A relativização da qualidade de segurado como requisito para a concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade. Uma nova abordagem à luz do princípio constitucional do caráter contributivo da Previdência Social

Resumo: O presente estudo trata de uma reflexão sobre a qualidade de segurado como um dos pressupostos para a concessão das prestações previdenciárias por incapacidade no Regime Geral de Previdência Social. Porém, antes de adentrarmos ao mérito da problemática proposta, destacaremos aspectos como: o que vem a ser o Regime Geral de Previdência Social, quais as espécies de benefícios previdenciários por incapacidade e as principais e atuais controvérsias jurídicas apontadas pela jurisprudência e doutrina envolvendo essas prestações. Por fim, serão abordados aspectos específicos sobre a qualidade de segurado e sua aplicabilidade quando da concessão dos benefícios por incapacidade, traçando um novo e inédito panorama à luz do princípio do caráter contributivo da Previdência Social. 

Palavras-chaves:
Direito da Seguridade Social. Benefícios por Incapacidade. Qualidade de Segurado. Hermenêutica. Desnecessidade.


Sumário: 1. Introdução. 2. O Regime Geral de Previdência Social. 3. Benefícios Previdenciários por Incapacidade. 3.1. Aposentadoria por Invalidez. 3.2. Auxílio-doença. 3.3. Auxílio-acidente. 4. O pressuposto qualidade de segurado para a concessão dos benefícios por incapacidade e o princípio constitucional do caráter contributivo da Previdência Social. 5. Síntese Conclusiva. Referências Bibliográficas


1. Apresentação do problema


O presente estudo trata de uma reflexão sobre a qualidade de segurado como um dos pressupostos para a concessão das prestações previdenciárias por incapacidade no Regime Geral de Previdência Social.


Desta forma, antes de adentrarmos ao mérito da problemática proposta, destacaremos aspectos como: o que vem a ser o Regime Geral de Previdência Social, quais as espécies de benefícios previdenciários por incapacidade e as principais e atuais controvérsias jurídicas apontadas pela jurisprudência e doutrina envolvendo essas prestações.


Por fim, abordaremos aspectos específicos sobre a qualidade de segurado e sua aplicabilidade quando da concessão dos benefícios por incapacidade, traçando um panorama à luz do princípio do caráter contributivo da Previdência Social.


2. O Regime Geral de Previdência Social


Para se iniciar a explanação sobre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), deve-se destacar inicialmente que, em que pese o princípio constitucional-previdenciário da uniformidade de prestações previdenciárias, contemplado no art. 7º da Carta Cidadã – o qual estabelece que a todos os segurados do sistema devam ser oferecidos idênticos benefícios, para os mesmos eventos cobertos – é certo que quando se trata da Previdência Social brasileira, não contemplamos a existência de um único regime previdenciário.


Para os renomados professores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, entende-se como regime previdenciário “aquele que abarca mediante normas disciplinadoras da relação jurídica previdenciária, uma coletividade de indivíduos que têm vinculação entre si em virtude da relação de trabalho ou categoria profissional a que se está submetida, garantindo a esta coletividade, no mínimo, os benefícios essencialmente observados em todo sistema de seguro social – aposentadoria e pensão por falecimento do segurado” [1].


Aqui, necessário se abrir um parêntese, para dizer que a nosso ver, quanto às espécies de benefícios previdenciários considerados essenciais (aposentadorias e pensão por morte), as prestações previdenciárias que possuem como objetivo a proteção do indivíduo em face de incapacidades temporárias também devem ser consideradas como essenciais, cabendo à Previdência Social a cobertura do risco social da perda, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho, especialmente, sob pena de ferimento ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, na forma do art. 1º, inciso III, da Carta Magna. Além disso, é de extrema relevância lembrar a lição de Sérgio Nascimento que observa que o Brasil apresenta-se como um Estado Democrático de Direito que tem como um de seus objetivos, na forma dos artigos 1º e 3º, inciso I, da CF, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, sendo certo que esses almejos devem sempre ser levados em conta pelo intérprete do texto normativo, especialmente, quando a matéria em debate é a previdenciária [2].


Dito isto, cabe salientar que, conforme comenta Fábio Zambitte Ibrahim, o sistema previdenciário brasileiro é composto de dois Regimes básicos, quais sejam: Regime Geral de Previdência Social e Regimes Próprios de Previdência dos Servidores Públicos e Militares e de dois Regimes Complementares de Previdência Social, sendo eles: o privado, que pode ser aberto ou fechado no RGPS, e o público, que por sua vez pode ser apenas fechado, nos Regimes Próprios de Previdência Social [3].


