Relativização da coisa julgada inconstitucional

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Resumo: O estudo da coisa julgada é importantíssimo para o processo, pois é tal instituto que garante a segurança das relações jurídicas. Se não fosse a coisa julgada, a todo o momento os conflitos já decididos poderiam ser modificados por qualquer motivo. O objetivo geral do trabalho é discutir os principais aspectos da coisa julgada, fazer uma análise sobre controle de constitucionalidade no Brasil. Depois das devidas considerações, parte-se para o tema proposto: debater o fenômeno da coisa julgada inconstitucional e ao final mostrar que o que deve prevalecer é a proteção dos princípios constitucionais, guardiões do ser humano, que não pode ser vítima de mácula cometida pelo Judiciário. Na elaboração do trabalho, foram utilizados os métodos dedutivo e indutivo. Durante o exame dos textos doutrinários, foi utilizado o método dedutivo, pelo qual se procura alcançar um denominador comum entre os autores. A partir do método indutivo, foram também analisados diversos artigos de coisa julgada inconstitucional. A relativização da coisa julgada não significa o desprestígio de tal instituto, e sim o seu fortalecimento. A sentença, obrigatoriamente, deve está dentro dos parâmetros constitucionais para receber o manto da imutabilidade.

Palavras-chave: Relativização. Coisa Julgada. Constituição.

Abstract: The study of res judicata is important to the process because it is such an institute that guarantees the security of legal relations. If it was not res judicata, all the time conflicts already decided could be modified for any reason. The general aim is to discuss the main aspects of res judicata, do analysis on control of constitutionality in Brazil. After due consideration of the general part to the theme: discuss the phenomenon of res judicata unconstitutional and the end to show that what must prevail is the protection of constitutional principles guardians of human beings, which can not be the victim of macula committed the judiciary. In preparing the study, we used the inductive and deductive methods. During consideration of the doctrinal texts, we used the deductive method, by which it seeks to achieve a common denominator among the authors. From the inductive method, were also analyzed several articles of thing ruled unconstitutional. The relativization of res judicata does not mean the prestige of such institute, but its strengthening. The sentence must, must is within the constitutional parameters to receive the mantle of immutability.

Keywords: Relativization. Res judicata. Constitution.

Sumário: Introdução. 1. Coisa julgada: conceito e noções gerais. 1.1. Coisa julgada formal e coisa julgada material. 1.1.1. Coisa julgada formal. 1.1.2. Coisa julgada material. 1.2. Limites da coisa julgada. 1.2.1. Limite objetivo da coisa julgada. 1.2.2. Limite subjetivo da coisa julgada. 1.3. Importância da coisa julgada material. 2. Supremacia da Constituição. 2.1. Controle de constitucionalidade das leis e atos normativos no direito pátrio. 2.1.1. Controle difuso. 2.1.2. Controle concentrado. 3. Relativização da coisa julgada inconstitucional. 3.1. Efeitos da decisão declaratória de inconstitucionalidade em relação à coisa julgada. 3.2. Princípio da segurança jurídica. 3.3. Meios de controle da coisa julgada inconstitucional. 3.3.1. Ação rescisória. 3.3.2. Ação declaratória de inexistência. 3.3.3. Embargos à execução. 3.3. Proteção dos Princípios Constitucionais. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

A coisa julga garante a imutabilidade da decisão transitada em julgada, isto é, protege o conteúdo da sentença. Evita-se, dessa forma, a perpetuação dos conflitos. É um princípio constitucional fundamental. Pode-se dizer que a coisa julgada solidifica o Judiciário, à medida que este para se firmar junto a sociedade tem que oferecer estabilidade naquilo que faz. É claro que quando juiz comete erro este poderá ser corrigido mediante os vários mecanismos existentes na lei processual brasileira. Enquanto não transitar em julgado, a sentença pode ser modificada por meio de recurso. Esgotado todas as vias recursais, ou não havendo interposição de recurso a sentença transita em julgado. Apenas depois de transitar em julgado, em regra, a sentença adquire caráter imutável. Depois do transito em julgado, o máximo que pode acontecer é a rescisão do julgado por meio de ação rescisória nas hipóteses previstas em lei. Mesmo com o manejo da rescisória, não quer dizer que a sentença possa ser alterada a qualquer momento, a ação tem prazo para ser proposta, que é de dois anos do trânsito em julgado.

A coisa julgada pode suscitar diversos problemas, entre eles- tema aqui proposto – o que diz respeito à coisa julgada inconstitucional.

O fato é que a aplicação de uma lei inconstitucional, contrária aos princípios, normas e valores da Constituição gera uma sentença inconstitucional. O Judiciário tem uma função social, que é aplicar o direito segundo as normas, os fatos e os valores.

Diante de decisões inconstitucionais tem-se discutido sobre a relativização da coisa julgada. A imutabilidade da decisão comporta abrandamento. Não prevalece mais a tese que a coisa julgada é um princípio absoluto, devendo ser protegida até mesmo quando contrária a Constituição Federal.

A coisa julgada tem o intuito de proteger as normas e valores constitucionais da sentença. A coisa julgada não é manto para sentenças inconstitucionais, contrária às normas e princípios fundamentais, como exemplo, a dignidade da pessoa humana, a isonomia, a moralidade, a legalidade etc.

Não se podem admitir decisões que tenham como fundamento comandos normativos inconstitucionais. A Constituição é o alicerce do Estado, todos os comandos nela contidos devem ser observados. O Poder Judiciário não é soberano, devendo se subordinar a Carta Política. A Constituição Federal tem supremacia em relação aos Poderes.

O objetivo geral do trabalho é discutir os principais aspectos da coisa julgada. Em seguida é importante fazer uma rápida análise nos controles de constitucionalidade adotados no direito pátrio. Depois das devidas considerações gerais da coisa julgada parte-se para o tema proposto: debater o fenômeno da coisa julgada inconstitucional; discutir os efeitos da decisão declaratória de inconstitucionalidade em relação a coisa julgada inconstitucional; debater a importância da relativização da coisa julgada material inconstitucional; apontar as soluções adotadas pela doutrina e jurisprudência, para lidar com a coisa julgada inconstitucional, e ao final mostrar o que deve prevalecer é a proteção dos princípios constitucionais, guardiões do ser humano, que não pode ser vítima de mácula cometida pelo Judiciário.

Na elaboração da monografia, foram utilizados os métodos dedutivo e indutivo. Durante o exame dos textos doutrinários, foi utilizado o método dedutivo, pelo qual se procura alcançar um denominador comum entre os autores. A partir do método indutivo, foram também analisados diversos artigos de coisa julgada inconstitucional, chegando a um consenso abrangente sobre a desconstituição da coisa julgada inconstitucional.

O trabalho foi desenvolvido basicamente pela pesquisa bibliográfica nas áreas de conhecimento jurídico, pelo levantamento e análise da regulamentação existente, por artigos jurídicos de internet e pela análise jurisprudencial dos Tribunais.

A primeira parte abordará as noções gerais da coisa julgada: conceito, previsão legislativa; coisa julgada forma e coisa julgada material; limites objetivos e subjetivos da coisa julgada; e a relevância da coisa julgada material.

Já no segundo momento, não se pode deixar de comentar a supremacia da Constituição em relação a todo o ordenamento jurídico, para em seguida comentar os controles de constitucionalidade das leis e atos normativos no direito pátrio. O controle de constitucionalidade não é acometido a um único órgão do Judiciário, de forma incidental, pode ser exercido por todos os Tribunais e Juízes. Porém, atribuiu-se apenas ao Supremo Tribunal Federal o controle da constitucionalidade de forma direta, isto é, independentemente de um caso concreto que pretende aplicar a norma inconstitucional.

Feitas todas as considerações necessárias será abordado a coisa julgada inconstitucional. Será destacada a justificativa de se relativizar a coisa julgada inconstitucional. Não se pode deixar também de se discutir os efeitos da decisão declaratória de inconstitucionalidade em relação a coisa julgada. O princípio da segurança jurídica não pode deixar de ser exposto, visto que é uma das razões de ser da coisa julgada. A segurança jurídica adquiriu interpretação moderna, não sendo alheio aos valores, princípios e fatos, e sim integrado em um conjunto. A coisa julgada inconstitucional é um fato, não se pode deixar de se apontar meios de controle da coisa julgada inconstitucional. Por fim, igualmente importante para o estudo do tema, não se pode deixar de destacar a proteção à Constituição.

1. COISA JULGADA: CONCEITO E NOÇÕES GERAIS

A atividade jurisdicional consiste em aplicar o direito ao caso concreto, segundo os valores e princípios regedores de nosso ordenamento jurídico. A função jurisdicional se concretiza através das decisões e sentenças.

Sempre que provocado para resolver uma lide, o Estado-juiz terá que dar obrigatoriamente uma solução.

Em algumas situações, devido à complexidade do assunto, é natural o judiciário rever a matéria discutida no processo, entretanto as dúvidas e incertezas do Estado-juiz não podem ser fontes de eterna discussão. O juiz não pode mudar de ideia e proferir uma nova decisão a todo instante. Por isso, a revisão não pode se prolonga indeterminadamente no tempo, chega-se em um determinado momento em que uma decisão definitiva deverá ser tomada.

Esgotadas todas as vias recursais torna-se impossível para as partes requerer a revisão do julgado, tornando-se definitivo, encerrando-se a atividade jurisdicional. É a coisa julgada, especificamente material, que atribui a sentença o caráter de definitiva:

“Em direito processual, coisa julgada é imutabilidade. Quando proferida a sentença, ela própria e seus efeitos inda são mera proposta de solução do litígio (sentenças de mérito), ou simplesmente proposta de extinção do processo (terminativas), uma vez que ainda é possível a substituição da sentença e a alteração do teor do julgamento, em caso de recurso interposto pela parte vencida. Uma decisão judiciária só fica imune a qualquer questionamento futuro, quando já não comporta recurso (CPC, ART. 476)” (DINAMARCO, 2002, P.295).

A coisa julgada tem fundamento constitucional, inserto no artigo 5°, inciso XXXVI da Constituição Federal: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Na sistemática da Constituição, a coisa julgada ocupa o título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”. Pelo artigo 60 , §4°, inciso IV da Carta Política, os direitos e garantias individuais são insuscetíveis de emendas tendentes a abolições. A lei de introdução às normas do direito brasileiro, no artigo 6°, §3°, trata da coisa julgada nos mesmos moldes da Constituição, acrescentando apenas o conceito do instituto: “Art.6° A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. […] §6° Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso”.

O Código de Processo Civil faz o detalhamento da coisa julgada, inclusive enumera algumas situações em que não se opera a coisa julgada. O conceito de coisa julgada é trazido pelo artigo 467: “Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.

Boa parte da doutrina brasileira adotou o conceito do doutrinador italiano Enrico Tullio Liebman, em que a coisa julgada torna a decisão judicial imutável, não podendo ser modificada, tornando eterno todos os seus efeitos – declaratórios, constitutivos e condenatórios:

“Diversas são as definições do fenômeno encontradas na doutrina. Interessa, aqui, referir a posição definida por Enrico Tullio Leibman, por ser a posição mais aceita na doutrina brasileira. Assim, é que, para aquele jurista italiano, mentor da escola processual brasileira, coisa julgada é ‘a imutabilidade do comando emergente de uma sentença’. Consistiria a coisa julgada, segundo Liebman, na imutabilidade da sentença em sua existência formal, e ainda dos efeitos dela provenientes” (SARAIVA, 2007, p. 407).

Como se percebe, o legislador deu uma atenção especial a coisa julgada, frisando sempre que ela deve ser protegida até mesmo das leis que lhe sobrevenham. Não admitindo a modificação da sentença que passou em julgado.

Deve-se destacar que apenas a atividade jurisdicional pode gerar a coisa julgada. Por meio da coisa julgada, em regra, a sentença torna-se indiscutível, no mesmo processo ou em outro. As decisões proferidas pela Administração Pública não fazem coisa julgada para o Judiciário, este pode rever as decisões administrativas sempre que provocado.

A imutabilidade põe um basta nas discussões, oferecendo uma solução para resolver o conflito. Dessa forma, a coisa julgada tem o intuito de evitar que os conflitos se perpetuem pelo tempo. Por isso que, proferida a sentença de mérito, sem haver recurso, ou havendo, esgotada todas as vias recursais, a consequência será a formação da coisa julgada. Não se admitindo que o mérito seja novamente discutido, exceto quando possível a ação rescisória.

A ação rescisória consiste na possibilidade de rescindir uma sentença de mérito já transitada em julgado. O escopo da dita ação é evitar que sentenças com vícios graves sejam definitivas. A ação rescisória é prevista no artigo 485 do Código de Processo Civil: “A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando”. Os incisos enumeram as situações que autoriza o uso da ação rescisória.

A coisa julgada não é um efeito da sentença. A coisa julgada é uma forma de tornar o conteúdo da sentença definitivo, estável, imutável. Os efeitos da sentença ficam cristalizados em consequência da coisa julgada:

“A autoridade da coisa julgada não é o efeito da sentença, mas uma qualidade, um modo de ser e de manifestar-se dos seus efeitos, quaisquer que sejam, vários e diversos, consoante as diferentes categorias de sentenças. Nisso consiste, pois a autoridade da coisa julgada, que se pode definir, com precisão, como a imutabilidade do comando emergente de uma sentença. Não se pode identificar ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando; é, pelo contrário, uma qualidade, mais intensa e mais profunda, que reveste o ato também em seu conteúdo e torna assim imutáveis, além do ato em sua existência formal, os efeitos, quaisquer que sejam, do próprio ato” (GARCIA apud LIEBMAN, 2007, p. 16).

A coisa julgada recai nos efeitos da sentença, não é um efeito da sentença. Segundo Dinamarco (2002, p. 304): “[…] a coisa julgada material, incide sobre os efeitos da sentença, não sobre ela própria como ato jurídico-processual – a proteção desta é feita pela coisa julgada formal”. No mesmo sentido é Marinoni (2004, p.675): “[…] a coisa julgada não é um efeito da sentença, mas uma qualidade que pode agregar-se a estes efeitos”. Portanto, a doutrina não considera a coisa julgada como um efeito da sentença. Separe-se a coisa julgada da sentença, pois são institutos diferentes. A sentença é o comando e a coisa julgada é que o torna definitivo.

1.1. COISA JULGADA FORMAL E COISA JULGADA MATERIAL

Há duas espécies, segundo a doutrina, de coisa julgada: a material e a formal. O Código de Processo Civil, no artigo 496, apenas definiu o que seria coisa julgada material como sendo “[…]a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”. A doutrina aponta, também, a coisa julgada formal. A coisa julgada por excelência é a material, é tanto que mereceu atenção especial do legislador.

1.1.1 Coisa julgada formal

A coisa julgada formal ocorre apenas endoprocessualmente, isto quer dizer que não se pode rediscutir a relação processual no mesmo processo em que foi proferida a sentença. Porém, nada obsta que seja novamente rediscutida a demanda proposta em outro processo. A coisa julgada formal pode ser verificada quando o julgador não decide o mérito, nas chamadas sentenças terminativas. É a situação em que o juiz extingue o processo sem resolução do mérito, nas situações previstas no artigo 267 do Código de Processo Civil:

“I – quando o juiz indeferir a petição inicial; II – quando ficar parado durante mais de um ano por negligência das partes; III – quando, por não promover os atos e diligências que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de trinta dias; IV – quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;  V – quando o juiz acolher a alegação de perempção, litispendência ou de coisa julgada; VI – quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual; VII – pela convenção de arbitragem; VIII – quando o autor desistir da ação; IX – quando a ação for considerada intransmissível por disposição legal; X – quando ocorrer confusão entre autor e réu; XI – nos demais casos prescritos neste Código”.

A coisa julgada formal envolve questão de técnica-processual. O defeito do processo impede o julgador de analisar o mérito. Para que possa oferecer uma solução, em outra ação, deverá o autor corrigir o defeito que causou a extinção precoce da causa.

Como se pode perceber, a coisa julgada formal assemelha-se a preclusão conforme ensina Marinoni (2004, p.670): “A impossibilidade de rediscutir a matéria dentro da mesma relação processual conduz, inexoravelmente, à ideia de preclusão”. Ambos representam a perda de se rediscutir uma questão no mesmo processo, porém a preclusão se refere às decisões interlocutórias e as faculdades processuais, conforme Theodoro Júnior (2001, p.468): “A preclusão é, pois fenômeno que se relaciona apenas com as decisões interlocutórias e as faculdades conferidas às partes com prazo certo de exercício”. Já a coisa julgada formal refere-se a imutabilidade da sentença. Operada a coisa julgada não se poderá impugnar o decisório, este fica imutável:

“Coisa julgada formal é a imutabilidade da sentença como ato jurídico processual, consiste no impedimento de qualquer recurso ou expediente processual destinado a impugná-la, de modo que, naquele processo, nenhum outro julgamento se fará” (DINAMARCO, 2002, p.297).

Outra parte da doutrina considera a coisa julgada formal uma preclusão:

“A ‘coisa julgada formal’ opera-se em relação a qualquer sentença a partir do momento em que precluir o direito do interessado em impugná-la internamente à relação processual. Como preclusão que é, não deve ser confundida com a figura (e o regime) da coisa julgada (material)” (MARINONI, 2004, p.670)

“Assim é que alguns autores acabam por identificar a coisa julgada formal como uma espécie de preclusão e a denominam de preclusão máxima, deixando claro que nenhum outro ato processual poderá ser realizado dentro daquela determinada relação jurídico-processual porque a sentença de mérito tornou-se imutável” (MARCATO, 2004, p. 1437)

Não se pode negar que a coisa julgada formal e a preclusão se parecem bastante, no entanto a discussão em torno dessa questão é pouco relevante, já que não tem nenhuma relevância na prática. No final das contas tanto um quanto outro representa a perda de uma faculdade processual, só com um pequeno detalhe, nem sempre a preclusão de um ato processual acarretará a extinção do processo sem resolução do mérito.

1.1.2 Coisa julgada material

A coisa julgada material produz efeitos fora do processo, é um fenômeno extraprocessual. Pode-se constatar a coisa julgada material quando o juiz julga o mérito (sentença definitiva), como, por exemplo, decide sobre a existência ou não de um direito. Na jurisprudência, a coisa julgada material não envolve questão processual, e sim mérito, conforme Negrão (2007, p. 463): “Coisa julgada e preclusão. Inexiste coisa julgada material se as questões decididas foram somente de natureza processual. A incidência  do disposto no art. 468 do CPC supõe decisão de mérito (RSTJ 13/399)”.

Com a coisa julgada material, as partes ficam impedidas de rediscutir o objeto da demanda na mesma relação processual, como também em outro, assim diz Wambier (2007, p.520): “[…] quando sobre determinada decisão judicial passa a pesar autoridade de coisa julgada, não se pode mais discutir sobre aquilo que foi decidido em nenhum outro processo”. O professor Wambier designa apenas coisa julgada para identificar a espécie material, quando se refere a formal escreve expressamente coisa julgada formal. Importante observar que a coisa julgada diz respeito ao que foi decidido expressamente na sentença. As questões de mérito, que não fizeram parte da sentença, não fazem coisa julgada material:

“Por isso, se a questão não fora decidida pela sentença, embora constasse do pedido, nem o autor embargou de declaração, não se formou a coisa julgada sobre o que não foi apreciado, podendo o autor, portanto, propor nova ação para obter a prestação jurisdicional correspondente (RTJ 99/289, RF 275/177, RT 621/177). Poderá conforme o caso, mover rescisória (RP 14/235 – Arruda Alvin). Se a sentença é omissa em quanto a um dos pedidos, não se forma coisa julgada com relação a ele porque não há sentença implícita (JTA 104/304). Ainda: Havendo a sentença originária definindo a responsabilidade perante terceiro sem decidir as relações entre denunciante e denunciado, não afronta a coisa julgada a decisão que, em processo específico, resolve essa questão” (RTJ 129/854 e STF – RT 647/221) (NEGRÃO, 2007, p. 564).

Segundo o artigo o artigo 269 do Código de Processo Civil, o juiz resolve o mérito nas seguintes situações:

“I –  quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor; II – quando o réu reconhecer a procedência do pedido; III – quando as partes transigirem; IV – quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição; V – quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação”.

O inciso I do artigo supra é denominada como sentença de mérito típica, os incisos II a IV do mesmo artigo são denominados de sentenças de mérito atípica.

Não se pode propor ação que já foi julgada por sentença de mérito transitada em julgado. Para cada ação, só se pode ter um provimento jurisdicional. Os elementos identificadores de uma ação são as partes, a causa de pedir e o pedido, segundo consta no artigo 301, §2° do Código de Processo Civil: “uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido”. A modificação de qualquer dos elementos mencionados gera uma nova ação, que não se submete aos efeitos da coisa julgada material. Agora, se duas ações têm as mesmas partes, causa de pedir e pedido, estar-se-á diante de ações idênticas, devendo se submeter à coisa julgada material. Segundo Garcia apud Nery Júnior (2007, p.35): “A coisa julgada não se caracteriza quando a causa de pedir, bem como os fatos, da nova pretensão são diversos da ação anteriormente proposta e definitivamente decidida”. 

Diante da relevância do assunto é bom lembrar que a causa de pedir consiste na alegação e descrição dos fatos, fundamento do pedido. O Código de Processo Civil adotou a teoria da substanciação, determina a descrição dos fatos, não sendo suficiente apenas a argumentação jurídica. Deve-se observar se o fato novo poderia ter sido alegado na ocasião da propositura da ação, em caso negativo não se faz coisa julgada, porém, se em caso positivo, haverá a coisa julgada:

“Entretanto, com a devida vênia, deve-se distinguir se o fato jurídico novo era ou não passível de ser alegado no processo anterior. Se os fatos (jurídicos) forem novos, no sentido de não poderem ter sido alegados no processo anterior, está correto dizer que não há coisa julgada, nem mesmo sob o enfoque de sua eficácia preclusiva. Entretanto, mesmo diante de nova causa de pedir, tornando a demanda distinta, envolvendo as mesmas partes, se o pedido for idêntico, os “novos” fatos ou fundamentos jurídicos alegados não poderão alterar o decisum de mérito já transitado em julgado, caso pudessem ter sido opostos no processo anterior, em plena manifestação da eficácia preclusiva da coisa julgada” (GARCIA, 2007, p.25).

Os fatos que poderia ser alegados e não foram não podem ser levantados em outra ação com o mesmo pedido, sob a justificativa de causa de pedir diferente. Admitir semelhante atitude seria apoiar a perpetuação dos conflitos, prejudicando a pacificação social. Estaria burlando a lei. Conforme o artigo 474 do Código de Processo Civil: “Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido”.

