Descarte de medicamentos: iniciativas regionais para a implementação da logística reversa

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Resumo: O objetivo do presente trabalho se dirige à identificação e análise de legislações estaduais, promulgadas após a edição da Política Nacional de Resíduos Sólidos, relativas à aplicação da logística reversa no campo dos medicamentos domiciliares (vencidos ou não utilizados). Trata-se de pesquisa exploratória, explicativa tendo por base levantamento documental e legislativo em relação ao tema. As referidas legislações foram comparadas tendo por base os seguintes aspectos: definição de responsável pela coleta, critérios para embalagem, preocupação com informações, responsável pelo descarte, proibição do descarte e prescrição da destinação final. Observou-se que a preocupação com o descarte de medicamentos domiciliares vem ganhando corpo em termos de instrumentos legislativos, havendo, no entanto, necessidade de maiores avanços. De um modo geral, as legislações analisadas apresentam lacunas, em especial, no que se refere à prescrição da destinação final ambientalmente adequada para os medicamentos e quanto à sensibilização da população acerca de seu papel no sistema de logística reversa.

Palavras-chave: Descarte de medicamentos, Resíduos sólidos, Logística reversa, legislação ambiental.

Abstract: The aim of this work is directed to the identification and analysis of state laws, enacted after the enactment of the National Policy on Solid Waste, on the application of reverse logistics in the field of home medications (accrued or unused). It is exploratory, explanatory based on documentary survey and the legislature from the topic. These laws were compared based on the following aspects: responsible for collecting, packaging criteria, concern information, responsible for disposal, prohibition of disposal,   and prescription of final destination. It was observed that concern for the disposal of household medicines is arising in terms of legislation, there is, however, need for further advances. In general, the legislation analyzed are gaps, particularly with regard to the prescription of environmentally appropriate final destination for the drugs and the sensitization of the population about its role in reverse logistics system.

Keywords: Disposal of medications, Solid Waste, Reverse logistics, environmental legislation.

Sumário: 1. Introdução, 2. A PNRS e a logística reversa no campo dos medicamentos, 3. Iniciativas regionais para a aplicação da logística reversa aos medicamentos, 4. Conclusões, 5. Referências.

1. Introdução

Em que pese não existirem dados oficiais sobre a questão do descarte de medicamentos no Brasil, estudos acadêmicos e experiências voluntárias permitem estimar que, anualmente, são descartados em nosso país um total entre 10,3 e 19,8 mil toneladas de medicamentos (BRANDÃO, 2013) evidenciando a enorme complexidade socioambiental desta questão.

Com a edição da lei federal 12.305/2010, relativa à Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) novas premissas surgiram para o controle dos resíduos no Brasil, destacando-se a logística reversa, que envolve o processo de coleta e a restituição de produtos e embalagens ao setor empresarial.

Atualmente, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, encontra-se em desenvolvimento o Acordo Setorial que fixará as bases para aplicação da logística reversa em relação aos medicamentos em todo Brasil.

Entretanto, enquanto não se consolida a definição deste cenário em termos nacionais, alguns estados tomaram a iniciativa de editar suas próprias legislações a respeito do tema.

Neste sentido, o objetivo do presente trabalho consiste em identificar e analisar legislações estaduais relativas à aplicação da logística reversa no campo dos medicamentos domiciliares (vencidos ou não utilizados), promulgadas após a edição da PNRS, comparando e apontando seus principais aspectos perante a nova sistemática de gestão de resíduos trazida por esta política setorial.

Trata-se de pesquisa exploratória, explicativa tendo por base levantamento documental e legislativo em relação à aplicação da logística reversa de medicamentosos de uso domiciliar no âmbito de diferentes estados que possuem legislação própria.

Analisaram-se legislações estaduais relativas ao tema promulgadas após a edição da PNRS.

Foram utilizados os seguintes descritores: lei medicamentos vencidos; lei coleta medicamentos; lei logística medicamentos.

2. A PNRS e a logística reversa no campo dos medicamentos

A promulgação da PNRS consolidou uma mudança de cenário no que se refere à gestão de resíduos sólidos no Brasil. Baseada na concepção de que poder público, setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações de gestão dos resíduos sólidos, a referida lei estabeleceu a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos como uma de suas premissas, prescrevendo obrigações a todos os envolvidos na geração dos resíduos sólidos.

Neste sentido, a logística reversa, compreendida como “um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada” (BRASIL, 2010), passou a ser encarada como um dos principais instrumentos de efetividade da responsabilidade compartilhada.

A aplicação deste mecanismo no âmbito dos medicamentos de uso domiciliar não é matéria especificamente prevista na lei federal, havendo, no entanto, previsões quanto à sua extensão em relação a outros produtos e embalagens.

