Comentários quanto às ações cíveis eleitorais

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A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabelece, em seu artigo 14, os pré-requisitos para candidaturas a cargos eletivos – elegibilidade, como a nacionalidade brasileira, pleno exercício dos direitos políticos, alistamento eleitoral, domicílio eleitoral na circunscrição, filiação partidária e idade mínima, dependendo do cargo concorrido.

Foi mais além a Constituição, ao trazer também expressamente neste artigo causas de inelegibilidade, incluindo os inalistáveis – estrangeiros e conscritos – e os analfabetos. Traz ainda outros casos e estabelece que lei complementar poderá ampliar o rol de inelegibilidade, estando hoje regulado pela Lei Complementar 64/90, com alterações posteriores.

Desta forma, têm restringida a capacidade eleitoral passiva – ser votado: I – candidatos que incidam inelegibilidade presente na CRFB ou na LC 64/90; II – candidatos assim declarados pela Justiça Eleitoral, com trânsito em julgado, com procedência de representação por abuso do poder econômico ou de autoridade ou utilização indevida de veículos ou meios comunicação social; III – Chefes do Executivo, sucessores e substitutos, para mais de um período subseqüente, dentre outras causas.

Dentro desse contexto, existem cinco ações, próprias do arcabouço jurídico eleitoral, para que a Justiça Eleitoral possa conhecer e decidir as argüições de inelegibilidade ou falta de condição de elegibilidade.

1. Ação de Impugnação de Registro de Candidatura – AIRC: dispõe a LC 64/90, em seu artigo 3º, que “Caberá a qualquer candidato, a partido político, coligação ou ao Ministério Público, no prazo de 5 (cinco) dias, contados da publicação do pedido de registro de candidato, impugná-lo em petição fundamentada”.

Tem a AIRC a finalidade de ser aplicada em caso de falta de condição de elegibilidade, prevista no art. 14, §3º da CRFB. O prazo vai da data do registro (05 de julho ou, quando feito pelo candidato que estava na convenção, é 07 de julho), até 5 dias da publicação dos editais dos candidatos inscritos. A publicação é feita no Cartório Eleitoral, para as eleições municipais e no Diário Oficial da União, para as eleições nacionais.

Além disso, a AIRC serve também para inelegibiliade por rejeição de contas (art. 1º, LC 64/90).

Até pouco tempo atrás, o candidato valia-se da Súmula 1 do TSE, que foi revista em 2006: entrava com Ação Anulatória da decisão da Câmara Vereadores, Tribunal de Contas Estadual ou da União, para desconstituir a decisão de rejeição das contas (art. 1º, I, g, LC 64/90), antes da AIRC, e ficava suspensa a inelegibilidade.

Agora, pode até entrar com Ação Anulatória da decisão, mas tem que demonstrar verossimilhança de mérito ou potencialidade probatória, ou seja, para que volte a ser elegível, o Juiz vai ter que deferir tutela cautelar. Não basta apenas entrar com a ação; vai precisar de uma liminar suspendendo a decisão que rejeitou as contas.

Pode ter a AIRC, como objeto, matéria constitucional ou infraconstitucional. Se versar sobre matéria constitucional, p.ex. domicílio eleitoral, não preclui. Se houver perdido o prazo da AIRC e o candidato venceu a eleição, é possível entrar com AIME ou RCD (serão vistas a seguir). Já se tratar a AIRC de exigência infraconstitucional, p.ex. rejeição de contas ou transferência do domicílio eleitoral – art. 55 do Código Eleitoral (caso ocorrido com o PRONA-SP em 2002), preclusa está a matéria.

Até a fase de diplomação, existe efeito suspensivo – conforme aplicação parcial do art. 15 da LC 64/90. Com o efeito suspensivo da AIRC, participa da propaganda eleitoral normalmente, tem seu nome incluído na urna de votação, etc., ou seja, o candidato concorre por sua conta e risco. Concorre porque seria irreversível o contrário; se fosse inocente, não teria como voltar a eleição. Essa é uma novidade desta ação, tendo ficado conhecida como “Teoria da Conta e Risco”.

Assim, até a fase de diplomação, fica suspensa a impugnação da candidatura. Da diplomação em diante, porém, deverá o candidato eleito aguardar o julgamento do “lado de fora”, não assumindo o cargo eletivo. Os votos ficam “guardados” – são nulos, para todos os efeitos, os votos dados a ele, até a decisão final (157, §3º e 4º, CE); por isso, foi intitulada como “Teoria dos Votos Engavetados”.

Quanto à quitação eleitoral, as resoluções de 2004 do TSE trazem duas novas condições para obtê-la: 1ª) prestação de contas regular (a sua omissão, no sentido de ausência, provoca a falta de quitação eleitoral); 2ª) multas eleitorais (transitadas em julgado) não quitadas, não recebe a quitação eleitoral. E têm que ser quitadas antes da AIRC, para não ter a candidatura impugnada.

