A atividade processual do curador especial e a defesa do revel citado fictamente (garantia do contraditório)

“…é inquestionável
que é do contraditório que brota a própria defesa. Desdobrando-se o
contraditório em dois momentos: a informação e a possibilidade de reação, não
há como negar que o conhecimento, ínsito no contraditório, é pressuposto para o
exercício da defesa.” (Ada Pellegrini Grinover,
Novas Tendências do Direito Processual)

Naturalmente,
o direito de ação sugere o direito de defesa. Por óbvio, ao ataque advém a
resistência e ambos se identificam como direito à prestação jurisdicional do
Estado. Enfim, são direitos da mesma natureza (verso e reverso de uma
mesma moeda): tal qual a ação, o direito de defesa é direito subjetivo
público, autônomo e abstrato.

Ressalta-se,
deste modo, o caráter de direito subjetivo processual (público, portanto) da
defesa, inclusive alçado à altitude constitucional. Não é despiciendo
invocar CARNELUTTI, processualista de relevo, com sua peculiar perspicácia,
notando que a pretensão da defesa “nada mais é que a afirmação da liberdade
jurídica”
.

Nessa
sintonia, a Magna Charta veio a impor o
CONTRADITÓRIO como garantia aplicável a todos os processos (sejam judiciais ou
não), ganhando, no processo civil, o significado da BILATERALIDADE DE
AUDIÊNCIA
, isto é, garante-se às partes contendoras,
em todas as fases do procedimento, a possibilidade de serem ouvidas, formando,
de fato, um efetivo – paupável, visível –
contraditório (ação e resistência).

Como
bem doutrina o Prof. OVÍDIO A. BAPTISTA DA SILVA “o princípio do
contraditório, ou da audiência bilateral, dá expressão a um princípio de
natureza constitucional no direito brasileiro, que é o direito de defesa, ou
devido processo legal, consubstanciado no art. 153, §4º, da Constituição
Federal.”
1

Na
doutrina alienígena, ROBERT WYNESS MILLAR (Los
principios formativos
del procedimiento civil,
p.47) faz menção à bilateralidade da audiência das partes como princípio
inseparável da função estatal da administração da Justiça, lembrando sua
presença tanto no direito romano, quanto no direito germânico.


se chegou mesmo a afirmar que “a história do princípio do contraditório
confunde-se, em verdade, com a própria história do processo civil.”

E
essa bilateralidade da audiência (ou seja, permitir que tanto autor, quanto réu
deduzam argumentos em juízo e tenham a imprescindível
oportunidade de provar a veracidade do que alegam – até porque como diz a
máxima jurídica alegar e não provar, é o mesmo que não alegar) é de tal
monta relevante que nas hipóteses (modalidades) de citação ficta (presumida) –
editalícia2 ou com
hora certa – o próprio Código de Processo Civil (Art. 9º II) impõe a nomeação
de curador especial, a fim de garantir defesa ao réu revel que não foi
cientificado pessoalmente3.

Em
suma-síntese: busca-se efetivar o contraditório4 preservar os interesses daquele revel
cuja citação não se deu pessoalmente, sendo possível, ao menos in these, que não tenha ciência da ação.

Recorde-se,
por oportuno, que um dos objetivos da citação consiste mesmo em advertir o réu
para preparar sua defesa, expondo sua opinião antagônica em relação aos pleitos
formulados pelo acionante (nesse
sentido JOSÉ FREDERICO MARQUES5
– e JOÃO MONTEIRO6.

Decorre, então, como imposição legal que o ato
citatório, em certas circunstâncias, quando não se tem certeza da ciência do
demandado do teor da ação – como na citação por edital ou com hora certa -,
esteja revestido de condições de segurança, de modo a evitar um julgamento
sumário, unilateral e injusto, como aquele a que foi submetido Joseph K.,
personagem de KAFKA em sua obra clássica, O Processo.

