A Excessiva Quantidade de Normas Presentes na Constituição de 1988

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(THE EXCESSIVE AMOUNT OF NORMS IN THE 1988 CONSTITUTION)

Autor[1]: Guilherme Francisco Souza Perez

Resumo: O presente artigo tem como principal objetivo apresentar as consequências de uma Carta Magna com excesso de normas, visto que, não é um assunto debatido com tanta frequência, porém, é de extrema importância, pois a ela pertence o poder de lei suprema da organização de um Estado, assim, sendo usado como base para a criação de novas normas de menor força hierárquica. Para tal, far-se-á necessário como base de argumentação, doutrinas de mestres e doutores, notoriamente conhecidos no meio jurídico; assim como matérias jornalísticas de sites reconhecidos e citações de Ministros do Supremo Tribunal Federal, pois assim são juridicamente conhecidos como “Guardiões da Constituição”.

Palavras-chaves: Direito Constitucional. Constituição Federal. Excesso de Normas.

 

Abstract: The main objective of this article is to present the consequences of a Magna Carta with excess of norms, since it is not a subject that is discussed so often, however, it is of extreme importance, since it belongs to the supreme law power of the organization of a state, thus, being used as a basis for the creation of new norms of lesser hierarchical strength. For this, it will be necessary as a basis for argumentation, doctrines of masters and doctors, notoriously known in the legal environment; as well as journalistic articles from recognized websites and quotes from Ministers of the Supreme Federal Court, as they are legally known as “Guardians of the Constitution”.

Keywords: Constitutional right. Federal Constitution. Excess of Norms.

 

Sumário: Introdução. 1 Sobre a Constituição de 1988. 2 Consequências do excesso de normas na CF/88. 3 Normas constitucionais apenas por sua formalidade. 4 Comparação com outras constituições. 5 Soluções para a problemática. Conclusão. Referências.

                                                  

INTRODUÇÃO: Dentro das divisões do direito, faz-se presente a matéria de Direito Constitucional, que é responsável pelo estudo e análise das normas presentes na Constituição Federal em vigor, no caso, a promulgada em 1988, durante o governo do então Presidente da República José Sarney, pelo Presidente da Assembleia Nacional Constituinte Ulysses Guimarães, o que representou um grande marco na história do Brasil, visto que foi um divisor de águas entre a era militar e a era democrática. Porém, nem só de pontos positivos é feito a Lei Maior, é inegável sua importância, e que nela deve constar todos os princípios básicos para a criação de outras leis que possam tornar pacifica a vida em sociedade, contudo, nota-se um excessivo número de normas constitucionais apenas pela sua formalidade, fazendo assim com que inúmeras consequências negativas, que serão expostas, apareçam com a evolução da sociedade, que há de se concordar, que, não é a mesma da década de 80.

 

1 SOBRE A CONSTITUIÇÃO DE 1988

            Desde a declaração de Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, até o presente momento (fevereiro de 2020), foram elaboradas 7 Cartas Magnas, contudo, existe quem defenda a existência de 8 Constituições Federais ao longo da história do país, levando em consideração a EC nº1/1969, um desses defensores é o advogado, professor de Direito Constitucional, mestre e doutor Pedro Lenza, que diz em sua obra, Direito Constitucional Esquematizado 23ºEd., “sem dúvida , dado o seu caráter revolucionário, podemos considerar a EC n. 1/69 como a manifestação de um novo poder constituinte originário, outorgando uma nova Carta, que ‘constitucionalizava’ a utilização dos Atos Institucionais”[2].

Para uma melhor discussão da problemática, faz-se mister manter o foco apenas na que está em vigor, a CF/88. A ela se dá o título de Constituição Cidadã, graças a enorme participação popular durante sua elaboração. Foi promulgada pelo Presidente da Câmara dos Deputados e Presidente da Assembleia Constituinte Ulysses Guimarães, com o principal intuito de restaurar o Estado Democrático de Direito que foi “extinguido” pelos militares após o golpe de 1964.