2. Ação de Investigação Judicial Eleitoral – AIJE: está previsto no art. 22 da LC 64/90:

“Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito (…)”

Serve a AIJE para declarar a inelegibilidade por abuso do poder econômico, político e abuso de autoridade. É julgada pelo Juiz Eleitoral, se a eleição for municipal, pelo TRE, se eleição geral e a presidencial pelo TSE. Nos Tribunais, o relator é o Corregedor-Geral ou Regional Eleitoral, com poderes para: quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico, desde que autorizado por lei (CE e Lei 9504/97).

Tem legitimidade para ajuizar a AIJE (art. 3º, LC 64/90): candidato, pré-candidato (o impugnado numa AIRC), partido político e/ou coligação (se tiver interesse no pleito – disputando a eleição), através de advogado – capacidade postulatória e o MPE. Eleitor não pode entrar com AIJE.

Tem como marco inicial o pedido de registro da candidatura e final, a diplomação. O objeto da AIJE – abuso do poder econômico, … – pode ser anterior ao registro da candidatura, desde que interposta a ação no período citado. Possui efeito suspensivo – art. 15, LC 64/90.

Tem como efeito declarar a inelegibilidade do requerido e de quem contribuiu com ele, por 3 anos (é ex tunc, retroage à data dos fatos), além de multa. Pelo descumprimento do art. 41-A (captação de sufrágio) da Lei 9504/97 não pode usar a AIJE, porque foi acrescentada por lei ordinária (Lei 9840/99) e não por lei complementar, que permite a inelegibilidade.

Portanto, para declarar inelegibilidade, apenas por previsão em lei complementar. A captação de sufrágio (doar, oferecer, prometer, entregar ao eleitor, para obter o voto, bem ou vantagem, como emprego ou função pública) não gera inelegibilidade.

Se a AIJE for julgada após as eleições e o candidato não vencer, ou desistir da candidatura, a AIJE não perde o objeto, porque ainda persistirá a aplicação de multa.

Para a AIJE surtir o efeito de inelegibilidade, tem que ser julgada antes das eleições, segundo o art. 22, XIV, da LC 64/90. Se for julgada após as eleições, o Ministério Público Eleitoral vai ter que entrar com RCD (c/ prova pré-constituída) ou AIME (sem prova pré-constituída).

Não existe litisconsórcio necessário no caso de eleição majoritária. Dessa forma, não precisa o vice (presidente, governador ou prefeito) ser chamado na ação, pois a chapa é una e indivisível.

Tem-se aplicado ainda a “Teoria da Emendatio Libelli Eleitoral” (AC 3066/TSE): estando numa AIJE apurando abuso de poder econômico, sendo comprovado que não houve abuso, mas sim compra de votos, pode cassar o registro do diploma na AIJE. Neste caso, ocorre sentença de parcial procedência para cassação do registro do diploma e cominação de multa, mas jamais declarar a inelegibilidade, haja vista o art. 41-A ter sido criado por lei ordinária.

E para que isso ocorra, a causa deve estar em plenas condições de julgamento – “Teoria da Causa Madura”, onde quem pode o mais, pode o menos. Serve para o caso de nulidade – reconhece a nulidade; não aplica ela, mas julga a causa improcedente – e TSE/TRE x juiz auxiliar. Essa aplicação vem do art. 515, III do CPC: não há violação do duplo grau de jurisdição, quando o juiz tinha possibilidade de julgar e não julgou; sendo assim, o tribunal pode decidir.

Com relação à competência, quem julga ações ligadas ao abuso de poder político/econômico são o TRE/TSE.

3. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo – AIME: prevista no art. 14, §10 da CRFB, prevê que o mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral em até 15 dias da diplomação, instruída com prova de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. Dispõe ainda o §11 que a ação tramitará em segredo de justiça, respondendo seu autor se temerária ou de manifesta má-fé.

A AIME exige potencialidade do dano, sendo instrumento de proteção das eleições e não do eleitor. Não tem efeito suspensivo, sendo que o eleito fica do “lado de fora”; não assume o cargo, até decisão final.

Opera-se mediante o mesmo rito da AIRC (art. 3º, LC 64/90) – o Rito Sumário Eleitoral; a eleição municipal é julgada pelo juiz eleitoral, a eleição geral, pelo TRE e a presidencial, pelo TSE. Não precisa ter prova pré-constituída, ou seja, permite-se dilação probatória. Ajuizando a AIME, pode efetuar a produção de provas depois, como oitiva de testemunhas, etc.

4. Recurso Contra a Diplomação ou Expedição de Diploma – RCD/RCED: também serve para declarar a inelegibilidade, por abuso do poder econômico, político e abuso de autoridade.

