Análise da Aplicabilidade da Lei n. 9.605/1998, frente à Proteção dos Animais Domésticos

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Resumo: O presente trabalho irá analisar juridicamente a Lei no 9.605/1998 em face dos animais domésticos bem como as respectivas situações de abusos e maus tratos contra esses seres vivos. Frise-se que os animais domésticos não possuem a devida proteção jurídica tampouco assegurados os seus direitos haja vista que esse assunto ainda é pouco debatido na sociedade. Desta feita o intuito deste estudo é demonstrar a sua importância para o ecossistema além de evidenciar que são seres sencientes podendo sentir e sofrer como os seres humanos. Ademais será feita uma análise diante de uma perspectiva filosófica com o intuito de expor o pensamento de renomados filósofos como Peter Singer diante do tema. Outrossim é objeto da pesquisa verificar como o sistema jurídico brasileiro pune os respectivos crimes comparando com sistemas jurídicos de outros países a fim de apresentar a distinção entre as referidas penas. Ainda serão apresentadas possíveis soluções para que os indivíduos percebam que os animais domésticos não possuem meios para se defender por si só e por isso dependem da proteção dos seres humanos a fim de que estes lutem para que suas garantias sejam asseguradas.

Sumário: 1. Introdução. 2.Direito dos Animais na Perspectiva da Filosofia.3. Proteção Jurídica dos Animais não-humanos no Direito Brasileiro.3.1.Animais não-humanos domésticos ou domesticados no Ordenamento Jurídico brasileiro.4.Declaração Universal dos Direitos dos Animais.5.Tutela Jurídica dos Animais Domésticos ou Domesticados no Sistema Jurídico Brasileiro.5.1.Sistema Jurídico Penal Brasileiro em face dos Crimes contra os Animais Domésticos ou Domesticados.6.Tutela Jurídica dos Animais no Direito Comparado.7.Conclusão

Introdução

Desde os primórdios se discute a extensão dos direitos aos animais, tendo em vista as utilidades e benefícios que proporcionam,   a natureza deles no que se refere a sentimentos e sensações. Nesse sentido, tratar da proteção dos animais, principalmente os domésticos, ainda é um tema novo, visto que até a promulgação da Lei nº 9.605/1998, a qual trata dos crimes ambientais, não havia grande preocupação sobre tal proposição.

Por se tratar de uma legislação recente direcionada a seres despersonificados[1], os quais não devem ser considerados, somente, como bem móvel[2] ou coisa, mas como seres vivos que carecem de proteção eficaz da legislação infraconstitucional e constitucional, isto torna essa legislação bastante interessante.

De acordo com o website Mundo Entre Patas, a conceituação atual de animal doméstico abarca apenas aqueles que podem ser domesticados pelo homem e, dessa maneira, conviver com os humanos. Nesse sentido, os animais domésticos mais comuns na sociedade atual são os cães e gatos, embora outros possam ser domesticados. (20–, p. 1)

Além disso, os animais domésticos são um gênero e dentro deste encontra-se a espécie denominada animais de companhia, tidos, muitas vezes, como membros da família.

Outrossim, parece que a maioria das pessoas não possui informações suficientes sobre a legislação vigente acerca da proteção dos animais domésticos. Entretanto, parece estar mais presente no imaginário da sociedade que é proibido caçar ou aprisionar animais silvestres, como se esse fosse o único propósito de tal legislação. Isto posto, o presente trabalho tem a finalidade de mostrar a importância de ampliar os direitos dos animais domésticos na legislação brasileira.

2 Direitos dos animais na perspectiva da filosofia

Paradigmas filosóficos antigos ainda estão enraizados em nosso cotidiano no que concerne ao tratamento do homem para com os animais, pois a convicção da superioridade humana é inquestionável na mente da população, já que este paradigma prevalece.

O motivo desse entendimento está relacionado com a racionalidade e a capacidade de estabelecer princípios morais ou éticos. Assim, a humanidade percebeu que a partir dessas características e habilidades teria domínio sobre a natureza e os animais, subjugando estes como inferiores e como se objetos fossem. (CHALFUN, 2010, p. 211)

O renomado filósofo australiano Peter Singer, tido como o fundador do movimento atual de direitos dos animais – em razão de seu livro Libertação Animal, publicado em 1975 – defende a posição moral dos animais com base no conceito Utilitarista de igual consideração de interesses. Essa teoria abrange a discussão do status moral dos animais, e o filósofo defende que este não deve ser baseado no conceito de direitos, mas sim no interesse que estes possuem para o campo da moralidade.

Para melhor esclarecer o significado da teoria Utilitarista é necessário salientar que esta se refere ao bem-estar dos conjuntos do seres sencientes[3], isto é, uma ação ou omissão de maneira a buscar a otimização dos mencionados seres vivos. Assim sendo, é uma teoria ética que propõe atitudes que gerem resultados positivos, independentemente de serem boas ou ruins, tendo em vista a importância das consequências dos atos.

A mencionada teoria Utilitarista foi criada e proposta pelo ilustre filósofo Jeremy Bentham em seu livro An Introduction to the Principles of Morals and Legislation no ano de 1789, época relativa à Revolução Francesa. Diante disso, vale ressaltar que a teoria Utilitarista combina com o “consequencialismo” onde verifica-se que o valor das ações está nas suas consequências. Por isso, o ápice desse conceito está ligado ao valor da ação, o qual está coadunado em ampliar o bem-estar e minimizar o sofrimento dos seres sencientes.

À vista disso, Peter Singer ao defender a teoria do Utilitarismo, argumenta que o elemento balizador é o que tange a diferença entre os seres que têm interesse dos que não os têm, sendo a capacidade de sofrer o elemento distintivo entre ambos.

Por conseguinte, os seres humanos não devem ter com relação aos animais o critério de que devam possuir inteligência para que se apliquem considerações morais, mas sim a habilidade deles de “experienciar” a dor.

Nesse contexto, mister se faz entender o conceito de especismo cunhado por Richard Ryder em 1970, tendo como base o sexismo e o racismo. Nesse sentido, o especismo aduz a discriminação arbitrária em face de outra espécie. (RYDER, 2008, p. 64)

É notório que os seres humanos fazem essa distinção e, na maioria das vezes, são “especistas” em relação às outras espécies, uma vez que não tratam com o devido respeito os outros seres, isto é, não é tornar todas as espécies com os mesmos valores ou fazer com que elas estejam na mesma classificação que os humanos se encaixam, pois se assim fosse não haveria diversos outros tipos de espécies, sendo que estas se diferenciam por causa de sua individualização. Porém, o que se clama é que os humanos tenham seus interesses igualmente considerados.

Na declaração de Singer, não se atentar ao princípio de igual consideração de interesses, quando se trata de espécies, é ser “especista”. Outrossim, conforme o renomado filósofo, o juízo moral, que abarca a teoria dos interesses semelhantes, requer a universalizabilidade do referido princípio.

Sendo assim, a partir do momento que se defende a tirania de uma forma de vida sobre as outras, no que tange a superioridade física ou intelectual, isto implica em sustentar o aludido juízo em qualquer circunstância. Isto posto, significaria que o domínio dos humanos sobre os animais, seria em face dos dominados serem desprovidos dos atributos inerentes à raça humana.

