O Concubinato na Previdência Social

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1. Introdução


A previdência social, como instrumento de segurança frente às adversidades da vida, além de contar com prestações em favor do desenvolvimento da família, atende aos grandes males que afligem a pessoa humana, como a idade avançada, a doença, invalidez e, também, a morte.


A cada necessidade social prevista, o sistema protetivo conta com, ao menos, uma prestação previdenciária adequada. No caso da morte, há o pensionamento dos dependentes, assim como, na prisão, benefício assemelhado, conhecido como auxílio-reclusão. Ambos são previstos na Lei nº 8.213/91, a partir dos arts. 74 e 80, respectivamente.


Tomando lugar o evento determinante – o risco coberto – há a concessão do benefício. No caso dos últimos listados, os beneficiários são compostos pelas pessoas que dependem (prisão) ou dependiam (morte) economicamente do segurado. A dependência econômica é o principal elemento caracterizador da condição jurídica de dependente previdenciário, pois a finalidade da proteção social, tanto para segurados como dependentes, é a manutenção de patamar mínimo de bem-estar, capaz de assegurar a vida digna.


O modelo previdenciário brasileiro, até pelas suas raízes do seguro social, adota previsão exaustiva de pessoas que podem enquadrar-se como dependentes econômicos do segurado. Ou seja, em privilégio ao equilíbrio financeiro e atuarial do sistema (cf. art. 201, caput, Constituição), a Lei nº 8.213/91, art. 16, limita a pretensão de dependentes, pois somente os lá relacionados podem demandar prestações no caso de óbito ou prisão do segurado.


2. Os Dependentes no Regime Geral de Previdência Social – RGPS


No RGPS, os dependentes são divididos em três classes, compostas da seguinte forma: I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido; II – os  pais;  III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido (art. 16, Lei nº 8.213/91).


A existência de um dependente de hierarquia superior exclui o direito dos dependentes inferiores. Isto é, se o segurado falece, deixando uma viúva e sua mãe, a pensão por morte será exclusiva da viúva. Após o falecimento de dependente superior, o benefício não se transfere para os dependentes inferiores, só para os de mesma hierarquia. Assim se, no mesmo exemplo anterior, a viúva vem a falecer, a mãe continuará não recebendo a pensão, que deixa de existir.


Os dependentes da classe I têm dependência econômica presumida, exceto o menor tutelado e o enteado, que, assim como os demais (classes II e III), devem comprovar a dependência econômica para receberem o benefício previdenciário[1]. O tema específico deste texto é a classe I, conhecida como classe preferencial, pelo fato de preponderar sobre as demais. Dentro da referida classe, há a figura do cônjuge ou companheiro(a).


Na classe I, a lei reconhece tanto o casamento como a união estável, como não poderia ser diferente. Da mesma forma, tanto o homem como a mulher podem figurar como dependentes do segurado, diferentemente da legislação pretérita, que demandava a incapacidade como requisito para o homem ser dependente de sua esposa. Apesar da atual lei previdenciária somente ter sido publicada em 1991, entendo que desde 05 de outubro de 1988, os homens têm igualdade de direitos para fins de pensão por morte, sob pena de negar eficácia ao texto constitucional. Como se verá nos itens a seguir, havendo esposa e concubina, a divisão do benefício deve ser feita.


Sobre o cônjuge, não há dúvidas quanto a existência do direito,  mas o mesmo não se pode falar da companheira(o). A Lei nº 8.213/91 apresenta indício de solução, ao estabelecer, no art. 16, § 3º, que considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.


Ou seja, pela análise específica do dispositivo, há como concluir-se que o legislador ordinário privilegiou a visão estrita de união estável, adotada pelo Constituinte, que apesar de conservadora, é prevista na Constituição. O aludido dispositivo constitucional prega que para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Havendo impeditivo ao casamento, contrario sensu, não haveria união estável. Essa é a interpretação dada pela Lei nº 8.213/91.


