Em prol da celeridade processual: súmula vinculante

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Resumo: Este artigo inicialmente destaca a preocupação com a morosidade do Judiciário, já que, muitas vezes, uma prestação jurisdicional tardia poderá ser ineficaz. Com o advento da Emenda Constitucional nº 45/04, buscou-se atribuir efetividade quantitativa e qualitativa às atividades do Poder Judiciário. Esta Emenda Constitucional trouxe várias inovações, como o princípio da razoável duração do processo e a súmula vinculante, e após a publicação da respectiva Emenda houve inúmeros avanços legislativos conferindo celeridade processual. Assevera-se que a súmula vinculante contribui para a diminuição da quantidade de processos no Judiciário, o que consequentemente permite uma maior agilidade nos julgamentos. O artigo analisa vários aspectos relativos à súmula vinculante, fazendo referências, inclusive, ao Direito estrangeiro. Ressalta-se que a súmula vinculante não prejudica a atuação e capacidade criativa do juiz e nem mesmo “engessa” o Direito. Esta súmula é eficiente, na medida em que uniformiza a jurisprudência, aliviando o Judiciário de causas repetitivas.


Palavras-chave: Emenda Constitucional nº 45/04. Celeridade processual. Súmula vinculante.


Abstract: This article initially highlights a concern with the slowness of the Judiciary, since many times a late judicial fulfillment can be ineffective. With the advent of the 45th Constitucional Amendment of 2004, it assigned a quantitive and qualitive effectiveness to the activities of the Judiciary Power. This Constitutional Amendment brought several innovations, such as the reasonable duration of the process and the biding precedent, and after the publication of this Amendment there were inumerous legislatives advances granting procedural celerity. It is asserted that the binding precedent contributes to decrease the amount of judicial process, which consequently permits more agility in judgements. The article analyzes several aspects related do the binding precedent, making references, including, to the foreign Law. It is outlined that the binding precedent does not affect the perfomance and creativity capacity of a judge, nor does it “plaster” the Law. This precedent is efficient, in a manner that it standardizes jurisprudence, relieving the Judiciary of repetitive causes.


Keywords: 45th Constitutional Amendment of 2004. Procedural celerity. Binding precedent.


Sumário: 1. Introdução; 2. Súmula vinculante; 2.1 Direito estrangeiro; 3. Considerações finais; 4. Referências bibliográficas.


1. Introdução


A Constituição Federal de 1988, ao ampliar significativamente o acesso à Justiça e ao conferir um extenso elenco de direitos fundamentais, permitiu um aumento da litigiosidade. A preocupação clara do legislador constituinte foi a de proporcionar o ingresso efetivo do cidadão aos meios jurisdicionais, para que este pudesse obter a proteção imediata caso houvesse algum ato violador – seja por parte do Estado, seja por parte dos particulares – de um pretenso direito.


Anteriormente, havia uma limitação do acesso ao Judiciário, especialmente em decorrência dos obstáculos econômicos, como a necessidade do pagamento das despesas processuais[1], impedindo os necessitados de utilizarem esse meio de solução de conflito. Vale ressaltar, também, que havia um enorme empecilho para a proteção de direitos coletivos e difusos, tendo em vista que diante à omissão da legislação, o Judiciário restringia-se aos meros conflitos intersubjetivos[2].


Com a facilitação do acesso ao Judiciário a problemática passa a centrar-se no aumento incontrolável da quantidade de processos, sobrecarregando todas as instâncias judiciais. Não há dúvidas de que o número de processos apreciados pelo Judiciário brasileiro é elevado, e esta situação se agrava ainda mais com a quantidade reduzida de juízes cuja proporção não acompanhou à efetiva demanda judicial e muito menos ao crescimento da população brasileira[3].  


Ressalte-se que a morosidade do Judiciário faz com que o jurisdicionado desacredite na eficiência da atividade jurisdicional. É certo que “de nada adianta a prestação tardia; o direito pode ter perecido, na prática, ou perdido muito de seu significado para o seu detentor, agredindo o valor maior inerente à sua pessoa, ou seja, a sua própria dignidade” (SCARTEZZINI, 2008, p. 1181).


Vale citar o caso verídico retratado pela doutrinadora Fabiana Spengler (2008, p. 49):


“Serve como exemplo da morosidade judiciária brasileira a recente notícia sobre a demora na tramitação de um processo que, inacreditavelmente, tramita ao longo de 70 anos. Trata-se do processo de inventário de Maria Eduarda Correa Simas, falecida em 31 de agosto de 1935, cuja abertura ocorreu em 29 de agosto de 1938, pelo inventariante Justino Correa Simas. O feito (nº 039/1.030032437-6) tramita na 2ª Vara Cível da Comarca de Viamão. Com a demora no tramitar do feito, as conseqüências foram nefastas: os herdeiros diretos faleceram; os bens foram todos alienados, ou cedidos onerosamente; ocorreu o esbulho de área rural de terceiros, o que determinou por parte dos prejudicados pedidos de providências policiais, bem como a abertura de processo criminal”.