A
nomeação de curador especial, então, é imperativa, cogente, porque sobre a
citação ficta (seja com hora certa, seja pela via editalícia)
pesa a presunção de que poderá o réu não ter tido efetivo conhecimento da
existência da demanda. Visa, então, a garantir contraditório efetivo e real
quando não se tem certeza de que o réu tem ciência da ação em face dele aforada
.
Daí decorrer, destarte, se tratar de múnus público imposto com vistas a
preservar o direito de defesa, consubstanciando bilateralidade do processo.

Lembra
JOSÉ MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO que “tendo sido o revel citado por edital
ou com hora certa, modalidades de citação ficta…, deverá o juiz dar ao réu
curador especial, com plenos poderes processuais. Nesta hipótese, apesar de
existir revelia, não se pode falar em seus efeitos  e tampouco em
julgamento antecipado da lide”
7.

Outra
não é a orientação pretoriana:

“Curador Especial (…) – Trata-se, segundo a doutrina, de
exigência de defesa do revel pelo curador e tem fundamento no principio do
contraditório, pois não se sabe se ele – o réu revel – não quis contestar ou
não pode, ou mesmo não soube da citação. – recurso conhecido pela letra c e
provido.”(
STJ, REsp.32.623/RJ, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJU31.5.93, p.10663)

“É nulo o processo em que, ao réu revel, citado editaliciamente, não foi nomeado curador especial.” (TJ/PB, Ac.un.2ªCâm. j.9.8.93, RNec.6094-1, Rel.Des. Almir Carneiro, in Revista do Foro 91:276)

Enfim,
no dizer de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, à luz de sua experiência judicante, o
curador especial deve “acompanhar o processo em seu nome e defender seus
interesses  na causa”
. (cf. Curso de Direito Processual Civil. Rio : Forense. 1996. 18ªed.. vol.I. p.262)

Somente
através dessa defesa dos interesses do demandado citado fictamente (por edital
ou hora certa), efetivada pelo curador especial, estará formado o diálogo
processual, representado pela tese e antítese (significando ação e reação).
Aliás, o processo civil é, efetivamente, marcado pela dialética. Daí decorrer,
então, a premente necessidade de o curador especial nomeado promover a
defesa do réu
, sob pena de quebrar o contraditório, cerceando-lhe toda e
qualquer chance de defesa.

Essa
defesa do réu revel citado por presunção legal é necessidade de boa justiça e
garantia constitucional de regularidade do processo!!!

O
ínsigne jurista peninsular PIERO CALAMANDREI, de há
muito, já antevia essa necessidade, vislumbrando que o processo moderno “não
pode abrir mão daquele tipo particular de colaboração que se realiza por
intermédio do contraditório, exatamente entendido como método de busca da
verdade baseado na contraposição dialética”.
8

Pois
bem, pelo fato de não se ter certeza de que o réu citado fictamente tinha
ciência da demanda em face dele ajuizada e pela imprescindível necessidade de
formação do contraditório como elemento da prestação jurisdicional, chega-se ao
móvel da existência do curador especial em favor deste
demandado, de modo a possibilitar a efetivação do contraditório efetivo e real
.

NÉLSON
NERY JÚNIOR, em seu festejado Princípios do Processo Civil na Constituição
Federal
(São Paulo : RT. 1997. 4ªed. p.142),
dedicando-se, com acuidade, à análise da matéria, dispara, com peculiar
percuciência, que “a missão específica do curador especial é CONTESTAR A
AÇÃO, que na verdade se revela em função COATIVA, dado que a sua atribuição decorre
de múnus público, que é o de assegurar a efetiva defesa do réu revel citado
fictamente.”