Em regra, o juiz não pode decidir novamente questões já decididas, salvo, segundo artigo 471 do Código de Processo Civil: “I – Tratando-se de relação jurídica continuativa, sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; II – nos demais casos prescritos em lei”. A Lei n.°5.478/68, artigo 15 prevê que “A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado pode a qualquer tempo ser revista em face da modificação da situação financeira dos interessados”.

A coisa julgada material é matéria de ordem pública, podendo, dessa forma, ser conhecida a qualquer momento e grau de jurisdição. O réu deve a argumentar em sede de preliminar de contestação conforme o artigo 301, inciso VI, do Código de Processo Civil: “Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: (…) VI- coisa julgada”. Entretanto, se o réu não arguir a preliminar de coisa julgada na contestação, ficará responsável pelas custas do retardamento, segundo o artigo 22 do Código de Processo Civil:

“O réu que, por não arguir na sua resposta fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, dilatar o julgamento da lide, será condenado nas custas a partir do saneamento do processo e perderá, ainda que vencedor na causa, o direito a haver do vencido honorários advocatícios”.

Os Tribunais acolhem a alegação da coisa julgada, mesmo que fora da contestação, porém o réu terá que arcar com as custas do retardamento. Afinal de contas o réu deu despesas desnecessárias ao Judiciário, que já vivi sobrecarregado:

“A coisa julgada constitui matéria de contestação, e não de exceção (cf. art. 301-VI), mas pode ser alegada a todo tempo (RF 246/393), arcando o réu com as custas do retardamento (art.22). Pode ser reconhecida de ofício” (RTJ 72/574, RJTJESP 101/212) (NEGRÃO, 2007,  p.563)

Passada em julgado a sentença sem haver recurso, formar-se-á a coisa julgada. A coisa julgada formal e material podem se formar separadamente. Qualquer sentença está apta a fazer coisa julgada formal, para isso basta que se torne irrecorrível. A situação pode ser constatada quando o processo é extinto sem resolução de mérito, caso em que ocorrerá apenas a coisa julgada formal. Agora, se o julgado analisa o mérito haverá a coisa julgada formal e material:

“Casos há em que só se forma a coisa julgada formal, e não a material, como por exemplo, na sentença em que se diz que ao autor falta legitimidade para agir. Entretanto, numa sentença em que o juiz acolhe o pedido do autor, há tanto a coisa julgada formal quanto a material. Assim, como se vê, a coisa julgada formal ocorre sempre, mas nem sempre acompanhada pela coisa julgada material, que só se forma se de sentença de mérito se tratar” (WAMBIER, 2007, p. 520).

A coisa julgada material torna imutável o efeito da sentença. É importante frisar que não é toda a sentença que passa a ter a autoridade da coisa julgada material. A sentença é composta essencialmente por três elementos: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. Segundo o artigo 458 do Código de Processo Civil,

“São requisitos essenciais da sentença: I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido, e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes lhe submeterem”.

O acórdão segue a mesma estrutura da sentença, conforma o artigo 165 do Código de Processo Civil: “As sentenças e acórdãos serão proferidos com observância do disposto no artigo 458; as demais decisões serão fundamentadas ainda que de modo conciso”.

O relatório é a síntese dos fatos e ocorrências relevantes para o processo, não faz nenhum juízo de valor. A fundamentação é a exposição das razões que levaram ao convencimento do juiz. É a razão da conclusão. Toda decisão deve ser fundamentada, conforme o artigo 93, inciso IX da Constituição Federal:

“IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão público, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”;

A parte dispositiva é a conclusão onde o julgador acolhe ou rejeita, total ou parcialmente, o pedido do autor. Apenas a parte dispositiva transita em julgado, ou seja, a parte da sentença que julga o mérito.

“O que a coisa julgada imuniza é sempre o decisum, que constitui resposta ao petitum. Os motivos da sentença, que dão solução aos pontos e questões suscitados na causa de pedir ou na defesa, não são cobertos pela coisa julgada: na medida em que se estabilizam, isso se deve à eficácia preclusiva da coisa julgada e não à auctoritas rei judicantae em si mesma” (GARCIA apud DINAMARCO, 2007, p.20).

Os fundamentos da sentença não analisam o mérito. O relatório e a fundamentação não ficam imutáveis. Conforme o artigo 469 do Código de Processo Civil:

“Não fazem coisa julgada: I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; II – a verdade dos fatos, estabelecidos como fundamento da sentença; III – a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentalmente no processo”.

Os dois últimos incisos do artigo 469 estão contidos no primeiro, conforme as lições de Dinamarco (2002, p.313): “Na realidade, todos os três incisos referem-se à motivação da sentença, pois os dois últimos não passam de meras especificações do primeiro”.

Dessa forma, os fatos e as questões de direito inseridas na fundamentação da sentença anterior, poderão ser objeto de alegação em nova demanda. Como também, a sentença poderá ter fundamento diverso para a relação jurídica analisada incidentalmente em provimento anterior, sem prejudicar a coisa julgada, já que a fundamentação não transita em julgado.

As questões prejudiciais fazem coisa julgada quando propostas em sede de ação declaratória incidental, dessa forma as prejudiciais serão analisadas por sentença. Artigo 470 do Código de Processo Civil, “Faz, todavia, coisa julgada a resolução da questão prejudicial, se a parte o requerer (artigos 5°e 325), o juiz for competente em razão da matéria e constituir pressuposto, necessário para o julgamento da lide”. Não faz coisa julgada material a questão analisada incidentalmente na fundamentação da sentença:

“A coisa julgada incide apenas sobre o dispositivo propriamente dito da sentença, não sobre seus motivos ou sobre questão prejudicial – CPC, art.469, I e III, salvante, quanto a esta, a propositura de ação declaratória incidental (RSYJ 140/405). A coisa julgada em sentido material restringe-se à parte dispositiva do ato sentencial ou àqueles pontos que, substancialmente, hajam sido objeto de provimento jurisdicional, quer de acolhimento, quer de rejeição do pedido” (RTJ, 133/1.311) (NEGRÃO, 2007, p. 565).

Apesar de não previsto no Código, não fazem coisa julgada material, segundo a doutrina, as sentenças proferidas em processo de jurisdição voluntária, as medidas antecipatórias; as sentenças de natureza cautelar e as sentenças que se submetem ao reexame necessário. Deve-se destacar que o acolhimento de prescrição ou decadência nos processos cautelares, faz coisa julgada:

“A alegação de decadência ou prescrição do direito do autor, reconhecida em processo cautelar, faz coisa julgada (art. 810). A sentença contrario sensu, a alegação de decadência ou prescrição, rejeitada no procedimento cautelar, poderá ser reexaminada na ação principal” (SIMP – concl. LXX, em RT 482/273) (NEGRÃO, 2007, p. 564).

A essência da coisa julgada material é resolver definitivamente uma lide. Assim, os processos que não têm conflitos, como também as decisões provisórias não adquirem a imutabilidade.

1.2 LIMITES OBJETIVOS E SUBJETIVOS DA COISA JULGADA

Definida a coisa julgada e diferenciada a coisa julgada material e formal, para melhor compreensão do estudo proposto, a continuidade do trabalho será voltada para a coisa julgada especificamente material, pois, como já dito, é a que tem condições de tornar-se imutável dentro e fora do processo. Os limites subjetivos e objetivos da coisa julgada são materiais.

1.2.1 Limite objetivo da coisa julgada

Os limites objetivos da coisa julgada consistem na imutabilidade da parte dispositiva da sentença, pois é à parte que decide o mérito do pedido, conforme as devidas considerações analisadas no tópico anterior. Não faz coisa julgada os fundamentos, a verdade dos fatos e as questões prejudiciais solucionadas incidentalmente no processo.

O que se deve destacar neste tópico em relação aos limites objetivos é que para cada pedido pode haver a formação da coisa julgada em momentos distintos:

“Se a impugnação à sentença é parcial (arts.505 e 512, ‘in fine’) forma-se coisa julgada sobre o que não fora objeto do recurso, iniciando-se o prazo para propositura da rescisória, quanto a esta parte (v. RTJ 103/472. No mesmo sentido: RJTJ 152/335, 153/544, RJTJESP 103/397, JTA 91/306” (NEGRÃO, 2006, p.588)

A cumulação de pedidos é autorizada pela lei processual no artigo 292: “É permitida a cumulação, num único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda entre eles não haja conexão”. Todos os pedidos serão julgados pela mesma sentença, porém para cada um aplica-se a teoria dos capítulos da sentença. Cada um dos pedidos corresponde a um capítulo.

Uma sentença pode conter vários capítulos. Se a sentença é impugnada apenas parcialmente, os capítulos que não forma alvo de recurso, transitará em julgado. O capítulo que não foi recorrido poderá ser executado definitivamente.

“Tendo sido interposto recurso parcialmente, é possível a execução definitiva da parte da decisão já transitada materialmente em julgado, desde que observados pressupostos indispensáveis: I – autonomia concreta ou abstrata entre o capítulo da decisão que se pretende executar e aquele objeto da impugnação; II – havendo litisconsórcio, que não seja ele unitário, quando houver recurso interposto por apenas um ou alguns dos litisconsortes” (GARCIA apud Santos, 2007, p.55).

A título de ilustração suponha que a sentença tenha três capítulos, relativos aos pedidos formulados pelo o autor: capítulo I, capítulo II e capítulo III. O juiz julgou procedentes todos os pedidos. O réu recorre apenas do capítulo I. Os capítulos II e III transitam em julgado desde logo, recebendo o manto da coisa julgada. No mesmo exemplo suponha agora que o réu recorra de todos os capítulos da sentença. O Tribunal dar provimento parcial, excluindo o capítulo I da sentença. Ainda inconformado o réu interpõe recurso especial com intuito de excluir os capítulos II e III da decisão. Entretanto, o Tribunal a quo nega seguimento ao que se refere a exclusão do capítulo II da sentença. Se o réu não interpor agravo desta decisão do Tribunal a quo transitará em julgado o capítulo II, mesmos que os autos subam para o Superior Tribunal de Justiça:

“Quando for parcial o recebimento do recurso pelo juízo a quo, isso significa que, se o recorrente não interpuser agravo, passará em julgado o capítulo de sentença ou de acórdão em relação ao qual o recurso houver indeferido; em outras palavras, o recorrente tem o ônus de interpor o agravo contra a parte desfavorável da decisão de recebimento. Isso pode acontecer no juízo de admissibilidade da apelação, dos embargos infringentes, do recurso especial ou do extraordinário etc., feito pelo juízo a quo (juiz de primeiro grau, presidente do tribunal de origem). O agravo será nesse caso parcial, não devolvendo o capítulo favorável da decisão, ou seja, o capítulo do qual consta o parcial deferimento do recurso; isso significa que no julgamento desse agravo o tribunal não poderá apreciar a parte positiva da decisão agravada, ou seja, a parte em que ela contém o juízo positivo de admissibilidade do recurso antes interposto. Isso será feito quando o próprio recurso lhe chegar, ocasião em que sua admissibilidade será apreciada em juízo preliminar de conhecimento” (Garcia, 2007, p.49).

Neste mesmo sentido já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça: “A falta de interposição do recurso de agravo de instrumento, na parte não admitida no recurso especial preclui o direito do recorrente em discutir a matéria irrecorrida, neste particular”

Se a parte recorre apenas parcialmente da sentença, e a outra parte não recorre dos pedidos que não foram impugnados pelo outro, haverá o trânsito em julgado.

Desse modo, o recurso devolve a matéria ao Tribunal apenas os capítulos da sentença impugnados, os outros transitam em julgado normalmente. O capítulo da sentença torna-se imutável. A coisa julgada será respeitada, pois se trata de uma garantia constitucional. Mesmo podendo o Tribunal conhecer de ofício as preliminares, estas só poderão influenciar no julgamento dos capítulos impugnados, os que não foram deverão ser observados. Já na situação de se impugnar todos os capítulos da sentença, não haverá problema em o Tribunal reconhecer alguma preliminar e extinguir o processo sem resolução de mérito.

A não alegação de matéria de ordem pública, não impede o Tribunal em reconhecê-la, porém o julgamento terá que se limitar aos capítulos resistidos. Denomina-se efeito translativo do recurso, a possibilidade do órgão ad quem reconhecer as questões de ordem pública de ofício, embora não suscitados no recurso. É um pequeno permissivo para o tribunal julgar fora do que constam as razões ou contrarrazões do recurso, no caso não se pode alegar que o Tribunal tenha proferido decisão ultra, extra ou infrapetita. Sobre o tema se manifestou o Supremo Tribunal Federal na ação cautelar número 112:

“(…)Sob pena de ofensa à garantia constitucional da coisa julgada, não pode tribunal eleitoral, sob invocação do chamado efeito translativo do recurso, no âmbito de cognição do que foi interposto apenas pelo prefeito, cujo diploma foi cassado, por captação ilegal de sufrágio, cassar de ofício o diploma do vice-prefeito absolvido por capítulo decisório da sentença que, não impugnado por ninguém, transitou em julgado.”

Todas estas considerações foram necessárias para que se fique delimitada a formação da coisa julgada.

1.2.2 Limite subjetivo da coisa julgada

Os limites subjetivos significam que a coisa julgada não poderá alcançar terceiros que não fizeram parte da relação processual. A coisa julgada não poderá beneficiar nem prejudicar pessoas estranhas ao processo. O Código de Processo Civil trata do assunto no artigo 472:

“A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros”.

A coisa julgada atinge diretamente as partes do processo, isto é, autor e réu, como também litisconsortes ativos ou passivos quando houver, o interventor litisconsorcial voluntário, o opoente, o litisdenunciado, o chamado e o nomeado.

O assistente, que interveio no processo, não poderá questionar a justiça da decisão. Transitada em julgada a sentença, o assistente não poderá modificar o seu conteúdo, salvo se alegar e provar a ocorrência de algumas das situações previstas no artigo 55, incisos do Código de Processo Civil:

“I – pelo estado em que recebera o processo, ou pelas declarações e atos do assistido, fora impedido de produzir provas suscetíveis de influir na sentença; II – desconhecia a existência de alegações ou de provas, de que o assistido, por dolo ou culpa, não se valeu”.

Deve-se observar que a parte final do artigo 472 estabelece que a coisa julgada atingirá terceiro nas ações relativas ao estado de pessoas. Os terceiros na verdade são interessados e para que a sentença torne-se imutável em relação a estes terão que ser citados em litisconsorte necessário. Note-se que o interesse do terceiro é jurídico, que nas lições de Marinoni (2004, p.684): “[…] terceiro interessado é aquele que tem interesse jurídico na causa, decorrente da existência de alguma relação jurídica que mantém conexa ou dependente, em face da relação jurídica deduzida em juízo”. Não é qualquer terceiro que terá que suportar a coisa julgada, mas somente aquele que tenha algum vínculo com que se está sendo discutido em juízo. Por haver um interesse jurídico, é permitida a participação do terceiro. Deve-se ressaltar também, que se faz mister abrir o contraditório para que a sentença torne-se imutável tanto em relação às partes como em relação a terceiros.

Embora a sentença atinja diretamente apenas as partes, não se pode negar que a sentença também poderá atingir indiretamente outras pessoas, mesmo que essas não tenham direitos, obrigações ou deveres na lide discutida. Como por exemplo, o autor pleiteia uma indenização ao réu, apesar do credor do autor não ter vínculo jurídico algum com a lide ele terá interesse que o autor ganhe para pagar o crédito dele. Como se percebe o julgado não trata dos direitos do terceiro, limita-se apenas as partes envolvidas no processo.

A coisa julgada também atinge o sucessor e o substituto processual, tais não fizeram parte do processo desde a origem, porém suportará a coisa julgada como se tivesse participado. Sobre o assunto se manifesta Dinamarco (2002, p. 321): “Não reside nessas proposições qualquer mitigação ou mesmo ressalva à regra da limitação subjetiva da autoridade do julgado às partes, mas mera especificação”.

Terceiros não se confundem com o substituto ou com o sucessor, pois estes têm interesse direto no julgado, a lei lhes dão esta legitimidade.

A sucessão causa mortis transfere todos os direitos e obrigações aos sucessores do falecido. As dívidas eventualmente existentes só obrigam os sucessores nos limites da herança.

Para ficar mais fácil pode-se citar como exemplo de substituição processual o adquirente de bem litigioso, o cedente permanece no processo ocupando posição de substituto processual, porém, o direito material não é mais de quem já cedeu o bem litigioso, e sim do próprio adquirente desse bem. O artigo 41, §3°do Código de Processo Civil estabelece: “A sentença, proferida entre as partes originárias estende os seus efeitos ao adquirente ou ao cessionário”. O adquirente ou cessionário só pode substituir o alienante ou cedente apenas se a parte contrária consentir. Em todo caso o adquirente ou cessionário poderão figurar como assistente do alienante ou cedente. Assim, se alguém adquire um bem litigioso será atingido pela coisa julgada, mesmo que o processo tenha sido defendido por outrem. Tal situação é excepcional, pois a regra é que sentença só vincula as partes da relação jurídica.

O limite subjetivo da coisa julgada não é absoluto. A Lei n.°8.078/1990, que dispõe sobre a proteção do consumidor, determina que nas ações coletivas a decisão vincula até mesmos aqueles que não fizeram parte do processo, dando efeito erga omnes, quando o pedido for julgado procedente, beneficiando todas as vítimas e seus sucessores.

1.3. IMPORTÂNCIA DA COISA JULGADA MATERIAL

Não se pode confundir coisa julgada com justiça. Definir justiça não é tarefa nada fácil, é um tema filosófico. A definição varia no tempo e no espaço. A ideia geral que se tem de justiça, sem fazer delongas, é dar a cada um o que lhe pertence. Em nenhuma lei consta que para a decisão torne-se definitiva, terá que necessariamente cumprir a justiça. É claro que intenção do Judiciário é ser justa, mas não existem fórmula nem método que se garanta o ideal.

Assim, a coisa julgada não significa que foi atingido um ideal de justiça, se assim fosse não haveria necessidade da ação rescisória para rescindir decisões transitadas em julgado.

O objeto da coisa julgada preocupa-se com a segurança das relações jurídicas, pacificando os conflitos, em regra, de forma definitiva.

Nenhum mecanismo processual é garantia de uma solução justa. O Código Processual adotou a coisa julgada para se colocar um ponto final nos conflitos. A busca incessante da verdade prejudicaria o direito de uma justiça rápida, princípio introduzido pela Emenda Constitucional n.°45, no artigo 5°, inciso LXXVIII: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Tal inciso foi inserido como direito constitucional, altamente relevante, direito fundamental de todo o cidadão, porém a realidade brasileira demonstra que há muito que ser discutido e revisto no nosso sistema, pois os processos demoram anos para serem julgados, têm duração de uma longa vida. É de se advertir que a verdade dos fatos é inatingível, não se pode levar fatos para a sala de audiência, e sim a versão da verdade. Porém chega-se em um determinado ponto que diante das provas dos autos o juiz deverá tomar uma decisão, estabelecendo a verdade dos fatos. A coisa julgada não passa de um critério de justiça processual. A decisão final expressa o juízo de convencimento do julgador, que não significa o retrato fiel da verdade e da justiça:

“Considerando o exame anterior feito, a respeito da função, da verdade no processo, e partindo-se das premissas ali lançadas, tem-se como razoável considerar que o instituto da coisa julgada representa critério de justiça para o processo civil. Eternizar-se a solução do conflito, na busca de uma verdade que, em sua essência, jamais será possível dizer estar atingida, constitui certamente algo inaceitável, mormente em se considerando o perfil das relações sociais e econômicas da sociedade moderna. É, por isso, realmente indispensável colocar, em determinado momento, um fim ao litígio submetido à apreciação jurisdicional, recrudescendo a decisão judicial adotada. A esse momento corresponde a coisa julgada” (MARINONI, 2007, p.674).

“O fundamento da coisa julgada reside não na preocupação de valorar a sentença diante dos fatos (verdade) ou dos direitos (justiça), mas no imperativo de ordem prática, qual seja, o de não mais permitir que retornem à discussão questões já soberanamente decididas pelo Poder Judiciário. Em outros termos, o objeto da coisa julgada repousa na segurança nas relações jurídicas e na pacificação dos conflitos, possibilitando assim, a convivência social” (LEITE, 2006, p. 569).

A função da coisa julgada é propiciar a segurança das relações jurídicas, ou seja, por fim a um conflito de interesse. A sentença de mérito transitada em julgado deve ser protegida de ataques futuros. Até porque a eternização das discussões judiciais colocaria em risco o próprio desenvolvimento da sociedade. Seria um caos se não houvesse a coisa julgada, pois a todo o momento se poderia modificar decisões já apaziguadas. Viver-se-ia em um conflito sem fim:

“A função da coisa julgada tout court é a de proporcionar segurança nas relações jurídicas, sabendo-se que a insegurança é gravíssimo fator perverso que prejudica os negócios, o crédito, as relações familiares e, por isso, a felicidade das pessoas ou grupos” (DINAMARCO, 2002, p.296).

A sentença de mérito transitada em julgado deve ser protegida de ataques futuros.

A insegurança das relações jurídicas seria um verdadeiro entrave para o progresso do Estado, já que dificilmente se faria investimentos, contratos em um ambiente instável. A coisa julgada é suporte básico para o Estado Democrático de Direito e essencial para a sobrevivência do direito de acesso a Justiça.  

A Constituição estabelece como direito fundamental o livre acesso ao Judiciário, no artigo 5°, inciso XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. De nada adiantaria ter acesso ao Judiciário se não fosse possível dar ao conflito uma solução definitiva, além do que o que o jurisdicionado procura é a tutela da jurisdição.

Presta-se, também, a coisa julgada para proteger o julgado de leis que lhe sobrevenham. O artigo 5°, inciso XXXVI da Constituição Federal prescreve que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Inclusive, há autores que entendem que a razão de ser da coisa julgada é apenas proteger os julgados de leis posteriores que lhe modifiquem a matéria:

“O tratamento que a Constituição conferiu ao instituto da coisa julgada foi, destarte, somente de coloca-lo ao abrigo da retroatividade das leis, norma de direito intemporal, pois, não se encontrando no texto constitucional, como querem os que ferrenhamente defendem a total intangibilidade da coisa julgada, disposição alguma que a erija em condição de princípio constitucional” (CAMINHA, 2003, p. 4).

