A inexigibilidade de conduta diversa nos crimes contra a ordem previdenciária

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Resumo: Trata-se de uma análise da culpabilidade à luz do direito penal humanista, cujo elemento da exigibilidade de conduta diversa determina em certas situações a incidência ou não do Direito Penal, tendo em vista que adota-se o finalismo. Nesse contexto, a culpabilidade desempenha papel importante, pois não seve como pressuposto da pena, mas sim como medida da pena.
 
Sumário: Tutela jurídico-penal da previdência social. 1.1. Origem do Direito Previdenciário. 1.2. Proteção Constitucional à Previdência Social 1.3 Origem dos Crimes Previdenciários. 1.4. Aspectos da Nova Lei de Apropriação Indébita Previdenciária. 2. A teoria da inexigibilidade de conduta diversa no direito penal. 2.1. Culpabilidade: Significado e Conceito no Direito Penal 2.2. Teorias da Culpabilidade. 2.3. Evolução Doutrinária da (in) Exigibilidade de Conduta Diversa no Direito Penal. 2.4. Pressupostos e características da Inexigibilidade de Conduta Diversa. 3. A inexigibilidade de conduta diversa e sua aplicação nos crimes contra a ordem previdenciária. 3.1. A Inexigibilidade de Conduta Diversa: Fundamento e demonstração Probatória. 3.2. A aplicação da Inexigibilidade de Conduta diversa no Crime de Apropriação Indébita Previdenciária. 3.3. Posições Jurisprudenciais acerca da Inexigibilidade de conduta Diversa no Crime de Apropriação Indébita Previdenciária.


INTRODUÇÃO


Esta pesquisa, intitulada de “(IN) Exigibilidade de Conduta Diversa nos Crimes Contra a Ordem Previdenciária”, propôs-se a demonstrar até que ponto a utilização do Direito Penal deve servir como instrumento de coação estatal indispensável à vida em sociedade.


A evolução histórica da Previdência Social dependeu do surgimento do próprio Direito Previdenciário, que, de acordo com a doutrina majoritária se deu, no mundo, por meio de Otto Von Bismarck e seu projeto do seguro operário, e, é fato que antecede ao surgimento do Estado, na medida em que a preocupação do ser humano, com o futuro e seu semelhante remonta aos tempos pré-históricos.


O surgimento do Estado, como instituição política, social e juridicamente organizada, fez surgir a necessidade de um sistema, baseado na solidariedade, em que o homem se preocuparia com seu semelhante, por meio de contribuições, em que o contribuinte de hoje seria o segurado de amanhã.


A necessidade de se contribuir para um sistema, baseado na solidariedade, posteriormente chamado de Previdência Social, fez nascer o tipo penal da apropiação indébita previdenciária. Contudo, antes da previsão legal dada pelo atual art. 168-A do Código Penal, tal crime recebeu outras denominações e outros tratamentos, fazendo-se, nesta pesquisa, um liame histórico entre a evolução dos crimes contra a Previdência Social e a própria Previdência Social, que, no Brasil surge com a Lei Eloy Chaves.


No que consiste ao conceito de crime, opta-se pela teoria do conceito analítico ou finalista da ação, já que, entende-se como crime o fato típico, ilícito e culpável. Nessa medida, encontramos na culpabilidade o elemento humanizador da função do jus puniendi.


Para tanto, analisa-se a evolução dogmática da culpabilidade, suas teorias e principais precursores das mesmas, concluindo-se que a culpabilidade é, realmente, o mais importante elemento da estrutura do crime, já que atua sobre a vontade do agente, o poder e o dever de exigir do agente conforme a norma.


A inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de excludente da culpabilidade, é tema pouco discutido entre os operadores do Direito, já que há doutrinadores que a entendem como pressuposto da pena e não como causa exculpante.


A inexigibilidade de conduta diversa é um dos atributos do elemento da culpabilidade, extraído do conceito analítico de crime, sendo conceituada como uma causa supralegal de exculpação penal, em que o agente não possui o livre arbítrio, diante de uma situação tal qual não se poderia exigir do homem médio comportamento diverso, para agir conforme o Direito.


O suposto autor de apropriação indébita previdenciária poderá ser acobertado pela exculpante da inexigibilidade de conduta diversa, quando obedecidos alguns requisitos, ou melhor, quando houver prova concisa de que a situação que o levou a praticar a conduta criminosa era de tamanha força que qualquer um agiria do mesmo modo.


Ou seja, quando o sujeito ativo deixa de repassar à Previdência Social (sujeito passivo) as devidas contribuições necessárias à manutenção do sistema, havendo, portanto, o não recolhimento das mesmas, há a caracterização do crime de apropriação indébita previdenciária, cuja pena é de reclusão, de dois a cinco anos, e multa.


Diante das considerações apresentadas, destaca-se uma indagação: até que ponto o Direito Penal, bem como o Direito de punir, devem ser levados em consideração para punir condutas não abarcadas pelo próprio Direito Penal e, condutas das quais, poderá qualquer ser humano ser vítima de circunstâncias tais quais não se poderia exigir do mesmo (homem médio), conduta diversa da que tomada, contrária à norma?


Diante disso, defendemos ser a inexigibilidade de conduta diversa, como causa supralegal de exculpação penal, e como atributo da culpabilidade, o grande divisor de águas do Direito Penal conservador, calcado na responsabilidade penal objetiva, e o Direito Penal condizente com a ordem jurídica constitucional pátria, em que o princípio da dignidade da pessoa humana prevalece como sendo fundamento do Estado Democrático de Direito.


Assim, ressaltamos que entre os objetivos fundamentais desta pesquisa estão: a) traçar uma maior discussão acerca da evolução histórica da Previdência Social, bem como dos crimes contra a ordem previdenciária; b) delinear os principais aspectos da atual lei de apropriação indébita previdenciária; c) de fornecer substrato teórico necessário para se avaliar a culpabilidade como elemento do crime e, não como mero pressuposto da pena; d) abranger uma maior discussão acerca das teorias sobre a inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.


A metodologia apresentada foi elaborada em três fases, divididas da seguinte maneira: a) primeiramente fez-se a coleta das informações existentes a respeito do referido tema; b) analisou-se, posteriormente as informações coletadas, no sentido de se fazer um entrelaçamento entre as informações, e; c) expões-se o resultado desse confrontamento de informações, o que resultou nesta monografia. Desse modo, colheram-se as informações em fontes bibliográficas, tais como, livros, revistas, leis, códigos, jurisprudência e artigos da web, no sentido de melhor esclarecer sobre as divergências doutrinárias acerca do tema proposto, utilizando-se do método jurídico-teórico.


Para a melhor compreensão das informações propostas a respeito do tema, recorremos ao magistério de Andrade Filho (2007), Felipe Cazuo (2007), Cezar Bitencourt (2006), Nadja Machado (2004), Claudio Brandão (2008), Aníbal Bruno (2005), Nivaldo Brunoni (2008), Baltazar Junior (2008), Paulo Costa junior (2009) , René Dotti (2002), Odonel Gonçales (2007), Heinrich Henkel (2005), Ivan Kertzman (2006), Pedro Lenza (2009), Machado (2002), Marques (1997), Nucci (2007), Prado (2007), Roxin (2004), Silva (2006), Silva (2007), Tavares (2008), Teles (2004), Toledo (2000), Veloso (2008), Yarochewsky (2000) e Zafaroni (2002).


Para tanto, apresente monografia foi divida em três capítulos. O primeiro capítulo trata a respeito da evolução histórica do Direito Previdenciário, tido na doutrina como marco de seu surgimento o projeto do seguro operário de Otto Von Bismarck. Versa também, o primeiro capítulo acerca da proteção constitucional à Previdência Social, tendo suas peculiaridades em cada uma de nossas constituições, desde a primeira datada de 1824. Versa, ainda sobre a origem dos crimes previdenciários, e, por fim sobre os aspectos da atual lei de apropriação indébita previdenciária, da qual se analisa as características do crimes de apropriação indébita previdenciária.


O segundo capítulo trata da teoria da inexigibilidade de conduta diversa no Direito Penal, tida como atributo da culpabilidade como causa de supralegal de exculpação penal. Aborda, ainda o segundo capítulo sobre as teorias existentes acerca da culpabilidade, bem como dos pressupostos e características da inexigibilidade de conduta diversa como um de seus atributos, fazendo-se a relação de como a inexigibilidade de conduta diversa, inerente à culpabilidade, pode ser utilizada como tese de exculpação penal, haja vista ser a culpabilidade um dos elementos do crime, e não mero pressuposto da pena.


No terceiro e último capítulo, trata-se sobre a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa nos crimes contra a ordem previdenciária, sua aplicação como meio de prova nos crimes de apropriação indébita previdenciária, e, por fim o entendimento jurisprudencial acerca da inexigibilidade de conduta diversa aplicada como exculpante penal nos crimes de apropriação indébita previdenciária, tendo em vista que não se pode exigir do sujeito ativo, que beirando à falência, recolha as contribuições sociais devidas à Previdência Social, quando a situação na qual se encontrava não lhe era exigível conduta diversa da que fora tomada.


1 TUTELA JURÍDICO-PENAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL


Inerente ao ser humano é a preocupação com o seu semelhante. Desde os tempos mais remotos da história, observa-se a preocupação do homem com o futuro, e, uma prova disso, é que o varão guardava sobras de alimentos para o futuro, para sua satisfação posterior, acobertando a si e a sua família.


Antes do surgimento do Estado como instituição organizada, política, social e juridicamente, o próprio ser humano, mesmo que inconscientemente, sentia a necessidade de se resguardar, poupando o possível à própria sobrevivência.


No entanto, mesmo com o surgimento do Estado, incontestavelmente, a relação do homem e suas necessidades com o próprio Estado foram, paulatinamente, se desenvolvendo e amoldando-se um ao outro.


Para entendermos todo esse processo, faremos um estudo de como se deu a necessidade de se criar um seguro obrigatório respaldado na solidariedade, de modo que o contribuinte de hoje se tornaria o segurado de amanhã. Assim, em linhas gerais e superficiais adentraremos na parte histórica do Direito Previdenciário.


1.1. Origem do Direito Previdenciário


As primeiras civilizações, com o escopo de perpetuar a espécie de um determinado clã, a prestar assistência aos seus integrantes foram Grécia e Roma. Nessas Civilizações, principalmente em Roma, em razão do pater família, existiam associações que sobreviviam de contribuições de seus membros, que mantinham um seguro social que servia os mais necessitados membros daquele clã (GONÇALES, 2007, p. 3).


O Estado, logo percebeu a necessidade e o dever de manter a disposição dos mais necessitados um serviço de assistência. Durante a idade média, algumas corporações profissionais mantiveram seguros sociais para seus membros, cujos integrantes contribuíam com uma determinada cota parte para ser distribuída para os demais membros (TAVARAES, 2008, p. 37).


Na doutrina, não há dúvidas de que o surgimento do Direito Previdenciário, em sua forma embrionária, se deu na Alemanha no século XX, por meio do projeto de Otto Von Bismarck, pois até então as normas eram esparsas e desvinculada de um sistema, quando em 1881 apresentou seu projeto de seguro operário e, em 1883, se tornou obrigatório para os trabalhadores da indústria, sob a tríplice contribuição. Vejamos o que nos ensina Tavares (2008, p.37):


“Em 1883, na Alemanha, foi instituído o seguro obrigatório para os trabalhadores da indústria, sob a tríplice contribuição do Estado, dos trabalhadores e das empresas, de autoria de Otto Von Bismarck. Seguiram-se as criações de seguro contra acidente de trabalho (1884) e seguro de invalidez e velhice (1889).”


Nesse mesmo sentido é a lição de Gonçales (2007, p. 4)


“Na Alemanha, no entanto surgiram as primeiras ideias da criação de um Direito Previdenciário. Até então, as normas de assistência eram esparsas, desvinculada de um sistema. Bismarck materializou essa filosofia (criação de um Direito de Previdência Social) quando apresentou, em 17 de novembro de 1881, seu projeto de seguro operário […]”.


Os Estados tiveram que abandonar suas posições cômodas, sob a óptica do Liberalismo, passando a tomar decisões na esfera do social, a partir das transformações trazidas pela Revolução das Máquinas, já que havia multidões e famílias vivendo em condições subumanas, fazendo crescer a filosofia da necessidade segundo a qual cada indivíduo tem direito à assistência social.


O projeto de Bismarck foi, por assim dizer, o gérmen do qual brotou os chamados direitos sociais, trazendo o sentimento de dignidade humana que serviu e serve como sustentáculo da solidariedade das gerações, fazendo nascer um sistema de contribuições sociais solidárias em que indivíduos, teoricamente, não ficariam à margem da proteção do Estado.


No Brasil, o processo de surgimento do Direito Previdenciário é produto do entrelaçamento ocorrido entre nossas fontes de produção e nossa colonização. Porém, antes de sermos atingidos pela grande Revolução Industrial e pelas ideias de Bismarck, “[…] as primeiras manifestações sobre a necessidade de implantação de um seguro social deram-se através das santas casas de misericórdia, como a de Santos (1543), montepios e sociedades beneficentes, todos de cunho mutualista e particular” (TAVARES, 2008, p.40).


Assevera Jorge (2007, p.6) que, sem dúvida em 1850, sob a regência do Código Comercial do Império, havia a garantia de um seguro social. Vejamos o que diz o autor sobre o assunto:


“O Código de Comércio do Império (atual Código Comercial), já em 1850, trazia disposição em seu art. 79, no sentido de que, em casos de acidentes imprevistos e inculpados, deveriam os empregadores manter o pagamento do salário por três meses. Tratava-se, sem dúvida, de uma espécie de seguro social, com custeio integral pelo empregador”.


O atual Código Comercial, vigente desde a época do Império, garantiu aos trabalhadores da época o que conhecemos hoje como auxílio de acidente de trabalho. As condições de trabalho naquela época, sem dúvida alguma, eram as mais indignas possíveis, pois os trabalhadores se sujeitavam a qualquer tipo de intempérie em troca subsistência, em troca do “bem estar social”.


Assim, não podemos deixar de perceber que o ser humano sempre foi protagonista da história de sua raça, sempre foi quem decidiu, mesmo que indiretamente, qual o destino de sua existência. O direito à Seguridade Social só dependeu da visão do próprio homem sobre o próprio homem. Mas, a evolução pela qual passamos e a forma sob a qual fomos colonizados nos fez vítimas de um sistema de antolhos e de amarras, impondo-se a lei do mais forte sobre o mais fraco.


1.2. Proteção Constitucional à Previdência Social


Seguro roteiro para entendermos as evoluções legislativas pelas quais passamos durante o decorrer dos séculos é o estudo de nossas Constituições, leis, decretos, regulamentos, que trataram da evolução da proteção constitucional da Previdência Social.


Como dissemos, nossa colonização, ou melhor, a forma como fomos colonizados e por quem fomos colonizados, determinaram o ritmo de desenvolvimento do nosso país. A constituição de 1824 foi fruto de insatisfações dos brasileiros temerosos com mais alguns anos de dependência brasileira como Colônia de Portugal.


Lenza (2009, p.51) faz um breve apanhado histórico sobre o tema:


Em seguida, em decorrência da Revolução do Porto e por exigência dos Nobres portugueses, o Rei D. João VI, rei de Portugal, retorna a Lisboa em abril de 1821, deixando no Brasil D. Pedro Alcântara […]. Esses acontecimentos, sem dúvida, contribuíram pela insatisfação para a intensificação dos movimentos pela Independência do Brasil, sendo que, em 09 de janeiro de 1822, desrespeitando ordem da corte portuguesa, que exigia seu retorno imediato na tentativa de efetivar a colonização brasileira, D. Pedro I, tendo recebido diversas assinaturas coletadas pelos “liberais radicais”, disse: “Se é para o bem de todos e a felicidade geral da Nação, estou pronto! Digam ao povo que fico (“Dia do fico”). […] Em substituição (da Assembléia Constituinte), D. Pedro I cria um conselho de Estado para tratar dos negócios de maior monta e elaborar um novo projeto em total consonância com a sua vontade de “majestade imperial”.


A Constituição política do Império do Brasil foi outorgada em 25 de março de 1824 e foi, dentre todas, a que durou mais tempo, tendo sofrido considerável influência da francesa de 1814.” (grifos no original)


Como a Constituição de 1824 foi o marco inicial das mudanças legislativas que estavam por vir, é necessário ressaltar que foi a insatisfação do povo com o reino de Portugal que fez com que o Brasil entrasse num processo de independência. Todo o inconformismo foi fruto de um poder fragmentado e diferenciado no interior do país, pois era necessário criar um governo que unificasse e distribuísse o poder de forma igualitária entre as capitanias hereditárias, já que antes de promulgada a Constituição de 1824 elas estavam dispersas num vasto litoral, com tradições peculiares e independentes.


Quanto aos benefícios trazidos pela primeira Constituição (1824) dentro da esfera do assistencialismo, a mais importante foi a implantação de um regime de mutualidade regido pelo art. 179, XXXI, criando a previdência social, a priori com os socorros públicos (GONÇALES, 2007, p.4). Contudo, mesmo com todo processo de organização política, a constituição de 1824 esbarrou em alguns problemas.


O tema nos força a destrinchá-lo em outra oportunidade, já que merece maiores considerações, bem como uma maior atenção. Portanto, trazemos a lição de Tavares (2008, p.41)


A carta de 1891 aludiu, pela primeira vez, à expressão “aposentadoria” para funcionários públicos. Em 1919, a lei nº 3.724, instituiu o seguro obrigatório de acidente de trabalho, bem como uma indenização a ser paga pelos empregadores, nesses casos.


No entanto, considera-se o marco da Previdência Social, no Brasil a Lei Eloy Chaves, Decreto Legislativo nº 4.682, de 24/1/1923, que determinou a criação de Caixas de Aposentadorias e Pensão para os empregados das empresas ferroviárias […].