Inicialmente, o texto continha 245 (duzentos e quarenta e cinco) artigos, o que comparada a outras Leis Maiores ao redor do mundo, tem um número bastante elevado de artigos. É inegável que o excessivo número de normas tem seus motivos, um deles por exemplo é a ampliação dos Direitos e Garantias Fundamentais, visto que, dentro apenas do artigo 5º existem 78 (setenta e oito) incisos e 4 (quatro) parágrafos. A respeito da classificação da Constituição Federal de 1988, ela é basicamente, promulgada, quanto à origem; escrita, quanto à forma; dogmática, quanto ao modo de elaboração; rígida, quanto à alterabilidade; analítica, quanto à extensão e formal, quanto ao conteúdo. Ao classificar como analítica, a própria doutrina entende que de fato é uma Carta Magna que é inchada, longa, extensa.

Outro fator que pode explicar a amplitude do texto constitucional, é o fato de a mesma ser classificada como sendo formal quanto ao conteúdo, ou seja, para que uma norma seja constitucional basta ela estar presente no texto da CF, independente do seu conteúdo, diferente do que ocorre com Cartas que possuem em maioria conteúdos materiais. Além da classificação citada, outra que também é considerada pelos doutrinadores, diz respeito sobre ser a CF/88 uma Constituição analítica, ou seja, que trata exaustivamente de diversos temas.

 

2 CONSEQUÊNCIAS DO EXCESSO DE NORMAS NA CF/88

É inegável que grande parte dos dispositivos constitucionais são de grande importância e relevância, justificando assim, sua presença em tal texto, porém, há de se lembrar de detalhes da Carta Magna que vigora, um deles é sua rigidez, que permite que a Constituição seja alterada ou emendada, salvo as cláusulas pétreas, por meio de um quórum qualificado no próprio texto constitucional, assim, inúmeros são os artigos que precisam ser alterados conforme evolua a sociedade, que não deveriam estar presente na Lei Maior e que caso não estivessem poderiam ser alterados por meio de lei ordinária, acelerando assim os tramites legislativos que ajudariam na evolução social e econômica do país, mas que ainda dependem de um longo processo para que seja alterado, precisando de votação nas duas casas do Congresso Nacional.

Além de que, é notório que, ao ter uma CF que trate de diversos assuntos, outro problema surge, o excesso de inconstitucionalidade. Ao ser incompatível com o que diz a Magna Carta, pelos meios de controle de constitucionalidade, ou pelo mais conhecido e usado deles, a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no Supremo Tribunal Federal (STF), uma lei, ato normativo federal ou estadual, caso em divergência em relação a uma norma constitucional pode e deve ser revogada imediatamente.

Assim, conforme exista excedentes normas constitucionais, muitos assuntos que são aceitos pela doutrina e tratados como normais em legislações pelo mundo todo, ainda são consideradas inconstitucionais ou tem sua constitucionalidade duvidosa apenas porque, encontram divergência no texto constitucional e por ser hierarquicamente superior deve ser respeitado. Mesmo sendo um assunto que separe opiniões, por estar presente na Lei Maior, deve ser obedecida. Trata-se da prisão após sentença condenatória recorrível, que era um tema que se entendia como possível desde 2016 pelo “guardião da constituição”, o STF, que permitia que os juízes poderiam determinar a execução provisória da pena após condenação a partir da segunda instância, porém em 2019, tal entendimento foi mudado para se encaixar no que diz o inciso LVII do art. 5º da CF/88, segue o mesmo:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

 

Tal tema não necessariamente precisaria estar presente na Constituição visto que poderia ser tratado apenas pelo Código de Processo Penal, como já é, pois assim descreve o artigo 283 do referido dispositivo:

 

Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. (Redação dada pela lei 12.403, de 4-5-2011)

           

Tal entendimento da Corte Suprema Brasileira se encontra em divergência com legislações que são consideradas renomadas e muitas vezes são usadas de base, como exemplo a dos Estados Unidos, onde o réu pode começar a cumprir sua pena logo após a condenação em primeira instância, os motivos que levam a isso são que, diferente do Brasil, todos os processos penais são decididos por tribunais do júri, que possuem enorme respeito e apreciação dos juízes, além de que, grande parte dos condenados aceitam acordos para se declararem culpados, assim há uma redução de pena em troca da não possibilidade de recorrer da condenação.

