2001, p. 401.

[73] MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Extensão das sanções administrativas de suspensão e declaração de inidoneidade. BLC n. 3, 1995, p. 130; RIGOLIN, Ivan Barbosa. Suspensão do direito de licitar. Abrangência da penalidade. BLC n. 11, 1999, p. 533; CORREIA, Marcelo Bruto da Costa. As sanções nos contratos administrativos e o princípio da proporcionalidade. ILC n. 152, out. 2006, p. 891; TOURINHO, Rita. Ponderações sobre infrações e sanções administrativas no âmbito das licitações e contratos administrativos. ILC n. 163, set. 2007, p. 891-899.

[74] STJ, REsp 174.274-SP, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 22/11/04.

[75] Vide MUKAI, Toshio. Suspensão temporária de licitar e contratar e declaração de inidoneidade abrangem a administração pública de modo geral? Uma decisão contra legem e inconstitucional do STJ. BLC n. 1, 2004, p. 1.

[76] TJAC, MS 51-RB, RDA 137, 1979, p. 255. Por outro lado: STJ, MS 4.261, DJ de 29/8/94: “Sanções aplicadas pela Administração em decorrência do descumprimento do contrato. Violação do direito líquido e certo indemonstrada. Descumpridas as normas do edital, a aplicação das penalidades previstas no próprio edital e legislação pertinente não fere direito, muito menos líquido e certo”. Vide ainda REsp 18.712, DJ de 29/11/99: “Administrativo. Licitação. Sanção aplicada. Intimação pessoal. Nulidade do processo por ausência de intimação pessoal substituída por intimação formal pelo Diário Oficial”; e TJSC, ApCv MS 4.879-SC, BLC n. 6, 1995, p. 303.

[77] STF, RE 529.154-5-RS, DJ de 16/8/07; o Min. Celso de Mello faz as seguintes referências: Orosimbo Nonato (STF, RE 18.331/SP), John Marshall (RF 145/154, RDA 34/132), Bilac Pinto (RF 82/547-562, 552).

[78] Ibid..

[79] TCU, Acórdão 991/2006, ILC n. 158, abr. 2007, p. 438.


Informações Sobre o Autor

Carlos Pinto Coelho Motta

Advogado em Belo Horizonte/MG


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