Justiça ambiental: para além do discurso hegemônico

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Resumo: A justiça social, analisada dentro do modelo econômico hegemônico, ganha um importante desdobramento quando verificado que os problemas ambientais afetam desigualmente os diferentes grupos sociais e étnicos. A crise ambiental global dita “democrática” pelo discurso hegemônico se apresenta contraditória no momento em que se perceber que seus efeitos atingem de forma distinta determinadas localidades e classes sociais. De forma geral, o trabalho tem como objetivo realizar considerações acerca da Justiça Ambiental e seus movimentos, analisar os fatores determinantes das principais áreas de incidência dos riscos ambientais, bem como averiguar as injustiças sociais intrínsecas da sociedade. Desse modo, verifica-se que os riscos ambientais não são necessariamente democráticos e a consequência de se ignorar as desigualdades sociais permite a adoção de soluções que não asseguram igual proteção ambiental para todos. Por fim, o método de abordagem utilizado é o indutivo, enquanto o método de procedimento é o empírico. Já, a técnica de pesquisa constitui-se na documentação indireta, pois o trabalho será desenvolvido através de análise bibliográfica em artigos de revistas científicas.

Palavras-chave: Justiça social. Justiça Ambiental. Crise Ambiental.

Sumário: Introdução. 1. Considerações preliminares acerca da Justiça Ambiental e seus movimentos no Brasil. 2. Fatores determinantes das áreas de incidência dos riscos ambientais. 3. Injustiças ambientais na atual sociedade. Conclusão. Referências.

Introdução.

Em observância ao atual modelo de desenvolvimento econômico, impossível não se verificar que os conflitos ambientais recaem sobre populações mais pobres e discriminadas, gerando um desenvolvimento injusto. Assim, a grande contradição inicia-se quando é averiguado que os grupos sociais, étnicos, raciais e de classe são atingidos de formas distintas pela crise ambiental, de modo que essa não está distribuída de forma democrática, conforme afirma o discurso hegemônico.

Desse modo, faz-se importante o estudo do tema. Inicialmente, serão abordadas considerações acerca da Justiça Ambiental e seus movimentos no Brasil, tendo em vista que o conceito daquela tem origem nesses últimos. Em um segundo momento, serão analisados os fatores determinantes dos riscos ambientais e, por último, serão estudadas as injustiças ambientais da atual sociedade, desse modo se constituem os objetivos gerais da presente pesquisa.

A pesquisa justifica-se devido à recorrência do tema na atualidade, diante da necessidade de preservação do meio ambiente, sendo preciso “desmascarar” a crise ambiental que é dita democrática, a fim de que a população compreenda que há grupos mais afetados pelas denominadas crises, embora muitos ignorem a problemática, por serem os menos atingidos pelas consequências, devido do desenvolvimento injusto.

O problema a ser enfrentado durante a pesquisa é se a crise ambiental global afeta de maneira justa os diferentes grupos sociais e étnicos, conforme é defendido pelo discurso hegemônico. Diante dessa problemática, tem-se a hipótese de que os conflitos ambientais não estão distribuídos de forma igualitária, tendo como grupos mais afetados aqueles com menos poder de aquisição, de classe social mais baixa e aqueles que sofrem com a discriminação étnica e racial.

Por fim, para a realização do trabalho, o método de abordagem utilizado é o indutivo, diante do estudo de diversos grupos afetados pelos conflitos ambientais, chega-se a conclusão do todo da desigualdade. O método de procedimento é o empírico, diante do estudo de quantidade suficiente de dados para chegar-se a conclusão do presente estudo. Já, a técnica de pesquisa constitui-se na documentação indireta, pois o trabalho será desenvolvido através de análise bibliográfica em artigos de revistas científicas

1. Considerações preliminares acerca da Justiça Ambiental e seus movimentos no Brasil

A Justiça Ambiental compreende o conjunto de princípios que buscam assegurar a um grupo – seja étnico, racial ou de classe – suporte, diante da parcela desproporcional das consequências ambientais negativas. Tal conceito decorre da comprovação de que a desestabilização dos ecossistemas afeta de modo desigual, e muitas vezes injusto, diferentes grupos sociais ou áreas geográficas.

Além disso, a Justiça Ambiental está intimamente ligada à gestão dos riscos ambientais, a fim de evitar injustiças sociais na sua distribuição. Pensar neste tema implica repensar as ações tomadas com base nos processos mercadológicos de distribuição de bens e renda.

Dessa forma, verifica-se que a Justiça Ambiental diz respeito ao tratamento justo e igualitário de todos os grupos da socidade, independente de suas posições sociais, quanto ao pleno envolvimento sobre as decisões sobre o acesso, ocupação e uso dos recursos naturais em seus territórios. Ademais, tem por princípio norteador a igualdade entre todas as comunidades no tocante à proteção do meio ambiente.