No decorrer deste estudo, centraremos nossa atenção apenas no Regime Geral de Previdência Social (RGPS).  Previsto no caput do art. 201 da CF e art. 9º da Lei n. 8.213/91, o RGPS é tido como principal regime previdenciário, sendo o regime brasileiro básico, caracterizando-se pela aplicação compulsória a todos os indivíduos que exerçam algum tipo de atividade remunerada, exceto quando esta atividade gerar filiação obrigatória a regime próprio.


Tratando-se de dados palpáveis, segundo estudos realizados e divulgados por Reinhold Stephanes, o RGPS abarcava, há 10 (dez) anos atrás, aproximadamente 86% (oitenta e seis por cento) de toda a população brasileira[4]. Com a crescente redução do desemprego e, conseqüente aumento gradual do número de trabalhadores formais, certamente os números atuais não são inferiores aos auferidos quando da realização da referida pesquisa, sendo que louvável percentual de abrangência é facilmente explicado, devido a já referida característica de filiação compulsória deste regime, ou seja, a filiação ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatória e automática para os trabalhadores da iniciativa privada.


Assim, o RGPS contempla de forma obrigatória todos os trabalhadores que possuem sua relação de emprego acobertada sob o manto celetista, os empregados rurais, os empregados domésticos, os trabalhadores autônomos, os empresários, pequenos produtores rurais e pescadores artesanais que laboram em regime de economia familiar, etc. São os denominados segurados obrigatórios, conforme art. 11 da n. Lei 8.213/91. Frisa-se ainda que, em atendimento ao princípio constitucional da universalidade do atendimento (art. 194, I, da CF), o RGPS permite, ainda, a adesão aos seus quadros, de pessoas que não estejam vinculadas a ele de forma obrigatória, bem como a regime próprio de previdência social, os quais são denominados de segurados facultativos (art. 13 da Lei n. 8.213/91).


Por fim, insta salientar que o RGPS é gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, autarquia federal que compõe a administração pública indireta e é vinculada ao Ministério da Previdência Social. Destaca-se que, devido à citada condição de ente autárquico, o INSS é dotado de personalidade jurídica de direito público, com legitimidade processual ativa e passiva para figurar em ações judiciais.


3. Benefícios Previdenciários por Incapacidade


O artigo 18 da Lei de Benefícios da Previdência Social – LBPS (Lei n. 8.213/91) expressa as prestações devidas pelo Regime Geral de Previdência Social aos seus segurados. O inciso I do referido normativo colaciona em suas alíneas as prestações previdenciárias devidas ao segurado, inclusive, quando decorrentes de acidente de trabalho, sendo elas: aposentadoria por invalidez, aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial, auxílio-doença, salário-família, salário-maternidade e auxílio-acidente.


A LBPS, em seu art. 18, inciso II, elenca ainda as espécies de benefícios devidos aos dependentes, quais sejam: pensão por morte e auxílio-reclusão. Destaca-se que, o RGPS deve oferecer o serviço social, bem como, a reabilitação profissional a todos os seus segurados e dependentes (inciso III, do art. 18, da LBPS).


Em nosso estudo, nos ateremos à observação mais detalhada dos benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente, prestações previdenciárias estas que são responsáveis pela cobertura dos riscos sociais: eventos de doença e invalidez (art. 201, inciso I da CF) – razão pela qual denominamos estas prestações de benefícios por incapacidade.


3.1. Aposentadoria por Invalidez


Para Fábio Zambitte Ibrahim “a aposentadoria por invalidez é concedida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nessa condição” [5].


Com fundamentação legal nos artigos 42 a 47 da Lei n. 8.213/91, esta modalidade de aposentadoria é devida a todos os segurados do RGPS, desde que a hipótese de incidência, qual seja, incapacidade permanente para o trabalho insuscetível de reabilitação profissional, concretamente se realize no plano fático, sendo sua renda mensal inicial correspondente a 100% (cem por cento) do salário de benefício (art. 44 da LBPS).


Muito embora o foco do presente estudo não seja uma abordagem esgotativa dos benefícios por incapacidade, vale dizer que a jurisprudência vem atenuando a exigência de impossibilidade de realização de toda e qualquer atividade laborativa pelo segurado como condicionante para a concessão da aposentadoria por invalidez.  Isto ocorre, pois, a incapacidade para o trabalho a ser verificada se trata de um fenômeno multidimensional que, segundo a juíza federal Maria Divina Vitória, em recente e sábia decisão proferida na Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (JEF’s), “não pode ser avaliada tão-somente do ponto de vista médico, devendo ser analisados também os aspectos sociais, ambientais e pessoais. Há que se perquirir sobre a real possibilidade de reingresso do segurado no mercado de trabalho. Esse entendimento decorre da interpretação sistemática da legislação, da Convenção da OIT – Organização Internacional do Trabalho, e do princípio da dignidade da pessoa humana. A restrição ao idoso aliada ao estado de saúde do trabalhador, na prática, inviabilizam o seu retorno à atividade que lhe proporcione meios de subsistência, razão do deferimento da aposentadoria por invalidez” [6].