Em 1930, foi criado o Ministério do Trabalho, da Indústria e Comércio, que tinha a tarefa de supervisionar a previdência social. A década de 30 daquele século foi marcada pela unificação das Caixas de Aposentadorias e Pensão […], em institutos públicos de Aposentadoria e Pensão.


A Constituição de 1934 estabeleceu a tríplice forma de custeio […]. A Carta de 1937, outorgada em pleno estado Novo, empregou a expressão “seguro social”.


Somente na Carta de 1946, surgiu, pela primeira vez, a expressão “Previdência Social”, elencando como riscos sociais, a doença, a velhice, a invalidez e a morte.


Em 1947, o Deputado Aloízio Alves, apresentou o projeto que deu origem Lei à Orgânica da Previdência Social […].


[…] A Constituição Federal de 1988 trouxe-nos uma completa estruturação de previdência, saúde e assistência social, unificando esses conceitos sob a moderna definição de “seguridade social”. (grifos no original)


Foi a partir daí, desde a criação e promulgação da mola propulsora do sistema previdenciário, no Brasil (Lei Eloy Chaves – nº 4.682/23), e, posteriormente na década de 70, como nos ensina Kertzman (2006, p.18), com a inovadora evolução legislativa, vez que os trabalhadores rurais, por exemplo, somente passaram a gozar de direitos previdenciários, a partir de 1971, com a criação do FUNRURAL pela LC 11/71, bem como com a inclusão dos empregados domésticos no sistema protetivo, em função da criação da Lei nº 5.859/72, e a criação do SINPAS, que um novo cenário constitucional de proteção previdenciária começou a ser construído até chegarmos ao patamar no qual nos encontramos atualmente.


Quanto se conquistou no decorrer dos anos! A Seguridade Social, paulatinamente, passou a fazer parte dos interesses do Estado, que passou a proteger e criar amparos sociais à classes de trabalhadores, culminando, em 1988, na criação de um sistema bem mais amplo, do qual fazem parte a saúde e a assistência, cuja principal finalidade é atender a pessoas que não contribuem para o sistema.


Assim, por conta da mesma Constituição de 1988 (BRASIL, 2009a), embasado no princípio da solidariedade, conforme art. 3º, I, a seguridade Social Compreende, conforme art. 194 do mesmo diploma legal supracitado, “[…] um conjunto integrado de ações de iniciativas dos poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.


Como vimos, foi com o advento da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2009a), que a seguridade social alcançou o ápice de sua proteção, se comparada às Constituições anteriores. A partir de então, outras normas, como sabemos, acompanhando a evolução social, passaram a tratar de pontos específicos, como por exemplo, a EC nº 20/98 (BRASIL, 2009b).


A proteção Constitucional dada à seguridade social está posicionada no título VIII da nossa Carta Maior, que trata da Ordem Social. Como veremos adiante, a Seguridade Social abrange a Previdência Social, a Assistência Social e a Saúde.


Nesse diapasão, antes de tratar sobre a Ordem Social, a Constituição Federal de 1988, engloba em seu art. 6º quais são os Direitos Sociais: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta constituição” (BRASIL, 2009a).


A Constituição Federal estabeleceu princípios, formas de custeio, objetivos e outros aspectos destinados a seguridade social, sob o sustentáculo do princípio da solidariedade, consolidado no texto da Carta Magna de 1988 em seu art. 3º, I (BRASIL, 2009a).


É através do princípio da solidariedade que o sistema da seguridade social se movimenta, pois sem o entendimento desse princípio não se compreende o “porquê” do sistema. Kertzman (2006, p.24) nos mostra quão importante é o referido princípio.


“O princípio da solidariedade é o pilar de sustentação do regime previdenciário. Não é possível a compreensão do sistema sem que o conceito de solidariedade esteja consolidado. Pode-se defini-lo como o espírito que deve orientar a seguridade social de forma que não haja, necessariamente, paridade entre contribuições e contraprestações securitárias. Através dele, tem-se em vista, não a proteção de indivíduos isolados, mas de toda coletividade.”


É nítido o sentido de norma orientadora do sistema da seguridade social, trazido pelo princípio da solidariedade. É através desse princípio que se é revelada a razão de ser, a necessidade de existência de um sistema que sobrevive à custa de contribuições de diversos integrantes da sociedade e, até mesmo o próprio governo.


É nos termos do art. 194 da CRFB/88 (BRASIL, 2009a) que se delineia o conceito de seguridade social. Segundo o referido artigo, a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.


Em seguida, no parágrafo único do mesmo artigo a Constituição Federal infere como sendo competência do poder público, a organização, nos termos da lei, da seguridade social, com observância obrigatória de alguns objetivos, tais como: a) Universalidade de cobertura e do atendimento; b) Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; c) Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; d) Irredutibilidade do valor dos benefícios; e) Diversidade da base de financiamento; f) Caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, mediante a gestão quadripartite, com a participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e dos governos nos órgãos colegiados.


Cada princípio orientador da seguridade exerce sua função de forma individualizada, fazendo com que o direito à seguridade social seja dado a todos os que dele necessitem. Porém, não cabe a nós, nessa obra, discorrermos sobre cada um deles.


Como vimos, dentro do ramo da seguridade social, estão englobados ainda outros institutos como, a previdência, a saúde e a assistência. Veremos sucintamente cada um deles.


A previdência social está relacionada em nossa Constituição Federal de 1988 em seu art. 201 (BRASIL, 2009a), que estabelece que a previdência social seja organizada sob a forma do regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. O mesmo artigo dispõe que a previdência social deve atender a alguns preceitos, tais como: a) Cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; b) Proteção à maternidade, especialmente à gestante; c) Proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; d) salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes de segurados de baixa renda; e) Pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes.


De acordo com Tavares (2008, p.22), a previdência é assim conceituada: “[…] seguro público, coletivo, compulsório, mediante contribuição e que visa cobrir os seguintes riscos sociais: incapacidade, idade avançada, tempo de contribuição, encargos de família, morte e reclusão”.


Deve-se destacar desse conceito dois princípios que regem a previdência social, quais sejam, o da contributividade e o da compulsoriedade. A compulsoriedade revela-se na obrigação que têm os trabalhadores que exercem atividades remuneradas lícitas a se filiar ao regime de previdência. A contributividade revela-se na necessidade de se contribuir para o sistema para ter direito aos incidentes cobertos pelo sistema.


A assistência social é conceituada, segundo as palavras de Martinez (1989, p. 80 apud GONÇALES, 2007, p.22) como sendo


“[…] um conjunto de atividades particulares e estatais direcionadas para o atendimento dos hipossuficientes, consistindo os bens oferecidos em pequenos benefícios em dinheiro, assistência à saúde, fornecimento de alimentos e outras pequenas prestações. Não só complementa os serviços da previdência social, como amplia, em razão da natureza da clientela e das necessidades providas.”


A assistência social encontra-se regulamentada no art. 203 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2009a), que dispõe que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social.


O mesmo artigo discorre sobre os objetivos da assistência social, que são: a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; b) o amparo às crianças e adolescentes carentes; c) a promoção de integração ao mercado de trabalho; d) a habilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração a vida comunitária; e) a garantia de um salário mínimo de beneficio mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.


Um diferencial notável entre a previdência social e a assistência social é que nesta não há a necessidade de se contribuir para o sistema para que se possa haver os benefícios acobertados pelo sistema, de modo que a contributividade e a compulsoriedade desaparecem para os amparados pela assistência social.


Outro direito social que integra a seguridade social é a saúde. A saúde encontra sua proteção constitucional no art. 196 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2009a). Dispõe o art. 196 da CRFB/88 que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário as ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.


Como é dever do Estado o direito à saúde deve ser universal, não havendo exclusão do paciente por critérios de renda. Note que aqui também não se necessita de contribuição para a previdência, pois é direito difuso, pertencente a todos sem descriminação. Ainda que haja participação de entidades privadas será a saúde prestada forma gratuita, devendo o Estado remunerar s entidades pelo serviço (TAVARES, 2008, p.13).


É dessa forma, dividindo o sistema da seguridade social em saúde, assistência e previdência social, dispondo sobre como cada um desses direitos sociais é tratado que a Carta Magna de 1988 protege toda a ordem social.


 Além disso, determinando princípios, forma de custeio e arrolando as competências dos entes federativos, em cada uma das esferas para legislar sobre cada um dos referidos institutos, bem como arrolando os incidentes acobertados por cada um dos sistemas, colocando ainda possibilidades de se criar novas leis, é que o legislador constitucional coloca o ser humano como a razão de ser de todo o sistema constitucional previdenciário.


1.3. Origem dos Crimes Previdenciários


Mesmo antes da Lei Eloy Chaves (Decreto Legislativo nº 4.682/23), Já havia uma complexa relação entre empregados e empregadores que, diante da ideia de preocupação com o futuro e de se manter um sistema que garantisse meios de sustentabilidade própria (futura seguridade social), gerava oportunidades para que os empregadores deixassem de repassar as contribuições de seus empregados, burlando a legalidade.


Porém, é a partir da década de 30 que fora dado tamanho relevo ao assunto, como assinala Prado (2007, p.519)


“De primeiro, convém assinalar que o art. 5º do Decreto-Lei 65, de 14 de dezembro de 1937, já determinava que o empregador que retivesse contribuições de seus empregados, deixando de efetuar o recolhimento na época devida, deveria ser sancionado com as penas referidas no artigo 331, n. 2, da Consolidação das Leis Penais. Agregue-se que a Consolidação praticamente manteve a mesma redação do Código Penal de 1890 no tocante ao artigo 331 que, embora estivesse contido no capitulo que disciplinava os crimes de furto, descreveria, na realidade o delito de apropriação indébita, que mais tarde tornou-se crime autônomo no Código Penal de 1940.”


Fazendo uma análise do texto supratranscrito, observamos que até então não havia nenhuma lei que estabelecesse nenhum rol de condutas, que quando praticadas constituísse crimes contra a previdência social. Além disso, o que hoje entendemos como apropriação indébita previdenciária, descrita no atual Código Penal (BRASIL, 2009c), era antes tratada, segundo relata o autor do referido texto, no capítulo destinado ao crime de furto.


Em 1960, por meio do Decreto-Lei 3.807, surge a Lei Orgânica da Previdência Social, dispondo em seu art. 86 que “[…] seria punida com as penas de apropriação indébita a falta de recolhimento, na época própria, das contribuições e de quaisquer outras importâncias devidas às instituições de previdência e arrecadadas do segurado ou do público” (PRADO, 2007, p.519).


O que podemos perceber é que havia uma confusão na redação das duas leis anteriormente mencionadas. Note que em 1937 a previsão criminal era para os que deixassem de repassar e, no tipo penal de 1960, a previsão legal incidia para os que deixassem de recolher, causando certo embaraço na aplicação das possíveis penas, o que ainda hoje acontece como nas discussões acerca do tema de apropriação indébita previdenciária.


A evolução legislativa dos crimes contra a previdência social continuou a medida  que o sistema previdenciário e as complexas relações sociais com o próprio sistema também se desenvolviam, dando novas concepções ao conceito de empregador e empregado serem abarcados pelas leis.


Em 1966, com o Decreto-Lei n.66, fora criada uma nova figura criminal que determinou como sendo apropriação indébita a falta do pagamento do salário família aos empregados quando as respectivas quotas tivessem sido reembolsadas à empresa pela previdência social (ANDRADE FILHO, 2007, p.61).


O que percebemos é que a nova lei, trazida pelo Decreto-Lei n.66, configurou mais um delito, além daquele previsto no art. 86 da Lei 3.807/60, no qual o fato de o agente deixar de efetuar o pagamento do salário família aos empregados quando as respectivas quotas tivessem sido reembolsadas à empresa pela previdência social também se constituía num delito cometido contra a previdência social.


Segundo o entendimento de Prado (2007, p.20), em 1976, a Consolidação das Leis da previdência social (Decreto 77.077/1976) nada inovou na matéria de crime de apropriação indébita previdenciária, mantendo os mesmo tipos penais instituídos pelo Decreto- Lei n.66, que foram inseridos no mencionado diploma legal pelos artigos 149 e 224.


Apenas em 1990, como advento da lei 8.137, é que se definiram os crimes contra a ordem tributária, em seus artigos 1º a 3º, passando a regular inteiramente a matéria relativa à supressão de tributos e contribuições, revogando as demais disposições sobre os crimes de sonegação fiscal e contra a previdência social (ANDRADE FILHO, 2007, p.62).


Antes que a Lei 8.137/90 (BRASIL, 2009d) fizesse “aniversário” veio à lume a Lei n. 8212/91 (BRASIL, 2009e) que, disciplinou a matéria em alguns de seus artigos. A referida lei trata-se da Lei Orgânica da Seguridade Social.


Segundo as palavras de Prado (2007, p.21)


“Como o advento da Lei n. 8212/90, […] condutas atentatórias aos interesses da previdência social forma tipificadas de maneira desastrosa, merecendo destaque, como antecedentes do delito aqui enfocado, o disposto no art. 95, alíneas d, e e f. Esses dispositivos penais, além dos outros tipos contidos nas demais alíneas do art. 95, foram expressamente revogados pela Lei 9.983/2000. Também não subsiste dúvida quanto a derrogação do art. 2º, inciso II, da Lei 8.137/1990, na parte atinente à contribuição social.”


Nesse sentido, também é o entendimento de Machado (2002, p.228), ao lecionar que a nova Lei 9.983/00 (BRASIL, 2009f) deu tratamento específico aos crimes que ferem a ordem previdenciária relacionados


“[…] com as contribuições sociais de previdência, aos crimes de não-recolhimento e de supressão ou redução de tributo, definidos na Lei 8.137/90, mediante a inserção no Código Penal do art. 168-A, que define o não-recolhimento como apropriação indébita previdenciária, e do art. 337-A, que define a supressão ou redução de contribuição social previdenciária ou qualquer acessório como sonegação de contribuição previdenciária”.


A necessidade de se aplicar e se promulgar a Lei 9.983/00 (BRASIL, 2009f) veio, segundo nos ensina Veloso (2008, p.66), da deficiência da legislação antiga, que não conceituava adequadamente os delitos e deixava a desejar nas penalidades impostas aos seus autores, de modo que, sob esse ponto de vista, além de descrever as condutas, a nova lei transformou a pena de detenção de seis meses a dois anos em reclusão de dois a cinco anos, para as condutas tipificadas no art. 1º da Lei 9.983/00 (BRASIL, 2009f).


A Lei n. 9.983/00 (BRASIL, 2009f) revogou expressamente parte relevante do art. 95 da Lei n. 8.212/91 (BRASIL, 2009e), retirando os crimes relativos à previdência social da legislação extravagante colocando-os no corpo do atual Código Penal (BRASIL, 2009c). Assim, além de dispor sobre as condutas lesivas à ordem previdenciária, dispôs a mesma lei sobre possível extinção da punibilidade, possibilidade do perdão judicial, etc., como podemos observar no art. 168-A, do referido diploma legal. Desse modo, sistematizou o delito, de modo que houvesse menos erros na aplicação da lei.


1.4. Aspectos da Nova Lei de Apropriação Indébita Previdenciária


Tendo sido objeto de estudo nosso, a promulgação de leis que tipificassem uma conduta criminosa e lesiva à Previdência Social, passou por um duro processo de aperfeiçoamento da técnica legislativa, que, contudo, inovava em alguns pontos das leis, sucessivamente, promulgadas, mas que, porém, regredia em outros.


Como sabemos, antes da lei 9.983/00 (BRASIL, 2009f) ser promulgada, vigorava, até então, a lei 8.212/91, no tocante às condutas lesivas à Previdência Social (BRASIL, 2009e), que dispunha sobre a Organização do custeio da Previdência Social. A referida lei tratava em seu art. 95, alíneas, de condutas tendentes a causar danos à Seguridade Social, revogando, tacitamente, as normas previstas no art. 1º e 2º da Lei 8.137/90 (BRASIL, 2009d), também , relacionados com a Previdência Social.


Por apresentar falhas, no tocante às condutas tidas como crime contra a Previdência Social, em 14 de julho de 2000 fora promulgada a lei 9.983 (BRASIL, 2009f). As falhas da lei 8.212/91 (BRASIL, 2009e), quanto às condutas lesivas à Previdência Social, eram ululantes, saltavam aos olhos dos aplicadores da lei, pois deixavam de atribuir penas a algumas das condutas ali previstas (art. 95, alíneas). Nesse sentido nos ensina Veloso (2008, p.75)


Porém, ao estabelecer a pena para as condutas, o legislador cometeu equívoco estipulando no § 1º do citado artigo punição apenas para as alíneas d, e e f, deixando de fora todas as outras alíneas. Isso impossibilitou a punição das demais condutas, as quais não possuíam sanção, face o princípio constitucional da legalidade, ou seja, não há pena sem lei anterior que a defina.


Fazendo dura crítica à lei, Maciel Filho (2004, p.70) diz que, não bastasse a omissão do legislador quanto à definição da pena para as demais alíneas, nas únicas par as quais foi prevista a aplicação da sanção penal, o legislador demonstrou total falta de técnica legislativa ao determinar que as penas aplicáveis fossem aquelas previstas no art. 5º da Lei n. 7.492/86 (reclusão de 2 a 6 anos), tratando-se de pena aplicada por remissão.”


Com a indiscutível lacuna legal existente na Lei 8.212/91 (BRASIL, 2009e), entra em cena a Lei n. 9.983/00 (BRASIL, 2009f), que acrescentou à parte geral do Código Penal (BRASIL, 2009c), além de outros artigos, o artigo 168-A (Apropriação Indébita Previdenciária). É sobre esse artigo, acrescentado pela referida lei, que nos debruçaremos em nossos estudos.


Contudo, antes de adentrarmos nos aspectos pontuais e materiais do próprio artigo 168-A do CP (BRASIL, 2009c), inserido pela Lei n. 9.983/00 (BRASIL, 2009f), faremos uma rápida abordagem sobre alguns pontos criticados pela doutrina, como a posição topológica do artigo e, bem como, se se trata de prisão por dívida ou se o delito trazido pelo artigo supracitado é mera conduta ou de resultado.