Lembra-se ainda na teoria dos filósofos René Descartes e Claude Bernard que o ser humano atingiu seu auge por meio do mecanicismo, período cartesiano em que o animal era considerado uma máquina onde não era considerado qualquer tipo de valor intrínseco, uma vez que era visto somente como um instrumento que servia ao homem. Ademais, nessa época a vivissecção tornou-se um método no qual os animais eram utilizados com fins de pesquisas médicas. (CHALFUN, 2010, p. 215)

Desta feita, há de se falar que resquícios do antropocentrismo ainda estão presentes no dias atuais, haja vista que tal teoria coloca o ser humano como o centro de todas as coisas, considerando, dessa forma, os animais como inferiores. Nesse contexto, é possível afirmar que grande parcela da sociedade considera a dignidade como sendo inerente apenas ao ser humano, tendo em vista as características da razão, autodeterminação, liberdade e autonomia.

Muitas vezes o homem esquece que também faz parte da natureza e, por isso, deve respeito e proteção a todas as espécies, não apenas para oferecer equilíbrio e harmonia, mas sim pela consciência de que também é um animal, além do dever de conscientizar-se de que todas as espécies contribuem de alguma forma para manter a natureza em sua estabilidade.

Ainda conforme Singer, este afirma que não é necessário que os animais tenham direitos, mas o que vale é a consideração de como os seres humanos devem tratar os animais. (2004, p. 153) Isto posto, asseguradamente, a dor é um estado de consciência, ou seja, um evento moral, o qual não pode ser observado. Desse modo, pode-se inferir o que outros estão sentindo a partir da observação de vários sinais externos. Por esta razão, todos esses sinais comportamentais podem ser visualizados em outras espécies.

São observações mínimas dos comportamentos dos animais que demonstram que estes possuem a capacidade de sentir emoções, vontade própria, capacidade de aprendizado e outras condutas que solidificam que são suscetíveis de sofrimento físico e emocional. (CHALFUN, 2010, p. 220)

Ademais, há de se falar que os animais possuem sistemas nervosos muito semelhantes aos dos seres humanos, uma vez que respondem fisiologicamente como os nossos quando estão em circunstâncias de dor. Portanto, se os animais não sentissem dor e sofrimento, suas atitudes não seriam iguais ou no mínimo similares aos dos humanos, face às situações das mesmas sensações.

Como leciona o filósofo francês Michel Serres, é necessário romper o contrato social e pactuar um novo contrato onde a harmonia e o respeito prevaleçam entre todas as espécies, com a extinção do entendimento que o ser humano é superior em todas as concepções que compreendem a razão. (CHALFUN, 2010, p. 214)

Todavia, é necessário frisar que a dignidade não deve ser um atributo pertinente somente ao homem, mas deve ser considerado perante todos os grupos sociais e, claro, também a todos os seres vivos a fim de criar um olhar sobre o outro com o intuito de afastar a ideia do especismo.

3 Proteção jurídica dos animais não-humanos no direito brasileiro

Tendo em vista as considerações e relevância que o tema referente aos direitos dos animais está assumindo nos dias atuais, isto é, a respeito da necessidade de reconhecer a dignidade intrínseca destes seres vivos, é de bom grado que se aprofunde a sua análise, para que se conheça como esses animais estão sendo recepcionados pelo Ordenamento Jurídico brasileiro.

O assunto já alcançou o âmbito jurídico, visto que o assunto está em debate na sociedade e até mesmo sendo alvo de reivindicação por ativistas que saem em protestos com o intuito de sensibilizar a população no sentido de que os animais também devem ser respeitados e protegidos, de forma significativa, pela legislação brasileira.

Nesse sentido, como bem ressalta Feijó, Grey e Santos, interessante lembrar dos tempos do Brasil Colônia, pois naquela época debatia-se que algumas espécies de animais não poderiam ser caçadas por meios cruéis como, por exemplo, fios de arame e redes. (2010, p. 161)

Outrossim, há de se falar que ao realizar a análise dos dispositivos legais desde a sua criação até os dias atuais, constata-se que em grande parcela das leis promulgadas, os animais receberam proteção e tutela, mesmo que aquelas tenham sido criadas a fim de proteger o equilíbrio ecológico ou com o intuito de que a propriedade fosse garantida aos senhores feudais. Desta feita, cabe salientar que o Código Civil de 1916, especificamente no artigo 46, classificou os animais como “bens móveis suscetíveis de movimento próprio”.

Em 10 de julho de 1934 foi promulgado, pelo Chefe de Governo Provisório Getúlio Vargas, o Decreto-Lei nº 24.645 – ainda em vigor – o qual estabeleceu medidas de proteção aos animais, proibindo atos de crueldade e maus tratos, sob pena de multa e prisão. Apesar de a mencionada legislação encontrar-se desatualizada atualmente, imprescindível lembrar que o referido regulamento fora considerado um grande avanço, uma vez que os animais estavam amparados de ações cruéis e maus tratos que pudessem vir a ocorrer. (FEIJÓ; GREY; SANTOS, 2010, p. 162)

Nessa senda é possível observar a relevância que a temática adquiriu com o lapso temporal, haja vista o destaque do assunto perante à sociedade. Nesse contexto, é fundamental aludir os princípios da dignidade e moralidade, os quais foram responsáveis por criar os dispositivos legais citados anteriormente.

Em 1988 com o advento da Constituição Federal do Brasil, felizmente, os animais, obtiveram notoriedade no âmbito constitucional em face dos atos de crueldade e maus tratos, tendo em vista o artigo 225, parágrafo 1o, inciso VII, da Magna Carta.

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.  (Regulamento)

Aqui se observa um dever do Estado e da sociedade em proteger os animais de qualquer ação que possa ser considerada como maus tratos. Portanto, percebe-se que existe evolução no que tange à preocupação dos humanos para com estes seres.

Em um recorte mais específico, no que se refere ao tema, o legislador criou em 12 de fevereiro de 1998 a Lei nº 9.605 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.

Especificamente no artigo 32, caput, da referida Lei, é considerado como crime:

Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.”

Ainda no parágrafo 1o do mencionado dispositivo:

“§ 1º – Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.”

Por conseguinte, sobreleva deixar assente que antes da previsão do artigo 32 da Lei nº 9.605/1998, a Lei de Contravenções Penais criada em 1941, em seu artigo 64, caput e parágrafo 1o, já demonstrava a importância dos animais diante do Poder Legislativo o qual criou normas jurídicas que colocam os animais em pauta quando o assunto abordava maus tratos. (FEIJÓ; GREY; SANTOS, 2010, p. 162)

Todavia, com o decorrer do tempo, o legislador percebeu que tratar o tema como contravenção penal não era suficiente para que os indivíduos tratassem com o devido respeito os animais e, por isso, preferiu elevar a questão à condição de crime.

Ao contrário do que é assentado pela legislação em vigor, na prática não ocorreram mudanças, pois os respectivos crimes são tidos como de menor potencial ofensivo, sendo tratados como contravenções, ou seja, não há eficácia da norma legal.

Quando realizamos uma análise jurídico-normativa acerca do artigo 32, parágrafo 1o, da Lei 9.605/1998 verifica-se que o bem jurídico tutelado é a dignidade animal, tendo como sujeito passivo o animal não-humano e como sujeito ativo pessoa – física ou jurídica – não havendo uma qualidade especial do agente, sendo, portanto, considerado como crime comum. (FEIJÓ; GREY; SANTOS, 2010, p. 163)

Nesse sentido, vale ressaltar um pequeno resumo elaborado por FEIJÓ; GREY; SANTOS (2010, p. 163), a respeito da classificação do crime ambiental em questão:

“Trata-se de crime material, exigindo para a sua consumação, resultado naturalístico, o qual ocorre quando o bem jurídico “dignidade animal” é ofendido, através da causação de dor, sofrimento, mutilações e até morte do animal […]. É admitida a tentativa. Quanto ao resultado, pode ser classificado como crime de dano, sendo o fato punível apenas a título de dolo (direto ou eventual), consistente na vontade e consciência de praticar a conduta descrita no tipo objetivo. A ação penal é pública incondicionada (art. 26 da Lei nº 9.605/1998).”