A coisa julgada é muito importante para se proteger as decisões de leis posteriores, porém, não deve ser dita como a única. É, também, muito interessante não deixar que os conflitos se perpetuem pelo tempo, pois não se pode viver em uma sociedade que não tenha soluções definitivas para os problemas.

A coisa julgada é um instrumento de pacificação social, trazendo seguranças às relações judiciais. Quando contrária a Lei Maior não se estará cumprindo tal função, e sim gerando revolta e maculando a imagem do Judiciário.

2. SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO

Kelsen dividiu em uma pirâmide vários estratos normativos, no topo ficam a Constituição ou as normas constitucionais, na sequencia e de forma decrescente, tem-se as emendas constitucionais, leis complementares, lei ordinária, resoluções legislativas, medidas provisórias e lei delegada; por fim, as normas complementares. A pirâmide de Kelsen é a teoria clássica em que se estabeleceu uma hierarquia normativa, considerou como lei suprema a Constituição e as emendas constitucionais. As normas hierarquicamente inferiores devem estar em consonância com os preceitos constitucionais. Dessa forma, o legislador, ao elaborar a lei, deve obviamente obedecer a Constituição.

A doutrina moderna desenvolvida pelo professor Canotilho e que teve com representante no Brasil Celson Ribeiro de Bastos, adotada um posicionamento diferente, defende que não há hierarquia entre as normas jurídicas, classificando-a em três grupos: primeiro, normas constitucionais, incluindo as emendas; segundo, ato legislativo (lei complementar, lei ordinária, medida provisória);  e terceiro, atos administrativos. Os dois últimos devem ser compatíveis como o primeiro.

Independentemente de quem adota a teoria clássica ou a moderna, uma coisa que se pode constatar em ambas é a submissão das leis, atos normativos e atos administrativos à Constituição, sob pena de incorrer em inconstitucionalidade.

A Constituição é o alicerce do Estado e ocupa posição de superioridade em relação a todas as normas jurídicas. É considerada lei suprema porque organiza todos os elementos necessários para o estruturar e reger um Estado de forma harmônica. A Constituição legitima a atuação dos Poderes, inclusive a forma de aquisição, a competência dos órgãos, e também se preocupou em estabelecer os direitos e deveres do cidadão.

A Constituição limita não só o cidadão como também o próprio Estado. A Carta Magna dispõe, entre outras matérias, sobre os direitos mais preciosos do ser humano. É a Constituição Federal que organiza o Estado brasileiro:

“Nossa Constituição é rígida. Em consequência, é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro. Toda autoridade só nela encontra fundamento e só ela confere poderes e competências governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou do Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem suas atribuições nos termos nela estabelecidos” (SILVA, 1993, p.47).

Nenhum Poder é absoluto, só podendo atuar nos limites autorizados pela Constituição Federal, e também conforme os princípios e ditames nela estabelecida. Dessa maneira, nenhuma manifestação de Poder poderá violar as liberdades, os direitos e as garantias individuais ou coletivas. Os atos e decisões dos Poderes Públicos devem ser absolutamente fiéis aos postulados constitucionais. O respeito que todos os Poderes, órgãos e cidadãos devem ter à supremacia da Constituição, configura uma garantia que os direitos e liberdades jamais serão ofendidos.

Os valores e princípios explícitos e implícitos consagrados na Constituição devem ser vetores para o intérprete da norma jurídica, seja para quem elabora ou para quem aplica as normas infraconstitucionais. É pacífico no ordenamento jurídico brasileiro à supremacia da Constituição.

Qualquer ato ou decisão emanado por qualquer dos Poderes, com vício de inconstitucionalidade, deverá ser extirpado. Os fundamentos de validade para todas as normas são encontrados na Constituição. Não existe nenhum Poder que não esteja sujeito ao controle de constitucionalidade. Violando-se a Carta Política, estar-se-á atingindo todos os cidadãos que esperam dos Poderes uma atuação legítima.

2.1. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS E ATOS NORMATIVOS NO DIREITO PÁTRIO

A Supremacia que a Constituição exerce em todo o ordenamento jurídico levou a necessidade de estabelecer mecanismos de controle de constitucionalidade. A Carta Política é a fonte de formação e conteúdo no processo legislativo. Ela examina e regulamenta todos os assuntos que entende relevantes para o Estado, como também esculpe os princípios mais importantes não só para o Direito, mas também para a vida da pessoa humana. A Constituição inspira todo ordenamento jurídico, por isso não pode haver norma infraconstitucional desrespeitando a ordem constitucional.

O controle de Constitucionalidade tem como função proteger o ser humano das injustiças e arbitrariedades do Poder. Assim, tem como finalidade proteger os direitos do ser humano. O legislador infraconstitucional fica subordinado a Constituição, não podendo, dessa forma, usar o Poder apenas para satisfazer interesses pessoais.

Deve-se advertir, desde já, que o controle de constitucionalidade só tem relevância para as Constituições rígidas, isto é, o processo de alteração tem um tratamento diferenciado das demais normas infraconstitucionais, sendo mais dificultoso, árduo e solene.  Para se aprovar uma emenda constitucional é preciso que seja discutida e aprovada pelo Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros (art.60, § 2º da Constituição Federal).

O controle de constitucionalidade pressupõe um escalonamento normativo, ocupado a Constituição posição de superioridade em relação a todo o ordenamento jurídico. Destaquem-se as lições do professor Moraes (2006, p.635): “A ideia de controle de constitucionalidade está ligada à Supremacia da Constituição sobre todo o ordenamento jurídico e, também, à rigidez constitucional e proteção dos direitos fundamentais”.

A inconstitucionalidade pode surgir em decorrência de ato omissivo ou comissivo do Poder Público. A inconstitucionalidade por omissão constata-se em virtude da não regulamentação infraconstitucional das normas constitucionais de eficácia limitada. A inconstitucionalidade comissiva decorre da incompatibilidade formal ou material com a Constituição.

A doutrina classifica a inconstitucionalidade formal em objetiva e subjetiva, como também em inconstitucionalidade formal orgânica, inconstitucionalidade formal propriamente dita, inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato. Não importa a denominação que seja dada, o essencial é saber que a inconstitucionalidade formal se observar diante de algum vício no processo legislativo, como, por exemplo, a lei elaborada por uma autoridade incompetente. Em suma, o vício é no procedimento de elaboração da lei.

A inconstitucionalidade material, também denominada de vício de conteúdo, substancial ou doutrinário, consiste em ofensa a preceito ou princípio à Lei Maior, como exemplo, regra ofensiva ao princípio da moralidade administrativa.

A inconstitucionalidade pode decorrer apenas de vício formal, apenas de vício material, ou ainda formal e material. A lei para ser considerada constitucional tem que obedecer aos requisitos materiais e formais concomitantemente.

A lei é uma das formas de obrigar as pessoas adotarem determinadas condutas, ação ou omissão, e para isso, devem obedecer aos critérios formais e materiais necessários a sua elaboração. O artigo 5º, inciso II da Constituição, considera direito fundamental o princípio da legalidade: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

O momento de controle da constitucionalidade de uma lei pode ser preventivo ou repressivo. O preventivo tem como objetivo evitar que uma norma inconstitucional entre no ordenamento jurídico. O controle repressivo retira do ordenamento jurídico lei ou norma contrária à Constituição.

O controle preventivo é o realizado durante a formação da lei ou ato normativo. É exercido pelo Legislativo, Executivo e o Judiciário. Na Câmara dos deputados, o controle preventivo é exercido pela Comissão de Constituição e Justiça da Cidadania. No Senado Federal, o controle é exercido pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Cabe a ambas as Comissões verificarem a Constitucionalidade do projeto de lei. Nada obsta, na discussão ou votação seja arguida a constitucionalidade de algum projeto de lei.

O controle preventivo exercido pelo Judiciário é provocado apenas pelos membros do Poder Legislativo. Os parlamentares têm o direito de participar de um processo legislativo de acordo com os ditames constitucionais. Caso o processo legislativo ofenda à Constituição, o parlamente que se achar prejudicado pode exigir no Judiciário um processo legislativo de acordo o que determina a Constituição. Não cabe tal controle quando a ofensa recai nas normas do regimento interno, neste caso deve o próprio Legislativo solucionar o problema.

O controle preventivo exercido pelo Legislativo é de responsabilidade do Chefe do Poder Executivo, vetando o projeto de lei quando considerar inconstitucional.

O controle posterior ou repressivo recai sobre a lei, não o projeto de lei. Dependendo de quem realizará tal controle, a doutrina costuma classifica-la em político, jurisdicional e misto. O controle político não é exercido por nenhum dos Poderes, e sim por um órgão distinto, encarregado em garantir a supremacia da Constituição. O controle jurisdicional é realizado pelo Judiciário e pode ser difuso ou concentrado. O controle misto é a presença do controle político e jurídico. O Brasil adotou o controle misto, porém, trata apenas com veemência do controle realizado pelo Judiciário. A regra geral é o controle de constitucionalidade repressivo pelo Judiciário. Há doutrinadores asseverando que o trabalho das Comissões no controle preventivo é político: “No Brasil, Barroso entende que o veto do Executivo a projeto de lei por entendê-lo inconstitucional (veto jurídico), bem, como a rejeição de projeto de lei na CCJ seria exemplos de controle político”.

Excepcionalmente, o controle repressivo será exercido pelo Poder Legislativo e pelo Executivo. O controle repressivo, exercido pelo Poder Legislativo pode ser de duas formas. Primeiro, através de decreto legislativo, na situação prevista no artigo 49, inciso V da Constituição Federal: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional: (…) V – sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”. Assim, caso o Presidente da República, no exercício da função de expedir decretos e regulamentos para a fiel execução da lei (artigo 84, inciso IV da Constituição Federal); ou quando na elaboração de lei delegada (artigo 68 da Constituição Federal) exceder os limites autorizados para regulamentar ou exorbitar os limites da delegação legislativa, o Legislativo poderá podar o excesso. O controle repressivo exercido pelo Executivo decorre da possibilidade do Chefe do Executivo deixar de cumprir uma lei inconstitucional. Os Chefes dos Poderes dos Executivos podem deixar de aplicar uma lei ou ato normativo inconstitucional, e não ser punido por isso, nem poderia, já que a inconstitucionalidade não merece respeito. Mais uma vez deve-se transcrever as lições de Moraes (2006, p.638): “Não há como exigir do chefe do Poder Executivo o cumprimento de uma lei ou ato normativo que entenda flagrantemente inconstitucional, podendo e devendo, licitamente, negar-se cumprimento, sem prejuízo do exame posterior pelo Judiciário”.

Todos os Poderes ficaram de alguma forma, portanto, incumbidos no controle de constitucionalidade. Tanto o Legislativo, como o Executivo e de forma mais forte o Judiciário devem de zelar pela Supremacia da Constituição.

O controle posterior exercido pelo Judiciário é o mais estudado pela doutrina pode ser pela via concentrada ou difusa.

2.1.1. Controle difuso

O controle difuso de constitucionalidade é de origem americana. No caso Madison versus Marbury, em 1803, o juiz Marshall da Suprema Corte Americana entendeu que não se deve aplicar a legislação infraconstitucional em prejuízo da Constituição. O juiz declarou a inconstitucionalidade da lei que se pretendia aplicar ao caso concreto.

O controle difuso de constitucionalidade surgiu pela primeira vez no Brasil com a Constituição republicana de 1892, no artigo 59. O artigo foi comentado da seguinte forma:

“[…] obriga esse tribunal a negar validade às leis federais, quando contrarias à Constituição, e as leis federais são contrárias à Constituição, quando o Poder Legislativo, adotando tais leis, não teve nos limites, em que a Constituição o autoriza a legislar, isto é, transpassou a competência, em que a Constituição o circunscreve” (MORAES apud BARBOSA, 2006, p. 647)

Foi consolidado no Brasil o controle difuso com a Lei Federal n.°221 de 1894, que autorizou os juízes e tribunais analisarem a constitucionalidades das leis e atos normativos do Poder Público (MORAES, 2006)

O controle difuso pode ser realizado por qualquer juiz ou tribunal do Judiciário. O controle difuso está difundido em todas as instâncias. Formalmente, o controle difuso é incidental, também denominado de via de exceção, defesa ou aberto. Em regra, a inconstitucionalidade da lei é vista como questão prejudicial ao mérito. Pode ser usado, entretanto, tanto pelo o autor como pelo réu, apesar da exceção ou defesa caber ao réu. O autor pode fazer uso da via difuso, por exemplo, em um mandado de segurança.

Caracteriza-se o controle difuso por ser dependente de uma ação principal. A declaração de inconstitucionalidade é necessária para se solucionar um caso concreto. A arguição de inconstitucionalidade pode ser levantada em qualquer processo. Não se trata de questão principal, e sim incidental. O escopo é deixar de aplicar a lei, dita inconstitucional diante de determinado caso concreto, não a retira do mundo jurídico, continuando válida e eficaz.

Qualquer cidadão prejudicado por lei inconstitucional pode socorrer-se ao Judiciário, não se exige legitimação especial para se suscitar incidentalmente a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo prejudicial do mérito.

Pelo controle difuso, o juiz pode deixar de aplicar uma lei por entendê-la inconstitucional. Por ser de extrema importância se manter a Supremacia da Constituição, pelos valores que ela representa, o juiz pode pronunciar-se até mesmo de ofício.

O artigo 97 da Constituição Federal determina que, “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.

A declaração de inconstitucionalidade incidental realizado pelo Tribunal depende do voto da maioria absoluta dos membros do respectivo Tribunal, ou dos integrantes do órgão especial. Trata-se de condição de validade. O artigo 97 da Constituição é denominado de cláusula de reserva de plenário. Apesar de a Constituição condicionar a declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo ao Tribunal, não há vedação, expressa ou implícita, para o juiz singular a declarar também de forma incidental. Em cumprimento do princípio da economia e da celeridade processual, o juiz tem o dever de zelar pela constitucionalidade de suas decisões. A aplicação de uma lei ou ato normativo inconstitucional gera decisão inconstitucional, consequentemente, gera insegurança.

O Supremo Tribunal dispensa, excepcionalmente, a formalidade do artigo 97 da Constituição Federal, quando o Tribunal, pelo órgão especial ou pelo pleno já houver se pronunciado a respeito da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei ou ato normativo do Poder Público, que se pretende atacar. Tal entendimento foi firmado pela Lei n.°9.756 de 17 de outubro de 1998, que incluiu o parágrafo único no artigo 481 do Código de Processo Civil: “Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão”.

Em regra, a declaração de inconstitucionalidade incidental torna nula a lei, desde a edição, isto é, produz efeitos retroativos. A declaração atinge apenas as partes que fizeram parte que fizeram parte do processo:

“Declarada incidenter tantum a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo pelo Supremo Tribunal Federal, desfaz-se, desde sua origem, o ato declarado inconstitucional, juntamente com todas as consequências dele derivadas, uma vez que os atos inconstitucionais são nulos e portanto, destituídos de qualquer carga de eficácia jurídica, alcançando a declaração de inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo, inclusive, os atos pretéritos com base nela praticado. Porém, tais efeitos ex tunc (retroativos) somente tem aplicação para as partes e no processo em que houve a citada declaração” (MORAES, 2006, p. 651)

Para terceiros, que não fizeram parte do processo que declarou a inconstitucionalidade, a lei ou ato normativo continua válido e eficaz. A declaração tem efeito apenas inter partes e ex tunc (retroativo), desfaz desde a origem. Porém, caso o Supremo Tribunal Federal exerça o controle difuso, a decisão deverá ser comunicada ao Senado Federal. Segundo o artigo 52, inciso X da Constituição, “Compete privativamente ao Senado Federal: (…) X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”. Assim, mediante resolução do Senado Federal, poderá o suspender a execução da lei, no todo ou em parte. Mediante a suspensão da lei do Senado, a inconstitucionalidade declarada incidentalmente inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, terá efeitos ampliados, atingindo todos, porém não retroativos, regulando apenas situações posteriores à publicação da resolução. Com isso, terá efeitos erga omens e ex nunc. Ilustra o professor Lenza (2006, p.181), “[…] quem tiver interesse em de pedir de volta um tributo declarado inconstitucional, deverá mover a sua ação individualmente para reaver tudo antes da Resolução do Senado, na medida em que ela não retroage”. 

2.1.2 Controle concentrado

O controle concentrado de constitucionalidade concentra-se em um único Tribunal, o Supremo Tribunal Federal. Apenas o Supremo Tribunal Federal exerce o controle concentrado de constitucionalidade das leis e atos normativos.

O controle concentrado é também denominado de abstrato ou direto. Tal controle surgiu no Brasil através da Emenda Constitucional n.°16, de 6 de outubro de 1965. A emenda atribui ao Supremo Tribunal Federal a competência para processar e julgar originariamente a representação de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo federal ou estadual, apresentada pelo procurador-geral da República (MORAES, 2006).

Caracteriza-se tal controle por ser exercido pela via principal. Não depende de um caso concreto. Não se preta o controle concentrado para resolver questões individuais. O objeto principal é apenas a declaração de inconstitucionalidade ou constitucionalidade da lei ou ato normativo do Poder Público.

A lei e o ato normativo são federais ou estaduais quando se pretende a declaração de inconstitucionalidade. A lei e o ato normativo tem que ser federal quando se pretende a declaração de constitucionalidade.

O controle concentrado cuida, essencialmente, da constitucionalidade das leis e atos normativos federais e estaduais em face da Constituição Federal. Não é possível o controle concentrado de leis e atos normativos municipais. O controle das leis e atos normativos municipais é o difuso. O Tribunal de Justiça local não pode exercer o controle concentrado das leis e atos normativos dos municípios que ofendem a Carta Política. O Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, é o único que pode exercer o controle concentrado:

“O Supremo Tribunal Federal entende não ser possível nessa hipótese o controle concentrado pelo Tribunal de Justiça, pois tendo as decisões efeitos erga omnes, no âmbito estadual, a elas estaria vinculado o próprio Supremo Tribunal Federal, que deixaria de exercer sua missão constitucional de guardião da Constituição” (MORAES, 2007, p. 671).

O controle concentrado tem o intuito de garantir a segurança das relações jurídicas, que não terá se forem pautadas em normas inconstitucionais.

Tanto na via difusa como concentrada, a declaração de inconstitucionalidade terá que ser aprovada pela maioria absoluta dos membros do tribunal, conforme o já citado artigo 97 da Carta Política.

A Constituição contempla cinco espécies de controle concentrado: ação direta de inconstitucionalidade genérica, arguição de descumprimento de preceito fundamental, ação direta de inconstitucionalidade por omissão, ação direta de inconstitucionalidade interventiva e ação declaratória de constitucionalidade. Será feito, nas linhas seguintes, apenas um breve relato de cada um.

A ação direta de inconstitucionalidade genérica e a ação declaratória de constitucionalidade estão previstas no artigo 102, inciso I, alínea “a” da Constituição Federal:

“Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: a)ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal”

A ação direta de inconstitucionalidade genérica tem como objeto lei ou ato normativo federal ou estadual.Tal ação tira do ordenamento jurídico a lei ou ato normativo do Poder Público ofensiva a Constituição. A ação declaratória de constitucionalidade tem como objeto apenas lei ou ato normativo federal e tem como escopo garantir a segurança jurídica, pondo um fim as incertezas a respeito da constitucionalidade de determinada lei ou ato normativo federal.

A arguição de descumprimento de preceito fundamental está previsto no artigo 102, § 1° da Constituição: “A arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente desta Constituição será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal na forma da lei”. Trata-se de lei de eficácia limitada, sendo disciplinada pela Lei n.°9.882/99. O objetivo é evitar ou reparar lesão a preceito fundamental de ato do Poder Público (artigo 1°, caput).

A ação direta de inconstitucionalidade por omissão é para torna efetiva norma constitucional de eficácia limitada, tem previsão no artigo 103, § 2° da Constituição Federal: “Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para torna efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”.

A ação direta interventiva tem previsão no artigo 36, inciso III da Constituição Federal: “A decretação da intervenção dependerá: […] III – de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador – Geral da República, na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à execução de lei federal”. O artigo 34 trata dos princípios sensíveis da Constituição:

“a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública direta e indireta; e)aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde”.

Note-se que as referidas ações só podem ser ajuizadas pelos legitimados constitucionalmente. Não são todos que podem propor tais ações. Quem pretende discutir a constitucionalidade da lei e não for legitimado, deverá propor na forma difusa e como questão prejudicial do mérito.

A lei compreende as espécies normativas do artigo 59 da Constituição Federal: emendas à constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções. Tem-se como ato normativo do Poder Público, o ato que tenha caráter normativo (LENZA apud NEVES, 2006). São passíveis de controle de constitucionalidade os seguintes atos,

“a) as deliberações administrativas dos órgãos administrativas dos órgãos judiciários (precedente: STF, ADIn 728, rel. Min. Marco Aurélio; b) as deliberações dos Tribunais Regionais do Trabalho judiciários (precedente: STF, ADIn 681/DF, rel. Min. Néri da Silveira), salvo as convenções coletivas de trabalho; c) o STF reconheceu o caráter normativo das resoluções do Conselho Internacional de Preços (STF, Pleno, ADIn 8-0, rel. Min. Carlos Velloso) permitindo, portanto, a sua verificação de compatibilidade com a Constituição” (LENZA, 2006, p. 189).

A decisão do controle concentrado tem efeito para todos (erga omnes) e efeito retroativo (ex tunc). A lei n.°9.868/99 introduziu o § 2° no artigo 102 da Constituição Federal:

“As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade, produzirão efeitos contra todos e efeitos vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”.

Assim, o que for decidido de forma definitiva nas ações diretas de inconstitucionalidade e as ações declaratórias de constitucionalidade vincula toda a Administração, direta e indireta, em todas as esferas, e os órgãos do Poder Judiciário.

No mesmo artigo que prever a ação direita de inconstitucionalidade por omissão, também menciona o seu efeito como já citado anteriormente, não sendo demais repetir o § 2° do artigo 103 da Constituição Federal:

Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

Não se pode estabelecer prazo para o Poder Legislativo, pois seria uma ofensa ao princípio da separação dos Poderes, esculpido no artigo 2° da Constituição Federal: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

A breve análise do controle de constitucionalidade foi necessária, pois se vai estudar a relativização da coisa julgada inconstitucional é preciso saber o que é uma inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, e quais os mecanismos de controle.

Não se pode deixar de se perguntar como é que ficam as sentenças que aplicaram normas declaradas inconstitucionais. Quando as sentenças são proferidas de acordo com os ditames legais não há problema algum.