Em razão da previsão constitucional, há dúvidas de todo tipo quanto à possibilidade de concubinas terem direito a pensão por morte ou auxílio-reclusão. Ou seja, pessoas com impedimento a casamento poderiam postular prestações previdenciárias à semelhança de uma união estável, muitas vezes em concorrência com parceiros legítimos? Para responder adequadamente essa pergunta, deve-se, primeiro, perguntar como aplicar o direito previdenciário.


3. O Direito Previdenciário e a Aplicação de Suas Regras


Os manuais de direito previdenciário, assim como de disciplinas próximas, reconhecem, em sua imensa maioria, a autonomia didática deste ramo do Direito, haja vista a particularidade de algumas normas e mesmo sua aplicação. A hermenêutica jurídica não é segmentada por ramo do direito, mas algumas especificidades podem ser encontradas, até pelas particularidades das relações regidas e pelos fins visados pelas normas.


É certo que a divisão do direito em ramos, no passado, serviu de pretexto para defender-se toda sorte de diferenciação de um determinado segmento jurídico frente aos demais, sob o manto de aparentes especificidades em sua aplicação, o que não existia na maioria dos casos. O direito tributário, no Brasil, foi um exemplo clássico desta patologia hermenêutica[2].


No entanto, não se pode, agora, incorrer no erro oposto, que  é ignorar um dos postulados hermenêuticos mais elementares – o direito cria suas próprias realidades. Não se desvinculando do mundo real, sob pena de ineficácia social, mas justamente para a ele adequar-se, buscando melhor instrumento de justiça e, por conseqüência, de pacificação social.


Novamente, exemplificando por meio de aspectos tributários, é comum que o legislador ordinário estabeleça certas presunções e mesmo ficções que possam viabilizar ou facilitar a aplicação da lei, como uma norma que estabelece algum momento determinado como real ingresso, no Brasil, de mercadoria estrangeira, para fins de incidência de imposto de importação.


Ninguém, seriamente, afirmará que a previsão, em lei tributária, de um aspecto temporal de incidência tributária, para fins de importação, terá de ser reproduzido para todo e qualquer ramo do direito. Não se exclui aqui eventual analogia, mas a vinculação automática da lei tributária a qualquer negócio jurídico relacionado à importação seria falar mais do que lei disse.


Mesmo que tais realidades construídas emanem da Constituição, demandam também interpretação adequada, sob pena de ignorar as particularidades de outros princípios constitucionais, que possuem valores diferentes e, não raramente, mais elevados frente àqueles que justificaram a previsão normativa definidora.


O problema atual do direito previdenciário é, basicamente, de interpretação. Suas regras legais são, quase sempre, aplicadas e interpretadas mediante conjugação e, mesmo, submissão a outros ramos do direito, como se o ramo jurídico da proteção social fosse mero apêndice normativo. Assim, por exemplo, funciona na matéria exacional, na qual decisões sobre incidência ou não incidência de contribuições previdenciárias quase nunca levam em consideração os reflexos no cálculo do benefício do segurado, ou, na parte protetiva, ao interpretar o rol de dependentes do RGPS, como se a união estável devesse se submeter a uma visão estritamente – e unicamente – civilista do tema.


O direito previdenciário possui, como componente elementar na aplicação de suas normas, o aspecto que denomino teleológico-pragmático. Teleológico, pois o fim visado pelo seguro social é a proteção de segurados e dependentes, o que quer dizer que as contribuições vertidas ao sistema, assim como um seguro, visam tutelar, além do próprio segurado, pessoas que dele dependiam economicamente, independente de convenções morais sobre como deve ser uma família.


É certo que a lei pode restringir tal rol, visando o equilíbrio financeiro e atuarial, mas não impor determinada visão dominante de como a vida deve ser vivida. Se a pessoa filiada ao regime previdenciário se engaja em relações homoafetivas ou concubinárias, não é papel do Estado, como mero gestor do sistema, impor, indiretamente, sanções pelas condutas que escapam à moral dominante, como negando um benefício a um dependente econômico do segurado.


Pragmático, já que, para a concessão da prestação, pouco importa se o liame afetivo foi validado pelos instrumentos jurídicos ou religiosos à disposição da sociedade. O que basta é a comprovação da vida em comum, o animus em formar uma sociedade conjugal. A previdência social visa assegurar benefícios que, além de bem-estar mínimo, garantem a própria vida, e tal salvaguarda não deve subsumir-se a formalidades jurídicas, especialmente no Brasil, em que pessoas mais humildes nem sempre atendem a tais questões.     