Na França, pelo fato de os réus serem julgados logo na primeira instância por 3 juízes, após a condenação do mesmo já se permite o início do cumprimento da pena, como confirma o jurista Tracy Reinaldet em entrevista ao jornal Folha de São Paulo em 2019, “com três juízes analisando simultaneamente um caso, a tendência de se chegar a uma sentença mais justa e com menos erro judiciário é maior do que em um caso examinado por um único juiz. Isso é importante para entendermos porque o legislador na França possibilita que uma execução penal possa ter lugar logo após uma sentença de primeiro grau”[3], afirma o advogado.

Vale ressaltar que, mesmo com a decisão do STF, por manter o entendimento de que só será possível o início do cumprimento da pena após o transito em julgado, ou seja, após se esgotarem todos os recursos, o Presidente da Corte Ministro Dias Toffoli ressaltou que, caso queiram, poderia o Poder Legislativo fazer a alteração, visto que a mesma não se trata de uma clausula pétrea, em conformidade com o tramite previsto na Constituição para a elaboração e promulgação de uma emenda constitucional que possibilitaria a prisão após a condenação em segunda instância, ou por uma via mais rápida que seria por um projeto de lei, alterando o artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP)[4], que teve seu texto retro citado.

Dessa forma, estudando apenas sobre um único tema, faz-se notório que, ao ter diversos artigos dentro da Carta Magna, que não só poderiam, como deveriam, ser tratados por um conjunto de normas, como no caso o CPP, surge a negativa consequência de um atraso na legislação do país e por consequência no judiciário, visto que, tal, não é a única norma presente na CF/88 que precisa se adequar a atual sociedade, e ao atual entendimento jurídico mundial.

Como dito no início do tópico, é fato que existe um elevado número de pedido de análise constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, que seria amenizado caso a Lei Maior não englobasse tantos temas. Segundo o acervo oficial divulgado pela Corte, em tramitação até a data de 01 de fevereiro de 2020, haviam 1.742 (mil setecentos e quarenta e dois) Ações Diretas de Inconstitucionalidade no STF, o que é inegável que é um número muito elevado.

Utilizando de dados fornecidos pelo próprio STF em seu portal de notícias, segundo matéria publicada em 14 de novembro de 2014, temos que, desde a promulgação da CF/88, mais de 5,1 mil (cinco mil e cem) ações diretas de inconstitucionalidade haviam sido ajuizadas a Corte[5]. Sem adicionar a essa conta os outros meios de controle de constitucionalidade como a ADC (Ação Direta de Constitucionalidade); a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental); e o ADO (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão).

É notório que o Brasil passa pela era do “neoconstitucionalismo”, aonde temos a Constituição Federal com o seu caráter de valor supremo em referência ao Estado Democrático de Direito, ou seja, tudo deve estar de condizente com tal. Além disso, a mesma concretiza e assegura a todos os cidadãos valores mínimos com os direitos fundamentais. Fazendo uma sátira ao constitucionalismo pós-moderno, e entrando em coerência com o que se discute, o professor e ex-Procurador da Justiça do Rio Grande do Sul Lenio Luiz Streck, diz em seu perfil oficial no Twitter, “era do neo-inconstitucionalismo! Tudo agora é inconstitucional. Não gostamos? Inconstitucional!”[6]. Com tal declaração do professor, faz-se possível o entendimento de que, cada vez mais com o passar do tempo, fica mais difícil debater qualquer assunto, visto que, passaram-se os anos desde a promulgação da Carta Magna, e em paralelo, a sociedade progrediu muito, principalmente com o avanço da tecnologia e a chegada da internet na casa de milhares de brasileiros, o que permitiu a possibilidade de que todos pudessem ter suas vozes ouvidas, que acaba influenciando o pensamento de outras pessoas, assim, ao se propor um pensamento moderno, encontra barreiras em uma Constituição analítica.