Diante disso, encontra-se em construção um Acordo Setorial, envolvendo poder público e agentes envolvidos no ciclo de vida dos medicamentos prevendo as respectivas obrigações de cada um para a implementação da responsabilidade compartilhada.  O edital de chamamento para elaboração do respectivo Acordo Setorial já foi aprovado pelo poder público, sendo fixado o prazo de 120 dias, após publicação no diário oficial, para que o setor envolvido apresente suas considerações a respeito (ANVISA, 2013).

3. Iniciativas regionais para a aplicação da logística reversa aos medicamentos

Enquanto não ocorre esta definição acerca da aplicabilidade da logística reversa para medicamentos em âmbito nacional, alguns estados passaram e editar legislações direcionadas à implementação de sistemas de coleta de medicamentos, vencidos ou não utilizados.

Com efeito, foram identificadas leis específicas a este respeito em 6 localidades:

– Acre (Lei nº 2.720/2013);

– Ceará (Lei nº 15.192/2012);

– Distrito Federal (Lei nº 5.092/2013);

– Paraíba (Lei nº 9.646/2011);

– Paraná (Lei nº 17.211/2012);

– Rio Grande do Sul (Lei nº 13.905/2012).

Estas legislações foram analisadas perante os preceitos de gestão dos resíduos sólidos trazidos pela PNRS.

Comparando-se os textos das diferentes legislações, foram eleitos os seguintes aspectos para comparação: responsável pela coleta, critérios para embalagem, preocupação com informações, responsável pelo descarte, proibição do descarte e prescrição da destinação final.

No que se refere à fixação do responsável pela coleta, todas as legislações definiram as farmácias e drogarias como estabelecimentos receptores. No caso do Ceará a obrigação foi estendida às distribuidoras enquanto que no Paraná foram abrangidos por este dever não só as farmácias (incluindo veterinárias e de manipulação), mas também lojas de produtos animais, serviços públicos de saúde, hospitais, clínicas, laboratórios e consultórios médicos, odontológicos ou veterinários que comercializarem ou distribuírem medicamentos, mesmo que de forma gratuita.

Tal fato acompanha a tendência seguida em outros países, em especial, membros da União Européia, Estados Unidos e Japão, onde a maioria dos sistemas de logística reversa de medicamentos elegem as farmácias e drogarias como elementos centrais do processo (GLASSMEYER et al, 2009).

Quanto ao estabelecimento de critérios para as embalagens de acondicionamento dos medicamentos recebidos, apenas os estados do Ceará, Paraná e Rio Grande do Sul apresentaram dispositivos indicando medidas específicas para o seu manuseio.

A preocupação relacionada à disponibilização de informações à população é matéria prevista apenas nas legislação do Acre e Paraíba que visam, de alguma maneira, proporcionar a conscientização dos consumidores.

Nestas duas localidades, percebe-se que a informação foi devidamente reconhecida como instrumento de efetividade do sistema de coleta.

Em relação à definição do responsável pelo descarte, observa-se algumas distinções no posicionamento dos estados. A legislação do Rio Grande do Sul não menciona esta responsabilidade, carecendo de regulamentação a respeito. Acre, Distrito Federal e Paraná especificam o descarte como obrigação da cadeia produtiva dos medicamentos enquanto que, Ceará e Paraíba, prescrevem o descarte como incumbência da administração pública municipal e estadual, respectivamente.

Neste caso, verifica-se que Acre, Distrito federal e Paraná são as localidades onde a legislação mais se mostra em consonância com os principios da responsabilidade compartilhada e logística reversa que impõem o tratamento do residuo como obrigação daquele que participa de sua geração. Nos estados em que são fixadas obrigações para o poder público, percebe-se uma certa distorção desta sistemática impondo-se à administração pública atividades que seriam de responsabilidade da iniciativa privada.

Somente as legislações dos estados da Paraíba e Paraná apresentam previsões a respeito da proibição do descarte inadequado de medicamentos vencidos ou não utilizados. Enquanto a Paraíba impede o descarte no lixo domiciliar, o Paraná veda uma série de formas de destinação final como lançamento in natura a céu aberto, queima a céu aberto ou condições não adequadas, lançamento em corpos d’água, lançamento em aterros sanitários que não sejam de classe I e lançamento na rede de esgoto.

Nenhuma das legislações analisadas enverada pelo caminho das especificações a respeito do tipo de destinação final ambientalmente adequada dos medicamentos recolhidos pelo sistema de logistica reversa, o qual se revela como um ponto sensivel do processo de gestão dos resíduos sólidos.