Sendo assim, não basta que a decisão judicial seja justa, seja correta, sendo imprescindível a presença da eficácia, e, portanto, somente através do conjunto destes elementos é que se constitui uma proteção judicial efetiva clamada por toda a sociedade.


Em face da busca por essa proteção judicial, e visando atribuir efetividade quantitativa e qualitativa às atividades do Poder Judiciário, houve o advento da Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, prevendo vários preceitos que se relacionam essencialmente com as finalidades destacadas[4], dentre os quais é válido citar: a razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII), a proporcionalidade do número de juízes na unidade jurisdicional (art. 93, XIII), a distribuição imediata dos processos (art. 93, XV), a repercussão geral no recurso extraordinário (art. 102, § 3º), a súmula vinculante (art. 103-A), e o Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B).


A nossa Carta Magna de 1988 passou a prever expressamente mais um direito fundamental dentro do extenso elenco do artigo 5º, positivando assim o princípio da razoável duração do processo: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”[5].


Por outro lado, não se pode deixar de observar que a necessidade de um processo célere já estava implícita no texto constitucional original, diante a consagração do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ou princípio do acesso à justiça, explicitado no artigo 5º, XXXV. A doutrina processual não diverge que “o direito de ação significa não apenas o mero acesso ao Judiciário, na dimensão restrita e insuficiente de propor demandas e se defender. Não. O direito de acesso à justiça significa tutela efetiva que se desdobra nos elementos adequação e tempestividade” (MENDONÇA JUNIOR, 2008, p. 31-32).


Dinamarco (2008, p. 1182, grifos originais) com muita propriedade assevera que:


Acesso à justiça equivale à obtenção de resultados justos. É o que também já se designou como acesso à ordem jurídica justa (Kazuo Watanabe). Não tem acesso à justiça aquele que sequer consegue fazer-se ouvir em juízo, como também todos os que, pelas mazelas do processo, recebem uma justiça tarda ou alguma injustiça de qualquer ordem”.


No mesmo sentido, Marinoni (1999, p. 218) ao comentar acerca do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, defende que:


“Uma leitura mais moderna, no entanto, faz surgir a idéia de que essa norma constitucional garante não só o direito de ação, mas a possibilidade de um acesso efetivo à justiça e, assim, um direito à tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva. Não teria cabimento entender, com efeito, que a Constituição da República garante ao cidadão que pode afirmar uma lesão ou uma ameaça a direito apenas e tão-somente uma resposta, independentemente de ser ela efetiva e tempestiva. Ora, se o direito de acesso à justiça é direito fundamental, porque garantidor de todos os demais, não há como imaginar que a Constituição da República proclama apenas que todos têm direito a uma mera resposta do juiz. O direito a uma mera resposta do juiz não é suficiente para garantir os demais direitos e, portanto, não pode ser pensado como garantia fundamental de justiça”.


Embora, em tese, fosse dispensável a inclusão de mais um direito fundamental[6] para que o indivíduo pudesse pleitear a celeridade na prestação jurisdicional, o certo é que, antes da Emenda Constitucional nº 45/04 surgiram poucas legislações com o objetivo de combater a morosidade da Justiça. Por outro lado, após o advento desta Emenda Constitucional, observa-se inúmeros avanços legislativos conferindo rapidez ao trâmite processual.[7]


Destaque-se que o princípio da razoável duração do processo vem alcançando resultados consistentes, direcionando “[…] inicialmente o legislador à construção de procedimentos que compatibilizem a defesa necessária (devido processo legal) com o menor número de atos e prazos curtos voltados para a celeridade da prestação jurisdicional” (MENDONÇA JUNIOR, 2008, p. 35).


Contudo, há enormes discussões sobre o que seria razoável duração do processo? É evidente a dificuldade de se estabelecer regramento acerca do prazo razoável para a finalização de determinado processo, porém, sem dúvida, esta não é a intenção do dispositivo constitucional (art. 5º, LXXVIII), como observa com bastante acuidade o processualista Marinoni (2008) ao sustentar que:


“[…] duração razoável, como o próprio nome indica, nada tem a ver com duração limitada a um prazo certo ou determinado. Se essa confusão fosse admitida, não se trataria de ‘duração razoável’, mas de ‘duração legal’ ou do simples dever de o juiz respeitar o prazo fixado pelo legislador para a duração do processo. O direito à duração razoável faz surgir ao juiz o dever de, respeitando os direitos de participação adequada das partes, dar a máxima celeridade ao processo. E dar a máxima celeridade ao processo, nesta dimensão, implica não praticar atos dilatórios injustificados, sejam eles omissivos ou expressos”.