É também pelo aspecto pragmático que o direito previdenciário trata, de modo igual, o cônjuge divorciado, separado judicialmente ou mesmo separado de fato. A idéia é simples: se não mais vivem juntos, a presunção de dependência econômica é perdida, somente cabendo benefício se comprovada. O mesmo deve valer para a vida em comum, pouco importando o estado civil do segurado ou mesmo sua opção sexual.


Se a isonomia é o valor fundante do Estado social; se a partir dela foram criados os direitos sociais e a busca da liberdade real; se é qualificada como a virtude soberana, deve ser observada em matéria protetiva, cabendo ao Judiciário superar a visão não somente anacrônica, mas mal situada, impondo a abordagem tipicamente civilista na seara previdenciária. As particularidades do direito previdenciário, sempre reconhecidas na esfera teórica, mas raramente aplicadas na prática, impõem uma interpretação peculiar, visando aspectos finalísticos e pragmáticos.


4. Concubinato Previdenciário – Uma Interpretação Adequada


Apesar do exposto, o tema é ainda tormentoso, pois, de acordo com o art. 226, § 3o, da Constituição, o reconhecimento para a união estável seria necessariamente visando ao casamento. Se há impedimento ao matrimônio, o raciocínio, a contrario sensu, seria pela impossibilidade de união estável de segurado ainda casado.


No entanto, a interpretação é por demais abrangente. O fato de uma união entre pessoas de mesmo sexo, por exemplo, também não se subsumir ao disposto no art. 226, § 3º da Constituição, não tem impedido seu reconhecimento, não para fins de casamento, pois não é do que se trata aqui, mas sim para prestações previdenciárias.


A idéia é que o dispositivo aludido, em confronto com outros preceitos constitucionais de maior relevo, traz necessária restrição interpretativa, admitindo que a facilidade constitucional para a união estável, a ser adotada em todos os segmentos do direito, é aquela entre homens e mulheres e, também, voltada ao casamento. No entanto, isso não impede, ao menos, para fins estritamente previdenciários, que se reconheça o direito ao pensionamento para relações homoafetivas ou concubinárias.


Ainda que a Lei nº 8.213/91 faça, expressamente, remissão à Constituição, qualquer estudante iniciante do Curso de Direito tem conhecimento que cabe a lei ser interpretada de acordo com a Constituição, e não o contrário. A Constituição brasileira tem, dentre seus objetivos, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV). Da mesma forma, o direito à vida é assegurado (art. 5º, caput),  o que, com bastante tranqüilidade, não se limita a vida física, mas uma vida que valha a pena ser vivida, ou seja, na qual a pessoa possa exercitar seus projetos de vida e, também, engajar-se em relações afetivas que maximizem seu bem-estar.


Seria, no mínimo, absurda a tentativa de ampliar a visão dominante de família da sociedade para todos os fins, ainda que retirando validade dos direitos à vida e a liberdade, além de incentivar flagrante preconceito a pessoas que se engajam em tais relações. A interpretação proposta, mediante adequada ponderação, tem a vantagem de reconhecer a eficácia normativa do art. 226, § 3º da Constituição, mas restringi-lo às hipóteses de facilidade à conversão de casamento. Nas demais, pode-se prevalecer a cultura dominante, no qual as sociedades conjugais devem ser entre homens e mulheres e monogâmicas, mas nunca para todo e qualquer fim, especialmente no aspecto previdenciário.


É certo que o direito não pode e não deve afastar-se, por completo, de aspectos culturais, os quais, inevitavelmente, regem, em alguma medida, a vida em sociedade. Um ideal abstrato de liberdade não pode ser subsumido a toda e qualquer sociedade, pois cada uma apresenta valores e histórias diversas, que devem ser sopesadas pelo Direito. Ainda que alguns setores da sociedade brasileira vejam com naturalidade as relações poligâmicas, é certo que a moral dominante é a monogamia. O Direito não recusa isso, mas ignorar a existência da poligamia e, pior, excluir prestações previdenciárias a tais situações, é injusto e mesmo inconstitucional.