Quanto à posição topológica do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c), inserido na parte especial do Código Penal, a doutrina majoritária repudia e faz duras críticas, porquanto não se pode olvidar que a apropriação indébita, em geral, possui tipo nuclear diferente da apropriação indébita previdenciária, devendo esta está inserida em outro título do Código Penal.


Costa Junior (2009, p.428) tece sua considerações a respeito do tema, da seguinte forma:


O legislador atentou contra os princípios basilares e consagrados do Direito Penal, evidenciando ignorar o que seja apropriação indébita. Aqui, é absurdo falar de apropriação, já que o empresário sempre foi dominus do numerário, que não transferiu a quem de direito.


Inaceitáveis as inovações que o legislador pátrio vem fazendo, atentando contra princípios basilares e consagrados do direito penal. Neste art. 168-A, ao dar ao delito o nomen júris de apropriação indébita previdenciária, o legislador evidenciou ignorar o que seja apropriação indébita, em que o agente, tendo a posse do bem, dele se apropria, mutatio animo, transformando-se de mero detentor e dominus.” (grifos no original)


O artigo 168-A do Código Penal (BRASIL, 2009c) dispõe que: “Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal convencional […]”. Assim, a crítica doutrinária feita quanto à posição topológica do art. 168-A do Código Penal é pertinente.


O artigo 168 do Código Penal (BRASIL, 2009c) dispõe que constitui apropriação indébita apropriar-se de coisa alheia móvel de quem tenha posse ou detenção, enquanto na primeira não se exige a configuração delitiva da apropriação de valor, mas sim a omissão de deixar de recolher à Previdência contribuição social a qual a ela pertence.


Vejamos o que doutrina Prado (2007, p.522)


“[…] a tutela penal não se justifica em tal caso pela simples necessidade de tutela do patrimônio, mas principalmente para garantir o cumprimento das prestações públicas por parte do Estado, especificamente na área previdenciária. Apenas uma interpretação meramente individualista poderia justificar a caracterização desse novo tipo penal como uma espécie de apropriação indébita, em que o trabalhador figura como sujeito passivo desse delito, por serem as contribuições “apropriadas” parte de seus salários.” (grifos no original)


A ilação a que chegamos é que a apropriação indébita previdenciária prevista no art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) não se confunde com a apropriação indébita prevista nos art. 168 a 170 do CP (BRASIL, 2009c), pois, que, na apropriação indébita previdenciária, no primeiro momento, o sujeito/agente recolhe o valor da contribuição social devida, omitindo-se, posteriormente, deixando de repassá-la à Previdência Social. Enquanto na apropriação indébita, o sujeito/agente já possui, ou melhor, é possuidor ou detentor da coisa e dela se apropria.


Outro aspecto que gera discussões acerca do tema é se o delito de apropriação indébita previdenciária se constitui num delito inconstitucional, pois gera a prisão por dívida, proibida no art. 5º, LXVII da CRFB/88 (BRASIL, 2009a). Porém, sem delongas ao tema, apresentamos a posição a qual nos filiamos, bem como a doutrina majoritária, na qual não há prisão por dívida nos crimes de apropriação indébita previdenciária, veja:


“Ocorre que no caso em questão o que se está criminalizando não é a conduta “dever”, mas sim a conduta consciente em deixar de recolher a contribuição descontada ou cobrada, o que gera uma dívida. Vários tipos penais podem ser cometidos no bojo de uma relação lícita ou podem gerar uma dívida, como no dano ou na apropriação indébita. […] Do mesmo modo, no crime de omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, o que se criminaliza não é omissão no pagamento da contribuição do empregador, mas sim a conduta de deixar de recolher a contribuição previamente descontada (BALTAZAR JUNIOR, 2008, p.20)”. (grifos no original)


Assim, tendo em vista que o tipo nuclear do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) não importa na criminalização do fato de se deixar de pagar o tributo para se abastecer os cofres públicos. O que se criminaliza, ou melhor, o que o Direito Penal impõe sua tutela é na vontade consciente de o sujeito ativo de praticar o delito, deixando de recolher a contribuição descontada ou cobrada.


O TRF da 4ª região editou a súmula 65 (BRASIL, 2002g) que dispõe sobre a matéria da seguinte forma: “A pena decorrente do crime de omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias não constitui prisão por dívida”.


Quanto ao ponto de discussão sobre se o delito de apropriação indébita é de resultado ou de mera conduta, hoje, em corrente majoritária na doutrina há, notadamente, inúmeras posições na defesa de que o referido crime tratado no art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) é de mera conduta. Porém, mostraremos as duas posições que se acham em conflito.


Na lição de Andrade Filho (2007, p.66), para a configuração do delito de apropriação indébita previdenciária, é necessário a comprovação da apropriação pelo agente, dos valores que não foram pagos à Previdência Social. Não basta a existência da vontade consciente de não satisfazer à obrigação tributária para caracterizar a conduta punível.


Em contrapartida, na lição do professor Prado (2007, p.520), “[…] não se exige à configuração delitiva a apropriação de valor, mas sim a omissão em deixar de recolher à Previdência a contribuição Social enfocada”.


O Superior Tribunal de Justiça, afirma Veloso (2008, p.78), decidiu a contenda no julgamento do REsp n. 476.640/SE, dispondo que o crime de apropriação indébita previdenciária é crime omissivo próprio de mera conduta e que se aperfeiçoa independentemente do fato de o agente vir a se beneficiar com os arrecadados e não repassados à Previdência Social.


Passemos agora a analisar o tipo penal em espécie, trazido pela Lei 9.983/00 (BRASIL, 2009f), art. 168-A CP (BRASIL, 2009c), bem jurídico tutelado, sujeitos, tipicidades, formas equiparadas, pena, ação penal, extinção da punibilidade, etc.


Como já sabemos, é entendido como Seguridade social o conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Sabemos também que as contribuições sociais não deixam de ser de ordem tributária, pois dessas são espécie do qual aquela é gênero, conforme art. 146, III e149 da CRFB/88 (BRASIL, 2009a).


Não há dúvida sobre a função de pilar de sustentabilidade assistencial dado à Previdência Social, pois as contribuições destinadas a ela sustentam o programa social desenvolvido pelo Estado que deve cumprir com a prestação desses valores de cunho social, baseado, como vimos, no princípio da solidariedade.


É nesse liame, e por essa razão, que o bem jurídico protegido pela norma inscrita no art. 168-A do Código Penal (BRASIL, 2009c) é a Previdência Social. Prado (2007, p.524) nos ensina que o legislador, ao tipificar as condutas descritas no referido artigo do CP, busca tutelar não apenas o patrimônio da Previdência Social, mas, também, protege de forma reflexa as prestações públicas no âmbito social.


O STF já afirmou que o tipo penal em questão é a tutela da subsistência financeira da seguridade social, no julgamento do HC 76.978-1-RS (BALTAZAR JUNIOR, 2008, p.21). Logo, não há dúvidas que o tipo descrito no art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) tem a finalidade de proteger o sistema da Seguridade Social, que, por ventura, venha a ser abalado por uma das práticas funestas descritas na lei.


Desse modo, entendemos que o que se deve punir é a vontade consciente de o agente praticar o crime omissivo, em que por vontade consciente visa lesar, deixando de recolher, no prazo legal, as contribuições sociais devidas à Previdência, vez que está em jogo o interesse patrimonial da Previdência Social.


Quanto ao sujeito ativo do delito, tem-se que é aquele que, por lei, tem o dever de recolher determinada quantia, também legalmente prevista, do contribuinte e repassá-la à Previdência Social (NUCCI, 2007, p.716). Nesse ínterim, sujeito ativo é aquele que tem vínculo com o órgão previdenciário do Instituto Nacional do Seguro Social, se obrigando a repassar ou recolher contribuição social.


Na lição de Prado (2007, p.525), outras pessoas podem ser enquadrados como sujeito ativo, levando-se em conta o vínculo existente entre esses e o INSS. Veja:


“[…] Aqui podem ser citados o empresário individual e todos aqueles que ocupam cargos administrativos ou técnico-contábil-financeiros nas sociedades empresariais, como os sócios-gerentes, os membros do Conselho de Administração, os diretores, contadores, gerentes de contabilidade, gerente de departamento de emissão de documentos fiscais de interesse do INSS, o agente que trabalha na agência bancária conveniada, entre outros.


Sustenta-se que os agentes do Tesouro Nacional podem praticar o referido delito se eventualmente deixam de repassar mensalmente a CSLL, COFINS e a receita de concursos e prognósticos ao orçamento da Seguridade Social, já que tais contribuições são arrecadadas pela Receita Federal.”


Interessante ressaltar que o sujeito ativo pode ser qualquer agente que possua vínculo legal ou convencional no processo de recolher à Previdência Social as contribuições devidas. Portanto, até mesmo os contadores de empresa, responsáveis pelo recolhimento das contribuições podem ser enquadrados como sujeito ativo do delito.


Quanto ao sujeito passivo, não há que se falar em outro, que não aquele lesado pela falta de recolhimento das contribuições devidas, ou seja, o Estado. Entretanto, o Estado representado pela União e sua Autarquia, o INSS, pois como autarquia federal e possuidora de personalidade jurídica própria, indubitavelmente é ela a vítima o crime (TELES, 2004, p.436).


O tipo objetivo descrito pela norma do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) é a conduta omissiva prevista no caput do artigo, ou seja, deixar de repassar à Previdência Social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional.


Todavia, quanto ao Tipo subjetivo inserido na norma do caput do artigo em análise, observa-se que há a necessidade imperiosa de ser a conduta dolosa para que haja sido concretizado o delito. É necessário que quem tenha a obrigação legal ou convencional de repassar à Previdência Social as contribuições, dentro do prazo determinado pela lei, se omita, ou melhor, deixe de repassar à Previdência as contribuições exigidas.


Nesse sentido, ensina-nos Baltazar Júnior (2008, p.35), que o agente age sempre de forma dolosa nas modalidades várias de apropriação de contribuições sociais


“Não há forma culposa, à míngua da previsão legal, embora a imprudência possa gerar a omissão no recolhimento. Assim, o elemento subjetivo é o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de não recolher a contribuição previdenciária arrecadada dos empregados. […] Admite-se, contudo, a absolvição por inexistência do dolo quando a contribuição é recolhida logo em seguida ao término do prazo, evidência de que a omissão no recolhimento se deu por mero descuido ou esquecimento”.


A vontade livre e consciente do agente em deixar de recolher as contribuições dentro do prazo legal revela o dolo, necessário para a configuração do delito de apropriação indébita previdenciária. É necessário que o agente criminoso haja com a vontade de não recolher as contribuições devidas à Previdência Social.


O verbo descrito na norma do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) é de “deixar de repassar”, revelando a necessidade de haver o ato de omissão de transferir as contribuições sociais, revelando o dolo de deixar de repassar ao INSS as contribuições recolhidas dos contribuintes.


No que tange à consumação do crime, esta ocorre quando (como já vimos, há várias decisões no sentido de ser o delito de apropriação indébita previdenciária, um delito omissivo próprio, um delito de mera conduta) o autor não repassa ao INSS as contribuições recolhidas dos contribuintes dentro do prazo legal. Assim, o fim do prazo legal para o repasse da pecúnia marca a consumação do delito (TELES, 2004, p.438).


Nesse mesmo sentido é a posição de Costa Júnior (2009, p.430)


Se se tratasse de verdadeiro crime de apropriação indébita, a consumação dar-se-ia na esfera subjetiva do agente, vale dizer, quando ele se transformasse, mutato animo, de mero detentor a verdadeiro senhor e proprietário. Entretanto, não se tratando de apropriação indébita, o momento da consumação é bem outro.


Nas modalidades previstas, o crime é omissivo. Nas duas primeiras, o agente deixa de repassar à Previdência Social ou de recolher, no prazo legal, as contribuições dos segurados. Assim, o crime se consuma quando se esgotar o prazo legal para o agente executar a ação esperada”. (grifos no original)


Como se trata de crime de mera conduta, como vimos, o simples fato de deixar de recolher as contribuições dentro do prazo legal configura o delito de apropriação indébita previdenciária, vez que não se exige do agente a intenção de ficar com os valores, mas apenas o fato de deixar de recolher as contribuições dentro do prazo legal previsto. Igualmente o crime se configura independentemente do fato de o agente vir a se beneficiar com os valores arrecadados dos contribuintes e não repassados à Previdência Social.


A doutrina é unânime em dizer que não há tentativa no crime de apropriação indébita previdenciária, porquanto se trate de crime omissivo próprio, ou seja, um crime que somente o fato descrito pela lei ocorre, independentemente do resultado posterior, como por exemplo Guilherme de Souza Nucci, Regis Prado, Ney Teles, Paulo Costa, etc.


O art. 168-A do Código Penal (BRASIL, 2009c) estabelece em seu § 1º o que a doutrina chama de formas equiparadas do delito de apropriação indébita previdenciária


“§ 1º Nas mesmas penas incorre que deixar de:


I – recolher, no prazo legal contribuição ou outra importância destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadação do público.


II – recolher contribuições devidas à Previdência Social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços.


II – pagar benefício a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela Previdência Social” (BRASIL, 2009).  


Nessas condutas descritas nos incisos do § 1º do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c), chamadas de forma equiparada do delito a doutrina, confere a todas elas que o tipo subjetivo é o dolo, vez que todas as condutas ali descritas exigem a vontade livre e consciente do agente de praticar o delito (NUCCI, 2007, p.720).


Nos casos previstos por cada inciso do § 1º do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c), existe uma forma de consumação e, dentro do raciocínio da doutrina majoritária é o que nos ensina Prado (2007, p.537).


“Consumação – no art. 168-A, parágrafo 1º, inciso I, perfaz-se quando o responsável tributário, embora tenha deduzido a contribuição social dos pagamentos, deixa de recolhê-la no prazo legal fixado pela mencionada legislação. No parágrafo 1º, inciso II, a consumação quando o agente deixa de efetuar o recolhimento da contribuição no dia 2 (dois) do mês subsequente ao do fato gerador. Já no parágrafo 1º, inciso III, ocorre no momento em que o agente recolhe a contribuição social deduzindo salário-família não pago ao segurado. […] Na última modalidade admite-se tentativa, embora seja de difícil configuração” (art. 168-A, § 1º, III, CP).


Interessante ressaltar que nos dois primeiros incisos do artigo há a estipulação de prazo para recolhimento, enquanto que, no inciso III, o que há é a punição do agente quando deixa de pagar ao segurado benefício do qual já foi reembolsado pela Previdência. De tal modo, a empresa é ressarcida do valor pago e, posteriormente, não repassa ao segurado que, em geral, conforme dispõe o art. 60 da Lei n. 8.212/91 (BRASIL, 2009e), recebe o benefício pago pelo INSS por meio da agência bancária. Contudo, é exceção o art. 68 da Lei n. 8.213/91 (BRASIL, 2009e), em que o benefício é pago ao segurado pela empresa que é ressarcida em contribuições futuras à Previdência Social.


O art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) estabelece pena de dois a cinco anos e multa aos que praticam o delito ali previsto. Quanto à ação penal, esta é pública e incondicionada, sendo a competência da justiça federal, porque os crimes de apropriação indébita previdenciária constituem lesões aos interesses da União, representada, nesse caso, por sua autarquia federal o INSS (TELES, 2004, p.439).


Quanto à extinção da punibilidade do agente, estabelece o § 2º do artigo     168-A CP (BRASIL, 2009c) que se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à Previdência Social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal, terá desaparecido o jus puniendi.


O agente deve obedecer, segundo a análise do referido § 2º do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c), a uma série de requisitos, cumpridos de forma cumulativa que darão a ele a extinção da pretensão punitiva do Estado. Deste modo deve o agente declarar a soma das contribuições, importâncias ou valores e o seu não recolhimento, confessar a retenção dessas contribuições, importâncias ou valores e o seu não recolhimento, ser espontâneo na declaração dessas contribuições, importâncias ou valores, prestar as informações devidas, efetuar o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e fazer tudo isso antes do inicio da ação fiscal (COSTA JUNIOR, 2009, p.431).


Assevera Prado (2007, p.534) que não mais se aplicam no que tange à extinção da punibilidade, o artigo 34 da Lei n. 9.249/1995 (BRASIL, 2009h), vez que a Lei n. 9.983/2000 (BRASIL, 2009f) tenha disciplinado a matéria de forma diferente. Dispõe, ainda, o mesmo autor, que com advento da Lei n. 10.684/2003 (BRASIL, 2009i) e, a norma referida em seu artigo 9º, que fica suspensa a pretensão punitiva nos crimes previstos no art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c), no período em que a pessoa jurídica relacionada com os agentes dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.


Por fim, estabelece o art. 168-A, § 3º (BRASIL, 2009c) que, mesmo antes do oferecimento da denúncia e após o início da ação fiscal, pode o juiz deixar de aplicar a pena ou impor somente a multa, desde que conforme o caput do mesmo parágrafo, o autor tenha bons antecedentes e seja primário e, o agente tenha efetuado o pagamento do débito bem como seus acessórios.


É necessário dizer que a norma do art. 168-A do CP (BRASIL, 2009c) representa uma norma penal em branco, pois que o Código Penal não fala quais os prazos legais são impostos para o recolhimento das contribuições sociais, sendo necessário recorrer à Lei n. 8.212/91 (BRASIL, 2009e) e ao Decreto 3.048/90 (BRASIL, 2009j), para se aferir quais os prazos do devido recolhimento.


Dessa forma, analisamos os principais pontos específicos trazidos pela Lei n. 9.983/00 (BRASIL, 2009f), que acrescentou uma letra ao art.168 do CP (BRASIL, 2009c), tratando o novo art. 168-A da apropriação indébita previdenciária, uma vez que as leis anteriores se mostraram deficientes na regulamentação penal do delito.