No nível da temporalidade é notório que a discussão filosófica ao entorno da matéria é pertinente, haja vista a importância moral dos animais.  Por esse motivo, embora as normas brasileiras tenham, ainda, viés antropocêntrico é possível notar que o assunto em tela cresce gradualmente nas rodas de debates, uma vez que estas envolvem discussões sobre os animais serem respeitados na medida em que a Lei os oferece segurança jurídica.

3.1 Animais não-humanos, domésticos ou domesticados, no ordenamento jurídico brasileiro

De acordo com Bianca Calçada Pontes, o Decreto-Lei nº 16.590/24 foi a primeira legislação que surgiu no Brasil com o propósito de regulamentar casos de crueldades aos animais, vez que regulamentava as Casas de Diversões Públicas. Diante disso, as corridas de touros, garraios e novilhos, brigas de galos e canários, juntamente com outras práticas que viessem a acarretar sofrimento aos animais foram banidas. (2012, p. 118)

Como já citado anteriormente, em 1934 houve a publicação do Decreto-Lei nº 24.645/34, que posteriormente sofreu substituição pela Lei nº 9.605/98, particularmente, no que tange ao artigo 32, que foi promulgada em 12 de fevereiro de 1998.

Todavia, insta salientar que em 1941 houve a edição da Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688/41), em que os maus tratos e crueldades com animais passou a ser considerado como contravenção penal, infligindo aos infratores a pena de prisão simples ou multa.

Ao abarcar o tema a respeito dos animais domésticos, é fundamental abordar a Lei Federal nº 4.591/64 que garante segurança jurídica aos animais que vivem em condomínios, ainda que existam leis específicas de convenções condominiais que proíbam animais não-humanos em apartamentos. (PONTES, 2012, p. 120)

Lamentavelmente, por desconhecimento de determinados dispositivos legais é comum que pessoas que possuam animais domésticos, sofram pressões e até ameaças dos síndicos para que se desfaçam do animal o mais rápido possível. Isto contribui para que o número de animais abandonados nas ruas cresça a cada dia, visto que parcela significativa da população trata o animal como um item sem valor, tampouco sem sentimento, podendo descartá-lo quando começam a surgir problemas nas famílias que acarrete, por exemplo, na impossibilidade de realizar uma viagem.

Com a evolução do tema no decorrer dos anos, a preocupação com a proteção dos animais não-humanos vem crescendo de maneira significativa, produzindo discussões acaloradas. Esse avanço se dá por conta de iniciativas e atitudes pertinentes às Associações Protetoras de Animais em face da insuficiência da legislação vigente que tem o dever de proteger juridicamente os animais de atos de crueldades.

Nesse sentido, insta frisar que a Society for the Prevention of Cruelty to Animals (SPCA) foi a primeira entidade inglesa designada a combater casos de maus tratos e preocupar-se com o bem-estar dos animais. (CORREIA;TINOCO, 2010, p. 141)

Isto posto, o Primeiro Promotor de Justiça do Meio Ambiente, Luciano Rocha Santana e o pesquisador em Direito Ambiental, Thiago Pires Oliveira, mencionam a questão da consolidação dos direitos dos animais:

A atual e emergente mudança de paradigma se baseia nas novas ideias protetivas dos animais advindas tanto de ponderáveis posicionamentos de grandes homens, como os do líder pacifista indiano Mahatma Gandhi, das lutas das entidades protetoras dos animais ao redor do mundo, quanto de sólidos estudos oriundos de especialistas vinculados, ou não, a instituições científicas e universidades, que passaram a defender uma nova postura ética do ser humano diante dos animais. (SANTANA, L.; OLIVEIRA, 2006, p. 72)

No período colonial, não havia no Brasil leis que asseguravam direitos e proteção aos animais, tendo em vista que o país era explorado e se submetia à legislação portuguesa. Todavia, nessa época ainda havia a exploração dos seres humanos como escravos, portanto, estes juntamente com os animais eram considerados mão-de-obra primordial para execução de trabalhos manuais ou que dependiam de força para serem realizados.

Com base nessas informações constata-se que se os indivíduos  não eram valorizados em sua essência como seres humanos, isto é, não possuíam seus direitos resguardados. Por sua vez, na legislação portuguesa ainda era possível encontrar alguns dispositivos que abarcassem a proteção da fauna e flora, conquanto a preocupação não era sobre o meio ambiente, mas em relação ao aspecto econômico. Para ilustrar, o Decreto que protegia a árvore pau-brasil, datado em 1570, foi considerado a primeira legislação acerca do tema ambiental declarada por D. João III. (CORREIA; TINOCO, 2010, p. 142)

No ano de 1822 o Brasil se tornou independente e a partir desse momento, mais especificamente no dia 06 de outubro de 1886, o primeiro documento jurídico foi criado em São Paulo, o qual visava a proteção dos animais. No mencionado Código, consignava em seu artigo 220:

“É proibido a todo e qualquer cocheiro condutor de carroça, pipa d’água, etc, maltratar os animais com castigos bárbaros e imoderados. Esta disposição é igualmente aplicada aos ferradores. Os infratores sofrerão multa de 10$, de cada vez que se der a infração. (LEVAI, 2004, p. 28)”

Ao que concerne ao Código Civil de 1916, os animais não-humanos eram considerados como coisas ou semoventes, e devido a esse fator somente eram protegidos porque eram considerados como parte de uma propriedade, em outras palavras, os animais – domésticos e domesticados considerados como coisas – eram propriedades do homem. (RODRIGUES, 2006, p. 68-69)

Outrossim, a Lei nº 7.347/85 foi de imensa importância, vez que trata de ação civil pública de responsabilidades por danos acarretados ao meio ambiente, ao consumidor e ao patrimônio artístico, turístico e paisagístico. Após a criação dessa legislação, a ação pode também ser requerida por uma entidade. Dessa maneira, ao invés da função ficar à cargo somente do Ministério Público, o legitimado para propor a ação se estende às entidades, tornando acessível para as Associações e Organizações Não-Governamentais (ONGs) a efetivação da tutela jurídica dos animais.

“[…] além do Ministério Público, outras instituições e entidades podem defender os interesses dos animais. Se o Ministério Público não mover a ação, trabalhará no processo, obrigatoriamente, como fiscal, ficando autorizado o Poder Público e outras associações legitimadas em habilitar-se como litisconsortes de qualquer dar partes. (CASTRO, 2006, p. 43)”

No dia 05 de outubro de 1988 adveio a promulgação da Carta Magna a qual confere proteção jurídica aos animais não-humanos. Como caracteriza LEVAI (2004, p. 32), a legislação ambiental brasileira é bastante evoluída, haja vista que protege juridicamente a fauna de maneira que todas essas garantias estão expostas na Constituição Federal, sendo considerada, portanto, como umas das legislações mais avançadas no mundo.