Na seara protetiva, uma companheira ou companheiro é pessoa que possui animus de convivência com o segurado, dividindo vida em comum e buscando uma sociedade conjugal, por afinidade de espírito e busca da plena realização. Se são impedidos, por lei, de contrair núpcias, é tema de total desimportância no meio previdenciário. Nunca é demais lembrar da possibilidade de criar da lei conceitos próprios para fins previdenciários – como a figura do equiparado a filho – ou mesmo adaptar alguns já existentes, como o(a) de companheiro(a).


Não há qualquer normatização legal de equiparados a filho fora do direito previdenciário e, por isso, não há problema concreto na aplicação de tal norma. Por tal motivo, tenho dito, de lege ferenda, que muito melhor seria a lei previdenciária prever, ao invés do signo companheira(o), a figura do equiparado à cônjuge. Com isso, magicamente, a dificuldade hoje criada, em grande parte, por preconceito e perfeccionismo ético de como deve ser a vida privada, deixaria de existir.


O melhor, sem dúvida, seria a terminologia diferenciada. Mas como essa ainda não existe, cabe a adequação interpretativa do signo companheira(o), no aspecto previdenciário, reconhecendo as especificidades deste ramo protetivo. Como conclusão natural, entendo que o art. 16, § 3º da Lei nº 8.213/91 é inconstitucional, ainda que o impedimento ao casamento seja restrito ao dependente, e não ao segurado.


Se determinado segurado, de modo flagrantemente imoral, ou mesmo ilegal, tenha relação não eventual com mais de uma pessoa, ou mesmo indevidamente casado (bigamia), não há razão plausível para, em caso de morte do segurado, prejudicar as pessoas com as quais se mantinha a relação continuada. Se, por exemplo, o segurado falecido engajou-se em união estável paralela, com duas pessoas diferentes e simultaneamente, quem terá direito ao benefício? Se os Tribunais não pretendem estabelecer alguma espécie de corrida previdenciária, é necessário admitir a divisão de benefícios em hipóteses de vida em comum, pouco importando o rótulo jurídico dado.


5. Visão Atual dos Tribunais


Administrativamente, o tema nunca apresentou problemas, tendo o INSS, tradicionalmente, em situações de concubinato, dividido a pensão por morte ou auxílio-reclusão com a esposa, desde que ainda houvesse vida em comum.Apesar disso, é sabido que o tema é socialmente problemático, em especial quando a vida dupla do segurado ou segurada surge após seu falecimento.


Nestas situações, é dever do INSS notificar a parte já qualificada como dependente, de modo a permitir o contraditório antes de admitir outra pessoa na condição de companheira(o). Assim dispõe o art. 24, parágrafo único, da Portaria MPS no 713/93.


Já no Judiciário, a questão tem se mostrado controvertida, especialmente nos últimos anos. A Corte Constitucional também, ao se deparar com um servidor falecido com esposa e concubina, determinou que a pensão seria devida exclusivamente à esposa, alegando que concubinato não se iguala à união estável e, portanto, restaria à margem da Constituição. Entendeu o Tribunal que, enquanto a união estável tem a pretensão de tornar-se casamento, o concubinato visa exatamente a pôr fim ao mesmo.[3]


Da mesma forma, o STJ negou pretensão de ex-cônjuge que havia voltado a viver com o segurado, formando sociedade de fato, pelo fato deste se encontrar em união estável com terceira pessoa[4]. Lamentável que tais visões ignoram o aspecto protetivo da previdência social, que não se importa com os aspectos formais da união entre duas pessoas, mas sim com o desamparo econômico quando da morte de uma delas.


Piorando a situação, o Decreto no 6.384/08, dando nova redação ao art. 16, § 6o, do Regulamento da Previdência Social – RPS, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99, passa a rezar que considera-se união estável aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção de constituição de família, observado o § 1o do art. 1.723 do Código Civil. A remessa ao Código Civil dá a impressão de uma tentativa do Poder Executivo em buscar a visão tipicamente civilista da união estável ao direito previdenciário, o que seria evidente absurdo devido ao temperamento necessário das normas sociais, especialmente quando tratam da garantia do mínimo existencial.