Outro aspecto que merece ser comentado é que o valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento), sendo devido ainda que a aposentadoria percebida pelo segurado atinja o seu limite máximo, ou seja, a soma dos valores pode ultrapassar o teto legal (art. 45 da Lei n. 8.213/91). Neste sentido importa dizer que o referido acréscimo sofrerá reajustes ao mesmo tempo em que o benefício que lhe deu origem.


Ademais cabe salientar que a aposentadoria por invalidez, a princípio, é devida a todo o segurado do RGPS, desde que cumpra seus pressupostos concessórios, quais sejam: qualidade de segurado; incapacidade verificada através de exame médico-pericial a cargo do INSS ou do Poder Judiciário; não ser portador de doença ou lesão ao se filiar ao RGPS, sendo perfeitamente possível, entretanto, a concessão do benefício nos casos da lesão ou doença ter sido agravada pelo trabalho; afastamento de todas as atividades e; por fim, o cumprimento de carência de 12 contribuições mensais, nos casos de incapacidade originada por qualquer doença. Ressalta-se que, o cumprimento do requisito carência não é exigido nos casos de o benefício ser originado por acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho (art. 26, da Lei n. 8.213/91).


Para fins do nosso estudo, destaca-se a presença do pressuposto concessório denominado qualidade ou condição de segurado, presente de forma obrigatória em decorrência da legislação infraconstitucional.


3.2. Auxílio-Doença


O auxílio-doença, com previsão legal nos artigos 59 a 63 da Lei n. 8.213/91, é o benefício previdenciário decorrente da incapacidade temporária do segurado para o trabalho ou para sua atividade habitual, quando esta inaptidão é superior a 15 (quinze) dias consecutivos. Difere-se da aposentadoria por invalidez devido à natureza temporária da incapacidade protegida. Traçaremos, a partir de agora, breves comentários sobre as principais questões controvertidas acerca do auxílio-doença.


Vemos que, hodiernamente, uma das maiores problemáticas que envolvem o referido benefício previdenciário é o procedimento adotado pelo INSS chamado de “alta programada”, que se iniciou em 09/08/2005, com o programa Cobertura Previdenciária Estimada (Copes). Em verdade, trata-se de sistema utilizado pela autarquia previdenciária no intuito de cessar ao máximo o pagamento desta modalidade de prestação aos segurados do RGPS, estabelecendo antecipadamente a data em que o trabalhador adoecido deve retornar ao trabalho. O grande problema apontado, é que, não raro, o INSS cessa os benefícios previdenciários indiscriminadamente, economia esta que é gerada à custa de muito sofrimento por parte dos trabalhadores, que muitas vezes têm seu direito ao percebimento do auxílio-doença cessado em função da política de corte de benefícios e, pior – se é que isto é possível – , quando batem às portas de seus empregadores para o retorno ao trabalho devido à alta concedida pela autarquia, na grande maioria das vezes doentes, não são aceitos quando da feitura de exame médico de retorno realizado pela empresa. Esclarece-se que, a nosso ver, a atitude da empresa não é o problema, pois esta realizou o exame médico de fato; o equívoco, ou melhor, a ilegalidade, certamente está na ação do INSS, que desrespeita a dignidade do trabalhador e, por conseguinte, a Constituição Federal (art. 1º, inciso III). Por outro lado, quando a empresa aceita o empregado ainda doente, temos um cenário de uma enormidade de lesões agravadas dentro do âmbito laboral, o que, como é sabido, pode ser passível de demanda judicial na justiça laboral, visando à reparação civil pelos danos materiais e morais sofridos e, no mínimo, a estabilidade prevista no art. 118 da LBPS.


A nossa visão sobre o tema é no sentido de que a forma como o procedimento é realizado pela Autarquia Previdenciária, nitidamente, é odiosa e perigosa, caracterizando, sem sombras de dúvidas, uma afronta à dignidade da pessoa humana.


Ademais, notamos ainda a não observância do devido processo legal, bem como da própria ampla defesa e do contraditório, ensejando total desrespeito ao texto constitucional e afrontando direitos líquidos e certos do indivíduo, conforme previsão do art. 5º, inciso LIV e LV da Carta Cidadã, sendo, portanto, possível que este procedimento ilegal seja atacado no Poder Judiciário via impetração de mandado de segurança.