Também
CLITO FORNICIARI JÚNIOR assevera ser imposição ao curador especial o dever de “contestar
a ação”
. (cf. Comentário a acórdão, in Revista de Processo 1:185)

Disso
não discrepa J.J. CALMON DE PASSOS observando que o curador especial “não
pode se omitir no desempenho do múnus que lhe é atribuído. Se, nomeado, faz-se
inativo, impõe-se o seu afastamento, nomeando-se quem de fato desempenhe as
atribuições do cargo”
. (in Comentários ao Código de Processo Civil.
Rio : Forense. v.III)

No
mesmo sentir: JOSÉ MANOEL ARRUDA ALVIM NETTO (op. cit.),
RITA GIANESINI (Da Revelia no Processo Civil. São Paulo. 1977. p.103) e a conclusão nº 17 do V
ENTA – Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada em matéria civil (in Ajuris
24:11).

Sobre
o tema o entendimento jurisprudencial é pacífico, como denotam os acórdãos
trazidos à liça ilustrativamente:

“Réu revel, citado por edital –  Curador especial que se
manifesta pela procedência do pedido – (…) 1 –  Curador especial nomeado
para defender o réu revel citado por edital não tem a alternativa, nem poderes,
para reconhecer a procedência do pedido ou dispor da ação….”
(TJ/PR, Ac.un.
1ªCâm.Cív., v.u., Ap.Cív. 23239900, comarca de Ribeirão Claro, Rel. Juiz
convocado Mendonça da Anunciação, publ. DJ/PR 2.4.93)

Dúvida,
então, inexiste: o curador especial nomeado ao réu revel citado fictamente
tem de PROMOVER DEFESA, não podendo anuir ao pedido, pena de aquebrantar o contraditório e causar desigualdade
processual.
Em outras palavras, o curador especial nomeado não terá outra
alternativa, senão promover defesa, de modo a garantir o contraditório,
formando a essencial bilateralidade do processo.

Como
corolário, exsurge que, qualquer atuação do curador,
diversa da efetiva promoção de defesa, gera nulidade, em face do
cerceamento do direito de defesa, além de implicar em descumprimento de múnus
público.

Repita-se
à saciedade: a anuência ao pedido formulado pelo autor, eventualmente
manifestada pelo curador especial (nomeado para defender o revel citado
fictamente) implica, iniludivelmente, em absoluta nulidade
do processo, por cercear a defesa daquele cujos interesses lhe incumbia
preservar e garantir. Esse o modo criado por lei para garantir a efetividade
do contraditório e da ampla defesa (enfim, a consubstanciação do devido
processo legal), não podendo o curador praticar atos de disposição do direito
que é disputado no processo
.

Impende
evidenciar, por outro turno, que não se está pretendendo afastar o imperioso
princípio da instrumentalidade das formas (CPC 244), pelo qual  só
deve ser proclamada a nulidade do ato se dele decorrer prejuízo. É que na
hipótese de falta de defesa do revel citado fictamente (pelo curador) o
prejuízo é presumido, decorrendo, indubitavelmente, flagrante gravame a ele, a
partir do momento em que não tem defesa. Máxime, ao
notar que sequer se terá absoluta convicção de que, realmente, o réu teve
ciência da propositura da ação.

Pelo
fio do raciocínio, vê-se decorrer a nulidade pela ausência do próprio
contraditório, imposto constitucionalmente, presumindo-se o prejuízo do réu e
percebendo-se a infringência ao texto magno.

Daí
advertir o mestre OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA que “para a completa realização
do princípio do contraditório, é mister que a lei assegure a efetiva igualdade
das partes no processo, não bastando formal e retórica igualdade de
oportunidades.”
(op.
et loc. cit.
)

Equivale
a dizer: a anuência do curador especial ao pedido, por infringir o
direito constitucional ao contraditório, quebrando a IGUALDADE ENTRE AS
PARTES
(a qual deve ser garantida pelo juiz – CPC 125 I),  implica na
presunção do prejuízo do revel citado fictamente – não se tendo sequer,
repita-se, certeza do seu conhecimento efetivo da existência da demanda.