O RCD tem efeito suspensivo (aguarda até decisão do tribunal, sem assumir o cargo) e vem previsto no art. 262, I do Código Eleitoral. Na eleição municipal, o juiz eleitoral processa o recurso,  mas o julgamento é perante o TRE; na geral, que processa é o TRE e o TSE profere julgamento. Não existe RCD na eleição presidencial.

O prazo de interposição do RCD é de 3 dias, contados da diplomação. Exige prova pré-constituída, como no Mandado de Segurança. O TSE entende como existente prova pré-constituída no caso da prova emprestada eleitoral, em que tenha sido oportunizado contraditório e ampla defesa. Exemplo: AIJE julgada após as eleições.

5. Representação: é cabível nos casos do candidato incorrer em captação de sufrágio (art. 41-A), condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (arts. 73 e 77) e captação ou gastos ilícitos de recursos durante a campanha (art. 30-A), todos na Lei 9504/97.

Quem julga as ações ligadas à compra de voto é o Juiz Auxiliar (propaganda, 30-A, 41-A e 73 da Lei Eleitoral). Se Juiz Auxiliar verifica abuso de poder econômico, não pode continuar; deve remeter a representação ao TRE/TSE.

O prazo máximo para Representação por compra de voto é o dia da eleição (41-A). Nesse caso, segue o rito do art. 22 da LC 64/90 – o Rito Ordinário Eleitoral, mais complexo e extenso e apenas os requisitos da inicial estão previstos no art. 96 da Lei Eleitoral.

Quanto à representação de condutas vedadas aos agentes públicos em campanha (73 e 77), incluído o popular “uso da máquina”, segue o rito e também os requisitos previstos no art. 96 – é o Rito Sumaríssimo Eleitoral, bem mais “violento”, com notificação imediata do reclamado para apresentação de defesa em quarenta e oito horas, e posterior decisão em vinte e quatro horas.

O art. 30-A é novidade inserida pela Lei 11300/06 e se refere à captação e aos gastos ilícitos de recursos – segue o Rito Ordinário Eleitoral, do art. 22, LC 64/90, pois vai precisa descobrir a origem do dinheiro e provar que o candidato sabia a sua origem, p. ex., do estrangeiro, sendo, então, negado a expedição ou cassado o diploma outorgado.

No caso da eleição proporcional, se o feito é julgado antes das eleições, declaram-se nulos os votos obtidos pelo candidato; se julga depois das eleições, os votos daquele candidato vão para a sua legenda partidária (175, § 4º do CE). Porém, não se aplica o art. 175, §4º na eleição proporcional em que houve compra de voto (art. 41-A) – os votos não vão para a legenda, caracterizando a aplicação da “Teoria dos frutos da árvore envenenada”.

Se a nulidade dos votos for correspondente a 50% + 1, haverão novas eleições (224, CE), o que em tese, permitiria ao candidato que sofreu representação concorrer na nova eleição, haja vista o art. 30-A, assim como o 41-A, não declararem a inelegibilidade, pois aprovados por lei ordinária.

A atual posição do TSE, porém, segue o entendimento do ex-Ministro do TSE, Fernando Neves: pelo Princípio da Razoabilidade, ninguém pode alegar a própria torpeza: quem deu causa à nulidade das eleições (41-A / 30-A, se teve 50% + 1 dos votos), não pode concorrer de novo.

Conclusão

Estabelecido o campo de atuação da ações cíveis eleitorais, é possível fazer um paralelo entre elas, no sentido de que a AIRC é ação contra candidato, visando uma condição de inelegibilidade; a AIJE é ação contra candidato, para investigá-lo pelas diversas formas de abuso de poder ou de autoridade, e a AIME e o RCD constituem ações contra candidato vencedor – só ele terá ou tem diploma, em virtude das atitudes vedadas pela legislação eleitoral já discorridas.

Esse rol de ações é taxativo, não tendo outras. AIJE, AIME e RCD exigem potencialidade do dano: fraude ou abuso com possibilidade de desequilibrar o resultado do pleito. O abuso deve comprometer o resultado da eleição. A exceção é o art. 30-A (verba não contabilizada), que não exige potencialidade.

Ao vencer a eleição, o foro dos mandatários federais com relação a estas ações não é o STF, porque a AIRC, AIJE, AIME, RCD e as Representações dos arts. 30-A, 41-A e 73/77 são cíveis eleitorais, e no cível eleitoral o critério é a eleição: se for eleição geral, como a de deputado federal: TRE, e não STF. Já a ação criminal eleitoral segue o foro por prerrogativa de função; neste caso, seria o eleito julgado perante o STF.

 

Referências:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Código Eleitoral – Lei nº 4937/65
Lei Complementar nº 64/90
Lei nº 9504/97
Sítio do TSE: www.tse.gov.br

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Mauro Evaristo Medeiros Junior

 

Procurador da Fazenda Nacional lotado em Joaçaba/SC, formado em Direito pela Associação Catarinense de Ensino, pós-graduado em Direito Civil pela PUC-MG

 


 

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