Abordada a referida questão, é importante dizer que o valor do benefício de auxílio-doença, após a edição da Lei n. 9.032/95 que alterou a redação originária da Lei n. 8.213/91, corresponde a 91% (noventa e um por cento) do salário de benefício. Quanto à natureza do benefício, esta pode ser previdenciária, quando decorre de doença/acidente de qualquer natureza, ou acidentária, quando se origina de um acidente de trabalho tipo/típico, doença do trabalho ou profissional. Destaca-se a não necessidade de cumprimento de carência, quando o benefício decorre de acidente de qualquer natureza, sendo certo que, caso em contrário, a carência estabelecida corresponde a 12 (doze) contribuições mensais. Ainda são requisitos para sua concessão que o segurado possua qualidade de segurado, incapacidade verificada através de exame médico pericial e não seja portador de doença ou lesão ao se filiar ao RGPS, salvo nos casos de agravamento. Novamente destaque para o pressuposto da condição ou qualidade de segurado na forma da legislação infraconstitucional.


3.3. Auxílio-Acidente


O auxílio-acidente é o benefício previdenciário pago mensalmente ao segurado do RGPS que, em decorrência de acidente de qualquer natureza sofrer de seqüela que implique na redução da capacidade laborativa para o trabalho que habitualmente exercia. O auxílio-acidente é devido ao segurado-acidentado em forma de indenização, não sendo substitutivo do salário, podendo, inclusive, ser acumulável com este.


Segundo os artigos 18, parágrafo 1º, da Lei n. 8.213/91 e 104 do Decreto n. 3.048/99, têm direito ao auxílio-acidente o empregado (exceto o doméstico), o trabalhador avulso e o segurado especial. Neste ponto, importante destacar nossa discordância à limitação infraconstitucional no rol de beneficiários deste benefício, posto que é de dissonância gritante aos objetivos da República Federativa do Brasil escopados nos artigos 1º e 3º da CF, bem como ao próprio artigo 201 da CF, que não faz qualquer distinção entre as modalidades de segurados para a percepção dos benefícios, o que, em conseqüência, gera afronta, ao artigo 5º, caput, da CF, no que se refere ao princípio da isonomia.


Após a edição da Lei n. 9.032/95 o valor da renda mensal inicial do auxílio-acidente passou a ser de 50% (cinqüenta por cento) do salário de benefício.


Anteriormente, segundo o artigo 86, parágrafo 1º, em sua redação originária, o benefício possuía o valor variável de 30% (trinta por cento), 40% (quarenta por cento) ou 60% (sessenta por cento) do salário de contribuição do segurado na data da ocorrência do acidente, dependendo do grau de gravidade das seqüelas.


Acerca desta alteração de percentuais, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que os benefícios concedidos anteriormente à edição da lei nova (Lei n. 9.032/95) em percentuais inferiores a 50% (cinqüenta por cento), podem ser majorados em inteligência ao princípio da retroação da lei mais benéfica [7].


Outro aspecto importante sobre este benefício, refere-se à sua cessação imediata com a concessão da aposentadoria, conforme mandamento contido na Lei n. 9.528/97, que alterou os dizeres do artigo 86, parágrafo 2º, da Lei n. 8.213/91. Quando isto acontece os valores referentes ao auxílio-acidente devem integrar o valor dos salários de contribuição utilizados no cálculo do salário de benefício da aposentadoria. Porém, destaca-se que, se o acidente que gerou a concessão do benefício ou a própria prestação tiver origem em data anterior à edição da Lei n. 9.528/97, o auxílio-acidente pode ser cumulável com a aposentadoria, sendo certo, entretanto, que, nesses casos, seu valor não será considerado para fins do cálculo da aposentação. Ressalta-se ainda que o recebimento de qualquer outro benefício – salvo aposentadoria, nos moldes já expostos -, não prejudicará o percebimento do auxílio-acidente.  Há de ressaltar entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São, que em incidente de inconstitucionalidade[8], julgou pela cumulatividade do benefício de auxílio-acidente quando o segurado após a aposentadoria retorna ao trabalho, voltando a contribuir compulsoriamente e se acidenta.


No que se refere aos requisitos, fora a ocorrência da infortunística, é necessário segundo a norma infraconstitucional, a presença da qualidade de segurado do acidentado à época da ocorrência do fato gerador do benefício. Dispensável assim, o cumprimento de carência mínima. 


4. O pressuposto qualidade de segurado para a concessão dos benefícios por incapacidade e o princípio constitucional do caráter contributivo da Previdência Social


Como já visto, a manutenção da qualidade de segurado está presente como um dos requisitos para a concessão de todos os benefícios por incapacidade, quais sejam: aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente. A regra é de que o segurado mantém a qualidade de segurado enquanto verter suas contribuições previdenciárias para o Sistema. As exceções encontram-se previstas no artigo 15, da Lei n. 8.213/91, in verbis:


Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:


I – sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;


II – até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;


III – até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; 


IV – até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;


V – até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;


VI – até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.