Outra
não é a posição consagrada pelos nossos Pretórios:

“CURADOR
ESPECIAL –  Réu revel citado por edital – Atuação do órgão no sentido de
concordar com a pretensão deduzida pelos usucapientes
– Cerceamento de defesa do ausente caracterizado – Nulidade do processo
decretada a partir de tal manifestação.”
(TJ/SP, in RT 663/84)

“CURADOR
ESPECIAL – CONCORDÂNCIA COM O PEDIDO – NULIDADE – FALTA DE DEFESA – A convicção
pessoal não pode preponderar sobre a obrigação de defesa do ausente. Assim,
ocorre nulidade se o curador concorda com a pretensão deduzida
.”
(TJ/SC, Ac. un. 3ª Câm.Cív., Ap.Cív.
45916, Rel. Des. Amaral e Silva, publ.
DJ/SC 10.10.94, ADV/COAD
49, 1994, verb.67639)

“Atividade
do curador especial. Não contestação. Exige-se o contraditório efetivo no
processo civil, quando o réu revel tiver sido citado por
edital ou hora certa. Assim,  caso o curador especial nomeado para
defendê-lo não apresente contestação, ‘é dever do juiz destitui-lo
do cargo e indicar outro para cumprimento da função designada, sob pena de
nulidade processual.”
(2ºTACív./SP,
Ac.un. 3ªCâm., Ag.513374, Rel. Juiz Cambrea
Filho, j.10.2.98, in BolAASP 2079 – 6 suplem.)

“O
descumprimento por parte do curador especial de sua missão específica, qual
seja a defesa do réu, acarreta a nulidade do processo, a partir da fase
contestatória.”
(TJ/PA, Ac.1ªCâm., Ap.8916, Rel. Des. Ricardo
Borges Filho)

E
mais esses arestos, proclamando a tese esposada:

“É
nulo o processo, por CERCEAMENTO DE DEFESA, em que o curador especial concorda
com a pretensão deduzida contra o réu revel citado fictamente.”
(RT
663:84)

“A
convicção pessoal não pode preponderar sobre a obrigação de defesa do ausente.
Assim, OCORRE NULIDADE se o curador concorda com a pretensão deduzida.”
(TJ/SC,
in Jurisprudência Catarinense 73:296)

Para
colocar dies cedit
em qualquer dúvida, por ventura ainda existente, vale invocar o escólio dos Professores da matéria na Faculdade de Direito
da PUC/SP, NÉLSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY, esclarecendo que a
atividade do curador especial “é destinada à defesa do réu, em face da
possibilidade de não ter ciência de que contra ele corre ação judicial. A
curadoria especial é múnus público, incumbindo ao curador o dever de,
necessariamente, contestar o feito.”

E
concluem com a proficiência que lhes é inerente: “caso o curador não
conteste, o juiz pode destitui-lo e nomear outro para
que efetivamente apresente contestação na defesa do réu.”
9

Assim,
torna-se incontroverso o DEVER DO CURADOR ESPECIAL NOMEADO AO REVEL (citado
fictamente) DE PROMOVER DEFESA, não podendo assentir ao pedido da parte adversa
(até mesmo por não poder praticar atos de disposição de direito), nem tampouco
quedar inerte às alegações do demandante, pena de nulificar absolutamente o
feito.

Importante
destacar que esse dever de promover defesa é tão sério que a própria legislação
processual faculta ao curador especial, para evitar a
ocorrência da revelia, quando não dispuser de elementos específicos, a
contestação por negativa genérica, como reza o Art. 302, Parágrafo
Único, do Pergaminho Adjetivo Civil, dispensando-o da impugnação específica, a
fim de obstar os efeitos da revelia, de que trata o CPC 319.