Assim, tendo visto os preceitos iniciais básicos pertinentes à primeira parte desta obra, trataremos, a posteriori, de outros objetos de nosso estudo, qual seja, a culpabilidade e a inexigibilidade de conduta diversa, para que possamos alcançar e entender melhor o tema central do nosso curso: “A inexigibilidade de Conduta Diversa nos Crimes Contra a Ordem Previdenciária – art.168-A CP”.


2 A TEORIA DA INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NO DIREITO PENAL


É incontroverso na doutrina o raciocínio de que o instituto penal denominado de inexigibilidade de conduta diversa está intimamente relacionado com o desenvolvimento dogmático da culpabilidade, vez que seu conceito está atrelado à atual função da pena no Estado Democrático de Direito.


Destarte, o Direito Penal passou grandes períodos históricos de transformações de sua dogmática, antes de chegar ao estágio no qual se encontra hodiernamente. Assim, a culpabilidade e as formas de exculpação da mesma, como a inexigibilidade de conduta diversa, por exemplo, mesmo frente a fatos jurídicos puníveis, devido às circunstâncias que cercara o agente, é fruto de um Direito Penal moderno.


Indubitável também é o fato de que o desenvolvimento do Estado está intimamente ligado ao desenvolvimento da concepção de pena, ou seja, a depender do modelo socioeconômico adotado pelo Estado a pena terá função social diferente.


Em vários momentos da história, sem divergência doutrinária, o direito de punir esteve ligado ao modelo socioeconômico do Estado analisado em suas diferentes fases históricas, que são as fases da vingança privada, vingança divina e vingança pública. Nesses vários momentos de postura estatal como portador do jus puniendi a pena também teve suas várias concepções.


Tido como mal necessário, a pena e seu entendimento foram alvos de várias teorias, passando desde o conceito clássico de delito até chegar ao atual conceito finalista adotado pelo Código Penal nacional.


Assim, o elemento culpabilidade, como um dos elementos do conceito de delito, se transformou ao longo dos séculos até chegar num patamar que não mais se concebe um formalismo rígido de aplicação do Direito Penal, transformando a inexigibilidade de conduta diversa na exteriorização da humanização do jus puniendi pertencente ao Estado, de modo que, suprimindo a objetividade do Direito Penal na aplicação da pena, ratifica a culpabilidade como juízo de reprovação pessoal (que recai sobre o autor do fato).


2.1. Culpabilidade: Significado e Conceito no Direito Penal


Como bem preleciona Bitencourt (2006, p.256), a atual concepção tripartida do delito, realizada por Luden em meados do século XIX, posteriormente sistematizada por Von Liszt e Beling, tido como fato típico, antijurídico e culpável, é produto da mais recente doutrina, já que no passado, conhecia-se o Direito sob a óptica de dois pilares: imputação ao fato e imputação de direito.


Cada elemento da teoria do delito, a depender da época de sua epistemologia, possuía uma acepção diferente, pois que vários estudiosos desenvolveram suas próprias teorias acerca do tema formando opiniões progressistas e atuais, à época, sobre o tema.


As primeiras escolas de Direito Penal se esforçaram para chegar a uma teoria realmente adequada para tratar dos delitos, imbuídas pela necessidade de se humanizar a pena e aplicá-la de modo proporcional.


Dessa maneira, dentro dos vários períodos do Direito Penal, vários foram os conceitos elaborados acerca do delito. Pertinente é a lição de Bitencourt (2006, p.256)


“Foi Ihering, em 1867, que desenvolveu o conceito de antijuridicidade objetiva para o Direito Civil, mas a adequação desse instituto para o Direito Penal foi obra de Liszt e Beling, com o abandono da antiga teoria da imputação. A elaboração dos primeiros contornos do conceito de culpabilidade coube a Merkel, que conseguiu reunir dolo e culpa sob o conceito de determinação de vontade contrária ao dever. A tipicidade foi o último predicado que se somou na construção da forma quadripartida do conceito de delito, permitindo o Beling, seu autor, formular a seguinte definição: “delito é a ação típica, antijurídica, culpável, submetida a uma cominação penal adequada e ajustada às condições da dita penalidade”. (grifos no original)


Analisando o fragmento de texto supracitado, é necessário clarificar alguns aspectos, para que não haja confusão na exegese do mesmo. Desse modo, observe que quando o autor fala da acepção quadripartida do delito, deve-se ter em mente que quer o mesmo utilizar os elementos da tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade como predicados da ação.


Outra observação sobre o referido texto é que a definição de crime nele apresentada é fruto da elaboração das teorias alemãs, construídas na segunda metade do século XIX. Nesse ínterim, temos o atual conceito de crime como ação típica, antijurídica e culpável, ou seja, em nada mudou o conceito. O que mudou de lá para cá foi a forma de como esses elementos são encarados na nova perspectiva do Direito Penal.


Porém, devemos notar, como bem ensina Greco (2009, p.142), que nosso Código Penal não nos fornece um conceito de crime, sendo, portanto, o mesmo, um conceito eminentemente jurídico, vez que não existe um conceito de crime fornecido pelo legislador.


A digressão histórica que fora feita é necessária para entendermos sobre o conceito e significado acerca da culpabilidade como um dos elementos de Direito Penal, já que não há maiores divergências doutrinárias sobre a tipicidade, como sendo juízo de adequação do fato humano à norma de Direito, bem como à antijuridicidade como sendo juízo de contrariedade da conduta humana ao Direito.


Como dito anteriormente, os elementos do conceito de crime passaram por grandes transformações, exalando o que as teorias formuladas pelos estudiosos do Direito Penal defendiam, e, diante das várias transformações o modo de aplicá-las também se transformavam.


No que concerne ao desenvolvimento teórico acerca do elemento da culpabilidade, salutar é a lição de Brandão (2008, p.200)


“O conceito de culpabilidade passou por várias fases. Em que pese sabermos que só no início deste século, com Reinhard Frank, construiu-se um conceito científico de culpabilidade, os estudos anteriores a ele já identificavam as espécies de culpabilidade, sem, contudo, “conseguir fixar um conceito comum às duas espécies”. (grifos no original)


 O que o autor do texto supratranscrito quer dizer é que mesmo antes de ser formulado o conceito sobre a culpabilidade e suas características, outros autores já haviam tratado do tema, como fora dito anteriormente em nossos estudos, como Merkel, por exemplo.


No que tange ao conceito de culpabilidade, nos ensina Brunoni (2008, p.33) que


“O significado dogmático atribuído ao princípio da culpabilidade implica o reconhecimento de que não cabe imposição de pena alguma se não concorre culpabilidade no autor, e de que a pena não pode exceder a medida da culpabilidade: a culpabilidade constitui o fenômeno e o limite da pena.”


Nesse mesmo sentido é a lição de Brandão (2008, p.201)


A culpabilidade é um juízo de reprovação pessoal, feito a um autor de um fato típico e antijurídico, porque, podendo se comportar conforme o Direito, o autor do referido fato, optou livremente por se comportar contrário ao Direito.


Quando se diz que a culpabilidade é um juízo de reprovação pessoal, diz-se que a mesma é um juízo que recai sobre a pessoa. Por isso, diz-se que a culpabilidade é o elemento mais importante do crime, porque o Direito Penal há muito abandonou a responsabilidade pelo resultado, ou responsabilidade objetiva, para debruçar-se sobre a responsabilidade pessoal.”


Algumas considerações devem ser feitas acerca dos dois entendimentos, pois mesmo que se mostrem no mesmo sentido, ou seja, congruentes à ideia de culpabilidade, revelam elementos diferentes; a culpabilidade como princípio de direito Penal e a culpabilidade como fruto do Direito Penal Subjetivo.


Nessa óptica, a culpabilidade como princípio de Direito Penal revela o ensinamento de Brunoni, passado ao leitor no início das considerações acerca do tema, ou seja, o princípio da culpabilidade implica no reconhecimento de que não cabe imposição de pena alguma se não concorrer culpabilidade no autor.


Na lição de Silva (2006, p.24) “Os princípios são, portanto, mandamentos jurídicos primaciais e fundamentais, compostos de valores da cultura sociojurídica da sociedade, que servem como substrato às outras normas jurídicas quando aplicadas na solução de casos concretos”.


Desse modo, revela-se a importância do Princípio da Culpabilidade no atual manuseio Direito Penal como instrumento de repressão e atuação do jus puniendi, já que no Estado Democrático de Direito deve prevalecer a humanização do Direito, ratificando a dignidade da pessoa humana como fundamento do mesmo.


Nesse sentido, o princípio da culpabilidade tem como escopo garantir a proporcionalidade e a racionalidade do dever estatal de punir, restando seguro a finalidade da pena como resposta proporcional ao fato delituoso cometido por determinado autor.


Ademais, a culpabilidade como fruto do Direito Penal Subjetivo significa dizer que não mais existe a responsabilidade penal objetiva no sistema penal, em que não se fazia nenhuma indagação sobre os motivos que levaram o agente a cometer o delito, mas somente interessava o resultado de dano (BRANDÃO, 2008, P.201).


A responsabilidade subjetiva, consagrada o princípio da culpabilidade, que por sua vez requer justamente o contrário; para que determinado resultado seja atribuído ao agente é necessário que sua conduta tenha sido dolosa ou culposa. Assim, mostra-se o princípio da culpabilidade como sendo o elemento mais importante da estrutura dogmática do delito.


Quanto ao conceito de culpabilidade, ensina Brandão (2008, p.202) que nem sempre foi assim, ou melhor, que quanto ao conceito de culpabilidade não há que se falar em unanimidade doutrinária. Vejamos


“Para Aftalión, o conceito de culpabilidade é um conceito impotente […]. Para o filósofo-penalista argentino, a culpabilidade deve ser conectada ao conceito de perigosidade, posto que, quando não há perigosidade, não há reprovabilidade.[…] Para Maurach, de outro lado, a culpabilidade está inserida em uma categoria maior, que é a atributividade. Para o professor de Munique, como a atividade do juiz penal é dupla, ou seja, aplicar a pena e aplicar a medida de segurança, deve-se reunir os dois conceitos para que a culpabilidade e a perigosidade estejam submetidas a um conceito maior; à ação culpável imputar-se-ia uma pena, e à ação perigosa de um inimputável se imputaria uma medida de segurança. “Ambas reações pressupõem que a ação tipicamente antijurídica possa ser atribuída ao sujeito como obra de sua vontade”. (grifos no original) 


Não se pode olvidar que, realmente, o conceito de culpabilidade tem um sentido muito amplo no campo das relações penais, e, por que não dizer, sociais, todavia, o conceito de culpabilidade, sobre o qual discutimos refere-se a um dos elementos do conceito de crime. Desse modo, não vemos como salutar discutir o tema sob a óptica do Direito Penal lato sensu, ou seja, em sentido amplo.


A culpabilidade, como um dos elementos que compõem o conceito de crime, é a reprovabilidade pessoal da conduta ilícita. É um juízo de reprovação que recai sobre o autor do fato, que, tendo a possibilidade de agir conforme o Direito age de forma contrária a ele.


É nesse liame que a culpabilidade se mostra como o mais importante elemento do conceito de delito, pois que garante ao agente criminoso a proporcionalidade da pena, afastando-se assim a ideia de culpabilidade como pressuposto da pena, como defende alguns doutrinadores.


A inclusão da culpabilidade no conceito analítico de crime tem como objetivo afastar do Direito Penal, a responsabilidade objetiva (expurgada do Direito Penal contemporâneo), já que a transportar para fora do conceito de crime, colocando-a como mero pressuposto da pena, seria não fazer o juízo de reprovação sobre o autor no momento da ação.


Nesse sentido são as palavras de Nucci (2007, p.116-117)


“Assim, a conduta, sob o prisma finalista, é a ação ou omissão voluntária e consciente, que se volta a uma finalidade. Ao transferir o dolo para a conduta típica, o finalismo despiu-o da consciência de ilicitude (tornando-a potencial), que continuou fixada na culpabilidade. […] O importante é esclarecer que a adoção da teoria tripartida é a mais aceita, dentre causalistas, finalistas e adeptos da teoria social da ação. Não se pode acolher uma das concepções bipartidas, que refere ser o delito apenas um fato típico e antijurídico, simplificando em demais a culpabilidade e colocado-a como mero pressuposto da pena”.


Porém, em sentido contrário, há uma parte da doutrina penal que, embora minoritária, expressa suas ideias sob o prisma da culpabilidade como pressuposto da pena, por entenderem que o Código Penal pátrio exclui a culpabilidade do conceito de crime justamente porque retirou do próprio conceito de crime os elementos psicológicos.


Vejamos o que diz Dotti (2002, p.335-336) ao entender que a culpabilidade é mero pressuposto da pena.


“A persistência em “fazer” da culpabilidade um “elemento” do conceito de crime revela o efeito da antiga compreensão quando se procurava separar antijuridicidade e culpabilidade mediante o critério objetivo-subjetivo. […] A proposição de que a culpabilidade é pressuposto da pena e não um “elemento” do delito, encontra ressonância em nosso ordenamento jurídico positivo, quando o código trata de algumas causas de isenção de pena.” (grifos no original).


Nesse mesmo sentido é a posição tomada por Capez (2001, p.273)


Verifica-se, em primeiro lugar, se o fato é típico ou não, em seguida, em caso de afirmativo, a sua ilicitude; só a partir de então, constatada a prática de um delito (fato típico e ilícito), é que se passa ao exame da possibilidade de responsabilização do autor.


Na culpabilidade afere-se apenas se o agente deve ou não responder pelo crime cometido. Em hipótese alguma exclusão do dolo e da culpa ou da ilicitude nessa fase, uma vez que tais elementos já foram analisados nas precedentes. Por essa razão, culpabilidade nada tem que ver com o crime, não podendo ser qualificada como seu elemento.”


Porém, entendemos ser a culpabilidade um elemento do crime e não um mero pressuposto de aplicação da pena, pois se assim o fosse, reduziríamos o Direito Penal a um pragmatismo excessivo, retirando a essência de sua legitimidade, porque se alguém cometesse um ilícito sem ter ideia de que o que fazia era ilícito, seria considerado um criminoso, aplicando a culpabilidade como pressuposto da pena, mesmo sem ter havido crime, ou havendo, bastando apenas a conduta e o resultado, pilares, sustentados à época da responsabilidade objetiva.


Alhures, tendo esclarecido o fundamento dogmático da culpabilidade como elemento do crime, passaremos a entender como o instituto evoluiu no decorrer dos anos, até chegar ao patamar no qual se encontra hoje, através do estudo das teorias acerca da culpabilidade.


Sabemos que no Direito Penal da antiguidade, a responsabilidade penal decorria da chamada responsabilidade objetiva, ou seja, da aplicação da pena para aos autores de simples fatos lesivos, sem ao menos se indagar da culpa do mesmo. E foi a partir do desenvolvimento do conceito de culpa que se desenvolveu novos elementos até o conhecimento do dolo.


  Assevera Bitencourt (2006, p.416)que, quando as teorias desenvolvidas acerca da imputação chegaram no patamar de apreciação subjetiva da conduta do autor do fato, chegou-se também à ideia de culpabilidade, à medida em que um determinado sujeito, por sua própria conduta, age, livremente, de forma contrária à lei. A partir de então, surgiram várias teorias sobre a culpabilidade para explicar a conduta de determinados sujeitos.


2.2. Teorias da Culpabilidade


A primeira teoria conhecida na doutrina é a teoria psicológica da culpabilidade. Segundo Zafaroni e Pierangeli (2002,p.603), a culpabilidade vista sob a óptica da teoria psicológica, era tida como a relação psicológica que havia entre a conduta e o resultado, sem qualquer elemento normativo, mas apenas com uma pura descrição de uma relação.


Porém tal teoria se mostrou falha, na medida em que não conseguiu explicar outros fenômenos delituosos, como a culpa inconsciente, como mostra Veloso (2008, p.133)


Essa teoria não respondeu a todas as indagações a respeito das relações psicológicas do evento delituoso com o seu autor, como defende Jescheck e Weigend (2002, p.578), segundo o qual tal concepção psicológica logo se mostrou insuficiente, porque não dava respostas às questões de quais relações psíquicas deviam considerar-se relevantes jurídico-penalmente e porque sua presença fundamenta a culpabilidade e sua ausência a exclui.


Assim, não se poderia explicar por que, ainda quando o autor atuou dolosamente e produziu uma relação psíquica com o resultado, deveria negar-se-lhe sua culpabilidade se ele é um doente mental ou agiu em estado de necessidade exculpante, nem se podia fundar o conteúdo da culpabilidade da culpa inconsciente na concepção psicológica, já que nela falta precisamente toda a relação psíquica com o resultado.”


Assim, por apresentar-se insuficiente para a dogmática penal, já que se a culpabilidade se esgotasse num mero nexo psicológico, assim, também, o inimputável seria passível de do juízo de culpabilidade, portanto, levaria em conta que tal agente seria capaz de agir com vontade, a doutrina desenvolveu nova teoria sobre o instituto, denominada de teoria psicológico-normativa da culpabilidade.


  A partir dessa teoria, a culpabilidade recebe mais uma característica, ou melhor, mais um atributo, passando, o valor, a ingressar em seu âmbito, de modo que dolo e culpa deveriam ser valorados normativamente. Nesse diapasão, passou-se a censurar o fato, se, de acordo com as circunstâncias se pudesse exigir do autor do fato, conduta de acordo com o Direito.


Nesse ínterim, assinala Brunoni (2008, p.143-145)


“O primeiro passo para uma concepção normativa de culpabilidade foi dado por Frank, que concebeu por primeira vez a culpabilidade como “reprovabilidade” do fato. A culpabilidade assim ententida se caracteriza por um juízo de censura ao sujeito que realizou um injusto, que consiste em analisar até que ponto e em que condições sua atitude interior é reprovável por ter-se oposto ao dever. Constitui, pois, um juízo valorativo expressado na fórmula “reprovabilidade pelo ato praticado”. (grifos no original).