Em precedente mais recente do STF, desta vez tratando de pensionistas do RGPS, a Corte manteve seu entendimento, ao afirmar que, apesar de o Código Civil versar a união estável como núcleo familiar, excepciona a proteção do Estado quando existente impedimento para o casamento relativamente aos integrantes da união, sendo que, se um deles é casado, esse estado civil apenas deixa de ser óbice quando verificada a separação de fato (RE 590779/ES, rel. Min. Marco Aurélio, 10/2/2009). Data maxima venia, a jurisprudência que começa a se formar é gravemente equivocada, e, muito provavelmente, acabará por estimular uma mudança no entendimento administrativo, o qual, até então, admitia a divisão entre esposa e concubina. Como já dito, o pensamento tipicamente civilista não encontra respaldo pleno frente aos direitos sociais, especialmente aqueles que visam assegurar a vida digna. Não admitir a divisão de pensão nestas hipóteses será, sem dúvida, condenar dependentes previdenciariamente legítimos à miséria.


6. Conclusão


Para fins estritamente previdenciários, pouco importa se a união estável visa ao casamento e o concubinato não; irrelevante para o sistema se a pessoa agiu de boa ou má-fé na nova união, mas sim o singelo fato de que uma nova sociedade familiar foi formada, ainda que oficiosamente, e não pode a lei pretender desconstituir os fatos, sob pena de ineficácia social.


Ainda que, por exemplo, não se tratasse de concubinato, mas se a união não fosse notória, devido ao pudor das partes envolvidas, estaria também o companheiro sobrevivente condenado ao desamparo, por não atender a concepção clássica da publicidade da união estável? Certamente não. A proteção social não se subsume a uma concepção ideal de vida e família; não visa impor projetos de vida ou condutas dentro da moral dominante, da mesma forma não se trata de chancelar uniões heterodoxas ou contrárias à moral dominante, mas sim assegurar os meios mínimos de vida aos segurados e  seus dependentes econômicos.


Não é, também, benesse estatal ou caridade alheia, mas forma de seguro social atuarialmente financiado para atender a tais situações, como o concubinato, sempre admitidas, que não podem ficar ao largo do sistema por contrariar a moralidade dominante da sociedade e mesmo do direito privado sobre o que deve ser uma família. Admitir, em tais casos, a prevalência de um conceito de família e união estável, ainda que previsto na Constituição, em detrimento do direito à vida e à previdência social (igualmente previstos na Constituição), é chegar a um resultado inadequado de ponderação, afastando aspectos mais relevantes do bem-estar social em favor de uma moralidade dominante.


A aplicação correta do direito previdenciário não implica, como possa parecer, uma necessária ampliação dos beneficiários, mas sim uma adequação à sua finalidade protetiva, afastada de qualquer tipo de perfeccionismo ético. Sem dúvida isso pode gerar ampliações de prestações, como foi a aceitação da união homoafetiva, mas há restrições, como a negativa de benefício para cônjuge separado de fato, salvo se comprovada a dependência econômica, pois se não mais vivem juntos, a premissa protetiva é que não mais dependência, pouco importando a que título foi feita a separação. Não se trata de alargar ou reduzir benefícios, mas somente aplicá-los de acordo com os ideais de bem-estar e justiça social.


 


Notas:

[1] Para maiores detalhes sobre os dependentes do RGPS, ver o meu Curso de Direito Previdenciário, 16 ed, Niterói: Impetus, 2011.

[2] Sobre o tema, ver BECKER, Alfredo Augusto.  Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Lejus, 1999.

[3]  RE 397.762/BA.

[4] REsp 1.157.273-RN, Rel. Min. Nancy Andrigui, 18/05/2010.


Informações Sobre o Autor

Fábio Zambitte Ibrahim

Professor da Fundação Getúlio Vargas – FGV Direito Rio; Doutorando em Direito Público – UERJ; Mestre em Direito Previdenciário – PUC/SP


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