Faz-se mister ainda, relembrar que, muitas Constituições, inclusive a brasileira, representam uma ruptura entre duas eras em um período, como por exemplo, a Carta Magna de 1988 que teve como principal objetivo terminar de vez com o regime militar que já governava o país por 21 anos, tendo o seu fim em 1985, ou seja, muita influência desse período foi depositado no texto, como exemplo tem-se o inciso III do art. 5º da CF/88, que diz o seguinte: “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”, mostrando outro ponto negativo, visto que, ainda ao se propor um pensamento moderno, além encontrar barreiras em uma Constituição analítica, também tem se o fato de a mesma ter sido promulgada em um período muito conturbado, aonde o foco principal era afastar de vez os militares do poder.

Como último ponto a ser levado em consideração no presente tópico, far-se-á necessário relembrar que, existem normas de eficácia limitada, que são aquelas que dependem de regulação por meio de lei infraconstitucional, que ficaram esquecidas no tempo pelo legislador. É notório que existem várias normas de eficácia limitada, assim Manoel Gonçalves Ferreira Filho classifica a CF/88 como sendo uma Constituição-dirigente, ou seja, “(…) se caracterizaria em consequência de normas programáticas (que para não caírem no vazio reclamariam a chama inconstitucionalidade por omissão…)[7]. Vale lembrar, que a ADO (ação direta de inconstitucionalidade por omissão) é ajuizada quando o legislador falta com sua função típica de legislar, regulando, sobre norma constitucional. Assim, utilizando-se de um exemplo prático, tem-se a Lei nº 12.506/2011, que dispões sobre o aviso prévio, com base no art. 7º, XXI, da Constituição Federal. Ou seja, somente após mais de 20 anos da promulgação da Carta de 1988, é que tal norma foi regulada.

Assim sendo, é notório que, enquanto a sociedade e seu pensamento evoluíram em grande escala, 30 anos após a promulgação do texto constitucional, a CF vem evoluindo de maneira mais lenta, e por consequência todo o sistema legislativo do país, tendo como causador disso, as excessivas normas que poderiam, deveriam, ser tratados por meio de legislação ordinária, para que, caso precisasse em um futuro próximo ou até mesmo longínquo, pudesse fazer sua alteração sem precisar de demorados tramites no Congresso Nacional, em alguns casos, existem normas que, simplesmente, repetem o texto presente na Lei Maior dentro de um conjunto de leis, como é o caso que será tratado em um futuro tópico deste trabalho, demonstrando assim sua completa falta de necessidade de estar presente em um texto de elevadíssima relevância e importância para um país, como é a Constituição Federal.

 

3 NORMAS CONSTITUCIONAIS APENAS POR SUA FORMALIDADE

            É indiscutível o tamanho da importância de se ter uma Constituição em um Estado Democrático de Direito, e não é essa a discussão apresentada neste trabalho, além de que, vale a ressalva de que, todos os títulos que são abordados na Carta Magna de 1988 tem sua importância e papel fundamental para o funcionamento do Estado, e de seus poderes. Porém, algumas normas em exceções dentro dos títulos é que se discute a sua verdadeira necessidade de estarem presentes no texto constitucional.

Quanto ao conteúdo de uma Constituição Federal, tem se a distinção entre formal e material. A propósito de ilustração faz-se por valer analisar o artigo 178 da Magna Carta do Império do Brasil de 1824, que havia como texto o seguinte:

 

“Art. 178. E’ só Constitucional o que diz respeito aos limites, e atribuições respectivas dos Poderes Políticos, e aos Direitos Políticos, e individuais dos Cidadãos. Tudo, o que não é Constitucional, pode ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinárias.”