Deve-se zelar não só pela Constitucionalidade das leis e atos normativos, mas também das sentenças. Não adiantar ter uma lei ou ato normativo constitucional senão for aplicada. Os próximos tópicos tratarão justamente dessa questão.

3. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL

Por muito tempo foi conferida a coisa julgada caráter absoluto imutável e inatingível, conforme Caminha apud Dinamarco (2003, p.3): “[…] capaz de fazer do preto, branco e do quadrado, redondo”.

A concepção tradicional da coisa julgada não atende mais aos anseios da sociedade. Há situações que o julgado deixa, não só a comunidade jurídica como também todos os cidadãos perplexos, porque é atentatória a dignidade da pessoa humana, contrária a moral e aos bons costumes.

Segundo a posição do Superior Tribunal de Justiça, no recurso especial número 622405 / SP, sentenças que contêm defeitos insanáveis são inexistente, e consequentemente não transita em julgado:

         “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DÚVIDAS SOBRE A TITULARIDADE DE BEM IMÓVEL INDENIZADO EM AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA COM SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. PRINCÍPIO DA JUSTA INDENIZAÇÃO. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA. 1. Hipótese em que foi determinada a suspensão do levantamento da última parcela do precatório (art. 33 do ADCT), para a realização de uma nova perícia na execução de sentença proferida em ação de desapropriação indireta já transitada em julgado, com vistas à apuração de divergências quanto à localização da área indiretamente expropriada, à possível existência de nove superposições de áreas de terceiros naquela, algumas delas objeto de outras ações de desapropriação, e à existência de terras devolutas dentro da área em questão. 2. Segundo a teoria da relativização da coisa julgada, haverá situações em que a própria sentença, por conter vícios insanáveis, será considerada inexistente juridicamente. Se a sentença sequer existe no mundo jurídico, não poderá ser reconhecida como tal, e, por esse motivo, nunca transitará em julgado. 3. "A coisa julgada, enquanto fenômeno decorrente de princípio ligado ao Estado Democrático de Direito, convive com outros princípios fundamentais igualmente pertinentes. Ademais, como todos os atos oriundos do Estado, também a coisa julgada se formará se presentes pressupostos legalmente estabelecidos. Ausentes estes, de duas, uma: (a) ou a decisão não ficará acobertada pela coisa julgada, ou (b) embora suscetível de ser atingida pela coisa julgada, a decisão poderá, ainda assim, ser revista pelo próprio Estado, desde que presentes motivos preestabelecidos na norma jurídica, adequadamente interpretada." (WAMBIER, Tereza Arruda Alvim e MEDINA, José Miguel Garcia. 'O Dogma da Coisa Julgada: Hipóteses de Relativização', São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, pág. 25) 4. "A escolha dos caminhos adequados à infringência da coisa julgada em cada caso concreto é um problema bem menor e de solução não muito difícil, a partir de quando se aceite a tese da relativização dessa autoridade – esse, sim, o problema central, polêmico e de extraordinária magnitude sistemática, como procurei demonstrar. Tomo a liberdade de tomar à lição de Pontes de Miranda e do leque de possibilidades que sugere, como: a) a propositura de nova demanda igual à primeira, desconsiderada a coisa julgada; b) a resistência à execução, por meio de embargos a ela ou mediante alegações incidentes ao próprio processo executivo; e c) a alegação incidenter tantum em algum outro processo, inclusive em peças defensivas." (DINAMARCO, Cândido Rangel. 'Coisa Julgada Inconstitucional' — Coordenador Carlos Valder do Nascimento – 2ª edição, Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002, págs. 63-65) 5. Verifica-se, portanto, que a desconstituição da coisa julgada pode ser perseguida até mesmo por intermédio de alegações incidentes ao próprio processo executivo, tal como ocorreu na hipótese dos autos. 6. Não se está afirmando aqui que não tenha havido coisa julgada em relação à titularidade do imóvel e ao valor da indenização fixada no processo de conhecimento, mas que determinadas decisões judiciais, por conter vícios insanáveis, nunca transitam em julgado. Caberá à perícia técnica, cuja realização foi determinada pelas instâncias ordinárias,  demonstrar se tais vícios estão ou não presentes no caso dos autos. 7. Recurso especial desprovido.” (STJ).

Há muitos estudo referentes a relativização da coisa julgada, muitas dignas de aplausos, inclusive ilustradas com exemplos práticos. No mundo da natureza não prevalece o absoluto, não poderia ser diferente no direito.

É ultrapassada a ideia de coisa julgada como algo imutável e inatingível, conforme Caminha apud Nascimento (2003, p.3): “Sendo a coisa julgada matéria estritamente de índole jurídico-processual, portanto inserta no ordenamento infraconstitucional, sua intangibilidade pode ser questionada desde que ofensiva aos parâmetros da Constituição”.

As decisões jurisdicionais configuram atos jurídicos estatais, meio de se manifestar a vontade do Estado; e, para que sejam ditos como válidos devem estar conforme os mandantes constitucionais. Dessa forma, não se podem convalidar decisões inconstitucionais (PRADO apud NASCIMENTO, 2005).

Pela importância que a Constituição exerce em relação a todo ordenamento jurídico, a doutrina e os tribunais passaram a repensar a garantia constitucional e o instituto técnico-processual da coisa julgada. Passou-se a entender que não é legítimo eternizar injustiças, deve-se evitar a prolongação das incertezas (Prado apud DINAMARCO, 2005).

A coisa julgada é um direito fundamental de todo cidadão, porém, não é absoluto. Todos os princípios e garantias devem estar em harmonia, não se pode aplicar uma garantia em detrimento de um princípio valioso da Constituição.

A decisão final do Judiciário não é infalível, podendo cometer erros eivados de inconstitucionalidade. Por isso, não se pode admitir decisões absurdas, porque estão protegidas pela coisa julgada. O próprio processo presta-se a atender os princípios constitucionais, e não contraia-los. A coisa julgada não é mais relevante que a Constituição.

O Judiciário já se permitiu a corrigir erro material em casos especiais, mesmo passado o trânsito em julgado da decisão, em nome da verdade real e os fins sociais da norma. Foi o que ocorreu quando descoberto o ácido desoxirribonucleico, mais conhecido como DNA, é o exemplo mais citado pela doutrina. Foi a partir de então que a relativização da coisa julgada passou a merecer atenção especial. Antes do exame de DNA, a investigação de paternidade era uma tarefa árdua, muitos casos eram julgados improcedentes devido à escassez de provas. Era extremamente difícil para mãe provar a paternidade, principalmente quando não se tinha um relacionamento público com o réu. O progresso científico permitiu identificar com certeza a paternidade. Havia um óbice para as ações de reconhecimento de paternidade julgadas improcedentes: a coisa julgada. Entretanto tal entrave já foi resolvido pela doutrina e os Tribunais, reconhecendo-se novas ações de investigação de paternidade com base no exame de DNA. Assim, admitiu-se romper com a coisa julgada. Não poderia ser diferente diante de tal situação. Seria injusto que as pessoas que não tiveram a oportunidade na época de fazer uso do exame, não pudessem ter novamente o pedido apreciado para provar com certeza o que alegou. O exame passou a ser quase que obrigatório para as ações de investigações de paternidade, é um meio de prova mais convincente da atualidade: 

“Em favor da “relativização” da coisa julgada, argumenta-se a partir de três princípios: o da proporcionalidade, o da legalidade e o da instrumentalidade. No exame desse último, sublinha-se que o processo, quando visto em sua dimensão instrumental, somente tem sentido quando o julgamento estiver pautado pelos ideais de Justiça e adequado à realidade. Em relação ao princípio da legalidade, afirma-se que, como o poder do Estado deve ser exercido nos limites da lei, não é possível pretender conferir a proteção da coisa julgada a uma sentença totalmente alheia ao direito positivo. Por fim, no que diz respeito ao princípio da proporcionalidade, sustenta-se que a coisa julgada por ser apenas um dos valores protegidos constitucionalmente, não pode prevalecer sobre outros valores que têm o mesmo grau hierárquico. Admitindo-se que a coisa julgada pode se chocar com outros princípios igualmente dignos de proteção, conclui-se que a coisa julgada pode ceder diante de outro valor merecedor de agasalho” (MARINONI, 2007, p.3).

Dessa maneira, não se pode negar a relativização da coisa julgada, principalmente quando fundada em dispositivo inconstitucional. É da Constituição que emana os princípios e normas que devem reger todo o ordenamento, desrespeita-lo equivale a quebrar a paz social e negar a supremacia da Constituição.

Não se podem admitir decisões que tenham como fundamento comandos normativos inconstitucionais. A Constituição é o alicerce do Estado, todos os comandos nela contidos devem ser observados. O Poder Judiciário não é soberano, deve se subordinar a Constituição. A Constituição é clara ao dispor que protege a coisa julgada, porém, não menciona que a coisa julgada deve ser protegida mesmo diante de decisões inconstitucionais. O princípio não deve ser protegido a todo custo. A proteção à coisa julgada vai depender do valor que se está protegendo, pois, se for atentatória a Lei Maior, não há em que se falar em segurança jurídica.

3.1. EFEITO DA DECISÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE EM RELAÇÃO À COISA JULGADA

A inconstitucionalidade da decisão pode ser no momento em que é proferida ou posteriormente. Ocorre a inconstitucionalidade da decisão desde logo, quando se observa que foi proferida violando algum princípio ou comando normativo. Também se nota a inconstitucionalidade da decisão quando esta se fundou em lei que foi julgada, posteriormente, inconstitucional.

A lei goza de presunção de legitimidade. Quando o Supremo Tribunal Federal declarada a inconstitucionalidade de uma lei surge a discussão a respeito das decisões judiciais proferidas segundo os ditames legais da época que eram tidas como constitucionais. O discurso desse tópico, portanto, será em torno da declaração de inconstitucionalidade, via concentrada, com efeito ex tunc e erga omnes, já que em sede difusa o juiz poderá deixar de aplicar lei que entender inconstitucional, independentemente de pronunciamento do Supremo Tribunal.

A constituição é a fonte principal dos direito dos cidadãos. O certo é que seja cumprida, por isso, se algum ato jurídico seja com ela incompatível, deverá ser nula, já que proferida em desacordo com a vontade geral.

A lei inconstitucional é passível de controle, tanto pela via concentrada como pela via difusa. É pela via concentrada em que se observam efeitos mais significativos, é o Supremo Tribunal Federal que decidirá.

A regra geral é que a lei declarada inconstitucionalidade, pela via concentrada, seja nula, com efeito erga omens,, ex tunc, vinculando toda a administração e os Poderes  conforme o artigo 102, § 2º da Constituição Federal:

“As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.”

Conforme o dispositivo, a declaração de inconstitucionalidade, como também a de constitucionalidade, vincula todos. Assim, é mais um mecanismo de proteção da supremacia da Constituição. Quando o Supremo Tribunal Federal julga a inconstitucionalidade de uma lei, deverá ser rigorosamente observada, pois nenhum ato pode se sobrepor a Constituição.

Porém, autoriza o artigo 27, da Lei nº 9.868/99, por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse público, ao Supremo Tribunal Federal atribuir a lei, mesmo que inconstitucional, só tenha eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou em outro momento que venha a ser fixado. Como exemplo pode-se citar a nomeação e demissão de servidores com base em lei inconstitucional, desobrigando a devolução dos salários percebidos por causa da lei inconstitucional. Assim, permitiu ao Supremo Tribunal Federal em ocasião do controle concentrado, valorar as consequências práticas da declaração de inconstitucionalidade da lei. Deve-se mitigar os efeitos da declaração sempre que se ponha em risco a boa-fé, a dignidade humana, a segurança jurídica, e outros princípios importantes.

“Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, em voto proferido pelo Ministro Leitão de Abreu, salientou a necessidade de se temperar a tese da retroatividade da declaração de inconstitucionalidade para se deixar imunes as situações jurídicas fundadas em ato praticado de boa fé” (MARINONI, 2007, p. 6).

Mesmo que não houvesse a lei, o racional era tomar o tal posicionamento, pois a lei não pode ser aplicada de maneira cega, e sim medindo as consequências práticas da decisão tomada.

A lei prever mecanismos de controle de lei incompatível com a Constituição Federal, e não prever o controle de sentença proferida de acordo com a lei declarada inconstitucional. Deve-se observar que a declaração de inconstitucionalidade pesará, e muito, sob as decisões desconformes a constituição. A declaração de inconstitucionalidade com efeito erga omnes e ex tunc atinge diretamente a coisa julgada material, formada anteriormente a declaração de inconstitucionalidade. De certa maneira, o controle de constitucionalidade das leis, de forma indireta, é um meio de se controlar, também, a constitucionalidade da sentença transitada em julgado.

Aplicando-se analogicamente o que acontece com o controle de constitucionalidade das leis, a sentença inconstitucional pode ter dois efeitos: ex tunc, alcançando todas as decisões, pretéritas e futuras, tendo efeitos retroativos; ou ex nunc, a decisão que declara a inconstitucionalidade da lei geraria efeitos apenas para as situações futuras.

É sem fundamento, em regra, a manutenção de decisões, mesmo que transitadas em julgada, inspiradas em leis tidas como inconstitucionais. A sentença inconstitucional deve ser tida como nula, não podendo produzir efeito algum. A declaração de inconstitucionalidade provoca não só a nulidade da lei, mas também a nulidade da sentença transitada em julgada.

É bom deixar claro que nem sempre as decisões de declaração de inconstitucionalidade da lei terão efeitos ex tunc. Há ocasiões em que será necessário, para evitar lesões a própria sociedade, atribuir efeito ex nunc a decisão. Portanto, os efeitos serão atribuídos tendo em vista as consequências geradoras da declaração. Apesar de parecer um pouco contraditório, mesmo inconstitucional, por razões de segurança jurídica ou interesse público, a declaração deverá ter efeitos apenas para situações futuras. Frise-se que isto acontece apenas quando o caso exigir.

Atribui-se efeito ex nunc por motivo de segurança jurídica e relevante interesse público, atingindo apenas as situações posteriores a declaração de inconstitucionalidade, mantendo-se com isso a coisa julgada mesmo declarada a inconstitucionalidade da lei que fundamentou a decisão.

Portanto, os efeitos atribuídos a ação declaratória inconstitucional são os mesmo para a sentença fundada na lei inconstitucional. Observe-se que a declaração de inconstitucionalidade não tem efeito automático em relação a coisa julgada, é necessário que o Poder Judiciário seja provocado para rescindir a sentença inconstitucional.

Para as decisões proferidas violando, nitidamente, a Constituição, não resta dúvida que deverá ser extirpada.

3.2. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

O princípio da segurança jurídica não é expresso na Constituição. Embora implícito, tal, é essencial para o Direito, pois só se pode falar em justiça onde houver segurança.

O princípio da segurança jurídica é essencial para existência de outros princípios constitucionais, como o da legalidade, a da garantia da coisa julgada, o do direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a irretroatividade das leis. É justamente a segurança jurídica que permite confiar nas sentenças judiciais. De nada adiantaria a tutela jurisdicional se pudesse mudar a todo instante a sentença.

Aparentemente quando se fala em relativização da coisa julgada, pensa-se logo em afronta a segurança jurídica. Como já discutido, quando se comentou a respeito da importância da coisa julgada material , o instituto é fundamental para o progresso social, já que a perpetuação dos conflitos inviabiliza qualquer investimento ou contrato. Uma vez formada a coisa julgada torna-se definitivo o decisório.

Não há nenhuma afronta a segurança jurídica a relativização da coisa julgada inconstitucional, nem é um empecilho para a evolução da sociedade, muito pelo contrário, a mitigação faz necessário para se preservar o próprio direito. Admitir decisões inconstitucionais gera dúvida a respeito da supremacia da Constituição, e até põe em suspeita a função jurisdicional.

Os mais ilustres constitucionalistas e processualistas asseveram que nenhum princípio é absoluto, devendo ser sempre interpretado dentro de um sistema:

“Não há uma garantia sequer, nem mesmo a da coisa julgada, que conduza invariavelmente e de modo absoluto à renegação das demais ou dos valores que elas representam. Afirmar o valor da segurança jurídica (ou certeza) não pode implicar desprezo ao da unidade federativa, ao da dignidade humana e intangibilidade do corpo etc. É imperioso equilibrar com harmonia as duas exigências divergentes, transigindo razoavelmente quanto a certos valores em nome da segurança jurídica mas abrindo-se mão desta sempre que sua prevalência seja capaz de sacrificar o insacrificável” (PRADO apud DINAMARCO, 2005, p.6)

Caso um princípio entre em choque com outro, faz-se uso da racionalidade:

“Nos casos de coisa julgada inconstitucional, pode haver conflito entre princípios constitucionais. A recusa de enfrentá-lo e resolvê-lo – seja negando sua existência, seja afirmando que sua solução já é integralmente dada pelas regras infraconstitucionais –  é incompatível com a Constituição. O único modo constitucionalmente legítimo de soluciona-lo consiste na ponderação dos valores fundamentais envolvidos, no caso concreto” (WAMBIER apud TALAMINI, 2007, p. 527).

A segurança jurídica é para as decisões pautadas nos arrimos constitucionais, protetora do cidadão, do Estado e do Direito:

“O Estado em sua dimensão ética, não protege a sentença judicial mesmo transitada em julgado, que bate de frente com os princípios da moralidade e da legalidade, que espelhe única e exclusivamente vontade pessoal do julgador e que bata de encontro à realidade dos fatos” (DELGADO, 2007, p. 21).

É inconcebível que em nome da segurança jurídica seja permitida decisão que afronte a moralidade, legalidade, dignidade da pessoa humana e tantos outros comandos constitucionais. A relativização da coisa julgada inconstitucional é imprescindível para se preservar a segurança jurídica. Só há segurança quando a decisão estiver em harmonia com a Constituição Federal:

“O objetivo do estudo é demonstrar que o valor da segurança das relações jurídicas não é absoluta no sistema, nem o é portanto a garantia da coisa julgada, porque ambos devem conviver com outro valor de primeiríssima grandeza, que é o da justiça das decisões judiciais, constitucionalmente prometido mediante a garantia do acesso à justiça (Constituição Federal, art, 5°, inciso XXXV)” (PRADO apud DINAMARCO, 2005, p.6).

A busca da segurança jurídica não pode ser cega, e sim racional, pesando todos os valores colocados em questão, para que ao final seja tomada a melhor decisão.

Os institutos do direito evoluem, modificam-se diante das novas realidades, a fim de adaptarem-se as necessidades da vida moderna, porém, há princípios imutáveis, inerentes a condição humana, logo percebidos pela razão, são comandos que serve de alicerce para todo o ordenamento jurídico, tais como a dignidade humana, a moralidade, a liberdade e outros.

A segurança jurídica não significa a imutabilidade do direito, e sim o constante aprimoramento legislativo e principalmente jurisprudencial. O direito deve acompanhar os fenômenos sociais, não podendo ficar estanque no tempo, pois neste caso se comprometeria a função do direito.

A defesa as instituições jurídicas é necessária, porém é dever destas evoluir diante das necessidades. Destaque-se que por mais que as relações mudem, o direito sempre será regidos pelos seus princípios fundantes.

3.3 MEIOS DE CONTROLE DA COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL

O ideal seria que o vício de inconstitucionalidade fosse impugnado antes de a sentença transitar em julgado, assim, não se teria surgido à necessidade de se discutir a relativização da coisa julgada. Não por isso deixará de se apontar uma solução, mesmo que tardia, para os vícios cometidos no decorrer do processo.

Há vários julgados sobre a coisa julgada inconstitucional, devendo-se citar apenas alguns exemplos só a título de ilustração. O resultado do julgado é a prevalência dos princípios constitucionais:

“Desapropriação. Indenização (atualização). Extravio de autos. Nova avaliação. Coisa julgada. Não ofende a coisa julgada a decisão que, na execução, determina nova avaliação para atualizar o valor do imóvel, constante do laudo antigo, tendo em vista atender à garantia constitucional da justa indenização, procrastinada por culpa da expropriante. Precedentes do STF. Recurso extraordinário não conhecido” (RE n. 93.412 – SC. Re. Min. Rafael Mayer, STJ 102/276) (DELGADO, 2007, p. 23).

“EROMS 10527 – SC. Rel. Min. Edson Vidigal – STJ, j. em 03.02.2000, DJU 08.03.2000, p.136: Lei inconstitucional é lei natimorta; não possui qualquer momento de validade. Atos administrativos praticados com base nela devem ser desfeitos, de ofício pela autoridade competente, inibida qualquer alegação de direito adquirido” (DELGADO, 2007, p. 23).

Sabe-se que as decisões inconstitucionais não podem prosperar, pois seria um ato contra a moralidade, legalidade, dignidade e outros princípios indiscutivelmente necessários para a paz social, conforme Caminha apud Otero (2003, p. 5): “[…] as normas inconstitucionais nunca se convalidam juridicamente, podendo, a todo o momento, serem destruídas judicialmente”.

Para que se faça combatê-la, é necessário que se aponte uma solução. A lei não estabeleceu um mecanismo adequado para se desconstituir a coisa julgada inconstitucional. A solução é extraída pela doutrina e confirmada pelos Tribunais:

“O Poder Judiciário quando emite decisões que vão de encontro à Constituição Federal, quer violando qualquer um dos seus postulados, que descumprindo os seus princípios, quer diretamente obscurecendo as suas regras, está, também, submetida, ao controle de constitucionalidade. Não há nenhum dispositivo na Lei Maior que o isente desse controle, nem esse privilégio pode ser concebido no círculo formativo de um regime democrático (DELGADO, 2007, p.1)

O que não se pode admitir é que uma decisão judicial inconstitucional ganhe o manto da imutabilidade. Ninguém deve se conforma diante de tal situação, seja qual for a via proposta para resolver o impasse, o que deve prevalecer é a Constituição.

Vários são os instrumentos jurídicos apontados pela doutrina para se combater a coisa julgada inconstitucional: ação rescisória, ação de nulidade, ação declaratória de inexistência jurídica, exceção de pré-executividade e impugnação à execução. Outras vozes, porém, minoritária apontam outras soluções. Os tópicos seguintes abordarão apenas alguns instrumentos para se rescindir a sentença inconstitucional.

3.3.1. Ação rescisória

O meio autorizado pela legislação brasileira par rescindir a coisa julgada é a ação rescisória, prevista no artigo 485 do Código de Processo Civil: “A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando”.Os incisos do artigo preveem as hipóteses de cabimento da dita ação. A desconstituição da coisa julgada inconstitucional, através da ação rescisória, tem fundamento no inciso V: “violar literal disposição de lei”.