§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. 


§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.


§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.


§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos”.


No mais, os demais pressupostos concessórios para esses benefícios se distinguem de acordo com o risco social acobertado por cada um deles (incapacidade permanente, incapacidade temporária e seqüela redutora da capacidade laborativa resultante de acidente de qualquer natureza, doença do trabalho ou profissional) e da natureza da prestação, que é condicionante para a exigência ou não de carência mínima, para os benefícios de auxílio doença e aposentadoria por invalidez [9]. Quanto ao auxílio-acidente, não se faz necessária a efetivação de um número mínimo de contribuições.


Por sua vez, o reflexo da perda da qualidade de segurado, encontra-se preceituado no artigo 102, da Lei n. 8.213/91. Senão vejamos:


Art. 102. A perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)


§ 1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)


§ 2º Não será concedida pensão por morte aos dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do art. 15 desta Lei, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria na forma do parágrafo anterior”. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)


A princípio, sem haver nenhuma divergência com outras normas do Direito Pátrio, bem como qualquer necessidade de aplicabilidade de uma das formas de integração do direito para sua correta interpretação, o artigo 102 da Lei n. 8.213/91, exclui o direito à aposentadoria por invalidez, ao auxílio-doença e ao auxílio acidente, àqueles segurados que perderam a qualidade de segurado, nos moldes do artigo 15, da mesma Lei de Benefícios.


Entretanto, nosso posicionamento aponta para a necessidade de observância de outras normas que compõem nosso ordenamento jurídico para uma melhor compreensão e correta interpretação da “qualidade de segurado” como critério para concessão dos benefícios por incapacidade. É o que demonstraremos adiante.


Neste sentido, quanto aos princípios da Previdência Social e os riscos sociais cobertos, importante observarmos os dizeres do caput e incisos do artigo 201, da Carta Cidadã, com a redação dada pela EC n. 20 e, portanto, vigente a partir de 16/12/1998:


Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)


I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)


II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)


III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)


IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)


V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.”


Vejamos ainda o que dispõe o artigo 3º, da Lei n. 10.666/2003, sobre a qualidade de segurado para os benefícios de aposentadoria por idade, tempo de contribuição e especial:


Art. 3o A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial. 


§ 1o Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.


§ 2o A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do § 1o, observará, para os fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3o, caput e § 2o, da Lei no 9.876, de 26 de novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir da competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991.


Por sua vez, quanto ao número mínimo de contribuições para a aquisição do direito à percepção dos benefícios previdenciários que exigem carência, dispõem os artigos 24, 25, inciso I, e 142, todos da Lei n. 8.213/91:


Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências.


Parágrafo único. Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.  (Vide Medida Provisória nº 242, de 2005)


Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:


I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais


Art. 142. Para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício:”



























































































Ano de implementação das condições



Meses de contribuição exigidos



1991



60 meses



1992



60 meses



1993



66 meses



1994



72 meses



1995



78 meses



1996



90 meses



1997



96 meses



1998



102 meses



1999



108 meses



2000



114 meses



2001



120 meses



2002



126 meses



2003



132 meses



2004



138 meses



2005



144 meses



2006



150 meses



2007



156 meses



2008



162 meses



2009



168 meses



2010



174 meses



2011



180 meses




Pois bem, ao se observar as normas acima elencadas nota-se que, a partir da edição da EC 20/98, a Constituição Federal, expressamente atribuiu caráter contributivo à Previdência Social.


Neste sentido, vale ressaltar que os professores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, tratam essa nova característica da Previdência Social, como sendo um de seus princípios específicos, ao lado da filiação obrigatória, do equilíbrio financeiro e atuarial, da garantia ao benefício mínimo, da correção monetária dos salários de contribuição, da preservação real do valor dos benefícios, da facultatividade de previdência complementar e da indisponibilidade dos direitos dos beneficiários [10].


Em ato contínuo, em 08/05/2003 fora editada a Lei n. 10.666 que, em parte, regulamentou infraconstitucionalmente, em seu artigo 3º, o novo princípio constitucional do caráter contributivo para os benefícios de aposentadoria por idade, por tempo de contribuição e especial. O fato é que, segundo a regulamentação legal, para a concessão dos benefícios acima citados, não mais se exige a qualidade de segurado como um de seus requisitos, quando já houver o cumprimento da carência exigida pela lei.