 

            Assim, seguindo o que diz referido artigo, havia um rol de normas que, por mais que estivessem dentro do texto constitucional, não tinha a hierarquia suprema, sendo passiveis de serem alteradas por meio de legislação ordinária, o que em vigência da Constituição de 1988 é algo inimaginável.

Com relação a formalidade da CF/88, explica o professor Pedro Lenza que, “formal, por seu turno, será aquela Constituição que elege como critério o processo de sua formação, e não o conteúdo de suas normas. Assim, qualquer regra nela contida terá o caráter de constitucional. A brasileira de 1988 é formal!”[8].

Seguindo para exemplo de normas que, notoriamente apenas são constitucionais por estarem presentes na Carta de 1988, tem se o parágrafo 2º do artigo 242, que apenas diz que o Colégio Dom Pedro II, que fica localizado na cidade do Rio de Janeiro, permanecerá na órbita federal, segue a seguir o texto completo:

 

Art. 242. O princípio do art. 206, IV, não se aplica às instituições educacionais oficiais criadas por lei estadual ou municipal e existentes na data da promulgação desta Constituição, que não sejam total ou preponderantemente mantidas com recursos públicos.

 

  • 1º O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro.

 

  • 2º O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal.

 

A respeito da referida norma, trata-se de um tema um tanto quanto polêmico, visto que, a Constituição assegura no seu artigo 211 que é de obrigação dos Municípios garantir o ensino fundamental e na educação infantil; dos Estados e do Distrito Federal os ensinos fundamental e médio e a União organizará o sistema federal de ensino. Porém, em seu próprio site oficial, o Colégio Dom Pedro II o seguinte, “com mais de 12 mil alunos, o Colégio Pedro II oferece Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio Regular e Integrado, Educação de Jovens e Adultos (Proeja), além de cursos de graduação e pós-graduação”. Ou seja, de certa forma, invade a competência do Estado e do Município do Rio de Janeiro, contudo tal discussão não vem ao caso, o que vem, é que, ao que se entende, para justificar sua permanência na esfera federal, adotou-se o oferecimento de cursos de graduação e pós-graduação. Ainda ressalvando que, indefere a decisão da órbita em que permaneça o colégio, nada justifica sua garantia dentro da Lei Maior, visto que poderia ser regulado por meio de lei federal, sendo assim, notoriamente uma norma constitucional apenas pela formalidade.

Argumento esse, que é reforçado pelo professor Pedro Lenza ao tratar do sentido formal da Constituição, que em seguida, usa como exemplo a mesma norma retro citada, como pronuncia o mesmo “vale dizer, tomando-se o sentido formal, o que nos interessa é a forma de nascimento da norma. Lembramos um exemplo que supomos ilustrar bem o raciocínio: trata-se do art. 242, §2º, da CF/88, que estabelece que o Colégio Dom Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal[9]. E ainda, ao tratar sobre ser a Carta Magna de 1988 analítica, ele volta a citar a norma, “analíticas, por outro lado, são aquelas que abordam todos os assuntos que os representantes do povo entenderem fundamentais. Normalmente descem a minúcias, estabelecendo regras que deveriam estar em leis infraconstitucionais, como, conforme já mencionamos, o art. 242, §2º, da CF/88 (…)[10]. Em acordo com o pensamento do professor, faz-se necessário ressalvar o argumento de que algumas normas presentes no texto constitucional deveriam ser legisladas por meio de leis infraconstitucionais.

Para um próximo exemplo, faz-se relevante apresentar o artigo 150 da CF/88, contudo, por se tratar de uma norma relativamente extenso, faz-se plausível tratar apena do inciso e dos itens correspondentes a imunidade tributária. Assim está disposto referida norma:

 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(…)

VI – instituir impostos sobre:

  1. a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
  2. b) templos de qualquer culto;
  3. c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
  4. d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
  5. e) fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no Brasil contendo obras musicais ou literomusicais de autores brasileiros e/ou obras em geral interpretadas por artistas brasileiros bem como os suportes materiais ou arquivos digitais que os contenham, salvo na etapa de replicação industrial de mídias ópticas de leitura a laser.