Silvio Rocha (2006) também corrobora com o exposto:


“A garantia da duração razoável do processo ou o direito a um processo sem dilações indevidas significa que o processo deve durar o necessário, dentro do razoável, para chegar ao seu termo com a prestação jurisdicional declaratória, constitutiva, condenatória ou executória, admitindo-se certo excesso no resultado da soma dos prazos processuais individualmente considerados, o que indica que a garantia da duração razoável do processo ou o direito a um processo sem dilações indevidas não significa a constitucionalização dos prazos processuais previstos na legislação. Por dilações indevidas, proibidas pelo direito fundamental acima citado, entendem-se ‘os atrasos ou delongas que se produzem no processo por inobservância dos prazos estabelecidos, por injustificados prolongamentos das etapas mortas que separam a realização de um ato processual de outro, sem subordinação a um lapso temporal previamente fixado, e, sempre, sem que aludidas dilações dependam da vontade das partes ou de seus mandatários’”.


É salutar que o prazo razoável seja aferido em cada caso concreto, observando-se as peculiaridades existentes, ou seja, o seu sentido deve ser “preenchido no caso concreto, tendo como indicativo a melhor e maior realização da garantia de acesso à justiça na perspectiva de acesso a uma resposta à questão posta qualitativamente adequada e em tempo quantitativamente aceitável” (MORAIS 2, 2008, p. 49-50), evitando-se dilações indevidas do processo.


Para que haja a delimitação do que seja considerado razoável, em se tratando de duração do processo, são válidos os seguintes critérios objetivos citados pela doutrinadora Liliane Batista (2008, p. 403), baseando-se na jurisprudência da Corte Européia de Direitos Humanos (Corte de Estrasburgo):


“1º) O da complexidade do processo;


2º) O do comportamento das partes; e


3º) O da atuação das autoridades competentes no processo.


4º) que se prende com o assunto do processo e ao significado que ele pode ter para o requerente, sendo que todos estes critérios são valorados e aferidos em concreto atendendo ‘às circunstâncias da causa’”.


Ressalte-se que o princípio da razoável duração do processo serve de norte, inclusive, para aplicação de institutos jurídicos como a súmula vinculante, já que esta contribui para a diminuição da quantidade de processos no Judiciário, especialmente no Supremo Tribunal Federal[8], o que consequentemente permite uma maior agilidade nos julgamentos.


É essencial que a duração excessiva do processo seja combatida[9], evitando-se prejuízos aos jurisdicionados.


2. Súmula vinculante


As discussões doutrinárias acerca da instituição de uma espécie de precedente vinculativo, no ordenamento constitucional brasileiro, se fortaleceram bastante quando ainda estava em fase de elaboração a Emenda Constitucional nº 45/04, que optou por positivar a denominada súmula vinculante, acrescentando o artigo 103-A à Constituição Federal de 1988.


Há de se reconhecer que o modelo de precedente vinculativo acolhido pelo legislador constitucional derivado não prejudica a atuação e capacidade criativa do juiz e nem mesmo “engessa” o Direito, devendo ser observados todos os requisitos e pressupostos previstos para a edição/revisão/cancelamento de uma súmula vinculante, evitando-se “[…] que se faça uso da mesma para resguardo de valores outros que não interessam à ordem jurídica e à sociedade em termos de prestação jurisdicional” (ASSMANN, 2007).


O poder atribuído exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal de fazer uso de tal instituto jurídico está limitado pelos parâmetros constitucional e legal, sendo imprescindível uma excessiva cautela para que não haja um distanciamento dos objetivos pretendidos, quais sejam: conferir segurança jurídica, através da uniformização da jurisprudência, impedindo julgamentos divergentes em casos similares; e, sobretudo, diminuir o excessivo abarrotamento de causas repetitivas, evitando a procrastinação dos feitos.


Com relação à crítica que se faz sobre uma possível violação à separação dos poderes[10], sob o argumento de que o Supremo Tribunal Federal estaria interferindo na atividade legislativa ao proclamar um ato com natureza de lei (caráter geral e aplicável a todos), é importante deixar assente que não há que se falar em separação absoluta dos poderes, tendo cada poder parte nos outros, evitando-se a concentração de poder[11].