Ainda, a noção de "justiça ambiental" exprime um movimento de ressignificação da questão ambiental. O resultado de uma apropriação singular da temática do meio ambiente por dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente envolvidas com a construção da justiça social. Ocorre que esse processo de ressignificação está ligado a uma recriação dos meios nos quais se dão os embates sociais para a construção de futuros possíveis. De modo que, nesses meios, os debates sobre a questão ambiental estão cada vez mais atrelados às tradicionais questões sociais de emprego e renda.

Por fim, considerando que o conceito de Justiça Ambiental advém de movimentos sociais, a fim de exemplificar a atuação da Justiça Ambiental no Brasil – embora aqui o tema seja de difícil compreensão e pouco desenvolvido – o movimento em prol de justiça ambiental ganhou força após o Seminário Internacional Justiça Ambiental e Cidadania, realizado no ano de 2001, em Niterói-RJ. Ao fim do seminário, foi criada no Brasil a Rede Brasileira de Justiça Ambiental, com a intenção de reverter os quadros de injustiças ambientais, o que significa lutar pela superação de toda forma de discriminação, a fim de garantir a participação efetiva de todos os segmentos sociais nas decisões acerca dos usos dos recursos ambientais.

2. Fatores determinantes das áreas de incidência dos riscos ambientais

Na seara ambiental, configuram-se as injustiças sociais com distribuição heterogênea dos efeitos maléficos ao ambiente na sociedade, geralmente atingindo de maneira muito desproporcional as pessoas mais frágeis da sociedade, sem recursos, de grande parte negra, com pouca educação, dentre outras características.

Os conflitos ambientais que geralmente envolvem grupos sociais com modos diferenciados de apropriação, uso e significação do território, possuem como origem, a ameaça de outro grupo externo àquela área, seja por qualquer meio como, solo, ar, água ou ambiente, pondo em cheque o conflito de interesses econômicos contra interesses sociais.

No Brasil, para Castilho (2012), há uma grande incidência de injustiça social nas regiões sudeste, que representa 27,70% da injustiça social brasileira, em virtude do elevado grau de industrialização e da ocupação territorial. Já em regiões como o Nordeste, com índices de 29,45% e o Norte 21,28%, os conflitos são elevados, visto nestas regiões atualmente se encontram a fronteira de expansão capitalista brasileira, por meio do agronegócio, da mineração e obras de infraestrutura, como hidrelétricas, rodovias e transposição do São Francisco.

Quanto às populações atingidas, Castilho (2012) afirma que as populações mais castigadas são as que vivem nos campos, florestas e região costeira nos territórios de expansão capitalista, dentre elas os povos indígenas, pequenos agricultores, quilombos, pescadores artesanais e ribeirinhos. Assim, o Brasil – como uma grande potência econômica – deve buscar meios de crescimento sustentável, sem sobrecarregar determinadas áreas, evitando a desigualdade ambiental, buscando melhores condições de vida para as populações atingidas, como uma contraprestação, desenvolvendo amplamente o acesso à justiça, saúde e educação nessas áreas, como método de mitigação.

3. Injustiças ambientais na atual sociedade

A sociedade atual encara os efeitos da irresponsabilidade organizada gerada pela modernização incompleta, de modo que a estruturação das sociedades por meio do modelo econômico-tecnicista vigente é responsável pela produção de riscos ambientais em escala mundial.

Esses riscos, por mais que sejam globalizados, isto é, se distribuam por todo o globo, tendem a produzir seus efeitos com maior intensidade sobre as populações mais desfavorecidas, que acabam sendo vítimas de injustiças ambientais.

Os movimentos sociais por justiça ambiental, ao contrapor esse modelo de sociedade, buscam denunciar a lógica tecnicista causadora de injustiças ambientais e mitigar as consequências perversas que são suportadas por determinados grupos sociais desfavorecidos economicamente.

No entanto, para compreender os movimentos por justiça ambiental antes é necessário conhecer algumas das principais causas de injustiças ambientais presentes na sociedade atual.

Segundo Acserald (2002), os movimentos por justiça ambiental apontam o caráter socialmente desigual das condições de acesso à proteção ambiental, isto é, a não homogeneidade da garantia ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a todos. De modo que não raras vezes se verifica que um grupo de pessoas suporta uma parcela desproporcional de degradação do espaço coletivo.

As injustiças ambientais ficam evidente frente à forte degradação vivenciada por esses grupos, vez que não possuem conhecimentos e recursos capazes de mitigar os efeitos da poluição do meio ambiente.Conforme Fensterseifer (2008), o retrato destes impactos é encontrado em grandes centros urbanos, onde grande parte da população carente é compelida a viver (em razão da má distribuição das riquezas) próximo a lugares degradados e poluídos, como encostas de morros sujeitos a desabamentos, lixões, polos industriais e rios poluídos.