Nesta esteira de raciocínio, leciona Sérgio Nascimento que “ao regulamentar o artigo 201 da Constituição, alterou a disciplina relativa à questão da perda da qualidade de segurado, razão pela qual o artigo 102 da Lei n. 8.213/91 deve ser interpretado juntamente com esses outros dois dispositivos” [11].


No entanto, vê-se que, quando se trata dos benefícios aqui estudados, ou seja, aqueles por incapacidade, ainda não há regulamentação do artigo 201 da CF, através da edição de norma infraconstitucional.


Em face dessa omissão legislativa, entendemos que a analogia (art. 4º, da LICC) é a saída mais viável para a solução dessa inércia do legislador ordinário, sendo certo, porém, que só poderá ser utilizada quando o segurado houver perdido a qualidade de segurado, mas houver cumprido o prazo de carência previsto nos artigo 25, inciso I ou 142 da LBPS, ou seja, o que defendemos não é que haja uma concessão indiscriminada dos benefícios.


A analogia, como se sabe, somente pode servir para preencher uma lacuna normativa quando se observa uma relação de semelhança entre a situação de fato em que a norma é omissa e a situação paradigma. Como fatos impeditivos da integração do direito por meio da analogia, estão os casos em que a Constituição da República estabelece reserva legal, o que não acontece no caso em comento.


No que diz respeito ao nosso tema, o professor Sérgio Nascimento realiza uma abordagem mais do que elucidativa sobre a possibilidade de aplicação da analogia para a perda da qualidade de segurado nos casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, utilizando-se como norma paradigma o artigo 3º, da Lei n. 10.666/03, quando diz: “nos casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença (incapacidade comprovada) a situação ainda não foi disciplinada pelo legislador ordinário, mas, como há relação de semelhança com a aposentadoria por idade (incapacidade presumida), pode, em tese, tal lacuna ser preenchida por analogia” [12].


Ora, é clara a semelhança entre o risco social coberto pela aposentadoria por invalidez e pelo auxílio-doença com aquele coberto pela aposentadoria por idade.


Ressalva-se, porém, que este não é o caso do auxílio-acidente, onde a incapacidade para o trabalho, embora parcial e definitiva, não é total como é como acontece na aposentadoria por idade (de forma presumida). Sendo assim, o risco social coberto pelo auxílio-acidente não se assemelha com aquele protegido pela aposentadoria por idade, o que impede a aplicação da analogia a esses casos.


Por outro lado, nos casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, é evidente que a Constituição visou à cobertura do risco da incapacidade para o trabalho. Desta forma, a única diferença que vemos entre esses benefícios e a aposentadoria por idade é que, naqueles casos, a incapacidade acobertada pela Previdência Social é comprovada, concreta, e no último, presumida. No entanto, entendemos que essa distinção, por si só, não é capaz de ocultar a possibilidade da aplicação da analogia como meio de integração do direito.


Assim, aplicando analogicamente os dizeres do artigo 3º da Lei n. 10.666/03 – no que condiz à desnecessidade da condição de segurado para a concessão da aposentadoria por idade – aos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, temos que os requisitos concessórios para os casos em que o indivíduo houver perdido a qualidade de segurado, serão somente: a ocorrência do fato gerador do benefício (incapacidade para o trabalho) e o cumprimento da carência exigida, que irá variar, conforme a data de inscrição do segurado no RGPS.


Neste sentir, caso o indivíduo tenha a inscrição posterior à edição da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, o número mínimo de contribuições será aquele previsto no artigo 25, I da mesma norma, qual seja: 180. Já, caso a inscrição do indivíduo no RGPS seja anterior à edição da LBPS, deve-se observar a data do surgimento da incapacidade, para assim, realizar a aplicação da carência reduzida prevista na regra de transição esculpida no artigo 142, da Lei n. 8.213/91.   


Chega-se a esta conclusão, posto que, nos casos de aposentadoria por idade, o ano em que o segurado completou a idade necessária para a concessão do benefício é o considerado como de implementação das condições para fins de aplicação do artigo 142.


Para o melhor entendimento sobre o posicionamento aqui defendido, vejamos a situação hipotética exposta a seguir:


Imaginemos que um indivíduo tenha contribuído para a Previdência Social por 11 anos (131 meses) e que tenha perdido a qualidade de segurado no ano de 1995.  Notadamente o segurado se filiou ao RGPS antes da Lei 8.213/91.  Imaginemos também que a data de início de sua incapacidade permanente tenha ocorrido no ano de 2001. Em tese teria perdido a qualidade de segurado.


Solução: Nos moldes do artigo 142, a carência exigida para a aposentadoria por idade, para quem fosse filiado ao sistema antes da edição da Lei de Benefícios e completasse a idade necessária no ano de 2001 era de 120 (cento e vinte) meses.