É de se notar, também, que a súmula aprovada nos moldes do artigo 103-A da Constituição tem efeito vinculante somente em relação aos órgãos do Poder Judiciário (excluindo-se o Supremo Tribunal Federal)[12] e os órgãos da Administração Pública, ou seja, o Poder Legislativo não está vinculado aos ditames da súmula, não havendo óbice à elaboração de uma lei que seja totalmente adversa àquela. Contudo, não se pode deixar de registrar a perspicaz reflexão de Luiz Rocha (2011, grifos originais):


“Apesar do Legislativo não estar primeiramente vinculado à mudança do artigo 103-A, podendo, inclusive, legislar novamente sobre matéria prejudicada pelos efeitos da Súmula Vinculante editada, talvez esse processo seja de pouca ajuda. Veja bem que o artigo 103-A, ele próprio, não desautoriza a atividade legislativa, mas qual seria o resultado de uma legislação aprovada posteriormente à edição da Súmula Vinculante, mas a contrario sensu? Muito provavelmente ela sofreria difusamente no Poder Judiciário a desaprovação constitucional, já que todo ele deve vincular-se ao enunciado da Súmula Vinculante, ainda que preteritamente editada”.


As súmulas vinculantes exigem o exercício efetivo do controle difuso de constitucionalidade, haja vista que, em regra, para que o Supremo Tribunal Federal consiga obter reiteradas decisões sobre uma determinada matéria constitucional, será preciso que anteriormente haja manifestações explícitas por parte dos juízes e Tribunais acerca da (in)constitucionalidade.


Por outro lado, é preciso reconhecer que as súmulas vinculantes “[…] estabelecem uma ponte que aproxima a jurisdição constitucional difuso-concreta à concentrado-abstrata no STF” (LEITE, 2007, p. 425), pois quando este Tribunal, no âmbito do controle difuso, decreta a inconstitucionalidade de uma lei, os efeitos desta decisão incidirão apenas inter partes, ou seja, a lei continuará a produzir efeitos perante os demais indivíduos, ocorre que com a elaboração de uma súmula com efeito vinculante, destacando o posicionamento da Corte sobre a inconstitucionalidade, todos os indivíduos na mesma situação jurídica serão albergados, cabendo aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, respeitar e cumprir o teor da decisão.


Um exemplo concreto pode ser visualizado diante dos julgamentos dos Recursos Extraordinários nsº 556664, 559882, 559943 e 560626, onde o Pretório Excelso reconheceu que apenas lei complementar pode dispor sobre normas gerais em matéria tributária, considerando inconstitucionais os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/91, que haviam fixado em dez anos os prazos decadencial e prescricional das contribuições da Seguridade Social. Em decorrência de tais decisões, os Ministros do Supremo Tribunal Federal resolveram aprovar a Súmula Vinculante nº 08[13], o que ensejou a extensão de segurança jurídica a todos no sentido de que não mais haverá cobrança de contribuições previdenciárias cujo prazo decadencial ou prescricional não esteja enquadrado dentro do lapso temporal quinquenal.


Vale ressaltar que, quando a súmula vinculante baseia-se numa decisão que declara a inconstitucionalidade incidental de uma lei, a competência destinada ao Senado Federal para suspender a execução, no todo ou em parte, da respectiva lei (art. 52, X, da Constituição Federal) torna-se desprezível, pois com a súmula o reconhecimento da inconstitucionalidade se estenderá a todos, devendo o Judiciário e a Administração Pública observar o que foi preceituado.


Gilmar Mendes (2008, p. 968-969, grifos originais) concorda com o exposto ao afirmar que:


“Não resta dúvida de que a adoção de súmula vinculante em situação que envolva a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo enfraquecerá ainda mais o já debilitado instituto da suspensão pelo Senado. É que a súmula vinculante conferirá interpretação vinculante à decisão que declara a inconstitucionalidade sem que a lei declarada inconstitucional tenha sido eliminada formalmente do ordenamento jurídico (falta de eficácia geral da decisão declaratória de inconstitucionalidade). Tem-se efeito vinculante da súmula, que obrigará a Administração a não mais aplicar a lei objeto da declaração de inconstitucionalidade (nem a orientação que dela se dessume), sem eficácia erga omnes da declaração de inconstitucionalidade”.


Glauco Leite (2008, p. 115) enfatiza inclusive que a Emenda Constitucional nº 45 realizou uma revogação tácita parcial do artigo 52, X, da Constituição Federal:


“[…] apesar de a EC 45/04 não ter revogado expressamente o ar. 52, X, da CF, nos casos em que o STF editar súmula vinculante baseada em decisões que reconheceram a inconstitucionalidade, em concreto, de uma determinada norma, o exercício da competência do Senado consistente na suspensão de sua eficácia será despiciendo, pois a súmula tem o condão de eliminar tal norma do sistema jurídico. Para essas situações, é possível afirmar que a EC 45/04 realizou uma revogação tácita do art. 52, X, da CF. No entanto, nos casos em que o STF simplesmente declarar a inconstitucionalidade de uma norma na via difusa, sem criar, após as reiteradas decisões, uma súmula vinculante, a competência do Senado não foi afetada, podendo ser exercida regularmente”.