 

Apenas o fato de tal norma, que rege sobre tributos, mesmo havendo já o Código Tributário Nacional (CTN), estar presente no texto constitucional, seria passível de uma discussão sobre sua real necessidade de se encontrar em uma Constituição. Contudo, além de estar na CF/88, é possível encontrar norma exageradamente semelhante no referido CTN, como assim está disposto no art. 9º:

Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(…)

IV – cobrar imposto sobre:

  1. a) o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros;
  2. b) templos de qualquer culto;
  3. c)o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;
  4. d) papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros.

 

Por se tratarem de normas semelhantes, para não dizer que é a mesma norma, faz-se necessário citar o art. 2º da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), que diz:

 

Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

  • 1ºA lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
  • 2 A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

 

Ou seja, por mais que tratem do mesmo assunto, uma norma não revoga a outra, muito menos torna o art; 9º do CTN inconstitucional.

O que se faz necessário refletir é, se já é regulado pelo CTN, código este que regula todo o sistema tributário do país, qual de fato é a necessidade de se ter a mesma norma na Constituição Federal? Visto que, segundo a teoria do neoconstitucionalismo, a sua principal função é ser o centro do sistema e a norma jurídica de maior imperatividade, sendo um guia para a elaboração de futurar normas.

Diferente das duas normas que foram citadas, algumas outras normas são inquestionáveis, a exemplo tem-se os artigos 18 à 25 da CF/88 que regem sobre poderes e funções reservados à União, aos Estados e Municípios, que indiscutivelmente precisam estar presentes no texto constitucional para auxiliar todos os poderes, em especial o poder legislativo, principalmente os municipais e estaduais, que em muitos casos invadem a competência exclusiva da união na hora de elaborar normas, e acabam sendo suas leis alvos de ADI’s perante o STF.

Outro ponto importante de se destacar, é a Lei Nº9.868, de 10 de novembro de 1999, que regula um processo de extrema importância constitucional, que muito já se foi falado neste trabalho que são as ações diretas de inconstitucionalidade, além da ação direta de constitucionalidade e da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Nota-se que não só a ADI mas os outros meios de controle de constitucionalidade também são regulados por meio de legislação ordinária, mesmo tendo papel de enorme importância, visto que, ainda que há outros meios para se evitar que normas inconstitucionais entrem na ordem jurídica, a elas se dão o maior protagonismo. Comprovando tal, faz-se passível mostrar a enorme repercussão do julgamento conjunto das ADC’s 43, 44 e 54 que julgavam sobre a possibilidade da prisão a partir de condenação em segunda instância, que durante todo o seu tramite no STF foi motivo de notícia nos principais jornais. Ou seja, comprova-se assim que, muitas normas presentes na constituição poderiam sim, ser reguladas por meio de legislação ordinária, ou equivalente.

 

4 COMPARAÇÃO COM OUTRAS CONSTITUIÇÕES

Muito bom seria, se plausível fosse a comparação com a Constituição Americana, que sem dúvidas é a referência dos principais ordenamentos jurídicos do mundo, tendo grande influência no Brasil. Contudo, por ter os Estado Unidos um sistema muito diferente do que é adotado no Brasil, visto que, no Brasil se adota o modelo cível law, aonde a norma escrita é a que rege as relações jurídicas, já nos Estados Unidos, é adotado o modelo Common law, sistema que usa casos precedentes como base. O uso de casos precedentes em juízo no Brasil também pode ocorrer, conforme diz o art. 4º da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), que assim é apresentada:

 

Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

 

Assim, mesmo que possível o uso de analogia, existe um requisito para que se possa usar, que seria a omissão da lei para a decisão do juiz, por tal motivo não é comum o uso. Outro fator que também impede a comparação com a Carta Americana, é o fato de cada Estado ter sua própria Constituição, ou seja, cada Estado tem autonomia para ter sua própria legislação, mesmo fazendo parte de uma nação, ou seja, a Lei Maior serve apenas de guia para as Cartas Estaduais.

