Da responsabilidade civil do médico

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A responsabilidade civil do médico vem cada vez mais sendo presente nos tribunais brasileiros. Sobre o que seja responsabilidade civil nos ensina Maria Helena Diniz: “A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal. (Curso de Direito Civil Brasileiro. Responsabilidade Civil. 10.ed., São Paulo: Saraiva, 1996, v. 7, p.29).

Os danos sofridos pelos pacientes tem sido objeto de avaliação, no que tange ao ressarcimento por parte dos responsáveis pelo fato. A responsabilidade civil do médico está embasada na teoria da culpa, ou seja, tem que haver culpa no agir do médico. E, esta culpa, no ordenamento jurídico brasileiro se manifesta através do dolo, pouco provável em casos de erro médico, pois o dolo é a intenção consciente, deliberada, de causar dano a outrem, ou assumir o risco de que isto ocorra, o que não deve ser aqui o caso, mas, sem dúvida nenhuma, se manifesta esta culpa pela presença de negligência, imprudência ou imperícia no agir do médico.  O médico teve um agir profissional que não foi o adequado para o caso por, repita-se, negligência, imprudência, ou até imperícia. A presença de uma, ou mais de uma, destas caracterizando a existência, no agir do médico, da culpa em sentido estrito.

O profissional médico se obriga com o paciente por uma obrigação de meios, como nos ensina Luciana Mendes Pereira Roberto: “Ele não deve ser responsável se o cliente não se cura. Ele promete somente cuidados atenciosos, e o cliente deve provar a culpa do médico e a relação causal entre a culpa e o ato danoso” (Responsabilidade Civil do Profissional de Saúde & Consentimento Informado, Curitiba: Editora Juruá, 2006, p.196). A classificação das obrigações contratuais, em de meios e de resultado, é uma criação doutrinária do jurista francês René Demogue (1930). Sobre o que seja obrigação de meios nos diz Fernando Antonio de Vasconcelos: “Ainda segundo o próprio DEMOGUE, há obrigações de meio quando a própria prestação nada mais exige do devedor do que pura e simplesmente o emprego de determinado meio sem olhar o resultado. O exemplo mais citado, no campo profissional, é o do médico que se obriga a usar de todos os meios indispensáveis para alcançar a cura do doente, porém sem jamais assegurar o resultado, ou seja, a própria cura” (Responsabilidade do Profissional Liberal nas Relações de Consumo, Curitiba: Editora Juruá, 2006, p.156). O atendimento médico deve ser diligente, prudente e revestido da perícia necessária ao caso. Neste adequado atendimento médico se insere o dever do médico de informar, instruir, corretamente o paciente para obter o seu consentimento para as diversas situações médicas ao qual vai submetê-lo durante um tratamento, e sobre isto nos ensina Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo: “Entretanto, é importante relembrar que o dever de informar dos médicos constitui uma obrigação muito mais complexa do que a (já complicada por si) prestação de instruções sobre os riscos decorrentes dos procedimentos propostos. Como já dito anteriormente, a obrigação é composta ainda de informações sobre diagnóstico, prognóstico, alternativas de tratamento, riscos e benefícios. Todos esses elementos contribuem para a formação da convicção do paciente, valorizando a sua autonomia, último objetivo do dever de informar” (O Dever de Informar dos Médicos e o Consentimento Informado. Curitiba: Editora Juruá, 2006, p.69). E sobre o que seja obrigação de resultado nos transmite Hildegard Taggesell Giostri: “Todos os que julgam, bem como os que escrevem sobre a temática “obrigação de resultado”, sabem muito bem que as prestações obrigacionais inseridas neste tipo de obrigação prevêm um resultado final, presumível e adredemente vinculado entre as partes. Não atingir aquele resultado significaria prestação não adimplida(A Responsabilidade Civil dos Profissionais Médicos na Área da Cirurgia Plástica. In: Leite, Eduardo de Oliveira (coordenador), Grandes Temas da Atualidade – Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro: Editora Forense, 2006, p.299). A doutrina e a jurisprudência brasileiras aceitam que a cirurgia plástica estética, embelezadora, não a cirurgia plástica reparadora, restauradora (neste caso se trataria de uma obrigação de meios), se caracteriza por ter o médico para com o paciente uma obrigação de resultado na relação de prestação de serviço que estabelece com este.

Existe uma relação contratual entre o médico e seu paciente, como preleciona  Maria Leonor de Souza Kühn: “A responsabilidade médica é considerada de natureza contratual por praticamente toda a doutrina” (Responsabilidade Civil – a natureza jurídica da relação médico-paciente. Barueri – SP: Editora Manole, 2002, p.61). Excepcionalmente poderá ser extracontratual, como no caso de um atendimento de emergência a um paciente inconsciente que não tenha, naquele momento, nenhuma pessoa responsável por ele. Como expressa Edmilson de Almeida Barros Júnior: “A natureza jurídica da relação médico-paciente, de forma pacificada, é contratual, sendo extracontratual, excepcionalmente, quando, por exemplo, o médico atende o doente em estado de impossibilidade de autodeterminação” (A Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.96).