Interessante observar que caso os preceitos da Súmula Vinculante nº 08 fossem mantidos sem qualquer ressalva, a União Federal teria vultosos prejuízos, pois os valores que já tinham sido arrecadados e os que estavam em vias de cobrança, com base nas leis declaradas inconstitucionais, envolviam bilhões de reais, e, com isso, visando resguardar a segurança jurídica, os Ministros do Supremo Tribunal Federal modularam os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, em sede de controle difuso, no que se refere aos recolhimentos já realizados pelos contribuintes, os quais não têm direito à restituição a menos que tenham ajuizado ações judiciais até a data do julgamento (11/06/2008).


A possibilidade de manipulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade está prevista nas Leis nsº 9.868/99 (art. 27) e 9.882/99 (art. 11), e na mesma esteira a Lei nº 11.417/06 explicitamente consente que os efeitos da súmula vinculante possam ser restringidos ou que a mesma só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público (art. 4º).


A Lei nº 11.417/06 trata sobre a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, regulamentando, assim, o artigo 103-A da Constituição, que é considerado norma de eficácia limitada[14], ou seja, não possui aplicabilidade imediata, sendo preciso a superveniência de uma lei – nesse caso, já tem-se a Lei nº 11.417/06 – para que a respectiva norma produza todos os seus efeitos principais. Neste sentido, Luiz Flávio Gomes (2007) ensinava antes do surgimento da citada Lei que:


“[…] as súmulas podem ser revisadas ou canceladas na forma estabelecida em lei. A lei dirá (ainda não existe essa lei) como será feita a revisão e o cancelamento de uma súmula. A norma que cuida da súmula vinculante (CF, art. 103-A) seria hoje auto-aplicável? Há controvérsia. O regimento interno do Supremo Tribunal Federal cuida da aprovação de súmulas, mas ficou defasado depois da EC 45/2004. Logo, melhor entendimento será: sem lei versando sobre o tema não pode o Supremo Tribunal Federal aprovar súmula vinculante. É preciso aguardar lei futura porque muitos pontos (decisões reiteradas, insegurança jurídica etc.) previstos na constituição configuram conceitos abertos (porosos, pendentes de interpretação e de definição). Se as súmulas vinculantes destinam-se a evitar a insegurança jurídica, não se pode concebê-las precisamente quando há insegurança em relação à sua aprovação, revisão ou cancelamento”.


Então, somente com o advento da Lei nº 11.417/06 é que o Supremo Tribunal Federal passou a utilizar o vigoroso instituto da súmula vinculante – atualmente há 32 súmulas vinculantes -, que pode ser adotado de ofício ou por provocação. Os mesmos legitimados a propor a ação direta de inconstitucionalidade (Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da Câmara dos Deputados, Procurador-Geral da República, dentre outros incluídos no artigo 103 da Constituição) podem provocar a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula, conforme prevê o artigo 103-A, § 2º, da Constituição, e diante deste dispositivo constitucional, que autoriza a ampliação do rol de legitimados[15], a referida Lei também possibilitou de forma louvável a iniciativa do Defensor Público-Geral da União (art. 3º, VI), dos Tribunais Superiores, dos Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais do Trabalho, dos Tribunais Regionais Eleitorais, dos Tribunais Militares (art. 3º, XI), bem como do Município (art. 3º, § 1º)[16].


O caput do artigo 103-A da Constituição e o § 1º deste artigo, estabelecem os requisitos e pressupostos essenciais e cumulativos para que seja aprovada uma súmula com efeito vinculante, quais sejam: decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal (no mínimo 08 votos), reiteradas decisões sobre matéria constitucional, publicação na imprensa oficial, controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a Administração Pública[17], insegurança jurídica[18], e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.


No que tange à necessidade de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, vê-se que a súmula não poderá emergir de uma decisão isolada, ou seja, as inúmeras decisões devem adotar o mesmo posicionamento em relação a uma determinada matéria, e, portanto, “[…] antes de ser vinculante, a orientação do Tribunal deve mostrar-se predominante” (LEITE, 2007, p. 425).


A problemática maior reside em se definir qual seria o número razoável de decisões para se atender ao termo “reiteradas decisões”? Entendo prudente que haja pelo menos seis/sete decisões com conclusões similares, possibilitando-se o amadurecimento da discussão do tema[19].


A polêmica Súmula Vinculante nº 11[20], que restringiu o uso de algemas, representa um exemplo claro de ausência de maiores discussões sobre o tema, havendo escassos precedentes, sendo acusada por muitos, inclusive, de ser um ato casuístico por ter sido aclamada logo após a prisão do banqueiro Daniel Dantas, o qual foi algemado pela Polícia Federal (este fato teve ampla divulgação pelos meios de comunicação).


Ademais, a redação da Súmula Vinculante nº 11 contém expressões que inevitavelmente provocam divergências interpretativas diante a imprecisão terminológica, como é o caso de “fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia”, o que ocasiona dificuldades na sua aplicação.