Assim, no caso do exemplo acima citado, independentemente da perda da qualidade de segurado, o indivíduo faria jus ao recebimento da aposentadoria por invalidez, pois já havia vertido mais de 120 contribuições ao Sistema na data do surgimento de sua incapacidade, ou seja, cumprido a carência mínima em analogia à aposentadoria por idade.”


Por fim, vale mencionar que, embora o posicionamento aqui esposado se trate de uma novidade jurídica e, por conseguinte, adotado por uma corrente ainda minoritária, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, possui julgados que corroboram com a viabilidade da tese aqui defendida. Senão vejamos:


PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. PRESENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. INOCORRÊNCIA. TERMO INICIAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. CUSTAS. ISENÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. I – Agravo Retido interposto pelo réu não conhecido, tendo em vista o disposto no parágrafo 1º, do art. 523 do Código de Processo Civil. II- A questão dos reflexos da perda da qualidade de segurado nos benefícios por incapacidade não se trata de relação que o legislador tenha procurado regular negativamente. III – São manifestas as relações de semelhança entre a situação de perda da qualidade de segurado na aposentadoria por idade (incapacidade presumida) e a situação de perda da qualidade de segurado nos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença (incapacidade comprovada), tendo em vista que ambos benefícios objetivam a proteção da incapacidade laborativa, além do que a proteção social referente à incapacidade laborativa por invalidez e doença encontra-se prevista no mesmo dispositivo constitucional (art. 201, inciso I, da CF/88) que também se destina à proteção social do evento idade avançada. IV – A perda da qualidade de segurado não causa óbice à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez se já havia sido cumprida a carência para a concessão do benefício de aposentadoria por idade. Integração do direito para preenchimento de lacuna por analogia, em razão das situações previstas no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003. V – Com a edição da EC nº 20/98 a previdência social brasileira passou a ter caráter nitidamente contributivo, não se justificando, portanto, que, em virtude da perda da qualidade de segurado, sejam desprezadas, nos benefícios por incapacidade, as contribuições já vertidas ao sistema por período equivalente ao prazo de carência estabelecido pelo art. 25, inciso II, da Lei 8.213/91, ou seja, o maior prazo de carência mínima estabelecido pela legislação previdenciária, ou equivalente aos prazos da tabela prevista no art. 142 da mesma lei. VI – O termo inicial do benefício deve ser considerado a partir da data da perícia médica judicial, quando constatada a incapacidade do autor, conforme precedente do C. Superior Tribunal de Justiça (STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Vicente Leal, RESP 354401/MG, v. u., DJ 08.04.2002). VII – A correção monetária incide sobre as prestações em atraso, desde os respectivos vencimentos, na forma da Súmula 8 do E. TRF da 3ª Região, observada a legislação de regência especificada na Portaria nº 92/2001 DF-SJ/SP, de 23 de outubro de 2001, editada com base no Provimento nº 26/01 da E. Corregedoria-Geral da Justiça da 3ª Região. VIII- Os juros moratórios devem ser calculados a partir do mês seguinte à publicação do presente acórdão, de forma decrescente, à taxa de 1% ao mês, nos termos do art. 406 do Código Civil e do art. 161; § 1º, do Código Tributário Nacional, incidindo tais juros até a data de expedição do precatório, caso este seja pago no prazo estabelecido pelo art. 100 da CF/88 (STF, RE n.º 298.616-SP, Relator Ministro Gilmar Mendes, maioria, julgado em 31 de outubro de 2002, DJ de 20/10/2006, p. 84). IX – Ante a sucumbência recíproca cada uma das partes arcará com as despesas que efetuou, inclusive verba honorária de seus respectivos patronos, nos termos do art. 21 do Código de Processo Civil. X – A autarquia está isenta de custas e emolumentos. XI – Benefício que deve ser implantado de imediato, tendo em vista o “caput” do artigo 461 do CPC. XII- Agravo Retido interposto pelo réu não conhecido. Apelação da parte autora parcialmente provida.” (TRF da 3ª Região. 10ª Turma. Proc. n.: 2005.03.99.051813-5, AC 1076199. Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento. j. 22/05/2007. DJU:06/06/2007)


PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. TRABALHADOR URBANO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PRELIMINAR. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. DESNECESSIDADE. LAUDO PERICIAL. ART. 436 CPC. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ANALOGIA. ART. 3º DA LEI Nº 10.666/03. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. TERMO INICIAL. CUSTAS. ISENÇÃO.  (…) III – A questão dos reflexos da perda da qualidade de segurado nos benefícios por incapacidade não se trata de relação que o legislador tenha procurado regular negativamente. IV – São manifestas as relações de semelhança entre a situação de perda da qualidade de segurado na aposentadoria por idade (incapacidade presumida) e a situação de perda da qualidade de segurado nos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença (incapacidade comprovada), tendo em vista que ambos benefícios objetivam a proteção da incapacidade laborativa, além do que a proteção social referente à incapacidade laborativa por invalidez e doença encontra-se prevista no mesmo dispositivo constitucional (art. 201, inciso I, da CF/88) que também se destina à proteção social do evento idade avançada. V – A perda da qualidade de segurado não causa óbice à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez se já havia sido cumprida a carência para a concessão do benefício de aposentadoria por idade. Integração do direito para preenchimento de lacuna por analogia, em razão das situações previstas no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003. VI – Com a edição da EC nº 20/98 a previdência social brasileira passou a ter caráter nitidamente contributivo, não se justificando, portanto, que, em virtude da perda da qualidade de segurado, sejam desprezadas, nos benefícios por incapacidade, as contribuições já vertidas ao sistema por período equivalente ao prazo de carência estabelecido pelo art. 25, inciso II, da Lei 8.213/91, ou seja, o maior prazo de carência mínima estabelecido pela legislação previdenciária, ou equivalente aos prazos da tabela prevista no art. 142 da mesma lei. (…) XII – Preliminar rejeitada. No mérito, apelação da autora parcialmente provida.” (TRF da 3ª Região. 10ª Turma, AC n. 1999.03.99.097274-9, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, v.u. participaram do julgamento os desembargadores Federais Castro Guerra e Galvão Miranda. j. 17/08/2004. DJU de 13/09/2004, Seção II, p. 524)


5. Síntese Conclusiva


Diante de todo o aqui exposto, concluímos que para a interpretação dos textos normativos infraconstitucionais que tratam, especialmente, de direitos sociais – como é o caso do Direito Previdenciário -, é necessária a atenta observância da Constituição Federal, utilizando-se, nos casos de omissão, de todos os meios de integração do direito para a concretização do tão almejado bem-estar social.


Diante disso, nota-se que, após a edição da EC 20/98 e, conseqüente, adição do princípio do caráter contributivo da Previdência Social à Constituição Cidadã de 1988, o pressuposto da qualidade de segurado para fins de concessão dos benefícios por incapacidade de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, deve ser relativizado quando o indivíduo que perdeu esta condição tenha cumprido a carência necessária para a concessão da aposentadoria por idade à data da constatação da invalidez temporária ou definitiva, tomando-se como referência para tanto, a aplicação da analógica do art. 3º da Lei n. 10.666/2003.


 


Referências bibliográficas

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, n.191-A, 5 out. 1988.

BRASIL. Lei n. 8.213 de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 25 de julho de 1991.

DE CASTRO, Carlos Alberto Pereira. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 9ª. ed. Santa Catarina: Conceito Editorial, 2008.

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 12ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008.

NASCIMENTO, Sérgio. Interpretação do Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2007.

STEPHANES, Reinhold. Reforma da previdência sem segredos. Rio de Janeiro: Record, 1998.

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008.

 

Notas:

[1] DE CASTRO, Carlos Alberto Pereira. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 9ª. ed. Santa Catarina: Conceito Editorial, 2008, p. 109.

[2] Nascimento, Sérgio. Interpretação do Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 105.

[3] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 12ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008, p. 28.

[4] STEPHANES, Reinhold . Reforma da previdência sem segredos. Rio de Janeiro: Record, 1998, p. 34.

[5] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 12ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008, p. 525.

[6] IUJEF n. 2005.83.00506090-2/PE, julgado em 17.12.2007.

[7] Neste sentido: Resp n. 438.962/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, DJ de 23/09/2002, p. 395 e Resp n. 395.360, Rel. Min. Felix Fisher.

[8] Incidente de Inconstitucionalidade n. 145.463-0/0-00.

[9] Quando os benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez decorrem de acidente de qualquer natureza, doença do trabalho ou profissional não é exigida a carência mínima de 12 contribuições, conforme inteligência do artigo 26, da LB. 

[10] DE CASTRO, Carlos Alberto Pereira. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 9ª. ed. Santa Catarina: Conceito Editorial, 2008, p. 103/107.

[11] NASCIMENTO, Sérgio. Interpretação do Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 185.

[12] NASCIMENTO, Sérgio. Interpretação do Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 186.


Informações Sobre o Autor

Rodrigo Moreira Sodero Victório

Advogado, com especialização em Direito Previdenciário e em Direito do Trabalho. Coordenador e Professor de Direito Previdenciário da especialização e cursos de extensão da Faculdade Legale, do Legale Cursos Jurídicos


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