Dessa forma, conforme a teoria psicológico-normativa da culpabilidade, entendia-se, a culpabilidade sobre o autor do fato no cometimento do mesmo, ou seja, censurava-se o fato em virtude de o individuo ter podido conhecer a ilicitude de sua vontade. Na teoria complexa (psicológico-normativa), alguns elementos da culpabilidade eram consideravelmente, importantes, na medida em que, sem os mesmos não se poderia aplicar determinada pena de forma razoável ou proporcional.


Assinala Brandão (2008, p.207) que “É pela relevância dada à consciência da antijuridicidade que a culpabilidade deixou de ser um puro nexo psicológico para ser um juízo normativo”. O que se pretende dizer com isso é que além de dolo e culpa, há outros elementos que devem ser considerados, tais como a reprovabilidade sobre o fato, ou mesmo a consciência da ilicitude da conduta, ou, ainda, as circunstâncias do fato.


Esses elementos foram frutos de aperfeiçoamento da teoria psicológico-normativa da culpabilidade, feito por outros grandes doutrinadores do Direito Penal, pois, conforme afirma Brunoni (2008, p.144-147), Frank, concebeu a culpabilidade como reprovabilidade, Goldschmidt, por sua vez, analisou a culpabilidade sob o prisma da contrariedade ao dever, Freudenthal, encontrou na exigibilidade um elemento central para formular um juízo de reprovabilidade. Já Merkel, tem a culpabilidade como efeito antijurídico, que se imputa ao agente, elaborando-se um juízo de valor sobre o autor do ato antijurídico, e, por último, Mezger, defendendo ser a culpabilidade o conjunto de requisitos para que se possa fazer um juízo de reprovabilidade sobre o autor da conduta antijurídica.


Contudo, essa teoria também se mostrou insuficiente, porque havia casos em que faltava um elementos intrínsecos à culpabilidade para se fazer um juízo de reprovação do fato, e, faltando um desses elementos o auto do fato poderia ser considerado inculpável. Corrobora com esta tese, Bitencourt (2006, p.424)


“Com a adoção de um dolo híbrido – ao mesmo tempo psicológico e normativo -, cria-se um problema para o Direito Penal, prontamente detectado por Mezger, a respeito da punibilidade do criminoso habitual ou por tendência. Esse criminoso, em virtude do seu meio social, não tinha essa consciência da ilicitude, necessária à configuração do dolo, porque, de regra, se criava e se desenvolvia em um meio em que determinadas condutas ilícitas eram normais, corretas, eram esperadas pelo seu grupo social”. (grifos no original).


Controvérsias como essas citadas no fragmento de texto supracitado, foram supridas pelo finalismo adotado por Welzel, porque faltando um elemento para configuração da culpabilidade não haveria reprovabilidade do autor do fato, já que desconhecia a ilicitude do fato, por, justamente, o mesmo ser aceito e tido como correto em seu determinado grupo social.


Diante dessas dicotomias, surge a teoria normativa pura da culpabilidade, idealizada por Welzel, que despiu-a, eliminando seus elementos psicológicos passando o dolo e a culpa para a ação, tendo a culpabilidade autêntica aparência normativa, uma vez que a culpabilidade, como reprovabilidade passa a ter um conceito puramente normativo, já que os elementos anímicos, ou psicológicos foram retirados da mesma para integrar o tipo subjetivo, a ação.


Nesse sentido, nos ensina Brunoni (2008, p.148) que “[…] a transferência de dolo e culpa para a tipicidade, a culpabilidade adquire autêntica feição normativa, pois deixa de compreender elementos anímicos”. Corroboram com a tese outros doutrinadores do Direito Penal, como é o caso de Henkel (2005, p.45), que, nesse contexto, assevera


“Conhecido é que essa abordagem simples, mas ao mesmo tempo um problema revolucionário, trouxe como conseqüência, um intenso debate, que o conceito psicológico da culpabilidade, até então dominante foi substituído pela teoria da culpabilidade, resultado da seguinte fórmula: culpabilidade penal não consiste, em qualquer caso, do esgotamento da relação psicológica do autor do fato (saber ou não saber; querer ou não querer), mas que, na sua essência, representa um fenômeno normativo; reside no julgamento, cujo conteúdo é designado como inconveniente ao direito ou reprovabilidade. Agora é possível chegar à conclusão de que a inexigibilidade reside na exigibilidade como seu elemento reverso.”


A culpabilidade, como dito, não contém nenhum elemento psicológico, mas somente elementos normativos: é formada pela potencial consciência da antijuridicidade, da imputabilidade e da exigibilidade de outra conduta, na medida em que a culpabilidade é tida como juízo de reprovação sobre o autor do fato, por ter esse agido de forma contrária ao direito (BRUNONI, 2008, p.148).


Nota-se, que o que fez Hans Welzel não foi o esvaziamento do conceito de culpabilidade, como uma parte da doutrina, minoritária, acredita. Malgrado, haja retirado da culpabilidade dolo e culpa colocando-os na ação, a culpabilidade passa por uma reformulação feita pelo mesmo autor supracitado, já que passa a ser puramente normativa, haja vista que os elementos psicológicos da culpabilidade são extintos para dar lugar aos elementos normativos.


Nesse liame de entendimento acerca do instituto penal da culpabilidade, assinala, com propriedade, Brunoni (2008, p.1489-149)


“Para os finalistas, pois, a culpabilidade é compreendida como um “puro” juízo de reprovação sobre o autor, por não haver este se omitido da ação antijurídica ainda quando podia fazê-lo. Dolo, situado no tipo, é concebido como objeto do juízo de censura da culpabilidade. Portanto, com a teoria normativa pura a estrutura da culpabilidade sofre uma redefinição nos seguintes termos: a) reprovabilidade da conduta típica e antijurídica; b)imputabilidade ou capacidade de culpabilidade (de entender e querer); c)potencial conhecimento do injusto; d) exigibilidade de comportamento ajustado ao Direito (de conduta diversa). A culpabilidade concebida como reprovabilidade, nos termos propostos pela teoria normativa pura, é aceita pela doutrina dominante […].” (grifos no original).


Tendo reformulado o conceito de culpabilidade, Hans Welzel, como adepto da teoria finalista da ação, transportou dolo e culpa para o primeiro elemento do conceito quadripartite de crime, a ação, e, incorporou à culpabilidade os elementos da imputabilidade, o potencial conhecimento do injusto e a exigibilidade de conduta diversa.


Contudo, entre os elementos da culpabilidade, nos irá interessar a análise de apenas um: a (in) exigibilidade de conduta diversa (conduta conforme o Direito), já que, se observada sua ausência em determinados casos e circunstâncias, será o autor do fato inculpável, porque não fora possível exigir do mesmo, nas circunstâncias em que se encontrava, uma conduta conforme o Direito.


2.3. Evolução Doutrinária da (in) Exigibilidade de Conduta Diversa no Direito Penal


Conforme nos ensina Welzel (WELZEL, 1997, p.210 apud BRANDÃO, 2008, p. 230), quando o autor imputável tem consciência da antijuridicidade da ação, verifica-se estabelecida a culpabilidade em sua materialidade, porém isso não significa que o ordenamento jurídico fará juízo de reprovabilidade na culpabilidade.


Assim, não constatada a configuração dos elementos da culpabilidade, como já estudado, a imputabilidade, o potencial conhecimento da antijuridicidade e a exigibilidade de outra conduta, poderá o autor ser absolvido de pena, por exculpação, haja vista a não configuração da culpabilidade.


Desse modo, quando estabelecida materialmente a culpabilidade, verificar-se-á se era possível exigir do autor do fato, comportamento conforme o Direito, ou seja, se naquelas circunstâncias poderia o autor, além do dever de se comportar conforme o Direito, poderia ele optar por se comportar conforme o Direito (relação entre dever e poder).


A ideia de exigibilidade de outra conduta na teoria da culpabilidade foi desenvolvida no século XIX, através da jurisprudência do Tribunal do Império da Alemanha (o Reichsgerich). A primeira decisão que adotou a tese foi dada no caso Leinenfänger (o cavalo que não obedece às rédeas) (SILVA, 2007, P.24).


Nesse sentido, assinala Azuma (2007, p. 80)


“Conta-se que, um senhor locador de carruagens ordenou ao cocheiro que arreasse dois cavalos para que pudesse sair. Ocorre que este cavalo possuía um defeito – prendia as rédeas e o cabresto com o rabo contra o corpo. Esse fato era conhecido pelo empregador e pelo patrão. O cocheiro tentou resistir à ordem do patrão, argumentando sobre a possibilidade de um acidente. Em vão. O patrão ameaçou despedi-lo se a ordem não fosse cumprida, fato que fez o cocheiro seguir o comando do proprietário do animal. No caminho da viagem, o animal prendeu as rédeas vindo a desbocar. O patrão perdeu a direção e atropelou um transeunte, ocasionado-lhe lesões. O empregado foi acusado e respondeu a processo por lesões corporais culposas. O tribunal alemão absolveu o cocheiro sob o fundamento de que não seria justo, todavia, exigir-se dele outro proceder. Sua recusa em sair com o animal importaria a perda do emprego, logo, a prática da ação não foi culposa, em razão da inexigibilidade de comportamento conforme o Direito, porque, na situação coativa em que se encontrava, estava obrigado a obedecer ao patrão.”


Analisando o caso supracitado, ratificamos o que temos estudado até o presente momento; a ideia de exigibilidade conduta diversa é ligada à ideia de liberdade, uma vez que se reprova o sujeito, que, podendo agir conforme o Direito, dentro de determinadas circunstâncias, age de forma contrária a ele. Portanto, tendo agido contrário o Direito, quando poderia e deveria ter agido conforme o mesmo, far-se-á o juízo de reprovabilidade sobre o autor do fato, verificando-se sua culpabilidade.


Entretanto, no caso em epígrafe, o autor do fato, o cocheiro, deveria ter agido conforme o Direito, mas, em virtude das circunstâncias, que tolhem a liberdade de agir conforme a norma, não pôde, o mesmo ter agido conforme o Direito, por ter sido ameaçado por seu patrão de ser demitido, o que tornaria impossível o sustento de sua família. É sobre esse raciocínio que se assenta a tese da inexigibilidade de conduta diversa.


A partir do estudo do caso de leinenfänger, a doutrina alemã desenvolveu, no início do século XX, através de Frank e a inovadora teoria normativa pura da culpabilidade, o elemento da exigibilidade de conduta diversa como pressuposto da culpabilidade (BRANDÃO, 2008, p.231).


Azuma (2007, p. 79) leciona que em 1913 Goldschimdt destinguiu a norma jurídica de norma de dever, podendo então um fato típico e antijurídico não ser culpável, de modo que o espaço para a aplicação da teoria da exigibilidade de outra conduta ganharia maior campo de atuação e pesquisa na dogmática penal da época


Contudo, conforme nos ensina Silva (2007, p.25), foi Freudenthal quem propôs a exigibilidade de conduta diversa como fundamento principal da culpabilidade, através do estudo das teorias de Frank e da análise da jurisprudência do Tribunal do Império Alemão, de modo que a reprovabilidade da conduta do autor reside no poder dever do agente de atuar de modo diferente da prática criminosa.


Ainda, segundo os ensinamentos de Veloso (2008, p.172), vemos que foi Freudenthal quem postulou a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa nas duas formas de culpabilidade até então conhecidas, o dolo e a culpa, já que até aquele momento doutrina e jurisprudência a aceitavam apenas nos casos de delitos em sua forma culposa, enquanto que na forma dolosa se aceitava apenas a tese do estado de necessidade.


Assim, conforme analisamos, quando ausente a possibilidade do autor de agir conforme o Direito, restará também ausente a reprovabilidade, e, portanto não haverá culpabilidade, logo, se as circunstâncias que rodeavam o autor do fato eram de tamanha magnitude, que qualquer pessoa se comportaria igualmente ao autor do fato, este não será considerado culpado, na medida em que, deveria, mas não poderia ter agido conforme o Direito, ou seja, não poderia ser exigido do mesmo conduta diversa da que fora tomada.


Destarte, afirma Henkel (2005, p.60) que os mesmos tribunais alemães que assentaram a tese da inexigibilidade de outra conduta tiveram incontáveis decisões em sentido contrário, por não estar o instituto legalmente previsto nas legislações, sendo, portanto, inadmissível sua aplicação, até então.


Nesse diapasão, entendendo que será punível o autor do fato que devia e podia agir em conformidade com o Direito, mas age de forma contrária constituindo o delito, devemos ter em mente que há possibilidades desse mesmo autor não ser punido, visto que nas circunstâncias em que se encontrava não era exigível comportamento diverso do realizado, na medida em que quando se carece de qualquer dos elementos da culpabilidade, como vimos, ela é excluída.


É a partir desse raciocínio que se há firmada a tese da inexigibilidade de conduta diversa. Assim, quando o agente deveria agir conforme o Direito, mas em determinadas circunstâncias age de modo contrário, pois não podia agir em congruência com o Direito, há a inexigibilidade de outra conduta.


A exigibilidade de conduta, conforme o Direito, como causa geral de inculpabilidade, conforme a entendemos hodiernamente, fora alvo de várias decisões contrárias, haja vista que alguns juristas e tribunais assim não a entendiam, e o seu contrário como causa supralegal de excludente da culpabilidade, pois não havia previsão legal (HENKEL, 2005, p.58)


Em sentido contrário ao entendimento da inexigibilidade de conduta diversa como causa geral de exculpação se mostra Jescheck, por entender que o instituto seria um princípio regulativo, e não causa de exculpação supralegal, alegando, ainda, que o reconhecimento de tal tese implicaria perigos a igualdade de justiça (JESCHECK, 1981, p.687 apud AZUMA, 2007, p.83).


Porém, entendemos que a teoria da inexigibilidade de conduta diversa é a ratificação de um sistema penal justo e que atende aos anseios da justiça social, humanizando a prática punitiva à realidade dos fatos da vida, porque o Direito, como ciência social, não deve se mostrar estático. Nesse sentido é o magistério de Yarochewsky (2000, p.39-40)


“A grande questão para o reconhecimento da inexigibilidade de outra conduta como causa de exclusão da culpabilidade, no caso concreto, é saber se o agente podia ou não podia agir de outro modo, se lhe era ou não exigido um comportamento conforme o Direito. O Direito Penal moderno não pode e não deve se prender ao formalismo demasiado, a uma rigidez de conceitos que, muitas vezes, afasta o homem da realidade. […] Hoje, apesar das opiniões em contrário, não é mais possível no Direito Penal, seja na doutrina, na jurisprudência, ou no Direito positivo, deixar de reconhecer e admitir a inexigibilidade de outra conduta como causa de exclusão da culpabilidade.”


A digressão histórica feita a respeito da construção da tese da inexigibilidade de outra conduta é indubitavelmente necessária, já que sem que haja esse entendimento não haveria como se desenvolver um raciocínio lógico do qual resulta a inexigibilidade de conduta diversa como causa de inculpabilidade. Ademais, a partir do desenvolvimento dos estudos de Freudenthal é que a inexigibilidade de outra conduta revela seus elementos cruciais, como ato volitivo, de liberdade, sobre o qual poderá recair a reprovabilidade.


Nesse Liame, entendemos ser impossível para o Direito Penal, ou mesmo ao Direito como um todo, prever todas as situações sobre as quais deve recair suas normas. Portanto, mais uma vez, reiteramos a ideia de que, como adeptos da concepção finalista do delito, a inexigibilidade de conduta diversa deve ser entendida como causa geral e supralegal de exclusão da culpabilidade.


Dessa maneira, Brandão (2008, p. 232) cita a jurisprudência do Superior tribunal de Justiça como acolhedora da tese da inexigibilidade de conduta diversa, como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, cuja admissibilidade no Direito brasileiro já não pode ser negada.


Portanto, como bem afirma Correa (2004, p.61), a inexigibilidade de conduta diversa assume a posição de princípio informador, determinando a atipicidade das condutas cuja realização exceda as possibilidades do homem médio.


Para que seja entendida como causa geral e supralegal de exclusão da culpabilidade, é necessário estudarmos os pressupostos e características do instituto em análise,  com escopo de demonstrarmos sua aplicabilidade.


2.4. Pressupostos e características da Inexigibilidade de Conduta Diversa


Diante das considerações feitas até aqui, chegamos à conclusão de que alguns elementos são intrínsecos à inexigibilidade de conduta diversa, tais como, a liberdade, a reprovabilidade e a relação entre dever e poder do agente imputável do fato quando inserido num contexto criminal de determinadas circunstâncias.


Nesse ínterim, temos conforme assinala Brandão (2008, p.231), que “A ideia de exigibilidade de outra conduta é ligada a ideia de liberdade, pois se reprova pessoalmente o sujeito que, podendo se comportar conforme o Direito optou livremente por se comportar contrário ao Direito”.


Contudo, no tocante à inexigibilidade conduta diversa temos que essa liberdade de se comportar conforme o Direito é tolhida pelas circunstâncias de determinadas situações, como bem mencionamos, no caso da cavalo que não obedecia às rédeas.


Quanto à relação de entre dever e poder, observa Yarochewsky (2000, p.39), que esta sofrerá juízo de reprovabilidade o autor imputável de certo fato, que podia e devia agir conforme o Direito. De tal modo, de maneira contrária, o autor imputável que devia agir conforme o Direito, mas, que diante das circunstâncias que ultrapassam os limites do homem médio, não podia agir conforme esse Direito será a ele aplicada a inexigibilidade de conduta diversa.


No que tange à reprovabilidade do autor do fato, Silva (2007, p.26) assevera que “É forçoso, pois, reconhecer que a configuração do juízo de reprovabilidade exige como requisito imprescindível a possibilidade de o agente atuar de forma diferente do ato antijurídico, quando devia e podia agir conforme o Direito”.


Entretanto não se pode reprovar a conduta do autor do fato, se em torno da execução, estivesse o mesmo rodeado de determinadas circunstâncias que, de tal modo, qualquer um se comportaria conforme o autor, restando ausente o fundamento da culpabilidade, pois não podia o mesmo agir de modo contrário à norma.