Apesar de a Constituição não ser uma lei comum, o inciso V do artigo 485 do Código de Processo Civil alcança a Carta Política. Se o ordenamento repudia sentenças contrárias à Lei, logicamente são inadmissíveis sentenças contrárias a Constituição.

Nem toda violação a lei enseja rescisória. Segundo a súmula 343 do STF: “Não cabe rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”. Porém, segundo o entendimento do Supremo Tribunal federal, não se aplica a súmula 343 quando a ofensa for ao texto constitucional. A súmula dirige-se as normas infraconstitucionais. A Constituição não é uma lei qualquer, mas sim fundamental para se reger o Estado. Não se pode deixar de aplicar o texto constitucional, por haver interpretações divergentes entre os Tribunais, a supremacia da Constituição nunca pode ser afastada. Deve-se sempre manter a aplicação do direito constitucional.

A ação rescisória como meio de impugnar a coisa julgada inconstitucional é defendida por Accioly Filho, Lúcio Bittencout e Alfredo Buzaid (PRADO apud WAMBIER e MEDINA, 2005).

Segundo a corrente que defende a rescisória, a sentença mesmo que inconstitucional é válida, pois contém todos os elementos necessários para entrar no mundo jurídico, porém, incapaz de gerar algum efeito. Sendo assim, não possui legitimidade.

O prazo para propor a rescisória é de dois anos do trânsito em julgado da sentença. Desse modo, passado o tempo sem haver impugnação o julgado inconstitucional se imortaliza. Para superar esse problema, há doutrinadores que considera cabível a rescisória mesmo passado o biênio, quando se constatar a inconstitucionalidade:

“[…] como forma de se corrigir, o quanto antes, mesmo sem necessidade de reforma da lei ou da Constituição, essa suposta omissão instrumental, seria a jurisprudência aceitar a ação rescisória com fundamento da inconstitucionalidade do julgado e sem prazo de decadência” (DELGADO apud DIAS, 2007, p. 5).

Na mesma esteira de pensamento a respeito do prazo rescisório:

“A ação rescisória poderia ser perpétua, sem com isso violar-se a Constituição. Se se entendesse essencial a existência de prazo, estar-se-ia a interpretar a Constituição como se ela apenas protegesse a chamada coisa soberanamente julgada, isto é, as sentença de mérito que não apenas transitaram em julgado como se tornaram irrescindíveis pelo decurso do tempo” (DELGADO apud Tesheuner, 2007, p.5).

“Deste modo a admissão da ação rescisória não significa a sujeição da declaração de inconstitucionalidade de coisa julgada ao prazo decadencial de dois anos, a exemplo do que se dá com a coisa julgada que contempla alguma nulidade absoluta, como é o exemplo o vício de citação” (PRADO apud OTERO, 2005, p.9).

A ação rescisória como meio de impugnar a coisa julgada inconstitucional é pouco difundida pela doutrina, porém, se este instrumento for utilizado, não poderá o Tribunal eximir-se, deverá dar uma solução, afinal de conta, o processo é regido pelos princípios da economia e instrumentalidade das formas. O que não pode acontecer é que a impugnação a inconstitucionalidade de uma decisão fique restrita a rescisória, dada a importância de uma decisão dentro dos parâmetros constitucionais:

“Muito embora não haja necessidade de se valer da ação rescisória para obter o reconhecimento do vício sério (nulidade) que contamina a decisão judicial, força é lembrar que não ser correto omitir-se o Tribunal de apreciar a questão se a parte lançar mão da ação do art. 485 do Código de Processo Civil” (DELGADO, 2007, p. 17).

“Portanto, segundo o que nos parece, seria rigorosamente desnecessária a propositura da ação rescisória, já que a decisão que seria alvo de impugnação seria unicamente inexistente, pois que baseada em ‘lei’ que não é lei (‘lei’ inexistente). Portanto, em nosso entender a parte interessada deveria, sem necessidade de se submeter ao prazo do art. 495 do CPC, intentar ação de natureza declaratória, com o único objetivo de gerar maior grau de segurança jurídica à sua situação. O interesse de agir, em casos como esse, nasceria, não da necessidade, mas da utilidade da obtenção de uma decisão neste sentido, que tornaria indiscutível o assunto sobre o qual passaria a pesar a autoridade da coisa julgada” ( PRADO apud WAMBIER e MEDINA, 2005, p. 7).

Conforme a Jurisprudência a rescisória é desnecessária para se rescindir a coisa julgada inconstitucional:

“A ideia de relativização da coisa julgada material consiste no excepcional afastamento da sua eficácia, a fim de que um outro valor igualmente caro ao ordenamento jurídico sobre ela prevaleça, por falar mais alto do que a imutabilidade do julgado no específico caso concreto. Tal prevalência se operaria independentemente da apresentação de ação rescisória, bastando a formulação de pretensão voltada à declaração de ineficácia da coisa julgada, quer em demanda especificamente ajuizada para tanto, quer no contexto de outra demanda, em caráter incidenter tantum” (NEGRÃO, 2007, p. 563).

A coisa julgada prima pelos valores que merecem proteção. É um princípio que depende de outro para cumprir a função pela qual foi destinado. A sentença contraria a Constituição não pode alegar coisa julgada para ganhar caráter definitivo.

3.3.2. Ação declaratória de inexistência

A ação declaratória de inexistência da coisa julgada, conhecida também como querela nullitatis, é bastante mencionada pela doutrina para desconstituir a coisa julgada inconstitucional. Trata-se de uma ação autônoma que pode ser proposta a qualquer tempo e em qualquer instância ou Tribunal. A sentença inconstitucional é considerada nula, ou melhor, inexistente, consequentemente, não há nem ao menos a formação da coisa julgada, conforme se extrai das lições do ilustre ministro Delgado (2007, p.4): “[…] se a inconstitucionalidade significa inexistência da lei e/ou ato, não se poderá falar em coisa julgada por encontrar-se esta fundamentada em algo que nunca existiu”. Tem-se, assim, que a sentença é nula e inexistente, e para que haja coisa julgada é necessário que esteja conforme a Constituição:

“A tese que vem ganhando corpo é a de que o fenômeno da inconstitucionalidade se reduz a uma relação de validade: se o ato de poder – qualquer que seja ele – é conforme à Constituição, vale; se não o é, não vale. É pelo mecanismo da nulidade, portanto, que se resolve o problema do ato inconciliável com a ordem constitucional” (DELGADO, 2007, p. 9).

Por isso, há autores que dizem que o manejo da rescisória para rescindir a coisa julgada inconstitucional não é cabível por faltar a possibilidade jurídica do pedido.

“O fundamento para ação declaratória de inexistência seria a ausência de uma das condições da ação: a possibilidade jurídica do pedido. Para nós, a possibilidade de impugnação de sentenças de mérito proferidas apesar de ausentes a condições da ação fica adstrita ao prazo do artigo 495 do CPC” (PRADO apud WAMBIER  e MEDINA, 2005, p.7)

Pode-se acrescentar também que a coisa julgada inconstitucional, já que não transita em julgado, carece de outros pressupostos essenciais da rescisória: sentença transitada em julgado:

“Pensamos também, conforme constou do item 2.1, que as sentenças que são inconstitucionais porque acolhem pedidos inconstitucionais, são sentenças (estas sim!) que não transitam em julgado porque foram proferidas em processos instaurados por meio do mero exercício de direito de petição e não de direito de ação já que não havia possibilidade jurídica do pedido o do artigo 495 do CPC” (PRADO apud WAMBIER e MEDINA, 2005, p.7)

A rescisória tem como objeto sentença que transita em julgado. Como a decisão inconstitucional não transita em julgado, e é dita como sentença inexistente, afasta-se a rescisória como meio adequado para se impugnar a decisão.

O Superior Tribunal de Justiça confirma o entendimento doutrinário até aqui exposto:

“A decisão judicial transita em julgado desconforme a Constituição padece do vício da inconstitucionalidade que, nos mais diversos ordenamentos jurídicos, lhe impõe a nulidade. Ou seja, a coisa julgada é nula e, como tal, não se sujeita a prazos prescricionais ou decadenciais. Ora, no sistema das nulidades dos atos judiciais nulos independem de rescisória para eliminação do vício respectivo. Destarte pode a qualquer tempo ser declarada nula, em ação com esse objetivo, ou em embargos à execução” (STJ, Resp 7.556/RO, 3 T., Re. Ministro Eduardo Ribertio, RSTJ 25/439)  (PRADO, 2005, p. 9).

A decisão foi muito precisa abordou de maneira concisa a coisa julgada inconstitucional. Como se percebe, na prática, o Tribunal Superior tem considerado decisão inconstitucional nula, não tendo que ser atacada necessariamente por rescisória, mas por qualquer outro meio adequado, inclusive ação anulatória. Acrescenta ainda que a  inconstitucionalidade de uma decisão é causa de nulidade absoluta e pode ser reconhecida a qualquer tempo, inclusive de ofício pelo juiz:

“Nada obstante e porque as nulidades podem ser decretáveis até mesmo de ofício, como é a hipótese da inconstitucionalidade, a eleição da via rescisória, ainda que inadequada, para arguição da coisa julgada inconstitucional não importa na impossibilidade de conhecer-se o vício. O que se deve ter em mente é o fato de que a admissibilidade da rescisória, nesta hipótese, é medida extraordinária diante da gravidade do vício contido na sentença. Os Tribunais, com efeito, não podem se furtar de, até mesmo de ofício, reconhecer a inconstitucionalidade da coisa julgada o que pode se dar a qualquer tempo, seja em ação rescisória (não sujeita a prazo), em ação declaratória de nulidade ou em embargos à execução” (PRADO apud OTERO, 2005, p.9).

Caso o juiz ou Tribunal não constate a inconstitucionalidade da decisão, nada impede que o próprio interessado pleiteie por uma sentença conforme os ditames constitucionais. Até porque pelo número de processo que abarrota o Judiciário, fica quase que impossível fiscalizar a constitucionalidade das decisões:

“[…] O Acórdão consigna, ainda, que mesmo o ulterior reconhecimento erga omnes da inconstitucionalidade nessas circunstâncias, no caso, em razão da edição de resolução pelo Senado Federal, mantém, para a parte o ônus de perseguir a rescisão do julgado apoiado na norma inconstitucional, caso ela queira eliminar do cenário jurídico os efeitos até então produzidos por esse julgado” (NEGRÃO, 2007, p.567).

3.3.3. Embargos à execução

Outra forma de se combater a coisa julgada inconstitucional é pela via de embargos à execução. O título exequendo seria inexigível por se ter baseado em lei tida como inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal ou em interpretação considerada, também pelo Supremo Tribunal Federal, incompatível com a Constituição. Pode-se impugnar à inconstitucionalidade da decisão via  impugnação à execução (WAMBIER, 2007).

Com a recente reforma processual, introduzida pela Lei n.°11.232 de 22 de dezembro de 2005, os embargos à execução passou a ter utilidade apenas para a execução fundada em título extrajudicial. Nos embargos o executado poderá alegar inexigibilidade do título. A inexigibilidade abrange a lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou interpretação de lei ou ator normativo que considere incompatível com a Constituição.

A não propositura dos embargos à execução não impede de o magistrado pronunciar a inconstitucionalidade da decisão. A declaração da nulidade do título não fica dependente única e exclusivamente de requerimento da parte:

“Mesmo que não houvesse a recente regra introduzida no Código de Processo Civil expressa em seu art. 741, parágrafo único, nada impediria que, por ocasião dos embargos, o juiz examinasse a questão da inconstitucionalidade da sentença considerada nula, independentemente de qualquer pronunciamento prévio do Supremo Tribunal Federal, nos aspectos difuso ou concentrado” (Delgado, 2007, p. 4).

Quando a execução se funda em sentença a impugnação será feita por meio de simples petição, não há necessidade de processo autônomo para isso. Na mesma direção do embargo à execução, poder-se-á alegar a inexigibilidade da sentença por ser esta inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou quando este ao interpretar lei ou ato normativo julgar incompatível com a Constituição.

A sentença que aplicou a lei inconstitucional, quando tiver que ser cumprida, pode o executado impugná-la através de simples petição, valendo-se o artigo 475 – L do Código de Processo Civil: “A impugnação somente poderá versar sobre: (…) II – inexigibilidade do título”. Prescreve o parágrafo primeiro do mesmo artigo transcrito: “Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal. (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)”

Acolhido o argumento da inconstitucionalidade, o executado não será obrigado a cumprir a sentença contrária à Lei Maior. Note-se que, tanto na execução por título judicial como também na execução por título extrajudicial, nada impede do executado se defender, podendo argumentar a inconstitucionalidade da sentença ou título. Note-se também que a impugnação à sentença é outro mecanismo processual de se combater decisão, mesmo que transitada em julgado, prospere.

Se o devedor houver ajuizado embargos à execução, ao invés de se defender por simples petição, o juiz em atendimento aos princípios regedores do processo, deverá receber a petição e adaptar ao procedimento. Não há nisso nenhum prejuízo para as partes, nem configura suprir a falta de algum requisito essencial da ação.

Parte da doutrina argumenta que o sucesso da rescisão da coisa julgada inconstitucional depende do pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, em sede de ação declaratória de inconstitucionalidade ou constitucionalidade da lei ou ato normativo federal ou estadual.

“Entendemos que a invalidação da coisa julgada inconstitucional somente tem lugar após o Supremo Tribunal Federal, na via concentrada de controle de constitucionalidade, declarar a inconstitucionalidade ou constitucionalidade de algum ato normativo federal ou estadual” (CAMINHA, 2003, p.7)

Parece mais adequada a situação, afastar a inconstitucionalidade, independentemente de pronunciamento do Supremo Tribunal Federal. Uma decisão inconstitucional quebra a harmonia social e enfraquece o Judiciário, situação que não pode ocorrer. Portanto, não importa que o Supremo Tribunal Federal ainda não tenha se pronunciado a respeito, pode o juiz incidentalmente reconhecê-la. Assim, o juiz ao analisar um recurso ou até mesmo na fase de cumprimento de sentença, deparando-se com a inconstitucionalidade da decisão, tem o dever de pronunciá-la independentemente de procedimento especial, podendo ser reconhecida em qualquer procedimento:

“É que as nulidades ipso iure devem ser conhecidas e declaradas independentemente de procedimento especial para esse fim, e podem sê-lo até mesmo incidentalmente em qualquer juízo ou grau de jurisdição, até mesmo de ofício segundo o princípio contido no art. 145 e seu parágrafo único do Código civil” (DELGADO, 2007 , p. 17)

Pelo que foi exposto, qualquer meio processual é idôneo para afastar a inconstitucionalidade de uma decisão. O rigor formal não pode ser utilizado em detrimento das pessoas. A forma é um meio e não um obstáculo ao direito. O que deve prevalecer é a proteção dos princípios constitucionais, guardiões do ser humano, que não pode ser vítima de qualquer mácula cometida pelo Judiciário.

3.4. PROTEÇÃO À CONSTITUIÇÃO

Os direitos e princípios constitucionais são frutos da soberania popular, conforme determina o parágrafo único, artigo 1° da Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, nos termos desta Constituição”. A Assembleia Nacional Constituinte, formada com finalidade exclusiva de elaborar uma
Carta Constitucional, tem como componentes pessoas que foram escolhidas pelo povo. Assim, o que for estabelecido pela Assembleia Constituinte, representa a vontade popular.

Em regra, a Constituição Federal pode ter os dispositivos modificados através de emendas. Porém, há artigos, pelo grau de relevância que ocupam, a Carta Política no artigo 60, §3°, veda expressamente proposta de emenda tendente a abolir: “I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais”. Os quatro incisos mencionados são cláusulas pétreas.

Há, também, de se mencionar que os direitos fundamentais são inalienáveis, imprescritíveis, irrenunciáveis. Inalienáveis porque não têm conteúdo econômico patrimonial, são intransferíveis, não é algo que passa de pessoa para outra, tendo todos igualmente direitos. Imprescritíveis quer dizer que o não exercício do direito, seja pelo tempo que for, não acarreta prescrição, podendo ser exigidos a qualquer momento. Irrenunciáveis, pois não se permite que seja abdicados.

É a Constituição que dispõe sobre os direitos e garantias fundamentais, a organização dos poderes, a defesa do Estado e das instituições democráticas, a tributação e orçamento, a ordem econômica, e a ordem social. Em suma, a Constituição Federal é a base de todo ordenamento jurídico, organiza o Estado, limita os Poderes e trata também dos direitos e garantias fundamentais. Ela é uma garantia do cidadão de exigir do Poder Público o cumprimento dos direitos individuais e coletivos, como também velar pela ordem do Estado. A Carta Política é essencial para a organização do Estado. Essa organização é essencial e também um tranquilizante para os cidadãos:

“O que todo cidadão espera do Poder Judiciário é a defesa integral da supremacia constitucional. Nunca a sua violação ao emitir decisões judiciais. A atividade judiciária, pela nobreza contida no seu exercício, deve imprimir o máximo de segurança jurídica. Esse patamar só será alcançado se ela configurar de modo explícito a harmonia dos seus efeitos com as linhas mestras materializadas no texto da Constituição Federal.” (DELGADO, 2007, p.2)

Um Estado sem limites, sem organização está sujeito ao autoritarismo, a arbitrariedade, além de vulnerar os direitos individuais e coletivos do cidadão, podendo-se, dessa forma, esperar de tudo em um Estado sem Constituição. O ser humano ainda não tem maturidade suficiente para reger um Governo sem violar princípios éticos, morais e direitos dos indivíduos, sem estar orientado por uma Constituição. Estados, mesmo com Constituições que o guiem, ainda cometem deslizes graves, calcule-se sem tê-la.

Pelo fato de a Constituição ser o alicerce do Estado, todas as leis, atos normativos, como também atos e negócios jurídicos devem estar em harmonia com a Constituição. A quebra desta harmonia gera uma situação de incerteza e insegurança, colocando em risco a Supremacia da Constituição. Qualquer lei, ato normativo, desrespeitando os tramites legais ou contrariando o conteúdo da Constituição é passível de controle de Constitucionalidade:

“O controle de constitucionalidade configura-se, portanto, como garantia de supremacia dos direitos e garantis fundamentais previstos na constituição que, além de configurarem limites ao poder do Estado, são também uma parte da legitimação do próprio Estado, determinando seus deveres e tornando possível o processo democrático em um Estado de Direito” (MORAES, 2006, p. 636).

Deve-se ser bastante maleável para se desconstituir a coisa julgada inconstitucional. A Supremacia da Constituição Federal não pode ser temerosa, nenhum princípio é absoluto, a interpretação é com base em outros princípios.

CONCLUSÃO

A coisa julgada é muito importante para a atividade do Judiciário e tem alicerce constitucional. Ele garante a imutabilidade dos julgados. Com isso, transmite confiança ao jurisdicionado. Dentro do prazo legal, existe a possibilidade de se mudar a sentença através de recurso. Destaque-se que não pode haver indefinidas alterações. Há o momento em que a sentença torna-se definitiva.

É a coisa julgada material que torna a sentença de mérito intocável, impede que seja esta rediscutida em outro processo, salvo por ação rescisória nas hipóteses restritas do Código de Processo Civil.

A relativização do mencionado instituto processual não lhe causa desprestígio, e sim fortalecimento. A coisa julgada não gozaria de credibilidade se não protegesse os direitos e garantias guardados pela Constituição Federal. A supremacia da Carta Política deve sempre ser mantida, pois é o alicerce de todo o ordenamento jurídico, ofendê-la significa agredir a paz social. Há segurança jurídica, quando a fonte dos direitos do cidadão é obrigatoriamente observada por todos.

O legislador não prevê um mecanismo específico para controlar a constitucionalidade das sentenças transitadas em julgado, o que não impede eleger uma forma para rescindir o julgado que aplicou a norma em desarmonia com a Lei Maior. O juiz pode deixar de efetivar uma sentença que for contraria a qualquer dispositivo da Carta Magna. Frise-se que, para afastá-la, não é obrigatório o pronunciamento da Suprema Corte. O julgador não fica adstrito ao julgamento, em via concentrada, do Supremo Tribunal Federal. Independentemente da via escolhida, sempre que a sentença estiver violando algum princípio ou comando da Lei Fundamental, o interessado pode requerer ao Judiciário a sua rescisão, mesmo que não caiba mais recurso. Até mesmo de ofício, o juiz pode reconhecer a inconstitucionalidade da decisão.

O importante é priorizar a Constituição. A sentença, obrigatoriamente, deve estar dentro dos parâmetros constitucionais para receber o manto da imutabilidade.

Deve-se ressaltar que o presente trabalho não esgota o debate a respeito do tema proposto, dada à extensão e importância do assunto. A coisa julgada é bastante ampla, podendo abrir a discussão em vários aspectos, inclusive complementando o trabalho exposto. Por isso, é importante fazer novas pesquisas e novos trabalhos, sempre.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Rossana Roberta de Sousa Araújo

Graduada em Direito pelo Instituto de Educação Superior da Paraíba -IESP advogada pós-graduada em Processo Civil lato sensu pós-graduanda em Direito Civil Imobiliário


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Relativização da coisa julgada inconstitucional

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Resumo: A presente monografia aborda o tema do instituto processual indispensável ao Estado Democrático de Direito, a coisa julgada. Analisa sua intangibilidade em decorrência da exigência da segurança jurídica. Questiona, porém, se a coisa julgada seria intocável mesmo quando viola norma constitucional. Neste sentido, relata opiniões que entendem que a res judicata deve ser compreendida em um sentido relativo, sucumbindo diante de valores, princípios e regras constitucionais. Analisa as medidas típicas contra a coisa julgada inconstitucional, concluindo, todavia, que a ação rescisória, a ação declaratória e os embargos de execução são os únicos meios legais aptos à quebra da coisa julgada inconstitucional. Trata-se, por tanto, de um tema bastante controvertido, longe de ser pacificado.[1]


Palavras-chave: Coisa julgada. Relativização. Segurança jurídica.


Sumário: Introdução. 1. A coisa julgada. 1.1. Conceito. 1.2. Coisa julgada formal. 1.3. Coisa julgada material. 1.4. Limites da coisa julgada 1.4.1. Limites Objetivos da Coisa Julgada. 1.4.2. Limites Subjetivos da Coisa Julgada. 2. Sentença julgada inconstitucional. 2.1. Conceito de inconstitucionalidade. 2.2. Limites da sentença. 2.3. Sentença inconstitucional transitada em julgado. 2.3.2. Sentença inconstitucional: nula ou inexistente? 3. Relativização da coisa julgada inconstitucional. 3.1. Considerações iniciais. 3.2. Relativização e segurança jurídica. 4. Meios de desconstituição da coisa julgada. 4.1. Ação rescisória. 4.2. Ação declaratória. 4.3. Embargos a execução. Conclusão. Referência


INTRODUÇÃO


O presente trabalho sobre a desconstituição da coisa julgada inconstitucional não tem a intenção de inovar a respeito desse assunto tão polêmico da atualidade, mas sim, possibilitar uma reflexão sobre o tema.