No Código Civil de 2002, não existe as mesmas redações que estavam contidas no Código de 1916, contudo no que tange aos animais domésticos e domesticados, embora não se trate especificamente dessa temática, é notório que da maneira transcrita na legislação os animais continuam sendo visualizados como bens particulares, apesar de atos cruéis serem abominados.

No Brasil é evidente as diversas legislações que abordam questões de proteção aos animais, principalmente os domésticos, no entanto o problema não é a ausência ou a pequena porção de leis que abordam o tema, mas sim a não aplicabilidade destas ou a não produção de resultados para que os transgressores percebam que cometeram um crime e devem refletir sobre o ocorrido. Pois, diante de um quadro lamentável percebido diariamente, onde existem diversos episódios de maus tratos, há de se falar que as punições para os transgressores devem ser fiscalizadas a fim de verificar se a pena está sendo aplicada e surtindo efeitos.

Rodrigues ressalta ainda que a legislação atual para o referido crime não é suficiente para causar na sociedade, receio de maltratar um animal e perceber que este faz parte do meio ambiente natural. Além de muitas vezes serem importantes para os homens como é o caso dos animais domésticos que servem de companhia para os seres humanos.

“Com efeito, as sanções previstas na legislação em comento são notoriamente ínfimas, constituindo-se como inábeis à função de prevenir e/ou impedir condutas ilicitamente tipificadas, pois a punibilidade sequer gera receios aos infratores. De outra banda, maior parte das ilicitudes restaria sob a égide dos Juizados Especiais Criminais, donde há, indene de dúvidas, uma maior viabilidade de transação, o que, por si só, não serve de desestímulo à prática de atividades predatórias aos Animais. (RODRIGUES, 2006, p. 75)”

Diante disso é necessário que haja uma reforma na legislação vigente a fim de os animais domésticos serem vistos por um ângulo diferenciado, com o propósito das pessoas terem consciência de que estes são seres indefesos e dependem do apoio dos seres humanos para que tenham suas garantias asseguradas.

4 Declaração universal dos direitos dos animais

Primeiramente, insta salientar que as Declarações não possuem força de lei, porém são de suma importância, haja vista que direcionam e influenciam na criação de normas jurídicas. Ademais, estas acrescentam novas formas de pensar sobre determinado assunto, pois pressupõem novos valores morais que devem ser avaliados quando se trata de elaborar regras jurídicas.

A Declaração Universal dos Direitos dos Animais foi proclamada em Assembleia da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) na data de 27 de janeiro de 1978, em Bruxelas, onde vários países tornaram-se signatários, inclusive o Brasil. O mencionado documento traz à tona os valores que os seres vivos possuem em conjunto com a relação humana frente aos animais, onde prevalece o respeito à dignidade que esses seres vivos detêm.

De acordo com Correia e Tinoco (2010), a referida Declaração é um documento amplamente divulgado e que por muitas vezes serve como referência para tratar do assunto que concerne às garantias inerentes aos animais não-humanos. Precipuamente, o documento coloca esses animais como sendo sujeitos de direitos, conforme consta em seu preâmbulo:

“Considerando que todo o animal possui direitos; Considerando que o desconhecimento e o desprezo destes direitos têm levado e continuam a levar o homem a cometer crimes contra os animais e contra a natureza; Considerando que o reconhecimento pelas espécie humana do direito à existência das outras espécies animais constitui o fundamento da coexistência das outras espécies no mundo; Considerando que os genocídios são perpetrados pelo homem e ha o perigo de continuar perpetrar outros, considerando que o respeito dos homens pelos animais está ligado ao respeito dos homens pelo seu semelhante; Considerando que a educação deve ensinar desde a infância a observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais, proclama-se o seguinte: […] (RODRIGUES, 2006, p. 146)”

Na Declaração Universal dos Direitos dos Animais estão contidos quatorze artigos, que abordam o respeito perante a vida dos animais não-humanos, bem como o dever de lhes assegurar uma vida digna, privando-os de atos de crueldades, sejam eles físicos ou psicológicos, fornecendo direito à liberdade, à reprodução, etc. (CORREIRA; TINOCO, 2010, p. 152)

Outrossim, João Marcos Adede y Castro se manifesta a respeito do tema:

“Nenhum documento foi tão claro, até agora, ao referir-se aos direitos dos animais, chegando ao ponto de, já no artigo 1o, dizer que os animais são iguais diante da vida, o que implica afirmar que, independente de sua utilidade ou valor comercial, devem ser tratados com o mesmo respeito. (CASTRO, 2006, p. 18)”

A Declaração Universal dos Direitos dos Animais adotou uma postura filosófica sobre os direitos dos referidos seres vivos, visto que existe o reconhecimento do valor à vida de todos os seres, além de relatar a postura humana que deve ser seguida a fim de que a dignidade e respeito aos animais não-humanos prevaleçam em detrimento de qualquer outra conduta que não condiga com o que está instituído no ilustre documento. (RODRIGUES, 2006, p. 63-64)

5 Tutela jurídica dos animais domésticos ou domesticados no sistema jurídico brasileiro

Conforme a análise da legislação brasileira referente aos crimes cometidos contra o meio ambiente, abarcados principalmente na Lei nº 9.605/1998, em conjunto com a abordagem realizada por Maria Toledo (2012), nota-se que o Direito Penal Ambiental no Brasil deixa de promover uma atenção específica aos animais domésticos, uma vez que a legislação abrange a tutela jurídica desses seres vivos de maneira geral, ou seja, não consideram os animais individualmente, mas os colocam como membros da “fauna”.

É evidente que todos os tipos de animais compõem a fauna, porém, como o foco deste trabalho são os animais domésticos ou domesticados, insta salientar que pela quantidade imensa de maus tratos que ocorrem contra estes, mister se faz necessária uma legislação específica para esses animais. Não desprezando os outros tipos de animais como os exóticos e silvestres, pelo contrário, defende-se uma lei que tratasse somente de maus tratos referentes aos animais.

O Direito Penal Ambiental coloca a “fauna” como um elemento primordial para o equilíbrio do meio ambiente, visando principalmente a qualidade de vida do ser humano. Dessa maneira, percebe-se que o legislador não optou por criar uma legislação que defendesse somente os animais, mas sim a criação de uma legislação que visasse o bem-estar do ser humano, deixando os mencionados seres vivos em plano secundário.

Diante disso, equivocadamente, o bem jurídico tutelado é o meio ambiente. Dessa forma, os animais não-humanos são tidos como objetos materiais dos delitos e os seres humanos os detentores dos direitos.

Isto posto, Maria Toledo (2012) enfatizou os princípios penais constitucionais de garantia, como o da legalidade, proporcionalidade, intervenção mínima, subsidiariedade, fragmentariedade, lesividade e adequação social a fim de explicar que o Direito Penal Ambiental se preocupa com a proteção do meio ambiente de maneira geral, mas não em específico com os animais não-humanos, com a vegetação, mares e rios.

Em face do exposto, importante fazer uma crítica em relação a Lei dos Crimes Ambientais nº 9.605/1998. Tendo em vista as penas que nela constam ao que concerne aos crimes cometidos contra o meio ambiente, o princípio da proporcionalidade merece ser destacado, uma vez que as sanções não estão em conformidade com a gravidade das condutas praticadas. Destarte, temos como efeito dominó decisões judiciais equivocadas, visto que o procedimento adotado o qual segue a Lei, infelizmente, compromete todo o sistema de aplicação do Direito.