Nessa perspectiva é o magistério de Henkel (2005, p.123)


“Na verdade, esta é uma causa da inculpabilidade pura, isto é, a negação de culpa por falta de uma formação jurídica defeituosa, por falta de censura sobre o autor. Está ausente o conteúdo normativo da culpabilidade, a reprovabiliade.”


A exigibilidade de conduta diversa deve ser entendida como pressuposto dos elementos da imputabilidade e do potencial conhecimento da ilicitude do fato, já que, sem que haja o juízo de reprovabilidade sobre o autor do fato estará ausente a culpabilidade, e, como vimos, a reprobailidade do fato dependerá se o autor do fato, mesmo devendo agir conforme o Direito age, devido a circunstanciais tais, de modo contrário, aplicando-se a inexigibilidade de conduta diversa.


Um dos pressupostos para que a inexigibilidade de conduta diversa seja aceita e como tese jurídica no Direito Penal é o reconhecimento de que tal tese seja reconhecida como causa geral e supra legal de exclusão da culpabilidade.


Adiantamos ao leitor sermos adeptos da corrente doutrinária que reconhece a inexigibilidade de conduta diversa como causa geral e supra legal que exclui a culpabilidade. Alhures, mostraremos outros entendimentos nesse sentido, como é o caso do magistério de Veloso (2008, p.190)


“A inexigibilidade é uma causa geral de exculpação da culpabilidade aplicável aos fatos não abrangidos pelas causas de exculpação previstas na lei, bastando para isso comprovar que, no caso concreto, o sujeito não pôde atuar conforme a norma, a fim de que seja eximido da responsabilidade penal, sem necessidade de uma previsão legal específica.”


Assim, nesse mesmo sentido é o entendimento de Azuma (2007, p.83)


“A inexigibilidade ocupa a função de fundamento geral de exculpação. É o fundamento do juízo de reprovabilidade. Todos os casos de exculpação em verdade o são porque não se exige um comportamento do sujeito de acordo com a norma.”


Os fragmentos de texto supracitados revelam o que já temos dito de forma contundente, ou seja, confirmam que é preciso reconhecer que existem situações anormais onde não se pode exigir do homem um comportamento conforme o Direito, ainda que não esteja previsto no ordenamento jurídico como causa de exculpação.


Contudo o conceito e natureza jurídica da inexigibilidade de conduta diversa é bem controverso em boa parte da doutrina, pois a depender de como o instituto é entendido receberá o mesmo diferentes ilações.


Para muitos a inexigibilidade de conduta diversa não é entendida como causa geral e supralegal de exclusão da culpabilidade, haja vista que se comportaria como princípio regulador, como já citado nesta obra.


Greco (2009, p. 420) assim define causa supralegal de exclusão da culpabilidade


Causas supralegais de exclusão da culpabilidade são aquelas que, embora não estejam previstas expressamente em algum texto legal, são aplicadas em virtude dos princípios informadores do ordenamento jurídico.


Nossa legislação penal, ao contrário da legislação alemã, não proíbe a utilização do argumento da inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.”


Desse modo, quando o agente não pôde ter agido em conformidade com o Direito nos casos em que esteja rodeado de circunstâncias que qualquer um diante das mesmas agiria, também, de forma contrária restará configurada a inexigibilidade de conduta diversa. Corroborando com esta tese, leciona Silva (2007, p.33).


“Desse modo, a inexigibilidade de outra conduta pode ser entendida como fundamento geral para a configuração de todas as hipóteses de exculpantes, pois quando ausente a capacidade de autodeterminação em conformidade com o Direito, por qualquer causa que seja, haverá a inexigibilidade de conduta diversa e, por conseguinte a inculpabilidade do agente da conduta criminosa praticada. […] Assim, pode-se afirmar que há inexigibilidade de conduta diversa quando ausente qualquer um dos elementos configurantes da culpabilidade (imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa).”


Por ser notadamente impossível que qualquer ordenamento jurídico tenha o condão de prever todas as situações em que irão atuar as normas, ou de prever normas para todas as situações, é necessário dinamizar o Direito. No caso do Direito penal, é necessário humanizar a pena, analisando o caso concreto, pois o Direito Penal deve servir como ultima ratio.


Dessa maneira, há que se afirmar que existem situações de anormalidade, não previstas pelo Direito, em que o sujeito é impedido de atuar conforme o dever-ser normativo, não se exigindo um comportamento conforme a norma. Nesses casos, a anormalidade dos fatos traz a inexigibilidade de outra conduta.


Nesse ínterim, afirma Azuma (2007, p.86)


“Pode ocorrer, ante o caso concreto, de o autor não ter a possibilidade de cumprir seu dever jurídico, em razão da anormalidade da situação. O Direito exige que todo sujeito capaz de culpa, portanto, imputável, realize atos conforme o entendimento do lícito e ilícito que possui. Contudo existem casos, onde não se exige do agente um comportamento conforme o Direito, isso em razão da motivação anormal de sua vontade impelida pelas circunstâncias anormais.”


Assim, a inexigibilidade de conduta diversa se mostra como uma alternativa para o Direito Penal, obstruindo o desenvolvimento de ações e interpretações temerárias das normas incriminadoras, exalando o anseio de justiça social do qual cada um é merecedor, já que às vezes esquecemos que somos seres humanos e semelhantes, ávidos de dignidade.


Contudo, há que se verificar verdadeira parcimônia na aplicação da tese da inexigibilidade de conduta diversa, objetivando evitar a impunidade, já que também há aqueles que, por avidez pecuniária ou qualquer outro motivo, fazem de verdadeiras soluções à justiça a semente da guerra.


Por fim, tendo esclarecido alguns pontos importantes acerca da inexigibilidade de outra conduta, passaremos, a posteriori, a analisar como o instituto é recebido, como meio de prova nos tribunais pátrios e de como a jurisprudência tem se comportado diante da referida tese.


3 A INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES CONTRA A ORDEM PREVIDENCIÁRIA


Tendo sido analisado a estrutura do tipo previsto no art. 168-A do Código Penal (BRASIL, 2009c) e, inserido pela Lei 9.983/2000 (BRASIL, 2009f), bem como as teorias da culpabilidade e seu relevante elemento, do qual nos ocupamos nesse nosso estudo, a inexigibilidade de conduta diversa, passaremos, alhures, ao estudo de como aplicar o referido instituto penal, como causa supralegal de exclusão da culpabilidade no crime de apropriação indébita previdenciária.


Todo esse estudo requer um entendimento do Direito como uma ciência única. O que se quer dizer com isso é que o que fora desenvolvido até aqui é parte do todo, o Direito Penal, o Direito Previdenciário, o Direito Tributário, Direito Constitucional, fazem parte da própria ciência social que é o Direito.


A aplicação da inexigibilidade de conduta diversa no crime de apropriação indébita previdenciária é alvo de críticas na doutrina e jurisprudência penalista. Porém, o que ocorre é a falta do próprio substrato probatório do fato não deixando espaço para a aplicação da inexigibilidade de outra conduta sobre o caso.


O fato do não-recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social pelo empresário, por conta do iminente perigo de falência da própria empresa requer um arcabouço probatório conciso com o escopo de tornar a atividade jurisdicional mais justa possível, protegendo o Estado contra eventual charlatanismo ou protegendo o próprio indivíduo da aplicação da pena de modo excessivo ou mesmo irregular (responsabilidade objetiva).


3.1 A Inexigibilidade de Conduta Diversa: Fundamento e demonstração Probatória


Em muitas circunstâncias da vida se estabelece um conflito de deveres de quem está juridicamente obrigado a cumpri-los. Observamos a inexigibilidade de conduta diversa como resposta a este conflito de deveres.


Ou seja, a inexigibilidade de conduta diversa pode ser demonstrada por meio da análise das circunstâncias sob as quais atuou o agente em comparação com o que reza o ordenamento jurídico, de modo que, tendo sido demonstrada a anormalidade das circunstâncias que impelem o autor do fato à conduta punível, porém, inculpável, haverá demonstrada a imperiosa necessidade de se enveredar pelo campo da inexigibilidade de conduta diversa.


Destarte, é necessário informar a posição majoritária da doutrina sobre a demonstração probatória da inexigibilidade de conduta diversa no crime de apropriação indébita previdenciária, tendo por base as dificuldades financeiras da empresa, forçando o empresária ao não recolhimento do tributo à Previdência Social, por que não basta alegar a tese. Nesse sentido é o que nos diz Baltazar Junior (2008, p.41)


“A prova na matéria é, por excelência, documental (TRF4, AC 2001171070015580/RS, Tadaaqui Hirose, 7ª T., um., 9.12.03). Admite-se, porém, seja ela reforçada através de depoimentos de testemunhas ligadas à empresa, como ex-empregados, contadores; fornecedores ou clientes. Claro está que a prova em questão é complexa, sendo impossível esgotar aqui todo rol de indícios de que poderá se valer o juiz para, de forma sensível, acolher ou rejeitar a tese das dificuldades financeiras, com base no conjunto da prova.”


No caso em tela (não recolhimento das contribuições sociais por conta da imperiosa dificuldade financeira), temos a inexigibilidade de conduta diversa entendida como fundamento geral e exculpante, na medida em que, ausente a autodeterminação em conformidade com o Direito, sendo, portanto, inculpável o agente da conduta criminosa.


Por outro lado, segundo Machado (2002, p. 170), há quem afirme que o contribuinte, diante da situação financeira difícil, não pode deixar de pagar as contribuições sociais arrecadadas e não recolhidas à Previdência Social, de maneira tal que essas circunstâncias geralmente alegadas pela defesa, não têm relevância na configuração do crime.


Entretanto, entendemos que não importa questionar a posição da culpabilidade em relação à estrutura do crime, posto que, seja como for, é preciso notar que existe um grande abismo entre o crime de apropriação indébita previdenciária cometido por aquele que deixa de pagar em razão das dificuldades financeiras que colocam em risco a continuidade da empresa e entre aquele que deixa de pagar por motivo de ganância, apenas.


Repetimos com exaustão que, toda vez que o agente de determinada conduta típica, em razão das circunstâncias anormais, agir sem conformidade com a norma legal, haverá situação de inexigibilidade de conduta diversa.


Indubitavelmente, pode incorrer o leitor na ideia do fato de que todo o sistema previdenciário, leia-se todo o sistema da previdência social, é também mantido por essas contribuições sociais arrecadadas pelos empresários, em sentido amplo, ensejando, portanto, uma dualidade entre a tese de inexigibilidade de conduta diversa nos casos de alegação de dificuldades financeiras e a manutenção do sistema previdenciário. Não obstante, não é essa a finalidade primordial da norma, já que, caso contrário, estaríamos diante de uma inconstitucionalidade, como já estudada por nós nesta obra; a da prisão por dívida.


Existem grandes exemplos do cotidianos, inclusive noticiados pela imprensa internacional, para ilustrar a tese da inexigibilidade de conduta diversa. Segundo o magistério de Azuma (2007, p.118)


“Na tragédia do tsunami, ocorrido no final de dezembro de 2004, uma mãe, com dois filhos nos braços, tendo uma corda ao seu alcance para se segurar e salvar suas vidas teve, contudo, que escolher em deixar um dos filhos, porquanto, não conseguia segurar os dois e a corda ao mesmo tempo, e caso não fizesse a opção por um dos filhos, morreriam os três. A escolha foi de ficar com o mais novo, já que o outro por ser mais velho teria maiores condições de se salvar. Felizmente, seu prognóstico deu certo, e o filho se salvou após a mãe tê-lo soltado.” (grifos no original)


No caso supracitado, observamos o que temos dito veementemente, um sujeito que pratica conduta típica ilícita diante de circunstâncias tais que a qualquer homem médio, ou seja, aquele homem como poder de ponderação mental equilibrada sobre determinados fatos, agiria da mesma forma estamos diante do que chamamos de causa supralegal de exculpação, nesse caso, a inexigibilidade de conduta diversa.


Segundo Silva (2007, p. 38), “A demonstração probatória da inexigibilidade de conduta diversa se faz quando ao processo judicial há circunstâncias ou indícios materiais que demonstram que qualquer pessoa ante a situação geral do caso teria atuado como se comportou o autor da conduta típica.”


Nesse ínterim, quando é possível demonstrar e, no caso da apropriação indébita previdenciária, com as provas que lhe são exigíveis, que, em dadas circunstâncias , ao agente de um fato típico não era possível agir de modo diverso de como atuou, deve-se entender como excluída a culpabilidade por força da inexigibilidade de conduta diversa.


Ainda segundo preleciona Silva (2007, p.39)


“No que tange ao julgamento, incumbe ao juiz pôr-se na situação do agente e analisar sua opção de atuação, com o objetivo de verificar se havia, ou não, a exigibilidade de conduta diversa daquela que foi praticada. Com efeito, através desse método, que Reale Jr. Denomina de processo simpatético mediato, o julgador, apreendendo a situação concreta do agente, suas condições pessoais, julga se seria possível exigir-lhe que omitisse a ação realizada.”


Numa exegese simples, o que podemos extrair do texto acima é que, o julgador, quando diante de certas circunstâncias, entender que ele próprio ou qualquer outra pessoa não poderia atuar de modo diverso, a não ser do mesmo modo que agiu o sujeito, estando, então, ausente a culpabilidade como reprovabilidade social da conduta praticada. Assim, há a inculpabilidade do agente por força da inexigibilidade de conduta diversa daquela que foi praticada pelo agente.


Mais uma vez, no caso de apropriação indébita previdenciária por razões de dificuldades financeiras, ou seja, quando o sujeito ativo deixa de recolher a contribuições arrecadadas de seus empregados para pagar seus salários, credores, contadores, etc., à previdência social, por conta de sérias dificuldades financeiras da empresa, é necessário que essa dificuldade, alegada pela defesa, seja imperiosa; se houver o recolhimento das contribuições à previdência social haverá o fechamento da atividade empresarial.


Corrobora com nosso entendimento Machado (2002, p.171)


“A nosso ver, a não-exigibilidade de outra conduta configura-se sempre que, em situação de crise financeira, a opção pelo uso do dinheiro disponível para o pagamento de empregados e de dívidas outras seja a única forma de manter a empresa em funcionamento, seja uma tentativa sincera de superação da crise, depois da qual a dívida tributária será paga.”


Nesse mesmo sentido, observamos ser a lição de Veloso (2008, p.205)


“Nessa situação de pouca liquidez, os empresários – industriais, comerciantes e profissionais liberais – não possuem outra opção senão a de deixar de recolher as contribuições e os tributos para pagar aos empregados e as obrigações de empréstimos com instituições financeiras, a fim de garantir a sobrevivência da empresa. Acontece uma situação extraordinária de motivação, a impossibilidade de recolher os tributos em detrimento da sobrevivência do negócio, na qual se encontra fortemente diminuída a capacidade de atuar conforme a norma.”


Assim, é por força de circunstâncias adversas e precárias que rodeiam o sujeito ativo, que há de se aplicar a inexigibilidade de conduta diversa no campo da apropriação indébita previdenciária, pois essas determinadas circunstâncias de força maior não podem ser reiteradas, ou seja, o empresário não poderá alegar que corriqueiramente se encontrara sob dificuldades financeiras.


Para admissão da precariedade das condições financeiras da empresa como fator excludente da culpabilidade, é necessário que fique caracterizada a temporariedade ou excepcionalidade da conduta perpetrada, que não deve perdurar por inúmeros exercícios financeiros, em que a sociedade se mantém em funcionamento à custa da sonegação fiscal (BOTELHO, 2004, p.49)


Nesse ínterim, entendemos que não se pode admitir que tal situação se estenda durante todo o funcionamento da atividade empresarial, admitindo-se a configuração de causa dirimente de responsabilidade criminal por permanentes dificuldades financeiras, pois tal consistiria em privilégio àqueles que baseiam seus negócios e suas fontes de renda no ilícito, consoante já advertido pela doutrina e pela jurisprudência, como veremos adiante.


3.2 A aplicação da Inexigibilidade de Conduta diversa no Crime de Apropriação Indébita Previdenciária


Como dito anteriormente, existem condutas nas quais o autor do fato é culpável, mas, que, em razão das circunstâncias anormais que lhe cercam, se exclui essa culpabilidade por meio da causa supralegal de exclusão da culpabilidade – inexigibilidade de conduta diversa.


Sobre o tema é, bem empregado o magistério de Silva (2007, p.29)


“No direito Penal antigo compreendeu-se que a pena criminal só adquire sentido se relacionada à ideia de evitabilidade do fato praticado. Assim, reprováveis são os fatos que podem ser evitados. Nesse contexto, o agente é culpável quando deve e pode agir em conformidade com o Direito, mas pratica conduta diferente que constitui o delito. A contrario sensu, quando ao agente não é exigível comportamento diverso do realizado, não há a reprovabilidade da conduta, devendo, portanto, afastar-se sua culpabilidade. Essa situação configura o denominado instituto da inexigibilidade de conduta diversa como hipótese de exculpação na teoria da culpabilidade.” (grifos no original)


Desse modo, a inexigibilidade de conduta diversa age como principal vetor de humanização da prática punitiva, haja vista que a realidade dos fatos da vida nem sempre devem servir de premissa para o inevitável enquadramento às normas legais repressoras de Direito Penal.


Segundo nos ensina Bruno (2005, p.34)


“Embora se deva concordar que o Direito exige necessariamente esforços e sacrifícios para se evitar a prática de crimes, a teoria de inexigibilidade de conduta diversa pressupõe que a ocorrência da circunstância excepcional excede a natural capacidade do ser humano de resistir à pressão dos fatos, pois se o Direito não exige heroísmos, requer, ao menos, uma vontade anticriminosa firme, porém limitada àquela que razoavelmente pode ser exigida de um homem normal.”


Sendo assim, deve-se destacar que o julgador tem o dever constitucional de velar pela dignidade da pessoa humana. Todo homem tem que fazer escolhas em determinados fatos de sua vida, porém, há que se admitir que nem em todos os fatos pode-se agir, conforme a conduta prevista em determinada legislação.