O controle do conteúdo do comando judicial é preocupação constante na seara acadêmica, como também agita o próprio espírito dos jurisdicionados, aos quais o comando é dirigido para a resolução dos conflitos intersubjetivos de interesse que surgem aqui e acolá, movimentando a cada momento o Estado, a quem os próprios jurisdicionados se submeteram aguardando a devida composição do litígio.


Em conseqüência dessa prestação jurisdicional do Estado, surge o instituto da coisa julgada, que apesar de sua conceituação aprimorada ao longo da história do Direito, sempre se baseou na necessidade de o ordenamento jurídico proteger as decisões judiciais de questionamentos intermináveis, impedindo, assim, a perpetuação das demandas e trazendo segurança jurídica.


A coisa julgada, então, protege as prestações jurisdicionais, emprestando-lhes o caráter de imutabilidade e indiscutibilidade que impedem novos questionamentos, em juízo, acerca da questão decidida.


Muitas vezes, porém, essas prestações jurisdicionais violam o texto constitucional e se cristalizam pelo decurso do tempo, ganhando status de intocáveis.


Assim, este trabalho apresenta como problemática para reflexão a impossibilidade de a lei ou ato normativo inconstitucional ser fundamento de uma decisão judicial imutável.


É notório que, atualmente, tanto na doutrina como na jurisprudência, há uma tendência crescente em se mitigar os limites da conceituação clássica do instituto da coisa julgada. Dessa forma, percebe-se que muitas vezes o julgador é chamado a se manifestar em situação nos quais a aplicação do código jurídico usual fornece decisões, a priori, inadequadas.


Questiona-se, desse modo, se devem ser consideradas intangíveis as decisões judiciais que apresentam conteúdo contrário à constituição? Se deve a coisa julgada inconstitucional ser relativizada? Quais os meios adequados para o seu controle da coisa julgada? Ou ainda, o que se pode dizer de uma decisão que põe fim a uma demanda, mas foi calcada em uma lei julgada posteriormente como inconstitucional?


Para muitos, a intangibilidade da res judicata encontra-se constitucionalizado no Direito Brasileiro – art. 5º XXXVI, da CF. Todavia, nem todos os intérpretes encontram a consagração da intangibilidade da coisa julgada.


Observaremos, no decorrer deste trabalho, que a doutrina já sinaliza no sentido de que a res judicata deve ser compreendida em um sentido relativo, devendo sucumbir diante de valores, princípios e regras constitucionais.


O presente trabalho divide-se em quatro capítulos: no capítulo 01 trataremos do instituto da coisa julgada, discorrendo sobre o seu conceito e limites; no capítulo 02 dissertaremos sobre a sentença julgada inconstitucional, indagando se a sentença incompatível com a constituição seria nula ou inexistente; o capítulo 03 discutiremos sobre a possibilidade da relativização da coisa julgada inconstitucional e o princípio da segurança jurídica; e por fim, analisaremos no capítulo 04 os instrumentos existentes em nosso sistema processual positivo aptos ao ataque à res judicata inconstitucional, ou seja, a ação rescisória, a ação declaratória e os embargos a execução.


1. COISA JULGADA


1.2 CONCEITO


Preliminarmente, pode-se conceituar a coisa julgada como o faz a o art. 467 do CPC que a denomina como a “a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.”


Nesse sentido, a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu art. 6º, parágrafo 3º, a define onde se lê que “chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba mais recurso.” Porém, esse conceito não parece ser completo, uma vez que a coisa julgada não é somente a decisão em si, mas uma qualidade sua.


Várias teorias foram formuladas na tentativa de definir o instituto em exame, o que gera, até os dias atuais, grandes discussões entre os doutrinadores. Dentre essas teorias destacam-se a teoria da presunção da verdade, a qual defendia que, por ser o alcance da verdade no processo algo inatingível, a coisa julgada seria o que mais se aproxima da verdade. Já a teoria da ficção da verdade, desenvolvida por Savigny, leva em consideração o conflito entre segurança jurídica e certeza. Segundo esta teoria, a insegurança é mais maléfica à sociedade do que a incerteza, o que justifica a coisa julgada atribuir força legal a uma determinada situação que poderia ser justa ou injusta e até mesmo sem equidade[2].


Doutrinariamente, a conceituação da coisa julgada, dentre diversas teorias, girou em torno de duas, a primeira liderada por Chiovenda e a segunda por Liebman.


Chiovenda entende que res judicata é o efeito da sentença que a completa, corresponderia à eficácia da sentença que acolhe ou rejeita o pedido, ou seja, para este ilustre mestre, a coisa julgada decorreria dos efeitos da sentença[3].


Na doutrina brasileira, posição semelhante foi tomada por Celso Neves, para quem a coisa julgada seria:


“O efeito da sentença definitiva sobre o mérito da causa que, pondo termo final à controvérsia, faz imutável e vinculativo, para as partes e para os órgãos jurisdicionais, o conteúdo declaratório da decisão judicial”[4].


A segunda corrente, defendida por Liebman, adotou um conceito mais moderno ao considerar que a coisa julgada é uma qualidade inerente a todos os efeitos da sentença, não só o elemento declaratório, mas também os elementos constitutivos e condenatórios, sendo este o conceito aceito pela maior parte da doutrina. Liebman define coisa julgada como:


“A imutabilidade do comando emergente de sua sentença. Não se identifica ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando; é, pelo contrário, uma qualidade, mais intensa e mais profunda, que reveste o ato também em seu conteúdo e torna assim imutáveis, além do ato em sua existência formal, os efeitos, quaisquer que sejam do próprio ato”[5]


Humberto Theodoro Júnior também defende que a coisa julgada não é um efeito da sentença e sim uma qualidade dela representada pela imutabilidade de seu julgado e de seus efeitos[6].


Alexandre Câmara entende que a coisa julgada é a imutabilidade da sentença (coisa julgada formal) e a imutabilidade de seu conteúdo (coisa julgada material) não cabendo dessa forma qualquer recurso. Segundo ele, a coisa julgada formal teria alcance limitado ao processo em que foi proferida a sentença, impedindo dessa forma que nova discussão naquele mesmo feito, e que a coisa julgada material teria alcance no conteúdo da sentença, extrapolando dessa forma o processo em que foi prolatada a decisão, tornando a decisão indiscutível e imutável em qualquer outro processo[7].


Prado assevera que “a coisa julgada não é efeito da sentença, e sim, uma qualidade que a torna imutável”[8]. Explica que:


“Ela pode ser “formal”, que é a imutabilidade da sentença dentro do processo em que se deu, ou “material”, que é a decisão que, enfrentando a questão de mérito, não é passível de ser impugnada por mais nenhum recurso ou o prazo para o aforamento de recursos se expira[9]”.


Dessa forma, pode-se afirmar que a coisa julgada é uma situação jurídica consistente na imutabilidade e indiscutibilidade da sentença (coisa julgada formal) e de seu conteúdo (coisa julgada substancial), quando tal provimento jurisdicional não está sujeito a qualquer recurso[10].


1.3 COISA JULGADA FORMAL


È uníssono entre os doutrinadores que a coisa julgada formal é a imutabilidade da sentença como ato jurídico processual. Dessa forma, pode-se dizer que ocorre a coisa julgada formal “quando estiverem esgotados todos os recursos previstos na lei processual, ou porque foram todos utilizados e decididos, ou porque decorreu o prazo de sua interposição”.[11] Conseqüentemente, tem-se “a imutabilidade da decisão dentro do mesmo processo por falta de meios de impugnação possíveis, recursos ordinários ou extraordinários”.[12]


“A coisa julgada formal, ou preclusão máxima, dá à sentença imutabilidade como ato processual de encerramento da relação processual”.[13] Tornando imutável a decisão, como ato processual, a coisa julgada formal é condição prévia da coisa julgada material, que é a mesma imutabilidade em relação ao conteúdo do julgamento e “mormente aos seus efeitos”[14].


A coisa julgada formal é o primeiro dos dois momentos do instituto da coisa julgada e opera no interior do processo, entre o juiz e as partes, mas não impede que o objeto discutido no julgamento volte a ser novamente discutido em outro processo.


Pode-se dizer que a coisa julgada formal significa: ” Diz-se da decisão em cujo processo não mais pode ser impugnada, seja porque precluíram os prazos recursais, seja porque se esgotaram todos os recursos previstos na lei”[15]. Como bem explica Vitagliano, “trata-se da impossibilidade de reformar a sentença por vias recursais, seja porque a última instância proferiu sua decisão, ou seja, por haver transcorrido o prazo para interpor recurso, ou finalmente porque se desistiu do recurso ou a ele se renunciou”[16].


Segundo Alexandre Câmara, “A coisa julgada formal, porém, só é capaz de pôr termo ao processo, impedindo que se reabra a discussão acerca do objeto do processo no mesmo feito. A mera existência da coisa julgada formal é incapaz de impedir que tal discussão ressurja em outro processo”[17].”


Cândido Rangel Dinamarco afirma que toda sentença nasce para extinguir um processo e portanto todas elas sãos aptas a receberem a coisa julgada formal. Assim, na coisa julgada formal o processo se extingue e nenhum recurso é mais cabível, por força da decisão judicial proferida naquele processo [18].


 Já Frederico Marques entende que: “A sentença se torna imutável na relação processual (ocorrendo assim a coisa julgada formal) quando inadmissível qualquer recurso para reexame da decisão nela contida”[19].


Pode-se dizer, então, que a coisa julgada formal é ao mesmo tempo o resultado da inadmissibilidade de qualquer recurso e o fator impeditivo da substituição da sentença por outra.


Formada a coisa julgada formal, a sentença adquire a imutabilidade como ato processual. Isto significa “que o mesmo Juiz que prolatou a sentença não a pode mais modificar, visto que ela adquiriu os contornos de ato processual imutável, inimpugnável, incontestável, portanto, definido”[20].


Conforme está disposto no artigo 474 do Código de Processo Civil, afirma Vitagliano que com o surgimento da coisa julgada formal, “todas as questões que constituem o cerne do litígio, não só as que foram efetivamente deduzidas, como as que poderiam ter sido alegadas mas não o foram, não podem mais ser objeto de argüição e de apreciação.”[21]


“Art. 474: Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.”


Acrescenta, ainda, o autor que, “com as questões não argüidas, embora pudessem tê-lo sido,” realiza-se “o fenômeno da preclusão, ou seja, a perda de um direito ou faculdade processual de alegar novamente aquelas questões.”[22]


 Finalmente, pode-se dizer que com a coisa julgada formal,


“o Juiz cumpre e acaba o ofício jurisdicional ou, em outras palavras, o Estado entrega ao particular a prestação jurisdicional que foi invocada, resultando, daí, que o litígio resta definitivamente composto, com a aplicação da vontade da Lei ao caso concreto”.[23]


1.4 COISA JULGADA MATERIAL


A coisa julgada material consiste na imutabilidade e indiscutibilidade do conteúdo (declaratório, constitutivo, condenatório) da sentença de mérito, e produz efeitos para fora do processo. Formada esta, não poderá a mesma matéria ser novamente discutida, em nenhum outro processo [24].


Dessa forma, se ingressarem com novo processo no judiciário cujo objeto já tenha sido discutido e apreciado por sentença definitiva e já tenha adquirido o status de coisa julgada material, deverá este novo feito ser extinto, sem resolução do mérito, em razão da existência da coisa julgada material (art. 267, V, CPC).


Segundo ensina Vitagliano,


“Na coisa julgada material concentra-se a autoridade da coisa julgada, ou seja, o mais alto grau de imutabilidade a reforçar a eficácia da sentença que decidiu sobre o mérito ou sobre a ação, a fim de que se impeça, futuramente, qualquer indagação sobre a justiça ou injustiça de seu pronunciamento”.[25]


Para a corrente dominante, a coisa julgada material só se forma nos julgamentos de mérito e consiste na imutabilidade não mais da sentença, mas de seus efeitos [26]. Essa imutabilidade projeta-se para fora do processo e impede que a pretensão seja novamente posta em juízo, pelas mesmas partes, com os mesmos fundamentos, no mesmo ou em outro juiz ou tribunal.


O juiz ao julgar uma pretensão, poderá conceder ou não a tutela pretendida, a sentença, transcorrido o prazo e recursos cabíveis, torna-se definitiva, resolvendo em caráter imutável e indiscutível a relação de direito material.


A segurança jurídica que advém da coisa julgada vem da constituição Federal no capítulo dos direitos e garantias individuais. Em seu art. 5º, inciso XXXVI, que dispõe que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.


O significado literal de coisa julgada “é a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.”[27]


A sentença transita em julgado, após exauridos e resolvidos os recursos manifestados contra a sentença, ou não sendo manifestado nenhum[28]. O que faz Surgir, conseqüentemente , dois fenômenos simultâneos:


“O primeiro é o advento da coisa julgada formal, isto é, a sentença, como ato processual torna-se imutável dentro da relação processual. Este fenômeno só se faz presente dentro do processo. O segundo fenômeno é a formação da coisa julgada material ou substancial. Esta que tem como pressuposto lógico a coisa julgada formal, caracteriza-se pela imutabilidade dos efeitos declaratórios, condenatórios ou constitutivos da sentença de mérito, chamados “principais”, como imutáveis também se mostram os efeitos secundários da sentença. Tais efeitos – principais e secundários – adquirem uma qualidade, que é a sua imutabilidade. Fala-se, assim, em “autoridade da coisa julgada”.”[29]


 Estes efeitos, ao se tornarem imutáveis, extrapolam a relação processual, irradiam-se para fora do processo de forma a impedir que outros Juizes ou Tribunais possam reapreciar aquele mesmo litígio[30]. Assim “o comando que emerge da sentença de mérito transitada em julgado faz lei entre as partes, isto é, obriga o réu vencido a cumprir o decisório, bem como dá, ao vencedor, a faculdade de fazer valer o direito reconhecido na sentença.”[31]


Em explanação sucinta, Alexandre Freitas Câmara conclui que:


“A coisa julgada material tem como efeito impedir qualquer nova apreciação da questão já resolvida e não, como já se chegou a afirmar, obrigar os juízes a decidir sempre no mesmo sentido da decisão transitada em julgado.”[32]


 


Por fim, pode-s afirmar que todos os efeitos da sentença, seja eles principais ou secundários, tornam-se imutáveis fazendo lei entre as partes. Entendimento este que pode ser verificado nos artigos 467 e 468 do atual Código de Processo Civil:


Art. 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.


Art. 468. A sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas.”


1.5 LIMITES DA COISA JULGADA


A coisa julgada evita que sejam debatidos aspectos já decididos em sentença que já transitou em julgado. Mas essa asseveração não é absoluta. È necessário verificar o que pode e o que não pode ser mais debatido e quais sujeitos não podem mais rediscutir aquilo que foi objeto de sentença anterior transitada em julgado. Ou seja, verificar quais são os limites objetivos e subjetivos da coisa julgada.


1.5.1 Limites Objetivos


Importante enfatizar que a coisa julgada “possui limites que estão fixados no dispositivo da sentença. Esses limites podem ser de ordem objetiva e subjetiva.”[33] Assim, segundo Prado, “Limites objetivos da coisa julgada referem-se à abrangência que o decisum teve em relação às questões decididas pelo prolator, decididas na motivação ou mesmo na fundamentação, desde que haja prolação de teor decisório”[34].


O Código de Processo civil inicia a regulamentação da matéria pelo art. 468, segundo o qual “a sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas”. Como se sabe, no sistema do CPC, a sentença faz coisa julgada nos limites do objeto do processo, o que significa dizer, nos limites do pedido.[35]


Verifica-se, desta forma, que o art. 468 do CPC leva à conclusão (e não poderia ser de outra forma) que apenas aquilo que foi deduzido no processo e, por conseguinte, objeto de cognição judicial, é alcançado pela autoridade de coisa julgada.[36]


Já o art. 469 e 470 do CPC completa, no sentido que os motivos e a fundamentação da sentença, não fazem coisa julgada, por mais relevantes e indispensáveis que sejam para determinar o alcance da parte dispositiva. Apenas ajudam no esclarecimento da decisão e no alcance desta, mas não a mudam. Podem ser levantados e decididos em outro processo, sem que a coisa julgada obtida em processo anterior os impeça.


Marcia Pelissari ao responder o questionamento: Quais os limites objetivos da coisa julgada? Aduz de forma esclarecedora que


“Os limites objetivos da coisa julgada referem-se àquilo que: a) tenha sido pedido pelos autos; b) tenha sido decido pela sentença. Em consonância com o art. 468 do CPC, a qualidade de coisa julgada é feita nos limites da lide e das questões decididas. E os limites da lide são traçados pelo pedido inicial (128 e 460 do CPC). Destarte, os limites objetivos da coisa julgada são extraídos da conjugação entre o pedido e o que constou no dispositivo. Não faz coisa julgado aquilo que tenha sido pedido, mas não tenha sido julgado (sentença citra petita) ou aquilo que tenha sido decidido pela sentença sem que tenha sido pedido pelo autor (sentença ultra ou extra petita).”[37]


1.5.2 Limites subjetivos


 Da mesma forma que a coisa julgada possui limites objetivos, ela também possui limites subjetivos. Estabelece o art. 472 do CPC que : “a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”. Dessa forma, a lei estabelece quais são as pessoas atingidas pela coisa julgada, segundo o artigo supracitado a coisa julgada só alcança as partes, não beneficiando nem prejudicando terceiros, ou seja, terceiros não são alcançados pela imutabilidade e indiscutibilidade da sentença.[38]


 A res judicata não pode beneficiar nem prejudicar terceiros estranhos ao processo. o principal fundamento é o de que o terceiro não teve direito ao contraditório[39], logo, não pode ser prejudicado pela imutabilidade e intangibilidade da coisa julgada.


Assevera Prado que: “os limites de ordem subjetiva se dão somente quanto às partes que integraram a relação jurídica processual.”[40] Segundo o autor, esse é o entendimento de Dinamarco[41] ao enfatizar que os limites subjetivos da coisa julgada se dão no processo, pois este é o resultado da soma de “uma relação jurídica processual e de um procedimento”.


Para Prado “a coisa julgada pode repercutir na esfera de índole material de terceiros que não fizeram parte desta relação jurídica”. Adota como, como exemplo, “os credores das partes, como avalizados, como afiançados, como co-avalistas, terceiros com iguais direitos, mesmos pedidos e mesmos fundamentos.”[42]


Nesse sentido, compatível é o pensamento de Lima ao dizer que a expressão “Limite Subjetivo da Coisa Julgada” significa que somente aqueles que são


“atingidos pela coisa julgada, aí incluído o estudo da possibilidade de a sentença produzir efeitos num universo de indivíduos maior do que o daquele atingidos pelas demais eficácias da sentença, ou seja, limite subjetivo da coisa julgada é a definição das pessoas que se submetem à imutabilidade do comando inserido na sentença, bem assim das pessoas que sofrem qualquer laivo de eficácia decorrente da decisão.”[43]


Reforça, ainda, esse entendimento as situações excepcionais, em que “pode haver a extensão da coisa julgada a quem não integrou a relação jurídica processual, devido à posição especial ocupada no plano das relações de direito material e de sua natureza”[44].


Dentre esses casos, Prado destaca:


“a situação dos sucessores das partes, que estão sujeitos à coisa julgada pelo fato de receberem direito e ações no estado de coisa julgada; o do substituído, no caso de substituição processual, em que o substituto é a parte, mas o direto material é do substituído, o qual tem sua relação jurídica decidida com força de coisa julgada; o dos legitimados concorrentes para demandar, no caso dos credores solidários”.[45]


Defende essa concepção Azambuja, criticando: “Também, somente num esquema, ou forma privatista do processo e da coisa julgada, podemos aceitar o dogma romano de fazer a autoridade da coisa julgada meramente aos que participaram do feito”.[46]


Lima[47], ainda, aprofunda o seu entendimento no sentido de que haja a extensão dos limites objetivos da coisa julgada mesmo no processo individual, atingindo os limites subjetivos de forma indireta, pois outras pessoas seriam beneficiadas com as razões da sentença, caso as mesmas transitassem em julgado. Com isso ter-se-ia alcançados pela coisa julgada os motivos, a verdade dos fatos e a apreciação da questão prejudicial que estão excluídos pelo artigo 469, do CPC.


“Art. 469 – Não fazem coisa julgada: I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença; III – a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo.”


Por isso, Lima afirma que:


“Muito mais acertado seria o Direito Processual pátrio optar pela extensão dos efeitos da coisa julgada a todas as questões efetivamente decididas, desde que relativas a fatos jurídicos concretos e indissociáveis da conclusão última da sentença”.[48] Assim, ele iria se preocupar apenas com as questões que não tivessem sido objeto de apreciação no primeiro julgamento. Facilitaria, profundamente a tarefa do judiciário e com isso contribuiria para que os efeitos da sentença se estendessem a outro ou outras pessoas que ingressassem no judiciário com base nos mesmos fundamentos ou causa de pedir, uma vez que esta já estaria reconhecida de forma incontroversa.”


Dúvida não há que a ampliação dos limites objetivos da coisa julgada, proposta por Lima, iria contribuir favoravelmente em favor de terceiros que não participaram da relação jurídica processual originária.


2. SENTENÇA JULGADA INCONSTITUCIONAL


2.1 CONCEITO DE INCONSTITUCIONALIDADE


Antes de adentrarmos na sentença inconstitucional, julgamos necessário apresentar uma noção sobre o que é a inconstitucionalidade.


Celso Ribeiro Bastos ensina que “a inconstitucionalidade não reside exclusivamente na Constituição nem no ato ou comportamento com ela confrontados. Na verdade, a inconstitucionalidade repousa na relação de contrariedade normativa entre uma e outra[49].