Ademais, lacunas podem ser encontradas na referida Lei de proteção ambiental, tendo em vista a quantidade de ambiguidades e obscuridades, como é o caso do artigo 32 o qual consiste em um termo jurídico indeterminado, exigindo que o intérprete complemente seu conteúdo. Com essas dificuldades fica cada vez mais complicado definir se o ato ocorrido se encaixa na modalidade do crime, pois o aplicador do Direito terá a função de verificar se a prática cometida foi necessária ou socialmente consentida. Ou seja, isto pode também ser considerado como outras formas de abrandar um crime.

Ainda de acordo com Maria Toledo, na intervenção penal em crimes contra o meio ambiente, o critério de ultima ratio e o princípio da intervenção mínima são os que prevalecem. A autora ainda afirmou que:

“[…] as normas não penais realizam uma programação sobre política preventiva e um sistema sancionador no âmbito penal, reservando a esta área apenas os atentados mais graves ao meio ambiente, ou seja, a tutela penal volta-se somente às lesões mais ofensivas, visando diminuir o número de normas incriminadoras. (TOLEDO, 2012, p. 203)”

Nessa perspectiva o Direito Penal é mais eficaz quando existe determinada conduta que tenha maior reprovabilidade social, perigo ou agressão à natureza, mas intervindo somente quando houver falha ou quando as normas do Direito Civil não puderem ser aplicada, e também quando as medidas administrativas não forem suficientes para coibir ou punir o transgressor.

Outrossim, grande parcela dos tribunais brasileiros tem acolhido a posição em que é exigido o dano real e não somente o dano potencial, isto é, ignora-se o princípio da cautela que é considerado como um dos mais importantes, no que diz respeito ao meio ambiente, pois é conhecido por ser bastante efetivo quando se trata do bem jurídico em questão.

Tendo em vista as sanções referentes aos crimes ecológicos, é notório que existem diversas falhas quando se trata de atingir o objetivo de prevenção para que os delitos não ocorram. Mesmo que as penas sejam as privativas de liberdade, elas podem ser, na grande maioria das vezes, convertidas em prestação de serviços, e multa.

Ante o exposto seria conveniente que as penas de multa sofressem um aumento significativo a fim de demonstrar tamanha relevância que o tema abordado possui. Além disso, o alto valor é um fator que faz com que o indivíduo repense na ideia de cometer um crime contra o meio ambiente, particularmente em face dos animais domésticos.

Todavia, sobreleva assentar que muitos desses indivíduos alegarão que não possuem condição financeira suficiente que possa utilizar para pagar a multa. Portanto, para esses casos é necessário que haja a pena privativa de liberdade, sem possibilidade de transações penais ou conciliações ambas com o intuito de amenizar a situação do indiciado.

A renomada autora Maria Toledo expõe de forma clara e concisa o que deve ser feito para que haja melhora da Política Criminal no âmbito do meio ambiente:

“[…] necessidade de se conciliar a Política Criminal em matéria ambiental com as diretrizes do texto constitucional, dotando-se a legislação de instrumentos e normas adequadas à proteção dos valores ambientais, refazendo a tipologia, e reajustando as margens das penas à gravidade de cada delito. (TOLEDO, 2012, p. 204)”

Considerando a temática em questão, cabe salientar o princípio da ofensividade que tem como preceito que todo delito deve lesar ou expor a perigo um ou mais bens jurídicos. Entretanto, Maria Toledo frisa que se deve tomar cuidado com a noção de bem jurídico, pois esta não pode ser confundida com a ideia de objeto da ação ou objeto material dos delitos.

Ainda conforme a ilustre autora Maria Toledo:

“[…] o objeto da ação é o objeto real sobre o qual incide a conduta típica do sujeito ativo da infração penal; é uma realidade empírica passível de apreensão sensorial, podendo ser corpórea (homem, animal ou coisa), ou incorpórea (honra, por exemplo). Pode-se dizer que o objeto da ação pertence a uma concepção naturalista da realidade, diferentemente do bem jurídico, que corresponde, em sua essência, à consideração valorativa sintética. Ressaltando-se que o delito pode ter ou não um objeto da ação (os delitos de mera conduta não possuem). (TOLEDO, 2012, p. 206)”

Isto posto, vale ressaltar que o bem jurídico é de suma importância para que ocorra a criminalização das condutas dos indivíduos, haja vista que é legítima a intervenção penal. Sendo assim, a lesão ao bem jurídico está de acordo com uma ação que infringe determinado valor que está protegido na perspectiva penal.

Consoante a Lei nº 9.605/98, os animais são considerados como objetos materiais dos delitos, recaindo, portanto as condutas ilícitas sobre aqueles, os quais são considerados como objetos corpóreos. Ademais, grande parte da doutrina declara como sendo objetos materiais as espécies da fauna silvestre e tudo o que é oriundo desta.

Por conta de alguns doutrinadores e até mesmo parcela da população crer que os animais silvestres são mais importantes que os domésticos ou domesticáveis é que a legislação faz-se cumprir rapidamente para os transgressores da lei, uma vez que um dos motivos alegados é de que algumas espécies encontram-se em extinção e consequentemente merecem maior atenção.

Contudo, como já dito acentua-se que todos os animais são seres sencientes e que possuem a capacidade de sofrer e sentir e por esse motivos devem ser respeitados da mesma forma.

Destarte, as ações serão tidas como ilícitas quando forem capazes de diminuir o número de seres vivos que compõe alguma espécie que esteja ameaçada de extinção ou que exerça papel ecologicamente importante em seu habitat, dessa forma acarretando enorme prejuízo tanto para o meio ambiente, bem como para a qualidade de vida do ser humano.

Ante o exposto verifica-se que na legislação brasileira o bem jurídico tutelado é em favor da sociedade, ou seja, tudo envolve o bem-estar dos seres humanos, o que está totalmente de acordo com o marco histórico do antropocentrismo.

Por conseguinte, os animais silvestres são mais visados quando se trata de crimes ambientais pelo fato de estes garantirem uma diversidade biológica, considerado um meio ambiente capaz de produzir mais recursos a fim de promover o desenvolvimento econômico desenfreado do país.

Fica evidente, portanto, que o foco da legislação não é de fato a proteção dos animais não-humanos, mas sim a dos seres humanos, com o objetivo de que estes possuam suas qualidades de vida preservadas. Todavia, sobreleva assentar que o escopo da legislação deve ser o meio ambiente por seu valor intrínseco, já que este abrange milhares de seres vivos que possuem a capacidade de sofrer tanto quanto os homens.

5.1 Sistema jurídico penal brasileiro em face dos crimes contra os animais domésticos ou domesticados

Diariamente ocorrem diversos tipos de maus tratos contra os animais domésticos. Para ilustrar há o caso recente que chocou a maioria da população e foi de destaque em mídia nacional, o da cadela Bela, enterrada viva em um terreno de difícil localização, apenas com a cabeça para fora, permanecendo no local por dois dias, no estado do Rio Grande do Sul. Além disso, outro evento que teve grande repercussão nacional foi o do cão da raça yorkshire, em que uma enfermeira espancou o filhote, na frente de seu filho menor de idade, até a morte.

São esses tipos de casos que revoltam as pessoas que possuem enorme apreço pelos animais, já que são seres indefesos e dependem dos seres humanos para que lhes sejam garantidos o respeito e a dignidade à vida.