E
não é só. Além da possibilidade da contestação por negativa geral,
inclusive requerendo a produção de provas, considerando-se a própria
natureza pública do múnus conferido, dispõe o curador do direito à intimação
pessoal
(Lei nº1.060/50, Art. 5º §5º, conforme
jurisprudência do STJ, in RSTJ 64:247 e DJU 18.10.93, p.21886) e
poderá
10,
argüir prescrição (como já admitiu o STJ, no julgamento do REsp.9961/SP, Rel. Min. Athos
Carneiro, publ. DJU2.12.91, p.1754211) ou argüir nulidades ou mesmo
recorrer
(cf. precedente do STJ, in RSTJ 47:272), inclusive lhes
sendo dispensado o preparo (“O recurso interposto por curador de réu
revel, independe de preparo, por exercer múnus público” –
TA/MG, Ac.un.4ªCâm., Ap.158.685-2, Rel.Juiz
Célio Paduani, in Revista de Julgados
52:206). Poderá, ainda, denunciar a lide a terceiro, no caso contemplado no CPC
70 I.

Todavia,
não será lícito ao curador especial praticar atos de disposição do direito,
tais como reconhecer, juridicamente, a procedência do pleito, confessar ou
transigir12. É que o
curador especial é representante judicial (processual) do revel citado
fictamente, não podendo praticar atos de disponibilidade do direito material
controvertido, o que implicará, em último plano, em descumprimento do múnus.

Deste
modo, implicará em nulidade a eventual anuência ao pedido (concordando com a parte
autora), confessando ou reconhecendo-o como procedente ou mesmo a eventual
transação efetuada, seja porque tal concordância colide com a sua função
basilar de promover defesa do acionado, seja porque, em conformidade com o CPC
38, para confessar ou reconhecer a procedência do pedido é preciso que o
representante processual detenha poderes especiais, em razão de significarem
atos de disposição do direito, o que inocorrerá na
curadoria especial.13
Em tais hipóteses (prática de atos de disposição do direito material), cerceada
estará a defesa e, como conseqüência, caracterizar-se-á a nulidade do processo.

Nesse
sentido a lição de NERY e NERY: “é nulo o processo no qual exista ato de
disposição de direito material praticado pelo curador especial.”

Oportuno
lembrar o voto do Des. VOLNEI CARLIN, ao relatar o Ag.Inst.4929,
no TJ/SC, consignando, oportunamente, que “o curador exerce a totalidade dos
poderes processuais que teria o seu representante legal, ‘v.g.’, contestar,
produzir provas, suscitar exceções, e embargos…, não limitando-se em pedir
justiça e apresentar defesa por negação geral.”
(Ac.un.1ªCâm. TJ/SC, in Jurisprudência Catarinense 65:300)

Não
é despiciendo lembrar que, no processo executório,
havendo citação presumida, deverá, por igual raciocínio e imposição legal e
constitucional, ser nomeado ao executado-revel curador, podendo, para garantir
o contraditório no processo de execução, serem oferecidos embargos à execução (meio de defesa típico
daquela espécie processual) como reconhecido pelo STJ
: “a
curadoria especial tem legitimidade para embargar execução promovida contra
executado citado por edital.”
(STJ, Ac.unân.4ªT.,
REsp.79.423/RJ, Rel. Min. Ruy Rosado Aguiar, DJU
29.4.96); “o juiz deve nomear curador especial ao devedor citado fictamente,
e que não compareceu ao processo de execução. O curador especial, representante
judicial do devedor citado fictamente, pode ajuizar ação de embargos à
execução.”
(STJ, Ac.unân. 2ªT., REsp.28114/RJ, j.3.3.97, Rel. Min. Adhemar
Maciel, RSTJ 96:182).

Nesse
diapasão a jurisprudência já cristalizada na Súmula nº9 do TACív./RJ14
e na Súmula nº 196 STJ: “ao executado que, citado
por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado curador especial,
com legitimidade para apresentação de embargos.”
.

Dessume-se, desta forma,
cristalinamente o dever do curador especial nomeado em PROMOVER DEFESA,
garantindo contraditório e uma relação processual justa e equilibrada, em busca
da VERDADE.