Havendo um dano – prejuízo –  a um paciente o médico poderá ser, em juízo, responsabilizado por este se tiver agido com culpa, pois a responsabilidade dos médicos é avaliada pelos tribunais à luz da teoria da responsabilidade subjetiva. Esta, também chamada teoria da culpa, exige que estejam presentes três requisitos – pressupostos – para que possa se dar a responsabilização civil do médico, a saber, ATO LESIVO, DANO, NEXO CAUSAL E CULPA. O ato lesivo seria um atuar do profissional não compatível com a “lex artis”, ou seja, um agir profissional não adequado à ciência médica em um determinado local e momento. O dano se caracteriza como um prejuízo para o paciente no seu patrimônio material ou moral. O nexo causal se apresenta como sendo o liame entre o ato do médico, causador da lesão e o dano experimentado pelo paciente – é a existência de uma relação de causa e efeito entre o ato lesante do profissional e o prejuízo, material ou imaterial, sofrido pelo paciente como decorrência deste ato. A culpa é a presença no agir do profissional da medicina de negligência, imprudência ou imperícia, ou seja, a culpa em seu sentido estrito, nunca se excluindo a possibilidade de que possa até haver dolo na conduta do médico caracterizando a presença de culpa no seu agir profissional. Sobre as modalidades da culpa em seu sentido estrito nos ensina Fernanda Schaefer: “A negligência (do latim negligentia) caracteriza-se por ser um descuido, desleixo, falta de diligência, incúria, desatenção, desídia, falta de cuidado capaz de determinar a responsabilidade por culpa, omissão daquilo que razoavelmente se faz, falta de observação aos deveres que as circunstâncias exigem. (…) A imprudência é a descautela, descuido, prática de ação irrefletida ou precipitada, resultante de imprevisão do agente em relação ao ato que podia e devia pressupor, ou, ainda quando o médico age com excesso de confiança desprezando as regras básicas de cautela. São situações em que o médico atua sem a devida precaução, e que acabam por expor o paciente a riscos desnecessários. (…) A imperícia (do latim imperitia) é a falta de prática ou ausência de conhecimento que se mostram necessários ao exercício de uma profissão ou de uma arte. É ignorância, incompetência, desconhecimento, inexperiência, inabilidade, imaestria para a prática de determinados atos, no exercício da profissão, que exigem um conhecimento específico” (Responsabilidade Civil do Médico & Erro de Diagnóstico. Curitiba: Editora Juruá, 2002, p.45-47). E a culpa (em seu sentido amplo) como causa de responsabilização por danos vem bem prevista em nosso direito positivo. É isto o que expressa o artigo 186, do Código Civil pátrio: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Complementado pelo teor do artigo 951, do mesmo Código Civil, verbis: “O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte de paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”. No mesmo sentido vai o parágrafo do artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor (lei nº8.078, de 11 de setembro de 1990), que diz: “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.

Há excludentes da responsabilização, em juízo, do médico como a força maior, o caso fortuito e a culpa exclusiva do paciente ou de terceiro, não relacionado à prestação do serviço profissional médico. As duas últimas previstas no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº8.078, de 11 de setembro de 1990), que em seu artigo 14, no inciso II, do parágrafo 3º, prevê: “O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: (…) II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”. Sobre as duas primeiras, a força maior e o caso fortuito, o artigo 393, do Código Civil brasileiro que as prevê como excludentes da responsabilidade por prejuízos resultantes de inadimplementos contratuais é didático: “O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito e força maior (…). Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”. Exoneram, pois, o médico da responsabilidade civil, em caso de dano ao paciente, a FORÇA MAIOR ou o CASO FORTUITO. Em ambos os casos

não há, em qualquer instante, a atuação culposa do Médico.

A força maior considera-se um fato natural, superior às forças humanas, não sendo possível ao ser humano evitar sua ação e conseqüências, apesar de identificá-lo e, até mesmo, prevê-lo. Não se resiste a ele mesmo que se queira. Portanto, a força maior se caracteriza por ser um evento externo à relação médico e paciente.

O caso fortuito é aquele fato que decorre da conduta humana, tendo como característica ser imprevisível e, portanto, inevitável pelos participantes da relação profissional e paciente. Assim, independe a sua  ocorrência tanto do médico, como do paciente, apesar de ocorrer no âmbito da relação médico-paciente. Pode-se dizer, até, ser, o caso fortuito, um evento interno desta relação. É obra do acaso – não esperado na conjuntura do que está ocorrendo em um determinado  momento de um atendimento médico.

Cabe mencionar o artigo 932, de nosso Código Civil brasileiro, inteiramente aplicável à responsabilização civil do médico pelos atos daqueles que o auxiliam em suas atividades profissionais. Diz este artigo: “São também responsáveis pela reparação civil: (…) III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”. Portanto, poderá ser responsabilizado o médico, nos tribunais, por atos daqueles que atuando em suas equipes de atendimento ao paciente, ou seja, na prestação de serviços médicos, causem dano a este. No mesmo sentido vai o entendimento que o médico é responsável pelos danos causados por equipamentos, substâncias, materiais, aparelhos e instrumentos que utilizar no seu exercício profissional. Poderá ser atribuída juridicamente esta responsabilidade ao fornecedor, fabricante ou importador, se o dano for decorrente de um aspecto, como defeito de fabricação, que seja responsabilidade destes, em última análise, se o dano não for decorrente do inadequado uso daqueles pelo médico.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Neri Tadeu Camara Souza

 

Advogado e Médico – Direito Médico
Autor do livro: Responsabilidade civil e penal do médico – 2003 – LZN

 


 

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