Diante do exposto, vale ressaltar que os delitos cometidos contra a fauna são considerados delitos comuns, isto é, qualquer pessoa física pode ser o sujeito ativo da ação. Nesse sentido, Luis Regis Prado define o sujeito ativo como “aquele que realiza a ação ou omissão típica, nos delitos dolosos ou culposos. Ou seja, é aquele cuja atividade é submissível ao tipo legal incriminador.” (2007, p. 267)

Maria Toledo frisa também que o “sujeito passivo do crime é o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado pela conduta criminosa.” (2012, p. 208) As consequências diretas e indiretas da conduta que fora praticada recaíram sobre determinado indivíduo. Diante disso, percebe-se que o sujeito passivo também pode ser o Estado, lesado por conduta advinda do sujeito ativo. Além disso é considerado como sujeito passivo pessoa física, jurídica, o Estado ou determinada coletividade que não detenha personalidade, mas que possui seu interesse penal atingido.

Ao que diz respeito sobre os delitos faunísticos, os sujeitos passivos, para a maioria da doutrina, somente o Estado e a coletividade poderiam ser considerados. No entanto, este posicionamento não deve ser considerado correto, visto que tal conceito exclui os animais não-humanos, não sendo estes vistos como vítimas. É evidente que este pensamento contradiz totalmente o que está elencado no artigo 32 da Lei nº 9.605/98, que pune os atos de crueldade. Desta forma, aqueles seriam vistos como objetos materiais e não como sujeitos que merecem ter seus direitos garantidos.

A Constituição da República Federativa do Brasil abarca de forma explícita em seu artigo 225, §1º, VII, que os atos de crueldade cometidos contra os animais domésticos e outros serão punidos. Indubitavelmente a intenção desse artigo é de proteger fisicamente os animais não-humanos e considerá-los como vítimas.

“A condenação dos atos cruéis não possui origem na necessidade de equilíbrio ambiental, mas sim no reconhecimento de que são dotados de estrutura orgânica que lhes permite sofrer e sentir dor.” (STJ, Resp, 1.115.916, Rel. Ministro Humberto Martins)

Atualmente, a pena para os crimes contra os animais domésticos ou domesticados é de detenção de 03 (três) meses a 01 (um) ano e multa, sendo agravada de 1/6 a 1/3 caso ocorra a morte do animal, conforme a Lei base do respectivo trabalho. Contudo, primeiramente insta salientar a diferença das penas de detenção e reclusão, tendo em vista que parcela significativa da sociedade não possui conhecimento específico para diferenciar ambas.

Ambas são penas privativas de liberdade, mas uma diferença marcante como bem enumera Bitencourt (2013) é que os crimes considerados mais graves são puníveis com pena de reclusão e os delitos de menor gravidade são puníveis com a detenção. Ademais, a pena de reclusão pode ter seu cumprimento iniciado com o regime fechado, o mais rigoroso do sistema penal brasileiro, enquanto que isto nunca poderá ocorrer com a pena de detenção.

Somente quando houver o cumprimento insatisfatório da pena de detenção é que o indivíduo pode ser levado a cumprir a pena em regime fechado, fato denominado de regressão. Ainda, os apenados no sistema de reclusão possuem mais dificuldades de obterem os designados “benefícios penitenciários”.

A fiança é um ponto que merece notoriedade quando trata-se dos crimes cometidos contra os animais domésticos, pois ainda conforme ilustra o conceituado autor, a autoridade policial é permitida a conceder fiança nas infrações punidas com pena privativa de liberdade não superior a quatro anos (art. 322 do Código de Processo Penal), independentemente de ser considerada como reclusão ou detenção. Somente quando a pena for superior a quatro anos, a fiança deverá ser requerida ao juiz. (BITENCOURT, 2013, p. 720)

Ponto nodal que deve ser destacado é ao que tange ao Juizado Especial Criminal (JECRIM), regido pela Lei nº 9.099/95 a qual regulamenta o referido procedimento sumaríssimo. Tal legislação refere-se aos Juizados Especiais Criminais e às infrações de menor potencial ofensivo.

Consoante o artigo 61 da mencionada Lei, este conceitua a infração de menor potencial ofensivo:

“Art. 61.  Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa. (Redação dada pela Lei nº 11.313, de 2006)”

Desta feita, conforme leciona os autores Alexandre Reis e Victor Gonçalves são consideradas infrações de menor potencial ofensivo, no âmbito estadual, todas as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não exceda 02 (dois) anos, possuindo ou não previsão de multa cumulativa. (2013, p. 312)

Além disso existe uma diferença entre o termo circunstanciado e o inquérito policial, fato que merece ser destacado, haja vista que muitas pessoas não sabem ou não entendem a diferença de um para o outro. Porém, ambos possuem a mesma finalidade, mas o termo circunstanciado é utilizado no JECRIM e é realizado de maneira menos formal, sem a necessidade da coleta detalhada de provas.

O artigo 76 da Lei 9.099/95 expõe que:

“Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.”

Dessa forma, o Ministério Público pode negociar a pena com o acusado, isto é, este processo do ponto de vista do acusado é oportuno, pois é um dos motivos para que o processo não corra, poupando o investigado de todas as consequências que poderiam advir do crime cometido.

A transação é proposta pelo Ministério Público ao acusado, antes do oferecimento da denúncia. No entanto, caso a proposta seja aceita esta não pode ser considerada como fator de reconhecimento de sua culpa ou de responsabilidade civil sobre o fato. Além de não poder ser considerada como reincidência e constar como antecedente criminal na ficha do indivíduo. O fato somente é registrado a fim do investigado se beneficiar do procedimento antes do prazo de 05 (cinco) anos definidos na lei. (BITENCOURT, 2013, p. 722)

As propostas abarcam duas condições de pena, as quais sejam: multa e restritiva de direitos. A primeira, claro, trata-se de pecúnia e a segunda pode ser uma forma de prestação de serviços à comunidade, impedimentos ao indivíduo de comparecer a determinado local, proibição de gozar do final de semana, dentre outros que cabe aos promotores escolherem a melhor alternativa. Lembrando que a mais comum, atualmente, é o pagamento de cestas básicas. (BITENCOURT, 2013, p. 723)

Todavia, se o Réu estiver de acordo com o que está estabelecido em dispositivo legal, isto é, não tiver sido condenado anteriormente por algum crime que tenha elencado pena restritiva de liberdade, não houver participado de transação penal nos últimos 05 (cinco) anos ou algum outro tipo de atributo pessoal conforme consta no artigo 76, §2º, Lei 9.099/95), o Ministério Público tem o dever de oferecer o instituto da transação, tendo em vista o direito subjetivo do indivíduo.

Diante do exposto verifica-se que a pena de maus tratos aos animais já é pequena em face da pena de outros crimes dos quais o Código Penal Brasileiro abarca, e o instituto da transação penal é um artifício que facilita a vida do acusado, pois este não cumprirá pena em regime fechado e ademais possui diversas formas de ser eximido da pena, fator que é concretizado quando o acusado aceita a proposta que o Ministério Público propõe.

Ademais, quanto às substituições da pena, estas são bastante flexíveis, sendo na maioria das vezes aceitas pelo Réu, tendo em vista que o pagamento de cestas básicas ou prestações de serviços à comunidade são alternativas ao cumprimento da pena.

Quanto aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade estes podem ser utilizados para demonstrar a comparação das penas existentes no Código Penal brasileiro e ao artigo 32 da Lei nº 9.605/98.

O crime de maus tratos aos seres humanos elencado no artigo 136, caput e demais incisos, do Código Penal brasileiro comina para o acusado pena de:

“Art. 136 – Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina:

Pena – detenção, de dois meses a um ano, ou multa.