Impende
encalamistrar, por derradeiro, que o princípio da
ISONOMIA garantido pela CR (5º caput e inciso I) e pelo CPC (125 I) há
de significar IGUALDADE REAL, SUBSTANCIAL, e não meramente formal.
Assim, impõe-se o tratamento desigual daqueles que são desiguais, sob pena de,
tratando-os igualmente, impor terrível e incalculável prejuízo. E uma das
formas de se garantir ISONOMIA PROCESSUAL é justamente a
nomeação do curador especial ao revel citado fictamente e conseqüente promoção
de defesa por este curador, mitigando a desigualdade gerada pela sua citação
presumida. Nesse diapasão EDUARDO ARRUDA ALVIM15.

Daí
decorrer, como mandamento constitucional, a imposição de o curador
especial promover defesa, pena de desigualdade entre as partes do processo.

Enfim,
“a igualdade de todos perante a lei é garantida pela CF, projetando-se no
plano do Direito Processual Civil… Igualdade no sentido de garantia
constitucional fundamental quer significar isonomia real, substancial… São
exemplos de efetivação da isonomia no processo civil: a) curador especial ao
réu revel citado fictamente (CPC 9º II)”
, como bem salientam NERY e NERY. (op. cit., p. 87)

Assim,
reconhecendo-se a possibilidade de nulificar absolutamente o processo, a partir
do momento em que deveria ser apresentada a defesa do revel citado fictamente16, se não se efetivar-se o contraditório,
deve o curador especial promover defesa (ainda que genérica) ou, no caso de
permanecer desidioso, deve ser destituído17,
recaindo a nomeação em outro advogado (Lei nº8.906/94
– EOAB), para que seja cumprido o ônus defensivo imposto por lei, de modo a
garantir o império do DEVIDO PROCESSO LEGAL, respeitando-se o CONTRADITÓRIO.

Nesta
linha de intelecção, é fácil antever a NULIDADE ABSOLUTA de qualquer procedimento- inclusive em face das previsões insculpidas na Lei Maior (CR 5º caput e inciso LV) – no
qual o curador especial não se desincumbir do dever de apresentar efetiva
defesa (ainda que, em última hipótese, por negativa geral, conforme permissivo
do CPC 302 Parágrafo Único), por aquebrantar o
tratamento igualitário aos revéis citados fictamente, presumindo-se o prejuízo
causado àqueles cujos interesses deveriam ter sido defendidos.

Bibliografia

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THEODORO
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: Forense. 1996. 18ªed.. vol.I

 

Notas

1. cf. Curso de
Processo Civil
. São Paulo : RT. 2000. 5ªed.. v.1. p.70-1

2. lembre-se, por
oportuno, que a citação por edital só poderá ocorrer depois de se tentar todos
os outros meios possíveis para a localização do acionado. Ao revés, estar-se-ia
procedendo de modo temerário, colocando em risco a própria formação válida do
processo. Para NERY e NERY “deve se tentar a localização pessoal do réu por
todas as formas. Somente depois de resultar infrutífera é que estará aberta a
oportunidade para a citação por edital.”
(Código…., p.704). Nesse caminho já há precedente jurisprudencial: “antes
de proceder-se à citação por edital, deve-se tentar a localização pessoal do
réu, com expedição de ofícios ao TRE, DRF e outros órgãos públicos, indagando
de seu paradeiro.”
(TJ/SP, in RJTJSP
124:46).

3. O CPC 9º II impõe, de igual modo, a nomeação de curador especial para o
réu preso, ainda que tenha sido ele citado pessoalmente (tenha ciência
inequívoca da ação), considerando a natural dificuldade que terá para promover
sua defesa na relação processual. A jurisprudência já chegou mesmo a elencar a nomeação de curador especial ao réu preso
como condição imprescindível para a validade do processo, mesmo que “já
tenha advogado constituído nos autos”
(RT 490:92).