Destaca-se que a diferença nos graus de exposição da população aos males ambientais não decorre de processos naturais ou casualidade histórica, mas de projetos sociais e políticos que distribuem de forma desigual a proteção ambiental. Isso resta claro ao se notar que se alocam instalações como de esgoto e lixo em áreas habitadas por populações trabalhadoras pobres, desprovidas de capital e pertencentes a minorias étnicas.

Como aponta Acserald (2002b, p. 07):

“A injustiça ambiental resulta da lógica perversa de um sistema de produção, de ocupação do solo, de destruição de ecossistemas, de alocação espacial de processos poluentes, que penaliza as condições de saúde da população trabalhadora, moradora de bairros pobres e excluída pelos grandes projetos de desenvolvimento. Esta é a lógica que mantém grandes parcelas da população às margens das cidades e da cidadania, sem água potável, coleta adequada de lixo e tratamento de esgoto, uma lógica que permite que grandes empresas lucrem com a imposição de riscos ambientais e sanitários aos grupos que, embora majoritários, por serem pobres, têm menos poder de se fazer ouvir na sociedade e, sobretudo, nas esferas do poder. Enquanto as populações de maior renda têm meios de se deslocar para áreas mais protegidas da degradação ambiental, as populações pobres são espacialmente segregadas, residindo em terrenos menos valorizados e geotecnicamente inseguros, utilizando-se de terras agrícolas que perderam fertilidade e antigas áreas industriais abandonadas, via de regra contaminadas por aterros tóxicos clandestinos.”

Em decorrência dessa alocação política discriminatória, essa parte da população desfavorecida acaba por encarar de perto a poluição do ar, das águas e dos solos, que geram inúmeros riscos à saúde da população.

As classes mais desfavorecidas que não possuem condições financeiras, ou apoio estatal, para encontrar meios anular ou ao menos mitigar os efeitos nefastos da degradação ambiental, acabam sendo as principais vítimas das injustiças ambientais.

Conclusão

Diante do presente trabalho, verifica-se que compreender as injustiças intrínsecas da sociedade e a forma pela qual a problemática ambiental incorpora as desigualdades sociais, de raça, de sexo e de classe, conforme a lógica hegemônica; é crucial para se determinar o campo de atuação da Justiça Ambiental.

Os fatores determinantes das áreas de incidência dos riscos ambientais decorrem, dentre outros, de processos não democráticos de elaboração e aplicação de políticas discriminatórias e do processo de destruição de formas não capitalistas de apropriação da natureza. Identificando como maior gerador de injustiça ambiental, a desigual apropriação do meio ambiente e dos seus recursos naturais, sendo a pobreza consequência dos processos sociais de despossessão; o que para os autores é disciplinamento da mente e do corpo e a exploração da força de trabalho para a produção de riquezas e bens.

Assim, considerando que os riscos ambientais não são necessariamente democráticos, a consequência de se ignorar as desigualdades sociais por detrás dos problemas ambientais é a adoção de soluções que não asseguram igual proteção ambiental para todos.

Desse modo, diante da grande desigualdade socioambiental, faz-se necessário dar intensidade à atuação da Justiça Ambiental, para que essa cumpra o ideal de igualdade entre as comunidades no que tange à proteção do meio ambiente, bem como é preciso que se invista em movimentos/ políticas sociais para conscientizar a população do que vem ocorrendo, a fim de desmascar a crise ambiental justa, conforme sustenta o discurso hegemônico.

Referências
ACSELRAD, Henri. Ambientalização das lutas sociais – o caso do movimento por justiça ambiental. In : Revista Estudos Avançados. Vol. 24. nº 68. 2010. p. 103/119. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142010000100010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 1º de setembro de 2015.
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CASTILHO, Adriana Guedes de. Enfoque dociológico dos Conflitos socioambientais e o movimento por justiça ambiental. In : Caos – Revista Eletrônica de Ciências Sociais/ UFPB. nº 21. p. 44-58. Disponível em :<http://www.cchla.ufpb.br/caos/n21/6.%20Enfoque%20sociologico%20dos%20conflitos%20sociambientais.pdf> Acesso em: 31 de agosto de 2015.

Informações Sobre os Autores

Ricardo Alexsander Miranda Rosa

Advogado. Graduado em Direito na Universidade Federal do Rio Grande – FURG

Debora Moreira Caporlingua

Advogado. Graduada em Direito na Universidade Federal do Rio Grande – FURG

Charles Sassone Oliveira

Advogado. Graduado em Direito na Universidade Federal do Rio Grande – FURG


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