§ 1º – Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena – reclusão, de um a quatro anos.

§ 2º – Se resulta a morte:

Pena – reclusão, de quatro a doze anos.

§ 3º – Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos(Incluído pela Lei nº 8.069, de 1990)”

Embora o Ordenamento Jurídico brasileiro considere o animal como “res”, vale ressaltar que este é um ser senciente bem como o ser humano, pois ambos possuem a capacidade de sentir e sofrer, haja vista que o animal demonstra claramente os seus sentimentos como, por exemplo, alegria, tristeza e dor.

A questão de elevar a pena dos maus tratos aos animais não é igualar ambas as penas, mas demonstrar que a pena atual do caput do artigo 136 do Código Penal, referente aos seres humanos, não é suficiente para mostrar ao cidadão que este agiu em desconformidade com a Lei, causando na vítima consequências que esta pode deter para a vida inteira.

Contudo, quanto aos parágrafos do artigo 136 percebe-se que a pena é aumentada e devido a esse aumento a pena para os maus tratos aos animais também deve ser elevada, pois como já exposto, os animais são demasiadamente importantes para o meio ambiente natural e os domésticos são, muitas vezes, companhias de pessoas que gostam de animais ou até mesmo que não possuem famílias ou amigos por perto.

Sendo assim alegar que os animais domésticos são seres vivos pertencentes a outra espécie não é um argumento plausível para que estes possuam menos proteção jurídica frente à legislação que concerne aos seres humanos.

Há de se falar que existe uma desproporção no Conjunto Normativo brasileiro a respeito das penas conferidas aos animais domésticos e aos seres humanos, pois a pena de maus tratos aos animais deve ser ao menos, próxima da estabelecida para os indivíduos.

Desse modo, a pena de maus tratos aos seres humanos deve ser aumentada, já que as consequências desse ato influenciam negativamente, causando até mesmo sequelas às vítimas. Sendo assim, é possível afirmar que não é a pena de maus tratos aos animais domésticos que deve ser ínfima ou atenuada, mas a pena de maus tratos aos seres humanos que deveria ser elevada por conta do caráter inerente ao ser humano e requisitos já mencionados.

O princípio da proporcionalidade tem a função de manter o equilíbrio e harmonia das normas quando houver conflitos entre elas. Dessa maneira, como existe incompatibilidade entre determinadas penas contidas no Código Penal brasileiro e a pena do artigo 32 da Lei nº 9.605/98, necessário utilizar-se da proporção quando o assunto são os maus tratos aos animais domésticos. Nesse sentido, a proporção entre as leis tem a finalidade de conferir máxima eficácia para a norma jurídica.

Diante disso, quanto à penalidade imposta aos maus tratos aos animais domésticos seria relevante analisar a pena de maus tratos ao ser humano e verificar as semelhanças existentes entre os dois seres vivos a fim das penas de ambos os crimes serem proporcionais.

De acordo com Leila Hitt, o princípio da proporcionalidade é primordial para que haja uma boa relação entre o objetivo que se pretende alcançar e o meio utilizado, pois este deve ser adequado, necessário e proporcional. (2013, p. 1)

A ausência de proporcionalidade na fixação das penas revela hierarquia entre as qualificações penais do Código Penal e a pena cominada para os maus tratos dos animais domésticos. Todavia, o intuito desse raciocínio não é minimizar a gravidade de comportamentos lesivos ao meio ambiente, pelo contrário a intenção é de deixar claro que todos os seres vivos que compõem o ecossistema são importante em si mesmos e por isso merecem ter suas garantias asseguradas.

Pretende-se, consoante os atuais postulados que aludem o direito punitivo, designar para a esfera da repressão penal as condutas que provoquem ofensas aos princípios fundamentais do meio ambiente social.

Nesse sentido, Laura Petraglia abordou o tema referente ao Projeto do Novo Código Penal, formulado por juristas para o Congresso Nacional, em relação ao Novo Código Penal reformulava a lei dos crimes de maus tratos aos animais, aumentando a pena para um a quatro anos de prisão. Contudo, o relator e senador Pedro Taques (PDT), baixou a pena para 06 (seis) meses a 03 (três) anos de prisão. (2014, p.1)

Petraglia mencionou também, o abandono de animais que atualmente não está inserido no Código Penal, mas que na reformulação estava prevista a pena de 01 (um) a 04 (quatro) anos de prisão, foi descriminalizado pelo relator. Embora seja alvo de inúmeras críticas, em fevereiro de 2014 Taques entregou o relatório final do Colegiado que ficou responsável pela alteração do projeto do Novo Código Penal. Destarte, o projeto terá análise da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). (2014, p. 1)

6 Tutela jurídica dos animais no direito comparado

O bem jurídico tutelado, quando se trata de maus tratos a esses animais é a moral e os bons costumes, visto que o indivíduo que comete tal crime pode ser tornar um perigo para a sociedade posteriormente, sendo considerado uma pessoa violenta que oferece risco para a convivência social.

Dessa maneira, conforme legislações referentes a outros países é possível verificar a existência de diferenças significativas ao que concerne à proteção jurídica dos animais domésticos.

No Brasil, a interpretação predominante na doutrina é a de que o Estado deve prezar pela tutela dos animais domésticos, impedindo a ocorrência de práticas cruéis tendo em vista o sofrimento das pessoas ao saber que tais práticas foram cometidas contra seres indefesos. Para tanto, as implicações sentimentais dos seres humanos voltam à tona, na medida que esses acontecimentos afetam as sensibilidades de determinadas pessoas como, por exemplo, amor, piedade e compaixão.

Nos Estados Unidos da América (EUA) existem três leis federais que tratam do bem-estar animal: Animal Welfare Act; The Twenty-Eight Hour Law of 1877 and the Humane Methods of Slaughter Act. No entanto, as referidas leis não tratam de animais de companhia tampouco dos animais criados para a alimentação. Contudo, 41 (quarenta e um) estados americanos mais o Distrito de Columbia possuem disposições criminais de crueldades contra os animais. (TOMASELLI, 2003, p. 1)

Seguindo a linha do antropocentrismo, o objetivo dessas leis é o de impedir a violência dos seres humanos, sob qualquer forma, em relação aos animais, bem como de protegê-los de maus tratos e crueldade, impondo uma penalidade para os transgressores. A maioria dessas normas estão sob o propósito da moralidade, isto é, o objetivo não é proteger os animais, mas sim manter os indivíduos junto à obediência das leis. Porém, independente da razão, muito estados estão reconhecendo que a crueldade animal, negligência e abuso são questões sérias.

Nos Ordenamentos Jurídicos dos respectivos estados as leis são acerca de atos anti-crueldade que protegem os animais domésticos de qualquer ato intencional que prejudique, torture ou mate o animal. Isto protege os animais contra abusos.

A americana Rebecca Wish, em seu artigo, retrata o número de leis que afetam cães como é o caso de licenciamento para obtê-los e suas vacinações demonstram a importância que a sociedade americana possui para com esses seres indefesos. (2004, p.1)

Além disso, os estatutos anti-crueldade dos estados americanos que oferecem proteção aos animais domésticos trabalham em conjunto a fim de condenar as pessoas acusadas de cometer abusos de animais. Todavia, os cidadãos americanos insistem para que uma lei federal seja criada com o intuito de regularizar o tratamento dos animais de companhia a fim de poder ajudar a prevenir os abusos que ocorrem, uma vez que na maioria dos estados, como no Brasil, os animais são considerados como propriedades. Alguns estados americanos estão alterando esse conceito, como é o caso do Colorado.