Assim, vislumbramos a inexigibilidade de conduta diversa nos casos de crime de apropriação indébita previdenciária, quando em circunstâncias tais, que não se pode exigir do homem médio conduta diferente da que foi tomada, por conta das sérias dificuldades financeiras da empresa, que, sem sombra de dúvidas geraria o caos na vida socioeconômica, não só do empresário, mas, como também , na vida daqueles que se relacionam, direta ou indiretamente com àquela atividade.


Desse modo, há que ressaltar que no caso supracitado existem motivos mais que suficientes para a ordem jurídica reconhecer que são superiores as circunstâncias que cercam o homem levando-o à ação anormal, tomada pela estrita necessidade.


O magistério de Silva (2007, p.31) ilustra, além de outros, o exemplo da inexigibilidade de conduta diversa no crime de apropriação indébita previdenciária, já que segundo ele “São exemplos de causa supralegal de inexigibilidade de conduta diversa: […] c) o exemplo do empresário que deixa de recolher tributos para pagar os salários dos seus empregados em razão de uma situação falencial de sua empresa.”


 Contudo, nos ensina Bruno (2005, p.64), que “[…] a aplicação do princípio da não-exigibilidade de outra conduta apenas se justifica quando surgem casos em que efetivamente (não obstante inexistente previsão legal) se pode afirmar que, razoavelmente, não é exigível do agente um comportamento conforme o Direito”.


Por conseguinte, entendemos que seria arbitrário apenar o contribuinte quando, existindo prova da existência dos elementos dos quais nos referimos na teoria psicológica – normativa da culpabilidade, no momento da realização do fato, como as circunstâncias nas quais está inserido o sujeito (autor do fato), ganhando força a aplicação da excludente da culpabilidade que defendemos: a inexigibilidade de conduta diversa.


Nessa direção é o entendimento de Toledo (2000, p. 327 – 328):


“[…] aquele que, no momento da ação ou omissão, não poderia, nas circunstâncias, agir de outro modo, porque, dentro do que nos é comumente revelado pela humana experiência, não lhe era exigível comportamento diverso. A inexigibilidade de outra conduta é, pois, a primeira e mais importante causa de exclusão da culpabilidade.”


A análise da tese da inexigibilidade de conduta diversa melhor se aplica, portanto, no crime descrito no art. 168-A do Código Penal (apropriação indébita previdenciária), já que não temos o intuito de banalizar a utilização do instituto penal da inexigibilidade de conduta diversa com sua possível má interpretação como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.


Segundo nos ensina Kapaz (2005, p.19), se analisarmos algumas estatísticas verificamos que o total de impostos em relação ao PIB dos países em desenvolvimento varia de 13,1% na Colômbia, até 25% na Rússia, enquanto que a taxa tributária em relação ao PIB, no Brasil é de 34,4%.


Nesse mesmo sentido preleciona Veloso (2008, p. 205)


“Partindo-se da premissa de que a inexigibilidade de conduta diversa é mais bem aplicada nos casos de omissão de recolhimento de tributos, constata-se que grande parte das vezes resulta da situação da economia nacional, mormente na época atual de globalização, na qual a queda das ações da bolsa de Pequim ou Jacarta afeta imediatamente todo o mercado mundial.”


Portanto, diante desse fato, da alta carga tributária em nosso país, é um tanto quanto desafiador exercer qualquer atividade de cunho financeira e, no caso de nossos estudos, a própria atividade empresarial. Isso sem falar na constante instabilidade do mercado interno diante de algumas manobras políticas ligadas à corrupção.


A apropriação indébita previdenciária, ou melhor, aplicar as penas previstas para o crime de apropriação indébita previdenciária se constituiu numa tarefa árdua para o julgador. Existem duas faces da mesma moeda, ou seja, de um lado se encontra a tutela jurídico-penal da Previdência Social, por outro lado se encontra comprometido o próprio desenvolvimento socioeconômico do país.


Faz-se necessário, porém, esclarecer que para que haja o acatamento da inexigibilidade de conduta diversa deve haver um acervo probatório incisivo. Como bem preleciona Botelho (2004, p.49)


A indispensabilidade de prova documental é requisito uníssono na jurisprudência pátria, podendo a prova testemunhal servir de reforço àquela.


Mas não é só. Para a admissão da precariedade das condições financeiras da empresa como fator excludente da culpabilidade, é necessário, que fique caracterizada a temporariedade ou excepcionalidade da conduta perpetrada, que não deve perdurar por inúmeros exercícios financeiros, em que a sociedade se mantém em funcionamento às custas da sonegação fiscal.”


Assim, acreditamos que nos casos em que haja cabalmente comprovada as dificuldades financeiras da empresa que, diante desse fato, leva ao empresário deixar de recolher e repassar à Previdência Social as contribuições devidas será mais que necessária a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa ao fato.


Porém, concordamos veementemente com o que nos ensina Botelho (2004, p. 48)


“O acatamento da tese defensiva da causa supralegal de exclusão da culpabilidade depende, primeiramente, da cabal prova documental das dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa à época dos crimes tributários, consoante o art.156 e 157 do Código Penal. Não é suficiente, portanto, a prova testemunhal, seja pela sua fragilidade, seja pela necessidade que o juízo verifique qual era, efetivamente, a situação financeira da sociedade devedora, o que, somente, é viável por meio dos exames dos diversos livros comerciais, balancetes, registros contábeis ou declarações de imposto de renda.”


 Nesse liame, adentraremos alhures, nas posições doutrinárias a respeito do tema da inexigibilidade de conduta diversa nos crimes de apropriação indébita previdenciária, porquanto, tenhamo-nos de frisar os pontos específicos de acatamento da referida tese.


Para Baltazar Junior (2008, p.38), a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa é mais sem instrumento de ratificação da própria dignidade da pessoa humana, quando, o empresário se encontra em situação que o submete a tal pressão que o faz agir contrário à norma, mas, que, porém, torna o agente inculpável quando da admissibilidade dos argumentos de defesa e da tese da inexigibilidade. Assim preleciona o supracitado autor


“Quando existe uma situação de dificuldade financeira, a via dos empréstimos bancários estará, provavelmente, fechada ou bastante limitada. O recurso à agiotagem ou ao factoring acelera o processo de descapitalização da empresa. Muitas vezes, não existe patrimônio social ou pessoal a ser vendido. Diante desse tipo de situação fática, não é razoável, exigir do empresário que sacrifique o pagamento dos salários e a própria sobrevivência da empresa em favor do pagamento de tributos, assim, garantindo “aplicabilidade aos princípios do valor social do trabalho e da dignidade da pessoa humana” (SANTA CATARINA, 2003). (grifos no original).


Dessa maneira, tendo sido alvo de nossos estudos, a culpabilidade se encontra prejudicada, já que, lhe falta um de seus elementos; a exigibilidade de conduta conforme o direito, no caso a que se refere o fragmento de texto citado acima.


Nesse sentido é a lição de Roxin (2004, p.57)


“Pois tanto aquele que “é incapaz de compreender o caráter ilícito do fato” como aquele que não está em condições de “agir segundo esta compreensão, carecem de idoneidade para serem destinatários das normas. A falta de capacidade de compreensão, bem como de autocontrole e orientação podem ser tidas como casos em que o autor não pode ser alcançado pela mensagem da norma” (grifo nosso)


É nesse sentido que nos referimos no tópico “2”, ponto “2.3”, que a culpabilidade, trazida pela teoria finalista da ação, é um de seus elementos mais importantes no que tange ao dever de punibilidade do Estado, quando necessário, haja vista os motivos que lhe afastam esse “dever”.


O caminho probatório para que haja a admissibilidade da tese da inexigibilidade de conduta diversa é um tanto quanto árduo, por quê alguns requisitos são tidos como essenciais à comprovação do fato das dificuldades financeiras.


Vejamos a lição esclarecedora, sobre o fato, de Baltazar Junior (2008, p.39)


“A dificuldade financeira apta a excluir a culpabilidade deve ser contemporânea à omissão de recolhimento, precisa ser objetiva e racionalmente explicada e demonstrada com documentos pelos quais se possa evidenciar que não decorreram elas de mera inabilidade, imprudência ou temeridade na condução dos negócios, e, principalmente, tem de resultar de conjunto de circunstâncias imprevisíveis ou invencíveis que tenham comprometido ou ameaçado, inclusive o patrimônio pessoal do sócio-gerente ou administrador.”


Para que não haja dúvidas, faz-se necessário evidenciar que a alegação da tese da inexigibilidade de conduta diversa requer um longo caminho probatório a ser percorrido pela defesa, pois sua banalização acarretaria no enfraquecimento do próprio sistema jurídico e por consequência na descredibilidade do Direito Penal como garantidor do Estado Democrático de Direito.


Congruente à lição de Baltazar Junior (retrocitada) é também o magistério de Botelho (2004, p.50)


“Destarte, além da robusta prova documental e da excepcionalidade da situação empresarial deficitária, o acolhimento da causa supralegal da inexigibilidade de conduta diversa não prescinde, outrossim, da prova da repercussão negativa no patrimônio pessoal dos sócios administradores, sendo aconselhável a juntada, aos autos, das Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física”.


Nesse caso, a circunstância concomitante da ausência de liquidez suficiente, presente no caso concreto, obriga o sujeito ativo a agir em desacordo com a norma. Em razão das dificuldades financeiras da empresa, ele se vê forçado a optar pela pagamento da folha salarial ou mesmo dos credores, em detrimento do recolhimento da contribuição social à previdência social.


É possível afirmar que nessa situação, diante do acervo probatório necessário, que há enquadramento do agir do sujeito na tese da inexigibilidade de conduta diversa, já que totalmente compreensível a opção adotada pelo agente diante de tais circunstâncias que lhe compeliram a desenvolver um desvalor de seu comportamento, que, porém, ao nosso ver, não é justificável pelo Direito em razão das circunstâncias que lhe forçaram a agir de tal maneira (VELOSO, 2008, p.207)


Sobre o tema, é salutar o entendimento esclarecedor de Baltazar Junior (2008, p.39)


“De lembrar que não é qualquer dificuldade de caixa da empresa que irá caracterizar a situação de que se cogita. Ao contrário, a dificuldade terá que ser extrema, beirando a impossibilidade de recolhimento. Para a dificuldade relativa podem ser utilizados outros recursos como o crédito bancário e mesmo a descapitalização da empresa, pela venda de bens. A omissão no recolhimento das contribuições deverá ser o último recurso de que lança mão o empresário. Naquelas hipóteses em que simplesmente se elegem outras prioridades para os recursos disponíveis, não estará afastado o delito.”


No mesmo sentido é a lição de Botelho (2004, p.53-54)


Entretanto, a constante evocação dessa tese, desprovida do necessário substrato probatório e desvinculada da correspondente hipótese fática, clamou por uma resposta pretoriana que delineasse os requisitos para o acatamento da inexigibilidade de conduta diversa, cuja demonstração depende de robusta prova documental de séria dificuldades financeiras contemporâneas ao delito […]


Sem embargo, tal tese, por implicar no julgamento do mérito e na absolvição do réu com base em uma excludente de culpabilidade, somente pode ser apreciada na sentença, após regular instrução probatória e observado o devido processo legal, sendo incabível a rejeição da denúncia sob tal fundamento, o que ultrapassaria o juízo de prelibação próprio desse momento processual no qual, ao revés, prevalece o in dubio pro societate”. (grifos nooriginal)


Por seu turno, para arrematar da questão, a 3ª Turma do TRF da 4ª Região, em 27 de abril de 1992, decidiu no julgamento do Habeas Corpus n. 91.04.26113-5/RS, que a prova das dificuldades financeiras deverá ser produzida no curso da instrução criminal, não se admitindo rejeição de denúncia sob tal argumento, nem se podendo discutir a matéria em sede de habeas corpus (BALTAZAR JUNIOR, 2008, p.43).


Ou seja, a tese da inexigibilidade de conduta diversa afeta a culpabilidade do autor do fato. Assim, resta necessário percorrer todo o caminho da fase de instrução processual, observado o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, fornecendo os elementos probatórios necessários para formar o convencimento do magistrado, e, por fim, absolver o réu, pois acatar a tese da inexigibilidade de conduta diversa sem elementos que comprovem os motivos determinantes da ação contrária à norma seria inconstitucional.


Não se trata, pura e simplesmente, de um reconhecimento de uma condição psicológica do sujeito. Na verdade, essa avaliação psicológica do autor do fato somente é feita se primeiramente estiver constatada a presença das circunstâncias objetivas, ou seja, os pressupostos de fato que permitam a análise da existência da inexigibilidade da conduta diversa (VELOSO, 2008, p.207).


O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no dia 9 de dezembro de 2003, julgou a apelação criminal de nº 200171070015580/RS, caso em que determinou sobre a prova no crime de apropriação indébita previdenciária, prescrevendo que, nesses casos, a prova é por excelência documental (BALTAZAR JUNIOR, 2008, p. 41).


Fazendo uma exegese ampliativa do julgado, Baltazar Junior (2008, p.41) nos ensina que o que o texto jurisprudencial quer nos dizer é que a prova documental é estritamente necessária, entretanto segue o autor


“Admite-se, porém, seja ela reforçada através de depoimentos de testemunhas ligadas à empresa, como ex-empregados, contadores; fornecedores ou clientes. Claro está que a prova em questão é complexa, sendo impossível esgotar aqui todo o rol de indícios de que poderá se valer o juiz para, de forma sensível, acolher ou rejeitar a tese das dificuldades financeiras, com base no conjunto de provas.”


Portanto, vemos a inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade nos crimes contra a ordem previdenciária como um instrumento ratificador do Estado Democrático de Direito. O Direito Penal, assim como outros ramos do Direito, não pode prever toda e qualquer situação, e mais, deve ser utilizado como o último dos recursos penalizadores, já que seus efeitos, diante de um sistema prisional falho e humilhante, em que a ressocialização é o último fim, são irreversíveis.


Dessa maneira, a inexigibilidade de conduta diversa deve ser acolhida pelo magistrado, quando diante de elementos probatórios suficientes e concisos, alegados pela defesa, para absolver o réu, que por imperiosa, iminente e contemporânea ao fato, dificuldades financeiras deixa de recolher as contribuições sociais à previdência social.


A doutrina entende, ainda, que a inexigibilidade de conduta diversa pode ser usada em vários outros casos, desde que presentes os elementos probatórios necessários para configurar as circunstâncias superiores que obrigariam a qualquer homem médio a agir de modo contrário à norma.


Nesse sentido nos ensina Veloso (2008, p. 209)


“A inexigibilidade de conduta diversa como causa excludente da culpabilidade penal pode ser largamente ampliada. O Superior Tribunal de Justiça, noticia Toledo (1991, p.239), admitiu em tese, por sua 5ª Turma, a sua alegação, em crime de homicídio. Há, por exemplo, a situação dos chamados “sacoleiros”, que, desempregados no Brasil, vêem-se premidos a comprar mercadorias no Paraguai e aqui revendê-las. Discute-se, igualmente, a aplicação dessa excludente nos chamados crimes de não-recolhimento das contribuições previdenciárias na época própria, quando o agente opta por não fazê-lo para salvar da falência a empresa.”


Desse modo, havendo a ausência do poder e do dever de agir conforme o Direito em razão das circunstâncias anormais que cercam e influenciam a realização da conduta contrária à norma pelo sujeito, há o que denominamos de inexigibilidade de conduta diversa.


Ou seja, quando ausente a capacidade de autodeterminação de acordo com o que prescreve o Direito, por está o sujeito compelido de agir conforme a norma haverá inexigibilidade de conduta diversa, e, por conseguinte,a inculpabilidade do sujeito.


Assim, pode-se, portanto, afirmar que há a inexigibilidade de conduta diversa quando ausente os elementos que compõem a culpabilidade: imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e exigibilidade de conduta conforme o Direito.


No crime de apropriação indébita previdenciária vários meios de prova poderão ser utilizados para demonstrar que o autor não poderia ter agido de maneira diversa da que agiu em virtude das circunstâncias em que se encontrava.


Baltazar Junior (2008, p.42), nos revela meios de prova, deveras interessantes. Vejamos


“Evidentemente que a situação da insolvência deverá ser contemporânea dos fatos objeto da denúncia, de modo que os documentos deverão dizer respeito ao mesmo período ou, se anteriores ou posteriores, em datas próximas, sob pena de se perder qualquer conexão lógica entre a situação de dificuldade financeira e a omissão no recolhimento. O mesmo vale para a juntada de documentos relativos a outras empresas, salvo se evidenciando se tratar de grupo econômico.”


O que se quer dizer é que não se admite a mera referência à crise financeira generalizada ou os planos governamentais de política econômica. Deverá ser evidenciada a situação de dificuldade de forma concreta, ou seja, o reflexo da crise na particular situação da empresa de que se cuida.


Continua Baltazar Junior (2008, p.42), em seu magistério,  pontuando sobre as provas no processo de apuração de crime de apropriação indébita previdenciária, prescrevendo que


A decretação da falência constitui forte indício no sentido de existência de dificuldades financeiras da empresa […]. Claro que não será a decretação da falência, de forma isolada, que levará à conclusão de que havia situação de dificuldade financeira, até porque, a falência poderá ser fraudulenta, o que demandará verificação mais cuidadosa. O fato se constitui em indício, a ser cotejado com o restante da prova […].”


A demonstração probatória da inexigibilidade de conduta diversa se perfaz com um acervo probatório conciso, baseado em fatos, circunstâncias e indícios materiais que mostrem que qualquer pessoa, na situação do autor do fato agiria da mesma forma que ele.


3.3 Posições Jurisprudenciais acerca da Inexigibilidade de conduta Diversa no Crime de Apropriação Indébita Previdenciária


Alguns pontos específicos sobre a demonstração probatória acerca da tese da inexigibilidade de conduta diversa já foram esclarecidos ao leitor no tópico anterior. O que iremos tratar alhures diz respeito às posições jurisprudenciais dos tribunais pátrios sobre o referido instituto de Direito Penal.