4. nesse sentido: “A
inobservância do art.9º, II, do CPC, que impõe a nomeação de curador especial
do réu revel citado por edital, implica anulação do processo desde a fase em que
devia ter acontecido a nomeação. A nomeação de curador especial objetiva
preservar o princípio do contraditório, assegurando o direito de defesa,
garantido constitucionalmente.”
(TJ/MS, Ac.un.T.Cív., Ap.849, Rel. Des. Gilberto da Silva Castro, Adcoas
115.585)

5. in Instituições de Direito Processual Civil. Campinas-SP : Millenium. 2000. 1ªed.. v.II. p.113

6. cf. Processo Civil
e Comercial
. 1936. p.285

7. cf. Manual de
Direito Processual Civil
.  São Paulo : RT.
2000. 7ªed. v.2. p344

8. cf. La
Dialetticità
del processo, in Processo
e Democrazia
. Pádua. 1954. p.1211

9. in Código de Processo Civil Comentado. São Paulo : RT. 1999. 4ªed. p.400

10. obviamente
que a única obrigação imposta ao curador especial é o dever de contestar o
pedido. Qualquer outra providência (como recorrer, embargar…) lhe é
facultada,  não imposta. Nesse sentido: “O curador especial, excetuado
o dever de contestar, atua no mais, segundo sua convicção profissional, não
sendo, portanto, obrigado a interpor recurso.”
(TJ/SP, Ac.un.2ªCâm.Cív.,
Ap.Cív.254.551-2, Rel. Des.
Borelli Machado, j.6.4.95, in JTJSP 170:64)

11. no
mesmo sentido: “o curador especial do réu revel citado fictamente pode
argüir prescrição em defesa.”
(TJ/RJ, in RDTJRJ 1:70)

12. não
poderá, também, exercer o direito de ação, como reconvir (CPC 315), ajuizar
ação rescisória, embargos de terceiros, entre outros, por não integrarem a
atividade de defesa. Por igual fundamento, lhe é vedado o chamamento ao
processo, por não lhe ser lícito “chamar terceiro ao processo”. (cf.
NERY e NERY, op.cit., p.403). Em sentido oposto, admitindo que o curador pode reconvir, TJ/SP, JTJ 146:237.

13. alguns
julgados chegam a exigir o reconhecimento da firma do instrumento procuratório
quando contiver poderes especiais, como o TRF – 4ªRegião (in RT 740:446)
e o STJ: “o CPC 38 e o EOAB 5º §2º dispensam o reconhecimento de firma nas
procurações ‘ad judicia’.
No entanto, se do instrumento de mandato constar a outorga de algum dos poderes
especiais mencionados no CPC 38, é necessário o reconhecimento de firma do
constituinte, aplicando-se o CC 1289 §2º.”
(STJ,
REsp.141716/RS, Ac.un. 5ª T., Rel.
Min. José Arnaldo, v.u.,
j.5.5.98, in BolAASP 2070:690)

14. Súmula nº9 TACív./RJ: “É obrigatória a
nomeação do curador especial, nas hipóteses do art. 9º do CPC, o qual tem
legitimidade para opor embargos à execução.”

15. cf.
Curso de Direito Processual Civil.  São Paulo : RT. 1999. v.I. p.110

16. reconhecendo
que a nulidade absoluta opera-se, automaticamente, a partir do momento em que
deveria o curador especial apresentar defesa, RT 514:238, 490:179; JTACív./SP 124:398 e TJ/MT, 2ªCâm.Civ., Ap.10567, Rel. Des. Athaíde Monteiro da Silva.

17. NERY e NERY lecionam
no mesmo diapasão: “caso o curador não conteste, o juiz pode destituí-lo e
nomear outro para que efetivamente apresente contestação na defesa do réu.”

(op. cit., p.400)

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Cristiano Chaves de Farias

 

Promotor de Justiça – BAHIA
Professor da Faculdade de Direito da UFBA – Universidade Federal da Bahia, FESMIP/BA –
Escola Superior do MP/BA,
EMAB – Escola de Magistrados da Bahia e JusPODIVM – Curso Preparatório para concursos

 


 

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