A súmula deve ser elaborada de forma criteriosa para não ensejar problemas interpretativos, devendo-se evitar conceitos vagos ou indeterminados, sob pena de não colaborar com a diminuição de processos judiciais (especialmente no âmbito do Supremo Tribunal Federal, diante ao grande número de reclamações[21] que porventura poderão ser interpostas com fulcro no artigo 103-A, § 3º, da Constituição, e artigo 7º da Lei nº 11.417/06).


2.1 Direito estrangeiro


As súmulas vinculantes instituídas no ordenamento jurídico brasileiro possuem fonte de inspiração no Direito estrangeiro, especificamente no Direito português (assentos) e no Direito norte-americano (stare decisis), embora tenha peculiaridades próprias.


Os assentos eram preceitos jurídicos gerais e abstratos, adotados em decisões com força obrigatória, visando à uniformização de jurisprudência e à certeza e segurança do Direito, sendo utilizados pelo Supremo Tribunal de Justiça para solucionar um determinado conflito em questão (cuja jurisprudência no próprio Supremo fosse divergente), e que valeriam como prescrição normativa geral para os demais casos[22].


O doutrinador português Castanheira Neves (2007, p. 431, grifos originais) realça que os assentos possuíam a natureza de uma disposição legislativa, tendo em vista que consistiam


“[…] em uma prescrição jurídica (imperativo ou critério normativo-jurídico obrigatório) que se constitui no modo de uma norma geral e abstracta, proposta à predeterminação normativa de uma aplicação futura, susceptível de garantir a segurança e a igualdade jurídicas, e que não só se impõe com a força ou eficácia de uma vinculação normativa universal como se reconhece legalmente com o caráter de fonte de direito […]”.


É possível identificar semelhanças entre os assentos e as súmulas vinculantes, como, por exemplo, o fato da uniformização da jurisprudência, porém, também há relevantes diferenças entre estes institutos jurídicos.


Os assentos eram criados pelo Supremo Tribunal de Justiça (e não pelo Tribunal Constitucional português – intérprete da Constituição) e necessitavam de apenas uma única decisão que eliminasse o conflito de jurisprudência, enquanto as súmulas vinculantes são adotadas pelo Supremo Tribunal Federal (guardião da Constituição) e precisam de reiteradas decisões deste seguindo a mesma linha interpretativa.


Cabe explanar, também, que os assentos não exigiam quórum qualificado para serem aprovados, enquanto que as súmulas vinculantes necessitam de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal. Outro ponto diferenciador está presente no procedimento de revisão, pois os assentos não podiam ser revistos pelo Supremo Tribunal de Justiça, sendo indispensável a interveniência do Legislativo para que fosse editada uma lei afastando o entendimento consolidado nos assentos, já as súmulas vinculantes podem ser alteradas pelo Pretório Excelso (há um rol amplo de legitimados para provocar a revisão ou o cancelamento).


Em relação ao stare decisis, inerente à países que comungam os ideais da common law (como Estados Unidos e Inglaterra), pode-se resumir que o mesmo denota o caráter obrigatório e geral de uma interpretação judicial, e, portanto, a jurisprudência afirma-se como a principal fonte do Direito, dando-se prevalência aos precedentes. Segue-se assim a concepção do stare decisis et non quieta movere (ficar com o que está decidido e não mover o que está em repouso).


Ressalte-se que o stare decisis e a súmula vinculante possuem semelhanças, principalmente no que tange à obrigatoriedade de observância da interpretação atribuída a uma determinada questão por uma Corte superior.


Os referidos precedentes da common law advêm das Cortes de recursos, sendo passíveis de alteração por estas Cortes quando as circunstâncias fáticas e jurídicas assim exijam (os precedentes também podem ser superados pelo Legislativo), e, então, assim como as súmulas vinculantes, não existirá uma estagnação do Direito:


“[…] a utilização do sistema de precedentes nos Estados Unidos não impede a evolução interpretativa do Direito pelos Tribunais. Isso pode se dar quando: a) a lei básica referente ao precedente for mudada pelo legislador; b) a antiguidade tornar o precedente obsoleto, ou; c) quando a maioria da Corte mudar sua filosofia judicial estabelecendo um novo precedente. Tal doutrina não impede as Cortes de substituir ou revogar o precedente. Stare decisis é uma prudente regra de julgamento, porém não é um comando universal e inexorável” (LIMA; MARQUES; AGUIAR; 2007).


3. Considerações finais


A Emenda Constitucional nº 45/04 trouxe importantes reflexos para o nosso ordenamento jurídico, com a positivação de institutos que amenizam a quantidade expressiva de processos especialmente no âmbito dos Tribunais (súmula vinculante, repercussão geral, etc.), e, além disso, ela incentivou o advento de várias legislações que conferem celeridade aos trâmites processuais.