Por mais que o sistema político seja um tanto quanto diferente da que existe no Brasil, a França tem uma Constituição bem reduzida, sem contar os textos a ela anexada, por exemplo, a Carta Ambiental de 2004 ou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 26 de agosto de 1789. De acordo com o que apresenta o site oficial do Conselho Constitucional francês, a Constituição Francesa contém, em seu texto integral, 89 artigos e 16 capítulos. Por ser divididos em blocos, além do texto integral da Constituição de 4 de Outubro de 1958, anexados tem-se os já mensurados, a Carta Ambiental de 2004, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 26 de Agosto de 1789 e o Preâmbulo da Constituição de 27 de Outubro de 1946.

Citando outro exemplo, tem-se a Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, nome dada a Constituição da Alemanha, que possui mais de 70 anos, tem como principal característica o fato de ter sido aprovada com a assinatura dos países que faziam parte do bloco dos aliados durante a segunda guerra mundial, que seriam a França, Inglaterra, EUA e, posteriormente, URSS, sendo assim classificada como uma Constituição pactuada, visto que, não só pôs fim ao regime nazista, como também o extinguiu de vez, por mais que ainda existam pequenos grupos que aderem a ideologia, o que é reprovado no mundo inteiro.

Mesmo não sendo a mais sintética que existe no mundo, tendo inclusive mais artigos do que a retro citada Constituição Francesa, a Lei Maior alemã pode se encaixar como exemplo de uma Constituição curta por ter sido aprovada em um grande momento histórico, o fim do regime nazista, assim, o texto tendo como sua última atualização em 28 de Março de 2019, conforme o que diz o Bundestag alemão, contém o total de 197 artigos e 11 títulos em seu texto integral, além do Extrato da Constituição Alemã de 11 de agosto de 1919 chamado também de Constituição de Weimar. Por mais que a diferença da quantidade total de artigos entre a Carta Magna brasileira e a alemã não seja algo tão significativo, diferente da comparação com a Carta francesa, vale ressaltar novamente, que a Lei Fundamental alemã pôs fim ao regime nazista, que teve significância mundial e foi assinada por outras nações, diferente do regime militar brasileiro, que teve a CF/88 como sua extintora.

 

5 SOLUÇÕES PARA A PROBLEMÁTICA

            Ao tratarmos de um tema, que, de fato, é considerado um problema, faz-se necessário a apresentação de possíveis soluções, ou meios para que se amenize a atual situação. De fato a elaboração de uma nova Constituição Federal seria a saída mais rápida, mudando alguns conceitos e diminuindo de maneira considerável o número de normas, contudo, tal mudança radical acarretaria em grande preocupação em todo os sistemas, principalmente o judiciário por iria gerar enorme insegurança jurídica, pois tem a Carta Magna como uma de suas características a função definitiva, que assim é explicado por Jorge Miranda “(…)Constituição definitiva ou de duração indefinida para o futuro pretende ser a Constituição produto final do processo constituinte”[11]. Assim, é previsto que uma Magna Carta dure por muitos e muitos anos, a exemplo da Constituição Americana que está em vigor a mais de 200 anos.

Portanto, mesmo sendo uma das possíveis soluções, com toda certeza é a menos viável ou recomendável. Pensando em possíveis alterações, por meio de emendas constitucionais, faz-se mais plausível tal solução, contudo, vale ressaltar que não são apenas duas ou três normas que precisam ser alteradas, e sim várias, e levando em consideração que alguns projetos de emendas à constituição levam anos para serem promulgados, também se torna de certa forma inviável tal meio para a resolução da problemática.