Considera-se, neste contexto, que a ausência de precrição do tipo de tratamento em função das diferentes classes e propriedades quimicas dos medicamentos é questão que pode ocasionar prejuízos para o gerenciamento ambientalmente adequado dos residuos neste segmento (FALQUETO; KLIGERMAN, 2012).

4. Conclusões

A preocupação com o descarte de medicamentos domiciliares vem ganhando corpo em termos de instrumentos legislativos. No entanto, o conteúdo dos textos normativos ainda carece de maiores avanços.

A opção pela aplicação da logística reversa e reconhecimento da responsabilidade compartilhada exige com que sejam previstas nas normas as obrigações de todos os agentes envolvidos na geração do resíduo, principalmente no que se refere à coleta, armazenagem, transporte e destinação adequada dos medicamentos recolhidos.

Do mesmo modo, a efetividade do sistema de coleta de medicamentos vencidos ou não utilizados depende, essencialmente, da participação do consumidor. Assim, programas de conscientização se mostram necessários para favorecer este envolvimento.

Neste sentido, verifica-se, de um modo geral, uma série de lacunas nas legislações estaduais analisadas, em especial no que se refere à prescrição da destinação final ambientalmente adequada para os medicamentos, respeitando especificidades químicas de cada classe farmacêutica e quanto à sensibilização da população acerca de seu papel no sistema de logística reversa.

 

Referências
ACRE. Lei nº 2.720, de 25 de julho de 2013.  Cria o Programa Estadual de Coleta de Medicamentos Vencidos ou Estragados. Diário Oficial do Acre, Rio Branco, 07 de julho de 2013.
ANVISA. Acordo setorial aborda descarte de medicamentos vencidos. Ag~encia Nacional de Vigilância Sanitária. 2013. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/ anvisa+portal/anvisa/sala+de+imprensa/menu++noticias+anos/2013+noticias/acordo+setorial+aborda+ descarte+de+medicamentos+vencidos+ou+em+desuso> Acesso em: 06 set. 2013.
BRANDÃO, A. Logística reversa: Brasil busca solução para descarte inadequado de medicamentos.  Pharmacia Brasileira, n.87, p.7-11, jan./mar. 2013.
BRASIL. Lei 12.305 de 02 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, nº 147, p. 3, 03 de agosto de 2010.
CEARÁ. Lei nº 15.192, de 19 de julho de 2012.  Define normas para o descarte de medicamentos vencidos e/ou fora de uso. Diário Oficial do Ceará, Fortaleza, 24 de julho de 2012.
DISTRITO FEDERAL. Lei nº 5.092, de 04 de abril de 2013. Dispõe sobre a obrigatoriedade de farmácias e drogarias receberem medicamentos com prazo de validade vencido para descarte. Diário Oficial do Distrito Federal, Brasília, 5 de abril de 2013.
FALQUETO E.; KLIGERMAN, D.C. Análise normativa para descarte de resíduos de medicamentos – estudo de caso da região sudeste do Brasil. Revista de Direito Sanitário, v.2, n.13, p.10-23, jul./out 2012.
GLASSMEYER, S.T. e col. Disposal practices for unwanted residential medications in the United States. Environmental International, v.35, n.3, p.566-572, abr. 2009.
PARAÍBA. Lei nº 9.646, de 29 de dezembro de 2011. Dispõe sobre as normas para a destinação final do descarte de medicamentos vencidos ou impróprios para uso, no âmbito do Estado da Paraíba e dá outras providências. Diário Oficial da Paraíba, João Pessoa, 30 de dezembro de 2011.
PARANÀ. Lei nº 17.211, de 03 de julho de 2012. Dispõe sobre a responsabilidade da destinação dos medicamentos em desuso no Estado do Paraná e seus procedimentos. Diário Oficial do Paraná, Curitiba, 03 de julho de 2012.
RIO GRANDE DO SUL. Lei nº 13.905, de 10 de janeiro de 2012. Dispõe sobre a obrigatoriedade das farmácias e drogarias manterem recipientes para coleta de medicamentos, cosméticos, insumos farmacêuticos e correlatos, deteriorados ou com prazo de validade expirado. Diário Oficial do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 11 de janeiro de 2012.

Informações Sobre os Autores

Gabriel Luis Bonora Vidrih Ferreira

Mestre em Direito Ambiental pela UEA. Doutorando em Direito PUCSP. Professor do Curso de Direito da UEMS

Fernanda Silva Graciani

Mestre em Toxicologia pela FCFRP/Usp. Doutora em Biociência e Biotecnologia aplicada à Farmácia pela FCFAR/Unesp


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