Um estatuto bastante interessante, apresentado pelo website Stray Pet Advocacy, que está contido dentro da Lei Federal Animal Welfare Act, é a de que qualquer estado e locais de abrigos precisam manter o cão ou o gato por pelo menos 05 (cinco) dias, incluindo finais de semana para que seja efetuada buscas pelo proprietário ou adoções. (2010, p. 1)

Nesse sentido, cabe salientar a ONG denominada The American Society for the Prevention of Cruelty to Animals (ASPCA), primeira sociedade humana , fundada em 1866, estabelecida na América do Norte e atualmente uma das maiores do mundo, tem a intenção de proteger os animais das “mãos” dos seres humanos e garantir-lhes à lei. Ademais é a primeira organização humanitária a conceder autoridade legal para investigar e fazer prisões por crimes contra os animais. Desse modo, a missão da ASPCA, como afirmou o fundador Henry Bergh, é “fornecer meios eficazes para a prevenção da crueldade aos animas em todo os Estados Unidos.” (ASPCA, 2014, p. 1)

Posterior a análise do Compendium do ano de 2013, que consta no website Stray Pet Advocacy, nos arquivos que possuem legislação referente a cada estado americano a respeito das penas contra os maus tratos aos animais, verifica-se uma semelhança entre eles, quais sejam: pagamento de multas altíssimas juntamente cumulada com a prisão do indivíduo. (2010, p. 1)

Em contraste com os EUA, na União Europeia, os animais domésticos são protegidos pela Convenção Europeia para a Proteção dos Animais de Companhia. Embora a Convenção não tenha sido ratificada pela França, Itália, Holanda e Turquia, o princípio básico deste tratado é o de que ninguém deve submeter um animal de estimação a desnecessária dor, sofrimento ou angústia. Além disso, a Convenção também afirma que nenhum indivíduo deve abandonar um animal doméstico. (TOMASELLI, 2003, p. 1)

A mencionada Convenção abarca o pensamento de que uma pessoa que possui um animal doméstico ou que concordou em cuidar dele é responsável pela saúde e bem-estar do mesmo e, por isso, deve ser oferecido alojamento, cuidados e atenção, alimentação, água, exercícios, além de tomar precauções para impedir a fuga dos animais.

Ao determinar que o animal de estimação não deve sofrer, o tratado tem a finalidade de proteger o animal para o seu próprio benefício. Desse modo, ao colocar o valor moral em proteger um animal, este ganha um status mais elevado do que apenas propriedade, tendo em vista que existe preocupação com o seu bem-estar.

Outros países europeus também adotaram legislação que confere bem-estar aos animais com o intuito de protegê-los de atos de crueldades. Na Suíça, a Lei Federal sobre Proteção Animal e do Decreto de Proteção dos Animais é o estatuto vigente atualmente no país. Essa legislação é abrangente e progressiva que inclui medidas para assegurar que nenhum sofrimento seja infligido aos animais. (TOMASELLI, 2003, p. 1)

Já na Noruega, o Animal Welfare Act é o dispositivo legal que serve para a regulamentação sobre o bem-estar animal no país o qual é baseado na ideia de que os animais devem ser bem tratados. Por fim, o Animal Welfare Alemão é uma das legislações mais progressiva atualmente, com base na ideia da responsabilidade do ser humano para com seus semelhantes. (TOMASELLI, 2003, p. 1)

Fica evidente, portanto, que a União Europeia tem uma seleção real de normas legais que dispõem acerca dos animais domésticos e os Estados Unidos somente cobrem o tratamento de animais de companhia através dos estatutos anti-crueldades dos seus respectivos estados e possíveis processos civis. Contudo, ambos possuem de alguma maneira legislações mais rígidas se comparadas com o Ordenamento Jurídico brasileiro.

Conclusão

É necessário que se modifique o paradigma de que o homem é a principal preocupação no arcabouço jurídico e, por isso, a ele se voltam todas as proteções, pois os animais possuem características em comum com os seres humanos havendo diferença somente de grau e espécie.

Ademais o Ordenamento Jurídico brasileiro vigente, no que tange à punição para os crimes de maus tratos, especialmente aos animais de companhia, não parece levar em consideração o real significado deles. O que demanda uma reforma da legislação para que possa atender os anseios e às exigências da nova ordem social, como já fora mencionado, para que vivamos em um meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Percebe-se, dessa maneira, que o propósito do presente trabalho não é colocar os animais domésticos acima dos seres humanos, mas propor alternativas para equilibrar o trato da legislação no que concerne a todos os animais para lhes assegurar uma vida digna. Dessa forma, os animais de companhia serão respeitados pela sua condição de vida sensível e não apenas porque representam harmonia no que diz respeito ao equilíbrio ambiental.

Isto posto, propõe-se o aumento de pena do crime contra os animais domésticos, para que a sociedade reconheça que eles merecem respeito pelo seu valor inerente, pelo o que eles são, tendo em vista que têm sensibilidade, independentemente da relevância para o meio ambiente ou de sua utilidade para o homem.

Outrossim, insta salientar o caso do Instituto Royal em que cães da raça beagle eram utilizados para o fim de experimentos de produtos estéticos. No local, que felizmente obteve suas portas fechadas, os animais eram submetidos à situações de crueldades, sendo mutilados e depois sacrificados, quando não mais possuíam nenhuma utilidade para a realização de novos experimentos.

Isto posto, vale lembrar que a legislação é bastante clara ao que concerne aos

experimentos com animais, tendo em vista que se existem meios alternativos para executar experimentos de pesquisas, deve-se utilizá-los, poupando os animais de tamanho sofrimento.

Dessa forma, a pena sendo elevada fará com que as pessoas temam cometer crimes de maus tratos aos animais, pois atualmente as pessoas têm conhecimento de que tais atitudes não acarretam em punição relevante.

Apesar da Diretriz Jurídica do Estado considerar o animal como coisa, já foi demonstrado que a vida desses seres vivos é valiosa e, por isso, estes devem ser respeitados, além de serem fornecidas mais proteções se comparado com um objeto material. Sendo assim, é correto afirmar que há equívocos na legislação quando se trata de seu cumprimento e da proporção das penas dos crimes que estão contidos no Código Penal brasileiro.

Por fim, tendo em conta que só a punição prevista em lei não é suficiente para a solução desta questão, convém citar o que também leciona o Promotor de Justiça Laerte Fernando Levai,  a criação de uma Promotoria de Justiça de Defesa dos Animais, bem estruturada, é altamente capaz de defender os animais domésticos de abusos.

Contudo, somente a criação desse órgão não cessará os crimes e, por isso, os sujeitos que certamente podem colaborar para a redução das mencionadas transgressões, são os pais e os professores educacionais de crianças, tendo em vista que aqueles têm poder de influência na formação de um cidadão, uma vez que exercem o papel de ensinar os valores supremos da vida, onde está inserido o respeito pelos animais.

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Notas:
[1] Despersonificados: é um ente que não é detentor de obrigações e direitos no âmbito jurídico.

[2] Bens móveis: são aqueles suscetíveis de movimento próprio ou remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social. (CHAVES, Cristiano, 2011, p. 493)

[3] Sencientes: capacidade de sofrer, sentir prazer ou felicidade.


Informações Sobre o Autor

Bruna Cristina Barbosa Sousa

Advogada e formada pela Faculdade de Direito de Vitória FDV


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