Assim, infelizmente, não se faz possível a apresentação clara de um meio para resolver tal problemática, o que se pode é demonstrar uma falha do poder constituinte ao elaborar a CF/88 que não previu possíveis transformações no tempo, mantendo sua atenção total em elaborar um texto que afastasse de vez o regime militar, o qual imperou sobre o Brasil por 21 anos, entre os anos de 1964 à 1985, e também qualquer outro tipo de regime ditatorial, como o socialista que até então comandava a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

 

CONCLUSÃO

Sendo assim, conforme tudo o que se foi apresentado ao longo de todo o presente trabalho, se mostra claro como a Constituição Federal de 1988, por ser muito extensiva, cria certos problemas, que atrapalham não só o judiciário, mas também o legislativo e o executivo. Vale ainda a ressalva, de que, o que foi feito não foi uma crítica direta a Constituição, mas sim ao poder constituinte, pois é inegável a importância de uma Carta Magna que estabeleça limites aos poderes, para que se possa evitar a possível implementação de um governo ditatorial, e que garanta o Estado Democrático de Direito e os direitos fundamentais.    Contudo, não sendo passível a clara demonstração de uma resolução para o que se foi criticado, cabe a todos os cidadãos, e os poderes da União, cumprir o que está presente na Lei Maior. Promulgando emendas quando necessário, ou usando da hermenêutica para adequar a norma aos tempos atuais, assim sendo, mesmo sendo passível de críticas, cumpre-se o que está na Constituição, até que haja a elaboração de uma nova, se necessário futuramente.

           

REFERÊNCIAS

ARBEX. Thais; CARVALHO. Daniel; TUROLLO JR. Jornal Folha de São Paulo. Reynaldo. Toffoli abre brecha para Congresso resgatar 2ª instância por via mais rápida. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/11/toffoli-abre-brecha-para-congresso-resgatar-2a-instancia-por-via-mais-rapida.shtml. Acesso em: 05 de mar. 2020.

 

Constituição Francesa. Conseil Constitutionnel. Disponível em: https://www.conseil-constitutionnel.fr/. Acesso em: 05 de mar. 2020.

 

FERREIRA, Flavio. Prisão após 2ª instância é adotada em países que são modelo para o Brasil. Jornal Folha de São Paulo. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/10/prisao-apos-2a-instancia-e adotada-em-paises-que-sao-modelo-para-o-brasil.shtml. Acesso em: 05 de mar. 2020.

 

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 34. ed. São Paulo. Saraiva. 2008.

 

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 23º ed. São Paulo. Saraiva. 2019

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MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 5º ed. Coimbra: [s.n], 2003. t.II.

 

Notícias STF. Lei que regulamenta trâmite das ADIs completa 15 anos. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=279809&caixaBusca=N. Acesso em: 05 de mar. 2020.

 

STRECK, Lenio Luiz. Twitter. Disponível em: https://twitter.com/LenioStreck. Acesso em: 05 de mar. 2020.

 

 

[1] Acadêmico de Direito na Universidade de Cuiabá (UNIC); [email protected]

[2] Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado 2019, 23. ed., p. 151.

[3] Folha de São Paulo, Prisão após 2ª instância é adotada em países que são modelo para o Brasil, 2019

[4] Folha de São Paulo, Toffoli abre brecha para Congresso resgatar 2ª instância por via mais rápida, 2019

[5] Notícias STF, Lei que regulamenta trâmite das ADIs completa 15 anos, 2014

[6] Twitter, Lenio Luiz Streck, 2019

[7] Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Curso de Direito Constitucional, 34. Ed., p. 14-15.

[8] Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado 2019, 23. ed., p. 114.

[9] Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado 2019, 23. ed., p. 94.

[10] Pedro Lenza, Direito Constitucional Esquematizado 2019, 23. ed., p. 113.

[11] Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, 5º Ed., 2003, t.II, p. 208.

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