Marcelo Caetano doutrina que “a inconstitucionalidade é, pois, o vício das leis que provenham de órgãos que a Constituição não considere competente, ou que não tenham sido elaboradas de acordo com o processo prescrito na Constituição ou contenham normas opostas às constitucionalmente consagradas”.[50]


Marcelo Neves define o que vem a ser inconstitucional como “um ato normativo cujo conteúdo ou cuja forma contrapõe-se, expressa ou implicitamente, ao conteúdo de dispositivos da Constituição[51]. È, portanto, a lei ou ato, numa relação imediata de incompatibilidade vertical com a normas constitucionais. Aponta,mais adiante, o citado autor:


“Na acepção lógica dos termos, o problema não se reduz aos casos das leis em relação de contrariedade ou de contradição com a Constituição. Estas duas hipóteses correspondem apenas à inconstitucionalidade material, que implica contrariedade ou contradição, aplicando-se, como Bobbio, estes conceitos da lógica clássica às antinomias entre normas jurídicas. A inconstitucionalidade formal não resulta de contradição ou contrariedade, no sentido lógico dos termos, entre lei e Constituição. A incompatibilidade normativa, nesta hipótese, decorre da inadequação ou desconformidade do procedimento efetivo de elaboração legislativa (plano do ser) ao conteúdo de norma constitucional prescritiva do processo legislativo (plano do dever ser). Daí porque a definição de lei inconstitucional deve denotar não só a incompatibilidade resultante de contradição e contrariedade entre conteúdos normativos (legal e constitucional), mas também a proveniente da desconformidade entre procedimento de produção normativa e conteúdo normativo (contitucional).”[52]


Em tais considerações, o referido autor quer dizer o que pode ser conceituado como desconformidade do ato normativo em relação a algum preceito ou princípio previsto na Constituição Federal.


Quanto aos tipos, as inconstitucionalidades são classificadas em:


a) Formal e orgânica – é aquela que decorre de vício de incompetência do órgão autor do ato normativo, e consiste em uma das hipóteses de inconstitucionalidade formal. Uma lei ou ato é, portanto, considerada formalmente inconstitucional quando é elaborada por um órgão incompetente para tal, ou, mesmo sendo competente, quando adote medidas que estejam em desacordo, ou seja, firam o que esteja previsto na Constituição. Implica dize que a inconstitucionalidade pode resultar de vício de elaboração ou de incompetência.


b) material – é aquela que se reporta ao conteúdo do ator normativo, ou seja, consiste em verificar se ele é compatível com o que se contém na Carta Magna. Caso haja discordância quanto ao seu conteúdo, significa que o ato normativo será considerado materialmente inconstitucional.


Havendo, portanto, contradição entre o conteúdo da norma e o conteúdo Constitucional, poderá ser declara a inconstitucionalidade material. Também, poderá ocorrer inconstitucionalidade material nos casos em que a norma, embora disciplinando matéria deixada pelo constituinte à liberdade de conformação do legislador tenha sido editada não para realizar os concretos fins constitucionais, mas sim para perseguir outros, diferente ou mesmo de sinal contrário àqueles, ou caso sua edição tenha ocorrido com o desígnio de realizar finalidades apontadas na Constituição Federal, mas ofende a norma constitucional por tê-lo feito de modo inapropriado, desnecessário, desproporcional ou, sem suma, de modo não – razoável.


Assim, a sentença, como ato normativo, é inconstitucional quando pressupõe, vincula ou gera uma afronta e/ou incompatibilidade com a Constituição.


2.2 LIMITES DA SENTENÇA


Dispõe o art. 468 do Código de Processo Civil que “a sentença que julgar total ou parcialmente a lide tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas”.


Vitagliano ensina que nem tudo na sentença se torna imutável, o que faz coisa julgada material é o dispositivo da sentença, a sua conclusão. Pode-se dizer que a coisa julgada se restringe à parte dispositiva da sentença; a essa expressão, todavia, deve dar-se um sentido substancial e não formalista, de modo que abranja não somente a parte final da sentença, mas também qualquer outro ponto em que tenha o juiz eventualmente provido sobre os pedidos das partes[53].


Dessa forma, os limites de atuação são os limites da sentença no mundo real após prolatada e passar a produzir seus efeitos, limitando-se ao caso sub judice. O juiz não pode extravasar os limites do objeto mediato do pedido. Por isso, diz-se que o julgamento é extra petita quando o juiz julga pedido diverso do que foi formulado. Ultra petita quando o juiz julga a mais, além do que foi pedido. Citra petita quando o juiz julga aquém do que foi pedido.


O pedido estabelece seus limites pelo: objeto imediato, a providência judicial (sentença pedida); e, objeto mediato, o bem jurídico pretendido[54].


2.3 SENTENÇA INCONSTITUCIONAL TRANSITADA EM JULGADO


Quando uma sentença é prolatada ela deve respeitar in totum as normas consagradas pelo texto constitucional. Na hipótese em que há o desrespeito à Constituição é que surge a noção de sentença inconstitucional, a qual “é aquela cujo comando pressupõe, veicula ou gera uma afronta à Constituição. ‘Inconstitucionalidade’ assume aqui o sentido amplo de situação inconciliável entre um ato e normas (regras ou princípios) constitucionais”.[55]


Destarte, a sentença que contraria a Lei Fundamental de um Estado Democrático de Direito é inconstitucional. E, “o que é inconstitucional não pode valer. O que não vale – não tem valor – não pode subsistir.”[56]. Na lição de Cármen Lúcia Antunes Rocha “Isto, que é lição pacífica para que se faça o controle dos atos dos poderes legislativo e executivo, começa, somente agora, a tomar forma clara também para os atos judiciais, incluídos os terminativos dos processos (sentenças e acórdãos).”[57] .Mais adiante, assevera:


“Sentença (ou acórdão) é ato estatal. Logo, o ato judicial terminativo, ou não, da ação há que se ater aos fundamentos e aos limites constitucionalmente definidos. A obrigação judicial de ater-se aos comandos constitucionais não pode ser excepcionada sob qualquer argumento, incluído o tão comumente apresentado como é o da soberania dos atos do juiz, menos, ainda por um pensar judicante que depois se demonstra não ser coerente, compatível, adequado constitucionalmente”.


Soberania não está na caneta do juiz, mas na tinta constitucional com que ela se aperfeiçoa e que a dota de força de poder estatal aderente e obrigante.


É certo que a sentença prolatada judicialmente, pondo fim à ação, impõe-se superiormente a outros questionamentos e respostas submetidos à apreciação, incluídos alguns feitos pelo próprio Estado. Nem por isso se tem uma “supraconstitucionalidade” ou “aconstitucionalidade” autorizada juridicamente ao juiz.


Ato inconstitucional diz-se nulo, na celebrada lição que vem desde Marshall[58]. Para tanto, verifica-se que a sentença é tida por inconstitucional quando seu comando provoca uma violação a preceitos estabelecidos pela Constituição Federal.


A sentença pode ser inconstitucional por violar as regras processuais relativas ao ato processual, ou seja, por violar a constituição em seu aspecto formal no desrespeito ao processo de elaboração e na falta de competência para julgamento do processo.


A inconstitucionalidade da sentença pode ser verificada também quando se verificar que a sua fundamentação baseia-se em lei inconstitucional ou contrária aos princípios constitucionais. Assim, esse tipo de inconstitucionalidade pode ocorrer em diversas hipóteses. Eduardo Talamini ressalta-as, in verbis:


“(a) A sentença amparada na aplicação de norma inconstitucional.


[…] Pode ocorrer de a sentença se basear em : (i) uma norma que já foi antes declarada inconstitucional em sede de controle concentrado (ou que já foi “suspensa” pelo Senado Federal, depois de reconhecida incidentalmente sua inconstitucionalidade pelo Supremo); (ii) uma norma que, posteriormente, vem a ser declarada inconstitucional no controle concentrado (ou vem a ser posteriormente retirada do ordenamento pelo Senado); (iii) uma norma cuja inconstitucionalidade, embora existente, não é averiguada em controle direto – seja porque ele não cabe, seja porque nenhum dos legitimados pleiteou-o – e, portanto, não é declarada (e tampouco a norma é retirada do ordenamento pelo Senado).[…]


A aplicação da norma inconstitucional não precisa situar-se na própria sentença. Pode haver ocorrido antes, no curso do processo, e repercutir diretamente sobre a sentença. Ademais, pode tanto ser norma atinente ao direito material quanto ao processo. […]


Essa primeira hipótese de ‘sentença inconstitucional’ é a mais freqüentemente lembrada e estudada, porém não é a única.


(b) Sentença amparada em interpretação incompatível com a Constituição.


[…] não se ofende a Constituição apenas quando se aplica uma lei cujo teor literal é francamente inconstitucional. A violação constitucional pode também advir da adoção de uma interpretação incompatível com a Constituição, em detrimento de outra afinada com os desígnios constitucionais. Há que se buscar sempre a interpretação conforme à Constituição.


(c) Sentença amparada na indevida afirmação de inconstitucionalidade de uma norma.


[…] pode estar havendo com a não-aplicação da norma indevidamente reputada inconstitucional a afronta direta a outros valores e normas constitucionais, e não a simples ofensa reflexa à legalidade (p. ex., no caso em que a norma que se deixa de aplicar prestava-se a dar eficácia a algum direito ou garantia constitucional, de modo que sua indevida não aplicação cria uma espécie de ‘inconstitucionalidade por omissão’ in concreto).


(d) Sentença amparada na violação direta de normas constitucionais ou cujo dispositivo viola diretamente normas constitucionais.


(e) Sentença que, embora sem incidir em qualquer das hipóteses anteriores, estabelece ou declara uma situação diretamente incompatível com os valores fundamentais da ordem constitucional.”[59]


Exemplificando, ainda mais, os casos em que uma sentença contrarie comando constitucional, José Augusto Delgado também cita diversas situações, entre elas, destaca: a sentença ofensiva à soberania estatal; violadora dos princípios guardadores da dignidade humana; que autorize alguém a assumir cargo público descumprindo os princípios fixados na Constituição e nas leis específicas; que ofenda, nas relações jurídicas de direito administrativo, os princípios da legalidade, da moralidade, da eficiência, da impessoalidade e da publicidade, dentre outros muitos casos em que há violação as normas constitucionais.[60]


Percebe-se, portanto, que todas essas hipóteses geram um vício de extrema gravidade, as quais levam hodiernamente diversos doutrinadores a repensarem a necessidade de relativização da coisa julgada inconstitucional.


2.2.3 Sentença inconstitucional: nula ou inexistente?


Segundo grande parte da doutrina a sentença que viole a Constituição Federal ou, até mesmo seus princípios implícitos, é nula. Isto porque a sentença existe, uma vez que reúne requisitos mínimos que a identifique como tal.


Poder-se-ia dizer que uma sentença é inexistente, por exemplo, se prolatada por uma pessoa que não fosse juiz. Com arrimo neste entendimento, colhe-se a lição de Theodoro Júnior[61]:


“Uma decisão judicial que viole a Constituição, ao contrário do que sustentam alguns, não é inexistente. Não há na hipótese de inconstitucionalidade mera aparência de ato. […] Mas, contrapondo-se a exigência absoluta da ordem constitucional, falta-lhe condição para valer, isto é, falta-lhe aptidão ou idoneidade para gerar os efeitos para os quais foi praticado.”


Assim, embora existente, a exemplo do que se dá com a lei inconstitucional, o ato judicial é nulo, estando sujeito em regra geral, aos princípios aplicáveis a quaisquer outros atos jurídicos inconstitucionais.


Para concluir, faz-se mister socorrer-se à sempre terça lição de Pontes de Miranda, citado por Cândido Dinamarco, que discorre sobre as hipóteses em que a sentença é nula de pleno direito, arrolando três impossibilidades que conduzem a isso: impossibilidade cognoscitiva, lógica ou jurídica[62]. Assim, a impossibilidade jurídica de uma decisão inconstitucional, conduz, fatalmente, à afirmação de que a sentença é nula, e não inexistente.


3 RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL


3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS


Primeiramente, cumpre destacar a distinção feita pela doutrina entre coisa julgada ilegal e coisa julgada inconstitucional. Esta é aquela que viola a própria Constituição Federal, enquanto que aquela apenas contraria a lei ordinária.


No tocante à coisa julgada ilegal, ou seja, decisão que viola dispositivo infraconstitucional, o entendimento da doutrina é de que ela deve permanecer imodificável e intangível, tendo em vista que a natureza da proteção da res iudicata é infraconstitucional, assim como a do dispositivo violado. Vale então transcrever a lição de Paulo Otero:


“A segurança e a certeza jurídicas apenas são passíveis de salvaguardar ou validar efeitos de atos desconformes com a Constituição quando o próprio texto constitucional expressamente o admite. […] Fora de tais situações, repete-se, os valores da segurança e da certeza não possuem força constitucional autônoma para fundamentarem a validade geral de efeitos de atos inconstitucionais.”


E conforme assinalado na doutrina de Theodoro Júnior[63], a coisa julgada não pode suplantar a lei, em tema de inconstitucionalidade, sob pena de transformá-la em um instituto mais elevado e importante que a lei e a própria Constituição. Se a lei não é imune, qualquer que seja o tempo decorrido desde a sua entrada em vigor, aos efeitos negativos da inconstitucionalidade, porque o seria a coisa julgada? E questão de lógica jurídica[64].


“Estudos sobre o direito antigo confirmam, revelada, por exemplo, nas origens do direito norueguês, em que era completamente ignorado o princípio da coisa julgada. A sentença era executória, mas sempre aberto o debate sobre a sua exatidão, com base em novas provas, ou sem elas.”


No magistério de Dinamarco[65], a sentença abusiva não é sentença.


“A coisa julgada não é em si mesma um efeito e não tem dimensão própria, mas a dimensão dos efeitos substanciais da sentença sobre a qual incida […] Por isso, como a CF não permite que um Estado se retire da Federação, ou que se imponha por execução forçada o cumprimento da obrigação de dar um peso da própria carne, etc., da inexistência desses efeitos juridicamente impossíveis decorre logicamente a inexistência da coisa julgada material sobre a sentença que pretenda impô-los”, Assim, tem-se que apenas a coisa julgada inconstitucional deve ser desconstituída, merecendo reparo a assertiva de Ovidio A. Baptista da Silva, ao criticar a relativização da coisa julgada ilegal, fato este que nunca foi defendido por nós e nem pelos demais doutrinadores e defensores desta tese”.[66]


Prosseguindo, e de acordo com os argumentos já expendidos, a coisa julgada foi criada para trazer, principalmente, segurança jurídica à sociedade. No entanto, a partir do momento em que se torna possível a convalidação no tempo de uma decisão inconstitucional, tem-se que, aí sim, surgirão insegurança e incerteza entre nós.


O juiz deve ser ativo, não passivo. Não queremos, com isto, ferir o princípio dispositivo, mas apenas que o juiz seja mais dinâmico, atento aos fatos e às mudanças sociais, ou seja, que o direito deve evoluir juntamente com as necessidades da sociedade. Não é preciso lembrar, ainda, que pelo princípio inquisitivo, o juiz é livre para determinar as provas necessárias à busca da verdade real.


Do contrário, caso o magistrado insista em apegar-se a formalidades, não se tornará possível a pacificação social com a distribuição de justiça, que vem a ser a principal função do Estado como o detentor da jurisdição.


Ao juiz cabe o papel de árbitro do equilíbrio das tensões sociais, que no processo se manifestam. Mais do que dar soluções a pretensões, aos conflitos em si mesmos, ele precisa estar atento à relação global entre as pessoas e pronto a restabelecer o equilíbrio afetado […]. Entra aqui, outra vez, o que tem sido dito sobre a participação do juiz na revelação do direito do caso concreto. Ser sujeito à lei não significa ser preso ao rigor das palavras que os textos contém, mas ao espírito do direito do seu tempo. Se o texto aparenta apontar para uma solução que não satisfaça ao seu sentimento de justiça, isso significa que provavelmente as palavras do texto ou foram mal empregadas pelo legislador, ou o próprio texto, segundo a mens legislatores, discrepa dos valores aceitos pela nação no seu tempo presente. Na medida em que o próprio ordenamento jurídico lhe ofereça meios para uma interpretação sistemática satisfatória perante o seu senso de justiça, ao afastar-se das aparências verbais do texto e atender aos valores subjacentes à lei, ele estará fazendo cumprir o direito.


Foi dito que, em paralelismo com o bem-comum como síntese dos fins do Estado contemporâneo, figura o valor justiça como objetivo-síntese da jurisdição no plano social. A eliminação de litígios sem o critério de justiça equivaleria a uma sucessão de brutalidades arbitrárias que, em vez de apagar os estados anímicos de insatisfação, acabaria por acumular decepções definitivas no seio da sociedade[67].


Todavia, com entendimento um pouco diferente do expendido até então, e com uma visão mais formal, Celso Neves entende que “permitir que, pelo mero decurso do tempo, uma sentença rigorosamente válida passe a ser nula, e uma sentença visceralmente nula se convalide significa contrariar a finalidade da coisa julgada que significa obrigar todos os juízes à obediência ao ato jurisdicional, vinculativo não só das partes, como também do próprio poder público”[68]. E lembra ainda que “são requisitos de formação da coisa julgada, portanto: a) o exercício de jurisdição contenciosa; b) a validade da sentença, como ato jurídico processual”[69].


Ainda, para aqueles que entendem que a flexibilização da res iudicata é uma verdadeira afronta ao princípio da segurança jurídica, nos socorremos aos ensinamentos de Teresa Wambier e José Medina[70], em obra de autoria de ambos com o sugestivo nome o dogma da coisa julgada.


Veja-se, portanto, que optar pelo cabimento de ação rescisória ou declaratória de inexistência, em todos estes casos, não é desprezar o valor da segurança! Quem fica com a possibilidade de impugnar tais decisões opta não só pelo valor justiça, mas pelos valores justiça e segurança, num sentido um pouco diverso do tradicional. Segurança, com os olhos voltados para o futuro, segurança no sentido de previsibilidade. E só parcialmente verdadeiro dizer-se que quem opta pela imutabilidade ou pela possibilidade de se impugnarem decisões em leis tidas (incidenter tantum, reiteradamente) por inconstitucionais estaria optando pelo valor segurança. Que segurança é essa? Segurança da subsistência do que já há, do que já existe, do que já é conhecido, ainda que não se trate do melhor? Segurança com os olhos voltados só para o passado?


A segurança pela qual optamos, que não é a segurança por si mesma, mas a segurança de se ter conseguido o melhor, portanto segurança com conteúdo[71].


Entretanto, Araken de Assis[72], apesar de ver com bons olhos a revolucionária mudança do CPC, entende que “parece pouco provável que as vantagens da justiça do caso concreto se sobreponham às desvantagens da insegurança geral”. Porém, acredita-se que a referida mudança veio em boa hora e, desde que aplicada com muita cautela, a verdadeira segurança jurídica só tem a ganhar.


Portanto, a necessidade de se relativizar a coisa julgada material decorre de vários motivos, quais sejam: a) estamos numa época em que se busca justiça nas decisões, e não é justo eternizar uma decisão inconstitucional com o argumento de preservação dos efeitos decorrentes da auctoritas rei judicatae; b) os atos dos poderes Executivo e Legislativo podem ser revistos e declarados inconstitucionais a qualquer tempo, logo, as decisões judiciais também; c) entende-se que uma sentença que vai contra a Constituição Federal e seus princípios não pode ser considerada uma sentença, assim, como a coisa julgada é uma qualidade da sentença, e não há uma sentença propriamente dita, nem efeitos susceptíveis de ficarem imunizados, pode-se dizer que uma decisão inconstitucional não está acobertada sob o manto da coisa julgada, e d) a absurda hipótese de admitir que a coisa julgada inconstitucional convalesça no tempo, seria o mesmo que dar a ela maior importância que a própria lei.


3.2 RELATIVIZAÇÃO E SEGURANÇA JURÍDICA


O conflito que se procura estabelecer entre segurança e justiça, na perspectiva lógica da aplicação do direito, é de mera aparência. É de fato, inadmissível a segurança servir de base para impedir a impugnação da coisa julgada, imutável, imodificável e absoluta, de acordo com o pensamento dos processualistas mais conservadores. Contudo, é fundamental que se enfrentem tais resistências, eliminando a idéia de superação do Estado de Direito pelo Poder Judiciário[73].


O Direito Constitucional abarca valores fundantes do Estado, tratando, assim, da organização político-administrativa dos Poderes circunscritos aos seus desígnios, com o intuito de viabilizar o equilíbrio social. A decisão como manifestação da vontade do ente federativo não deve demonstrar visão pessoal do seu prolator. De acordo com Delgado[74], em sua dimensão ética, o Estado “não protege a sentença judicial, mesmo transitada em julgado, que bate de frente com os princípios da moralidade e da legalidade, que espelhe única e exclusivamente vontade pessoal do julgador e que vá de encontro à realidade dos fatos”.


Nesse sentido, torna-se inviável ser invocada a segurança jurídica para acolher a tese de que a coisa julgada faz do preto o branco, ao se querer impingir-lhe o caráter de absolutividade de que não é revestida. Os princípios da moralidade, da justiça e da eqüidade devem ser realçados como apanágio de uma sociedade civilizada, de forma que sobressaia seu degrau de superioridade em confronto com os demais que povoam o universo jurídico.


Além disso, o acatamento da coisa julgada não é colocado em dúvida pela probabilidade de uma pretensão de nulidade contra o julgamento que viola preceito constitucional, notoriamente porque seu alcance sofre limitações no seu aspecto subjetivo, com a possibilidade de manuseio da rescisória, para desconstituição do julgado. Em segundo lugar, porque presente nesses casos, os pressupostos da relatividade inerentes à natureza das coisas. Evidentemente, a pretensa impermeabilidade que deseja se atribuir às decisões emanadas do Poder Judiciário não existe[75].


Tenta-se, então, travestir a coisa julgada da argamassa de intocabilidade[76], tentando revelar sua faceta de cunho absoluto, que não resiste a mais detida análise dentro do cenário da principiologia, lastreada no constitucionalismo. Diante da evidência dos fatos, toda iniciativa que objetive reverter essa situação não tem recebido a devida simpatia pelos contrários a qualquer esforço renovador, visando ao aperfeiçoamento da sistemática até então adotada. Apesar de tudo, a mudança há de se impor com a remoção dos óbices que impedem ou limitam seu avanço.


Silva salienta que o princípio da segurança, conformador da coisa julgada, não deve, em determinadas circunstâncias, se opor à idéia da justiça, pois a coisa julgada não é valor absoluto, e no confronto entre ela e a idéia de justiça, esta é que deve prevalecer. Entende-se, portanto, que não é necessário mais do que um passo no sentido de fazer subsistir a responsabilidade do Estado pelo exercício da função institucional, ainda que isso implique alguma restrição da amplitude do conceito da coisa julgada[77].


A Coisa Julgada não redunda necessariamente na consolidação da segurança jurídica, já que o mecanismo constitucional que a protege objetiva preservar a irretroatividade. A garantia assegura sua incolumidade, evitando, assim, que seja alcançada por lei superveniente, capaz de desfigurar o conteúdo decisório que lhe deu conformação.