Como fora incessantemente demonstrado é necessário que haja provas proeminentes das dificuldades financeiras pela qual passa a empresa para a caracterização da inexigibilidade de conduta diversa.


A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, tendo como juiz relator o Sr. Dr. Ricardo China, no julgamento da Apelação Criminal n. 15839 em 08 de dezembro de 2009 deu provimento ao referido recurso movido pelo Ministério Público Federal, no que tange à inexigibilidade de conduta diversa prelecionando que “Para que seja reconhecida a inexigibilidade de conduta diversa as dificuldades financeiras devem ser cabalmente demonstradas pelo acusado, de forma que fique claro que a ele não cabia outra alternativa que não efetuar o repasse” (MINAS GERAIS, 2009a).


Como dissemos, o acervo probatório deve ser robusto, e, eminentemente documental, sendo insuficiente a prova oral. Porém, a prova documental poderá ser reforçada através de testemunhas ligadas à empresa.


Assim, preleciona Botelho (2004, p. 48)


“O acatamento da tese defensiva da causa supralegal de exclusão da culpabilidade depende, primeiramente, da cabal prova documental das dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa à época dos crimes tributários, consoante o art.156 e 157 do Código Penal. Não é suficiente, portanto, a prova testemunhal, seja pela sua fragilidade, seja pela necessidade que o juízo verifique qual era, efetivamente, a situação financeira da sociedade devedora, o que, somente, é viável por meio dos exames dos diversos livros comerciais, balancetes, registros contábeis ou declarações de imposto de renda.”


Em outra Apelação Criminal, de n. 200561250032337/MG, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal, tendo como juiz relator o Sr. Dr. Henrique Herkenhoff, julgou, em 13 de outubro de 2009, improcedente o referido recurso, tendo como fundamento a inexigibilidade de conduta diversa no crime e apropriação indébita previdenciária, alegando que “Não comprovada a causa supralegal de exclusão de ilicitude caracterizadora da inexigibilidade de conduta diversa em razão de dificuldades financeiras, as quais, além de não serem contemporâneas aos fatos, não foram tão graves a ponto de colocar em risco a própria existência da empresa e não divergem daquelas que são comuns a qualquer atividade de risco.” (MINAS GERAIS, 2009b).


Mais uma vez, prevalece o entendimento de que as dificuldades financeiras alegadas pela defesa que argúi a tese da inexigibilidade de conduta diversa deve ser contemporânea ao fato. Nesse sentido, salutar é relembrar a lição de Baltazar Junior (2008, p.39)


“A dificuldade financeira apta a excluir a culpabilidade deve ser contemporânea à omissão de recolhimento, precisa ser objetiva e racionalmente explicada e demonstrada com documentos pelos quais se possa evidenciar que não decorreram elas de mera inabilidade, imprudência ou temeridade na condução dos negócios, e, principalmente, tem de resultar de conjunto de circunstâncias imprevisíveis ou invencíveis que tenham comprometido ou ameaçado, inclusive o patrimônio pessoal do sócio-gerente ou administrador.”


Por outro lado, vejamos a decisão da 4ª Turma do Tribunal Regional da 1ª Região, na Apelação Criminal de n.1999.37.00.004084-2/MA, tendo como juiz relator o Sr. Dr. Hilton Quiroz, que assim se pronunciou


“Penal. Não Recolhimento de Contribuição Previdenciária. Lei n.º 8.212/91, art. 95, alínea ´D´. Lei n.º 9.983/2000. Art. 168-A, § 1º, inc. I, do Código Penal. Autoria e Materialidade Comprovadas. Dificuldades financeiras. Alegação de inexgibilidade de conduta diversa. Acolhimento. 1. Constitui a infração descrita no art. 168-A do Código Penal, deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional. 2. O crime de apropriação indébita previdenciária, que é crime omissivo puro, não exige que da omissão resulte dano, bastando, para sua configuração, que o sujeito ativo deixe de repassar à Previdência Social a contribuição recolhida dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional. 3. Autoria e materialidade demonstradas. 4. Acolhimento da tese de inexigibilidade de conduta diversa, como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, considerando que a conduta dos réus, apesar de típica, visto que se amolda à figura prevista no art. 168-A do Código Penal, e de não estar albergada por qualquer causa excludente de ilicitude, não é culpável, na medida em que não lhes era exigível portar-se de maneira diversa, em consonância com o ordenamento jurídico. 5. Apelação improvida.” (MARANHÃO ,2007.)


Outra jurisprudência esclarecedora, que corrobora com aquilo que temos nos dedicado nesta obra se desdobra, adiante, em decisão que acata a tese da inexigibilidade de conduta diversa por conta das dificuldades financeiras. Vejamos


“PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. DIFICULDADES FINANCEIRAS DA EMPRESA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA COMPROVADA. 1. O delito de apropriação indébita previdenciária, tipificado no art. 168-A, do Código Penal, constitui-se como um crime omissivo próprio ou puro, que se consuma quando o agente deixa de repassar aos cofres previdenciários as contribuições descontadas dos salários dos seus empregados, e se aperfeiçoa independentemente de o agente se beneficiar ou não dos valores não repassados, dispensando-se o animus rem sibi habendi. 2. As dificuldades financeiras da empresa podem caracterizar duas hipóteses: a atipicidade da conduta, quando demonstrada a impossibilidade de efetuar o recolhimento das contribuições previdenciárias, por falta de numerário, ou, como se pretende no caso em tela, a exclusão da culpabilidade ante a inexigibilidade de conduta diversa, quando o recolhimento era possível, mas comprometeria a sobrevivência financeira da empresa. 3. O crime de apropriação indébita previdenciária se caracteriza quando o inadimplemento resulta de uma escolha do agente que, podendo agir, opta pela omissão, e sua culpabilidade deflui da exigibilidade de conduta diversa, o que se descaracteriza quando, como no caso dos autos, indícios de provas apontam para a existência da aludida dificuldade financeira, tais como: existência de inúmeros títulos protestados, requerimento de falência, vários meses de salários atrasados, máquinas e equipamentos em condições precárias, efetivação de contratos de abertura de créditos em valores significativos. 4. Apelação provida.” (ESPÍRITO SANTO, 2006.)


No julgamento supracitado, ficam bem claros alguns indícios de provas aos quais nos referimos. A dificuldade financeira da empresa terá que ser extrema, beirando a impossibilidade de recolhimento. Deve-se lembrar, porém, que a decretação da insolvência (usada como indício de prova pela defesa no recurso alvo do julgamento cita acima), deverá ser contemporânea aos fatos abjetos da denúncia


Também serviram de prova, para a defesa no julgamento retrocitado, indícios de dificuldades financeiras, recolhimentos, ao longo dos meses, alternados, omissões parciais, salários atrasados, equipamentos em condições precárias, etc.


Verifica-se, dessa forma, que tais circunstâncias levariam, como podemos observar do fragmento de texto acima, a qualquer um a se comportar de tal maneira como se comportou o réu, ou seja, as circunstâncias que o cercavam eram de tamanha força que o compeliram, e impediriam a qualquer um em seu lugar, a omitir o recolhimento, praticando o crime de apropriação indébita previdenciária.


Porém, por conta dessas circunstâncias de força maior, que levaram o réu a cometer o crime, não se verifica a culpabilidade, por falta de um de seus elementos: a exigibilidade de conduta conforme o Direito. Pois, já que era inexigível do autor que, diante do fato de grande dificuldade financeira comprovada, se comportasse diferente da forma da qual se comportou praticando o delito.


Ao agente não existia a possibilidade de poder agir em conformidade com o Direito, em razão das circunstâncias anormais que o cercavam, influenciando-o a realização do ato volitivo.


Assim, se as circunstâncias em torno da execução da conduta realizada são de um modo tal que qualquer um se comportaria como o autor do fato, estará ausente o fundamento da culpabilidade. Verificou-se que não era possível exigir do agente que se comportasse conforme o Direito.


Para que não paire dúvidas sobre o assunto, ilustraremos mais uma jurisprudência que se coaduna com o que fora por nós defendidos nesta obra. Vejamos


“PENAL E PROCESSUAL PENAL – APELAÇÃO CRIMINAL – NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DESCONTADA DE EMPREGADOS – ART. 168-A DO CP – AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS – DIFICULDADES FINANCEIRAS DEMONSTRADAS – INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA – APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DESPROVIDA. I – O crime previsto no art. 168-A do Código Penal é crime omissivo próprio e formal; se perfaz com a adequação da conduta omissiva à descrição típica penal, quando o agente se abstém de recolher à Previdência Social os valores anteriormente arrecadados.. II – A Sentença proferida na Audiência de Instrução absolveu os réus, enfatizando que as dificuldades financeiras foram relatadas, inclusive, pelo acusador, auditor fiscal, que afirmou que tomou conhecimento pelos depoimentos dos empregados, e em decorrência da ausência de dinheiro em caixa, que os salários dos professores estavam atrasados. III- O Parquet sustenta que a Sentença não esclarece se as dificuldades se situam na tipicidade ou culpabilidade;alega falta de comprovação e de excepcionalidade das alegadas dificuldades, configurando-se, a conduta delituosa, como uma opção gerencial. IV – Materialidade e autoria comprovadas; entretanto, a comprovação de dificuldades financeiras, através dos depoimentos das testemunhas de defesa e, também, de acusação, demonstra a impossibilidade de o Apelante agir conforme o direito, restando excluída a culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa, impondo-se a absolvição com fundamento no art.386, VI, do CPP. V- Apelação do Ministério Público desprovida.” (MINAS GERIAS, 2009c).


Portanto, o que se quer, como já dito, não é a banalização da tese da inexigibilidade de conduta diversa, mas que, quando o julgador, diante de provas cabais, demonstradas efetivamente pela defesa, faça uso do Direito Penal como mais um instrumento verdadeiro de proteção à dignidade da pessoa humana e humanização da prática punitiva do estado.


Assim, em virtudes dos fatos alegados e provados, deve deixar de lado sua avidez arrecadatória, por não se tratar de dívida, para se consubstanciar os direitos e garantias fundamentais como fundamentos do Estado Democrático de Direito.


Por fim, deixamos a lição de Veloso (2008, p. 229), no sentido de que a aplicação da tese da inexigibilidade de conduta diversa deverá ser utilizada quando presentes


“[…] 1) somente há uma situação de conflito quando está provado que a saúde financeira da empresa é precária ao ponto de encontrar-se em estágio de falência ou pré-falência; 2)a opção feita tenha sido efetivamente no sentido de preservação de preservação da empresa e não para lazer ou aumento do patrimônio dos sócios; 3) a precariedade dos recursos seja motivada pela situação econômica do país ou por fato estranho à responsabilidade dos sócios e não por gastos perdulários e má administração.”


CONCLUSÃO


A presente monografia teve como escopo investigar com base nas legislação pátria, doutrina e jurisprudência, como a inexigibilidade de conduta diversa, tida como causa supralegal de exculpação penal, pode ser utilizada como meio de prova nos crimes de apropriação indébita previdenciária.


Em seguida, tendo feito a análise de todos os aspectos que envolvem a inexigibilidade de conduta diversa nos crimes de apropriação indébita previdenciária, pode-se observar que, o agente ativo do respectivo crime que, diante de situação imperiosa na qual qualquer um tido como homem médio agiria do mesmo modo, apresente acervo probatório conciso, da tal situação imperiosa, estará isento de responsabilização penal, por não lhe ser exigível conduta diversa da que fora, por ele, tomada, aplicando-se a causa supralegal de exculpação penal: inexigibilidade de conduta diversa.


O que chamou atenção no tema fora o aumento considerável dos delitos tidos como “crimes contra a ordem econômica”, que no Brasil, em virtude de nosso sistema de tributação, bem como o elevado número atos de corrupção, passou a ser um dos tipos penais mais praticados.


Assim, a alta carga tributária brasileira, constitui-se como um dos vetores principais para que empresários, de modo geral, passem por dificuldades financeiras, ficando à beira da inviabilidade de continuar sua atividade comercial, tendo que optar, em algumas vezes, entre recolher a devida contribuição, como reza a norma do art. 168-A, ou continuar com a atividade comercial que lhe serve como meio de vida.


Portanto, admitindo-se a culpabilidade como um dos elementos da teoria finalista da ação, ou do conceito analítico do crime, o Direito Penal adquire harmonização com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, proporcionalidade e razoabilidade.


Esse tema é de grande relevância, tendo em vista que ainda há resquícios da responsabilidade penal objetiva, em alguns julgados, ou mesmo na doutrina minoritária, na qual se vê a culpabilidade como pressuposto da pena, o que se torna num erro grave, já que a função da culpabilidade é a de aferir o livre arbítrio do agente da conduta em seu poder e dever de agir conforme a norma. Deste modo, a inexigibilidade de conduta diversa pode ser conceituada como a ausência do dever e do poder de agir em conformidade com o Direito em razão de circunstâncias anormais que imperam sobre a vontade do agente na realização do ato volitivo.


A teoria da inexigibilidade de conduta diversa foi introduzida e desenvolvida no Direito Penal com supedâneo na teoria da concepção normativa da culpabilidade, proposta por Fank, desenvolvida, posteriormente, por Goldschimidt e aperfeiçoada por Freudenthal.


A doutrina entende que quando ausente a capacidade de autodeterminação do agente na realização da conduta, haverá a inexigibilidade de conduta diversa, sendo, portanto, inculpável o agente, na medida em que ausente a culpabilidade não há a exigibilidade do agir conforme o Direito. Portanto, ausente a culpabilidade, haverá a aplicação da  inexigibilidade de conduta diversa, pois inexistente um dos elementos da culpabilidade.


A responsabilização penal deverá ser sempre subjetiva, atuando como corolário do Estado Democrático de Direito, em que somente se deve punir outrem pela acusação da prática de crimes, além de provado o nexo de causalidade entre a conduta e o dano, também ficar demonstrado a culpabilidade do agente.


É insustentável aplicar o Direito Penal como garantia de pagamento de tributo diante de uma responsabilização objetiva sobre o autor da conduta. O fim ao qual deve se preocupar o Direito Penal diz respeito à guarda do sistema jurídico da Previdência Social (sujeito passivo no crime de apropriação indébita previdenciária).


Nesse sentido, para se punir faz-se necessário a existência de uma ação típica e antijurídica, bem como um juízo de apuração penal sobre a culpabilidade, no sentido de se analisar se havia a possibilidade de o agente se comportar conforme o Direito ou não. Havendo a possibilidade de o agente se comportar conforme o Direito e, ele assim não o faz, restará aperfeiçoada a culpabilidade, se, de modo contrário, estiver o sujeito diante de uma situação que, dadas as circunstâncias, não podia se comportar conforme o Direito, sobre ele não poderá recair a culpabilidade ou reprovação do fato, já que não lhe era exigível conduta diferente da qual tomou.


Assim, a culpabilidade penal é entendida como princípio regulador do direito de punir estatal, é um escudo frente às arbitrariedades de um Estado que não corrobora com a humanização da pena. A culpabilidade é elemento ratificador da dignidade da pessoa humana.


Passando por diversas teorias, a culpabilidade ocupou e ocupa o patamar de maior importância no Direito Penal, o de atribuição da reprovabilidade do fato ao autor do mesmo. Hodiernamente, a teoria consagrada na doutrina é a teoria normativa pura da culpabilidade, na qual os elementos psicológicos do autor do fato (dolo e culpa) passam para a ação deixando a culpabilidade com pura feição normativa, por seus elementos normativos: a imputabilidade, potencial conhecimento da ilicitude e exigibilidade de conduta conforme o Direito.


A inexigibilidade de conduta diversa é forma contrária da exigibilidade de conduta conforme o Direito, entendida como causa geral de exclusão da culpabilidade, aplicável àqueles fatos não abrangidos pelas causas de exculpação penal previstas na lei, necessitando-se provar, no caso concreto, que o agente não pôde se comportar conforme o Direito, tendo em vista estar rodeado de circunstâncias tais que não se pode exigir de ninguém conduta diversa da que foi tomada.


Quando a demonstração probatória da inexigibilidade de conduta diversa se faz trazendo ao processo judicial as circunstâncias ou indícios materiais que demonstram que o agente se comportou da mesma forma que qualquer um se comportaria diante daquelas circunstâncias, restará a ele a exclusão de sua culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa.


A inexigibilidade de conduta diversa se faz presente em situações em que empresas ou pessoas físicas ficam obrigadas ao não recolhimento das contribuições devidas, em virtude da inexigibilidade de conduta diversa, por que, ou salvam o negócio não recolhendo o tributo ou ficam à mercê da insolvência.


Ressalte-se que não se trata de perdão de dívida, mas, sim, da utilização do Direito Penal como instrumento de ultima ratio, com o escopo de proteger bens jurídicos relevantes em casos de grave violação de tais bens.


Por conseguinte, conclui-se que a utilização da inexigibilidade de conduta diversa nos crimes de apropriação indébita previdenciária deve ser usada com parcimônia e, em casos que reste provado que a saúde financeira da empresa é precária ao ponto de beirar a falência ou mesmo a insolvência, além disso deve haver relação entre a opção feita do não-recolhimento com o salvamento da empresa.


Por fim, acreditamos que esta monografia colaborou para o esclarecimento do tema, possibilitando o aprofundamento do conhecimento acerca da inexigibilidade de conduta diversa como causa geral de exculpação penal, possibilitando a exposição de argumentos inovadores no sentido de entender que os crimes de apropriação indébita previdenciária não podem ser punidos por meio da responsabilidade penal objetiva, devendo o Direito Penal ser usado com o escopo de proteger casso graves de violação a bens jurídicos e, não como meio de viabilização do valor da dívida.


 


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Informações Sobre o Autor

Arykoerne Lima Barbosa

Advogado em Maceió/AL. Pós-grauado em Direito Constitucional. Juiz Conciliador do JEF


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