O modelo de súmula vinculante instituído pelo legislador constituinte derivado é eficiente, na medida em que uniformiza a jurisprudência, “desafogando” o Judiciário de causas repetitivas.


Por fim, vale asseverar mais uma vez que a súmula vinculante não prejudica a atuação e capacidade criativa do juiz e nem mesmo “engessa” o Direito. Ademais, é necessário que todos os requisitos e pressupostos, previstos na Constituição Federal de 1988 e na Lei nº 11.417/06, sejam rigorosamente observados, evitando-se qualquer desvirtuamento das finalidades precípuas da súmula.


 


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SPENGLER, Fabiana Marion. Tempo, direito e Constituição: reflexos na prestação jurisdicional do Estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.

 

Notas:

[1] Em 1950, a Lei nº 1.060 passa a garantir os benefícios da assistência judiciária à todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

[2] Em 1965, a Lei nº 4.717 prevê a Ação Popular; em 1985, a Lei nº 7.347 institui a Ação Civil Pública; posteriormente, já na vigência da Carta Magna de 1988, há a elaboração da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), dentre outros; garantindo-se assim a tutela dos direitos transindividuais (coletivos e difusos).

[3] “Enquanto na Argentina, são 10,9 juízes para cada 100 mil habitantes, aqui, temos 5, 3 magistrados” (MORAIS 1, 2008).

[4] O Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, José Renato Nalini (2008, p. 197, grifo original), pondera que: “[…] Tudo na EC 45/2004 leva a crer que o intuito da celeridade foi o motor de inspiração da reforma”.

[5] Vale ressaltar que, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), de 22/11/69, prevê claramente que “toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza” (art. 8º, n. 1). O Brasil ratificou a respectiva Convenção somente em 25/09/92

[6] O constitucionalista Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2003, p. 284) aduz que na Constituição Federal de 1988 há uma “inflação de direitos fundamentais”, o que de certa forma dificulta a concretização/efetivação de todos estes direitos

[7] Lei nº 11.276/06 (institui a chamada súmula impeditiva de recurso); Lei nº 11.277/06 (permite a sentença liminar de mérito); Lei nº 11.417/06 (regulamenta a súmula vinculante); Lei nº 11.418/06 (disciplina a repercussão geral em sede de recurso extraordinário); Lei nº 11.419/06 (trata sobre a informatização do processo judicial); Lei nº 11.672/08 (estabelece o procedimento para o julgamento de recursos repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça); etc

[8] A súmula vinculante funciona “[…] como filtro de diminuição da quantidade de demandas em curso no STF e, de forma reflexa, nos demais tribunais nacionais” (ARAÚJO, 2007, p. 64).

[9] Há doutrinadores – como Scartezzini (2008, p. 1192) – que defendem a possibilidade do Estado ser responsabilizado pela demora na prestação jurisdicional, cabendo indenização caso haja dano irreparável ao particular. Neste sentido, Silvio Rocha (2006) expõe que: “[…] o descumprimento à duração razoável do processo dá ensejo ao dever do Estado de reparar os danos causados, a exemplo do que acontece na Itália pela aplicação da Lei de 24 de março de 2001 (a chamada Lei Pinto, por ser o sobrenome de um dos senadores autores do projeto de lei posteriormente convertido em lei), que admite uma indenização equitativa por dano moral e material àquele que sofreu danos morais e materiais pela violação do direito fundamental à duração razoável do processo, que pode ser pleiteada ainda que pendente o processo em que tenha ocorrido a violação da duração razoável. Cabe realçar que podem propor a ação as partes da relação jurídica processual com dilação indevida, sendo irrelevante quem tenha razão na demanda. No Brasil, a partir da caracterização do direito de todos à duração razoável do processo, surge a responsabilidade civil do Estado por dilação indevida do processo. O pedido de indenização pode referir-se tanto a um processo judicial como a um processo administrativo, já que o direito fundamental à duração razoável do processo incide no âmbito judicial e no âmbito administrativo”.

[10] A expressão separação dos poderes, aqui utilizada, deve ser entendida como separação de funções, pois o poder é uno e indivisível, ou seja, o que se divide são as funções estatais.

[11] A Constituição Federal de 1988 acolhe expressamente a separação dos poderes (art. 2º), prevendo a independência e harmonia que deve existir entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Esta Constituição não adota uma separação rígida dos poderes, ou seja, não há funções exclusivas, mas sim preponderantes, e, então, cada Poder possui funções típicas e atípicas, por exemplo, o Judiciário tem a função típica de julgar e funções atípicas de elaborar seu regimento interno (legislar) e organizar seus órgãos e servidores (administrar). Vale citar, ainda, que a Constituição prevê um controle recíproco entre os Poderes, por exemplo: quando o Judiciário controla a constitucionalidade das leis; quando o Executivo veta um determinado projeto de lei; quando o Legislativo fiscaliza sob o aspecto financeiro, contábil, os atos dos outros poderes

[12] No que tange à inexistência de autovinculação do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes observa o seguinte: “[…] Talvez seja mais preciso afirmar que o Tribunal [STF] estará vinculado ao entendimento fixado na súmula enquanto considerá-lo expressão adequada da Constituição e das leis interpretadas. A desvinculação há de ser formal, explicitando-se que determinada orientação vinculante não mais deve subsistir. Aqui, como em toda mudança de orientação, o órgão julgador ficará duplamente onerado pelo dever de argumentar” (MENDES; COELHO; BRANCO; 2008, p. 969).

[13] Súmula Vinculante nº 08 (publicada no Diário Oficial da União de 20/06/2008, p. 1): “São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do Decreto-Lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”

[14] As normas constitucionais podem ser classificadas, quanto à extensão da eficácia jurídica que proporcionam, em normas de eficácia plena, normas de eficácia contida e normas de eficácia limitada. Esta classificação foi formulada por José Afonso da Silva ainda na década de 60, sendo a mais propagada atualmente no Brasil, no entanto, é preciso deixar registrado que esta iniciativa de dividir as normas constitucionais segundo a eficácia, já havia sido anteriormente realizada na década de 50 por José Horácio Meirelles Teixeira que, influenciado pelo doutrinador italiano Vezio Crisafulli (autor da obra La Costituzione e le sue Disposizioni di Principio – A Constituição e as suas Disposições de Princípio), classificou as normas constitucionais em normas de eficácia plena e normas de eficácia limitada ou reduzida (sendo estas divididas em normas programáticas e normas de legislação), e, portanto, não existiria norma constitucional despida de eficácia, afastando-se, assim, a classificação realizada por Rui Barbosa, que baseado na doutrina norte-americana, dividia as normas constitucionais em autoexecutáveis (selfexecuting) e não autoexecutáveis (not selfexecuting), onde estas somente gerariam efeitos com a atuação do legislador

[15] Art. 103-A, § 2º, CF/88: “Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade” (grifos nossos)

[16] No caso do Município, a iniciativa poderá se efetivar somente de forma incidental ao curso de processo em que seja parte

[17] Exclui-se a controvérsia já pacificada pelo entendimento jurisprudencial, como bem observa Rodolfo Camargo Mancuso (2005, p. 711): “A controvérsia acerca da norma virtualmente vocacionada a ser sumulada não pode estar superada por entendimento subseqüente, mas deve estar ainda consistente no momento em que o Supremo Tribunal Federal examina a possibilidade de sumulação, o que bem se compreende, porque uma súmula justifica-se por sua capacidade de dirimir, definitivamente, conflito interpretativo de atualidade”.

[18] Sintetizada pela existência de casos análogos com decisões discrepantes

[19] Já Edilson Nobre Júnior (2008, p. 46-47) entende ser desnecessária a existência de muitos pronunciamentos: “Penso que, por reiteradas decisões, não é o caso de serem exigidos inúmeros julgamentos. Dois deles, se oriundos do plenário, já seriam, a meu sentir, suficientes. Assim justifico-me em face da atividade do Supremo Tribunal Federal. Concorde-se ou não com os seus pronunciamentos, é inegável, por parte de quem acompanha sua jurisprudência, que o Supremo Tribunal Federal é muito cioso em manter uma coerência de seus julgados”.

[20] Súmula Vinculante nº 11 (publicada no Diário Oficial da União de 22/08/2008, p. 1): “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”

[21] A reclamação visa, especialmente, garantir a autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal. Ressalte-se que a previsão deste instituto também contra ato da Administração – conforme está contido na Constituição e na Lei nº 11.417/06 – é novidade, pois anteriormente somente havia permissão para a utilização do mesmo em face de decisões judiciais. Com o objetivo de evitar um uso excessivo da reclamação, o legislador, conscientemente, dispôs que ela somente será cabível contra omissão ou ato da Administração Pública quando haja um prévio esgotamento das vias administrativas (art. 7º, § 1º, da Lei nº 11.417/06).

[22] Canotilho (2003, p. 938, grifo original) acentua que “os assentos eram normas materiais ‘recompostas’ através de uma decisão jurisdicional ditadas pelo Supremo Tribunal de Justiça sempre que houvesse contradição de julgados sobre as mesmas questões de direito no domínio da mesma legislação”.


Informações Sobre o Autor

Eduardo Braga Rocha

Procurador da Fazenda Nacional. Mestre em Direito (área de concentração: Direito do Estado) pela Universidade da Amazônia. Especialista em Direito e Processo Tributários pela Universidade de Fortaleza. Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza. Membro Associado do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública


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