Não é possível que a inconstitucionalidade que contamina a coisa julgada povoe o ordenamento jurisdicional, dando-lhe o contorno de conteúdo pronto e acabado. Nada pode ser definitivo, se não por terem concorrido para sua construção elementos que, pela sua consistência, tenham sido concebidos conforme a eqüidade[78].


A regra emanada do Texto Maior proporciona, então, a conclusão singela do seu proveito no equacionamento dos problemas suscitados pela coisa julgada inconstitucional. Desnecessários outros dispositivos para regular todas as situações que possam surgir nesse campo. Essa percepção estritamente legalista de certa doutrina, que não se compraz com hermenêutica constitucional, postula a ampliação legislativa para regular procedimento, malgrado já se tenha para tanto a solução adequada com os instrumentos existentes.


Não existe pertinência entre as sentenças iníqua, injusta e inconstitucional, com a segurança jurídica, visto configurar coisas diametralmente opostas. A segurança jurídica pressupõe decisão conforme a constitucionalidade, encontrando no princípio da moralidade o pilar básico de sua sustentação. Fora disso, é a consolidação de absurdo, como pretexto para tornar definitiva uma situação que não resiste ao menor argumento ético e jurídico[79].


Lembra Alvim[80] que a doutrina tenta explicar o fenômeno da sentença transitada em julgado pelo aspecto político e jurídico, em razão do seu caráter de definitividade que não comporta qualquer modificação. Entretanto, o Estado permite às partes a modificação das sentenças erradas ou injustas, mediante os instrumentos processuais adequados. Mas essa procura de justiça “[…] deve ter um limite, além do qual não mais se permita discutir a justiça ou injustiça do julgamento operado através de sentença. Do contrário, não haveria estabilidade dos direitos e ninguém teria assegurado o gozo dos bens da vida”[81].


Uma vez em que a sentença possa ser vista pela ótica política ou jurídica, isso não quer dizer que ela se preste ao papel de consagradora de uma injustiça. A estabilidade social que se pretende obter a partir de uma solução definitiva, nessa condição, não resiste à menor análise. De fato, a busca da justiça não deve sofrer limitação de qualquer ordem, pois, se assim fosse, haveria de correr-se o risco de transformar a iniqüidade num manto de satisfação. Pretende-se com essa tese, fazer ver que a sentença, mesmo nula, deve prevalecer, a pretexto de que concorre para a segurança jurídica. Contudo, a sentença deve ser justa, conforme a eqüidade, dando a cada indivíduo o que merecido, segundo máxima romana.


Assim, a superação da justiça pela segurança jurídica não tem a menor acolhida entre os pensadores contemporâneos, em face da total impossibilidade de sua interação com o ambiente processualista constitucional. Tanto que Silva chega até a admitir que essa tese, embora ressaltando necessidade de um estudo mais aprofundado ao seu derredor, causa repugnância ao sentimento dos que estão comprometidos com o processo justo.


O tema Relatividade da Coisa Julgada merece tratamento aprofundado, que o espaço desta exposição não comporta, ou seja:


“Pode-se dizer que a coisa julgada é relativa na medida em que pode ser desfeita por ação rescisória nos casos previstos em lei. Mas a questão que tem sido posta não é essa, mas a questão do conflito que pode haver entre a segurança jurídica que a coisa julgada confere e o valor da justiça. Então, pergunta-se se a coisa julgada deve prevalecer, mesmo quando ela acoberta uma decisão profundamente injusta. Certamente que repugna ao sentimento jurídico ver a justiça suplantada pela segurança”[82].


Em outra passagem, Silva destaca, como proeminente, o valor justo: “As idéias de segurança, ordem e certeza formam os valores do direito positivo. Mas é o valor do justo que deve merecer a primazia, porque o direito, especialmente o direito constitucional, há de ser o meio de sua realização”[83]. A ordem e a certeza sempre serão valores instrumentais da efetivação da justiça na sua feição social. Sem essa idéia de justiça a segurança, a ordem e a certeza podem derivar para o arbítrio. “Onde a justiça reina, a convivência democrática estará salvaguardada” [84].


A segurança jurídica não se revela apenas pelo seu ângulo conceitual nem pode ser apreendida dentro de um contexto estritamente legal, pois ela transcende o ordenamento jurídico, na medida em que outros ingredientes concorrem para sua conformação. A própria realização do direito é assimilada como elemento fundante das necessidades humanas, por isso que sua estrutura formal exige o concurso de elementos fundamentais. Assim sendo, além da eficácia que perpassa todo o seu conteúdo, depende da certeza de cognoscibilidade e, sobretudo, de previsibilidade e do suporte jurídico como ponto determinante da certeza de validade dos seus efeitos no universo a que se circunscreve.


Têm-se atribuído à coisa julgada uma função de pacificação social, seu fundamento tem conotação de natureza política, visto que busca harmonizar certas situações jurídicas. Decorrente disso, sua imutabilidade diz respeito a uma necessidade circunstancial, não necessariamente de caráter legal.


A prescrição segundo a qual a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada é matéria no plano do Direito Constitucional. Nesse caso, a coisa julgada vive e se agita no ângulo do direito processual. O enunciado, portanto, a vincula pelo aspecto estritamente de natureza temporal, impedindo sua retroação no âmbito legislativo.


Outro equívoco é pensar que a segurança jurídica pode ser alcançada sem que a sentença seja manifestamente justa. É absurda a idéia segundo a qual a revisão da coisa julgada possa implicar insegurança geral.


A segurança jurídica não decorre do ato do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário. Ao contrário, têm-se observado, com muita freqüência, que o processo decisório opera, muitas vezes, em detrimento dos interesses fundamentais da sociedade, pelo casuísmo e fraude que determinam sua formulação no campo da objetividade jurídica ou administrativa. Fato que induz ao sentimento de que essa produção estatal sempre há de ser olhada de modo crítico e com certa reserva.


Nesse caso, a segurança jurídica, como de resto determinadas regras processuais, surgem como elementos de oposição à plena realização do fenômeno jurídico. São tomadas em si mesmas, como um valor enclausurado no próprio corpo que lhe dá consistência, transformando-se num instrumento de imposição ao sacrificar o direito em sua homenagem. Em razão disso, usa-se a segurança como pretexto para negar o direito do cidadão, escamoteado por sentenças injustas, fraudulentas e inconstitucionais.


Se for certo afirmar que a decisão judicial abarca os fatos passados – exceção das relações jurídicas continuativas –, não menos verdadeira é a constatação de que segurança jurídica insere-se no contexto da irretroatividade, supondo-se que ela decorra de uma exigência legal. Por conseguinte, o que assegura a Constituição é que a lei não prejudicará a coisa julgada. Essa, entretanto, poderá ser objetivo de desconstituição através de outra decisão judicial, o que não afeta o comando constitucional referido.


“A segurança jurídica pode ser tomada por vários ângulos no tocante à sua formulação conceitual. Entretanto, a noção que basta a este estudo vincula-se aos valores fundamentais que conformam o Estado. Neste aspecto, sua função torna-se primordial, na medida em que busca estabelecer harmonia entre a sociedade e o Estado, através de vínculo de legitimidade política”[85].


Como se denota, a seguridade desponta como própria razão de ser do direito, tendo presente que este desempenha uma função de garantia daquela, a fim de instaurar uma relação de confiança entre os sujeitos da relação jurídica. Realiza-se nesse plano, quando se afirma como uma ordem certa, eficaz, identificando-se com a previsibilidade da norma jurídica (administrativa, legal, judicial).


Supondo-se que a segurança jurídica configura, no plano axiológico, um valor alto do sistema jurídico, não menos verdade é que ela não pode ser utilizada como uma garantia da insegurança.


Os valores morais, éticos, sociais são tão edificantes na construção do direito justo que sem eles a sociedade seria levada ao caos. Então, esta colaboração de outros instrumentos é válida na busca incessante da eficácia das regras de direito, pois o sistema carece dessa sinergia, como adverte Ramírez:


“A insegurança jurídica não pode sobrepor-se ao princípio da justiça, em detrimento dos princípios da eqüidade e da moralidade devido ao seu caráter de arbitrariedade como elemento de negação do direito, guardando, destarte, identidade com o abuso de poder. Desse modo, a insegurança não reside numa frustração de confiança no direito”[86].


Também não escapa dessa ótica, quanto às decisões judiciais, a percepção crítica de Bermudes, que entende que relativamente às decisões judiciais cuja subsistência é repugnante, existe a certeza de que elas não podem prevalecer de nenhum modo. Seria contra-senso pretender-lhe a eficácia, em nome da segurança jurídica, quando elas são causa de insegurança jurídica pelas incertezas, pela incredulidade, pelos temores que infundem. Produzem efeito contrário à sua finalidade institucional. Não se pode admitir o cumprimento destes atos, nem mesmo depois de preclusos todos os meios legais para a sua impugnação[87].


Quanto ao modus operandi do Poder Judiciário Bermudes demonstra sua preocupação:


“Sem dúvida, devem-se aperfeiçoar os meios hábeis a prevenir as sentenças aberrantes. Um deles será aumentar a qualidade da jurisdição, porque, como mostra a experiência, o fator determinante da prestação jurisdicional escandalosa é a precariedade em todos os níveis, materiais, humanos, morais, de exercício da função estatal de fazer justiça”[88].


Importante frisar que o direito não se confunde com a coisa julgada, pois, na observação de Rocha[89] ela configura apenas uma garantia do direito e este não persegue a injustiça segura. Fica, portanto, sem sentido a idéia de uma coisa julgada petrificada, porque nem mesmo a Constituição é intocável.


E assim a referida constitucionalista entende que o Direito não busca com a coisa julgada a segurança jurídica como direito, mas como garantia de direitos. E o Direito busca a justiça segura, não a injustiça segura. Não se pode buscar fazer da coisa julgada ato pétreo ou intocável do Estado, intangível pelo próprio Estado, ainda quando sobrevenham demonstrações de seu erro ou tangibilidade necessária por meios próprios. Se nem ao menos a Constituição é intocável, admitindo-se a sua reforma quando se faça necessário e mais justo e legítimo, o que seria de um Estado no qual a força das coisas mostradas e demonstradas parecessem intocáveis por ter um juiz decidido de forma definitiva[90].


Há quem negue, inclusive, a segurança jurídica como um valor a ser preservado pelo sistema jurídico, ao encará-la como um suposto mito. Tal posição radical é sustentada por Frank[91], conforme comentário tecido a esse respeito por Ramírez, que põe em destaque algumas linhas centrais da tese desenvolvida no livro Law and the Modern Mínd. Para Frank[92], a decisão jurisdicional é que importa, posto que o direito não se contém no texto legislativo. De sorte que a segurança jurídica não decorre pura e simplesmente do ordenamento jurídico positivo.


4. MEIOS DE DESCONSTITUIÇÃO DA COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL


Relatadas as premissas pertinentes à coisa julgada, verifica-se que o instituto se apresenta como um dogma jurídico, sendo intransponível, evitando que o pronunciamento judicial que a conduz fosse passível de desconstituição por meio de recursos ou de ações judiciais[93].


Este entendimento vem sofrendo mitigações, flexibilizações, sendo espancado em diversas situações, as quais demonstram que o instituto da coisa julgada pode acobertar injustiças processuais e/ou ilegalidade. Nesse sentido, indaga-se: o que reveste de maior relevância jurídica? A segurança própria de uma sentença judicial intocada ou a eliminação de uma mácula também gerada por essa mesma decisão?


Há entendimentos doutrinários que se revelam convincentes à relativização da coisa julgada inconstitucional, senão veja-se:


Para Nascimento[94], nula é a sentença que não se adéqua ao princípio da constitucionalidade, dado que as normas respeitantes à coisa julgada são de natureza infraconstitucional, o que não se pode admitir que sobreponha às normas constitucionais.


Defende o autor que uma vez transcorrido o prazo decadencial da ação rescisória “deve-se valer da ação declaratória de nulidade tendo presente que ela [a sentença] não perfaz a relação processual, em face de grave vício que a contaminou inviabilizando, assim, seu trânsito em julgado”.[95]


Dinamarco[96] reconhece que “o valor da segurança das relações jurídicas não é absoluto no sistema, nem o é, portanto a garantia da coisa julgada, porque ambos devem conviver com outro valor de primeiríssima grandeza, que é o da justiça das decisões judiciais, constitucionalmente prometido mediante a garantia do acesso à justiça”. Com sua inteligência privilegiada, externa que “os princípios existem para servir à justiça e ao homem, não para serem servidos como fetiches da ordem processual”.


Delgado[97] ressalta que a “segurança jurídica deve imperar quando o ato que a gerou não esteja contaminado por desvios graves que afrontam o ideal de justiça”.


Para Tereza Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina


“a relativização da coisa julgada se faz necessária para evitar a estabilização de situações indesejáveis, imposta por decisões definitivas do judiciário ao caso concreto”. Dão dois caminhos para se relativizar a coisa julgada. O primeiro consiste em reconhecer situações que a coisa julgada não se teria nem mesmo formado, ou seja, seria inexistente porque emanada de um vício de origem. Exemplos seriam as sentenças juridicamente inexistentes, pois prolatadas por uma pessoa que não fosse magistrado. O remédio processual cabível seria a ação declaratória de inexistência. O segundo consiste em se dar uma nova interpretação ao inciso V do art. 485 do CPC (violar literal disposição de lei), alcançando-se os princípios constitucionais, pois “uma violação a um princípio é muito mais nociva e prejudicial ao direito, porque potencialmente mais danosa do que uma ofensa à letra de um dispositivo legal”[98].


Por sua vez, Brandão conclui ser “possível haver a relativização da coisa julgada material quando ela macular a própria norma constitucional.” Oportuno citar os seguintes critérios para a relativização da coisa julgada inconstitucional, defendidos pelo autor:


Caso 1: A sentença que infringiu diretamente uma norma ou princípios inseridos na própria Constituição ou que deixou de aplica-los. Essa sentença nunca pode ser convalidada.


Caso 2: A sentença que se baseou em determinada norma, que foi supervenientemente declarada inconstitucional, com efeitos ex tunc pelo Supremo Tribunal Federal através do controle concentrado de constitucionalidade, ou pelo controle difuso de constitucionalidade, tendo a norma sido suspensa pelo Senado Federal. Nesses casos, afasta-se a aplicação da Súmula 343 do STF.


Caso 3: O título executivo judicial que foi fundamentado em uma determinada lei, a qual foi supervenientemente declarada inconstitucional pelo STF, pode ser considerado inexeqüível com fundamento no art. 741, parágrafo único, do CPC.


Os remédios processuais para viabilizar estas situações são os seguintes:


– Sentenças com nulidades ipso iuri ou inexistentes:


a) Ação rescisória até o prazo de 02 (dois) anos do trânsito em julgado da decisão;


b) Ação declaratória de nulidade / inexistência da sentença, sem prazo para interposição.


Caso 1: Ação rescisória até o prazo de 02 (dois) anos do trânsito em julgado da decisão, ou ação declaratória de inconstitucionalidade da sentença, sem prazo para interposição.


Caso 2: Só cabe ação rescisória, afastando a Súmula 343 do STF.


Caso 3: São cabíveis quatro tipos de remédios processuais: ação rescisória (artigo 485, V, do CPC), os embargos à execução (artigo 741, § único, do CPC), a exceção de pré-executividade e a ação declaratória de inexigibilidade de título executivo judicial.”[99]


Como se depreende intuitivamente, a proteção a coisa julgada é a materialização, sob a forma de uma regra explícita, do princípio da segurança jurídica, em cujo âmbito se resguardam a estabilidade das relações jurídicas, a previsibilidade das condutas e a certeza jurídica que se estabelece acerca de situações anteriormente controvertidas[100]. Daí por que, no Brasil, a coisa julgada,deixou de ser apenas um instituto de direito processual para adquirir status constitucional.


As advertências à utilização da tese da relativização da coisa julgada aumentam quando se observa que a coisa julgada inconstitucional, antes de se sedimentar, passou pela análise e julgamento do Poder Judiciário, e muitas vezes por todas as instâncias, desde a ordinária até a extraordinária, respeitando o devido processo legal, sendo oportunizado às parte o direito à ampla defesa da tese que buscava defender em Juízo, utilizando-se ainda de todos os recursos processuais previstos constitucionalmente e na legislação infraconstitucional, não sendo o bem que era objeto de decisão judicial sido declarado inconstitucional nesse momento, e porque essa foi a manifestação última do Poder Judiciário[101].


Agora, ainda que se busque tutela jurisdicional para desconstituir a coisa julgada, devem ser observados os meios previstos na legislação processual para tanto, empedindo que em qualquer hipótese se permita a desconstituição de uma coisa julgada através de um processo sumário[102].


A doutrina tem debatido a possibilidade de relativização da coisa julgada diante de injustiças flagrantes e teratológicas. Validar uma sentença abusiva e mesmo inexistente como pronunciamento judicial seria medida odiosa, que não pode ficar presa ao fato de ter sido ultrapassado o prazo para a propositura da ação rescisória[103].


Segundo França Junior, “a doutrina tem apontado – em rol disjuntivo – os seguintes meios de controle de constitucionalidade da coisa julgada:”


a) ação rescisória, se ainda presente o prazo de 2 anos a que alude o art. 495 do CPC;


b) ação rescisória, ainda que superado o referido prazo (Humberto Theodoro Júnior e Juliana Cordeiro de Faria);


c) ação autônoma declaratória desconstitutiva de coisa julgada inconstitucional;


d) embargos à execução da sentença que contém o citado vício da inconstitucionalidade.[104]


4.1 AÇÃO RESCISÓRIA


Quanto à via a ser adotada para obter o desfazimento da coisa julgada, a doutrina processualista tem sido surpreendentemente liberal: admite a ação rescisória, sem sujeição ao prazo decadencial de dois anos, sob o fundamento de que a coisa julgada inconstitucional é nula, e, como tal, não se subordina a prazos decadenciais ou prescricionais[105].


No que diz respeito à ação rescisória, se ainda presente o prazo de 2 anos, cabe ressaltar que se encontra pacifico o entendimento na jurisprudência no sentido de que quando o artigo 485, inciso V do CPC assevera que cabe a rescisão quando a sentença rescindenda “violar literal disposição de lei” está-se usando o termo “lei” em sentido que abarca a Constituição Federal, sendo absolutamente correta esta tese, pois o objetivo da norma é impedir a consolidação de sentença contrária à Lei, não teria o CPC interesse em preservar uma sentença contrária à Lei Maior.


Assim como a revisão criminal, a ação rescisória é o processo previsto constitucionalmente para a desconstituição da coisa julgada que resguarda este direito fundamental do cidadão.


Prevista nos artigos 485 e seguintes do CPC, a ação rescisória é o equivalente cível da revisão criminal. Conceitua a doutrina a ação rescisória como ação impugna­tiva autônoma constitutiva negativa (ou desconstitutiva), vez que se destina a rescindir coisa julgada cível. Como exemplificação, cita-se a ação rescisória não é recurso porque trata-se de uma ação autônoma, que não só tem lugar noutra relação processual, subse­qüente àquela onde fora proferida a sentença a ser atacada, como pressupõe o encerramento definitivo dessa relação processual. A ação rescisória (artigo 485 do CPC), em verdade, é uma forma de ata­que a uma sentença já transitada em julgado, daí a razão fundamental de não se poder considerá-la um recurso[106].


A ação rescisória visa a res­cindir, a romper a sentença como ato jurídico viciado. É a ação pela qual se pede a declaração de nulidade da sentença.


O termo “nulidade”, usualmente empregado para caracterizar a sentença rescindível, tem um significado diferente daquele que se atribui aos vícios dos demais atos jurídicos. O que é nulo, como se sabe, não produz nenhum efeito e não reclama desconstituição judicial.


Salvo o caso de sentença inexistente, a sentença rescindível, produz os efeitos da res iudicata e apresenta-se exeqüível enquanto não revogada pelo remédio próprio da ação rescisória. Em outras palavras, enquanto não rescindido, o julgado prevalece.


Com exclusão das sentenças inexistentes, após o trânsito em julgado, há poucos casos em que a senten­ça apresenta-se eivada de nuli­dade absoluta. Mas, em tal situação, em decorrência da natureza do vício do processo e, em conseqüência, da sentença, não terá de valer-se, obrigatoriamente, da resci­sória, para furtar-se aos efeitos da res iudicata. Nos próprios embargos à execução, conseguirá a declaração de nulidade de todo o processo, inclusive da sentença.


Por afastar o inconveniente de identificar a sentença rescindí­vel com o ato nulo e por abranger a possibilidade de cumulação do judicium rescindens com o judicium rescissorium, agora expressa­mente adotada pelo Código, deve-se reconhecer como completa a definição de Barbosa Moreira, para quem: “Chama-se rescisória à ação por meio da qual se pede a desconstituição de sentença transita em julgado, com eventual rejul­gamento, a seguir, da matéria nela julgada”[107].


A decisão de recorrer ao instituto da coisa julgada parte da opção feita pelo legislador no sentido de fazer preponderar a segurança das relações sociais sobre a “justiça material”.


Com efeito, há situações excepcionalíssimas em que tornar indiscutível uma decisão judicial, por meio da coisa julga­da, representa injustiça tão grave, e solução tão ofensiva aos prin­cípios que pautam o ordenamento jurídico, que é necessário pre­ver mecanismos de revisão da decisão transitada em julgado. De fato, embora normalmente a coisa julgada sane todo e qualquer vício do processo em que operou, este defeito (que permite a utili­zação da ação rescisória) é tão grave que fazer vistas grossas seria altamente prejudicial à legitimidade do ordenamento jurídico e da prestação jurisdicional.


Nota-se, cf. Humberto Theodoro Júnior[108], como na ação de revisão cri­minal: a presença de dois juízos: o judicium rescindens e o judicium res­cissorium. Esta é a norma prevista no artigo 488 do CPC:


A petição inicial será elaborada com observância dos requisi­tos essenciais do artigo 282, devendo o autor:


I – cumular ao pedido de rescisão, se for o caso, o de novo jul­gamento da causa;


II – depositar a importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a título de multa, caso a ação seja, por unanimida­de de votos, declarada inadmissível, ou improcedente.


Existe, pois, na ação rescisória, a necessidade de cumulação da pretensão de rescisão da sentença (desconstitutiva ou constitutiva negativa) e a de nova solução para o mérito da causa, se for o caso.


Ressalta Humberto Theodoro Júnior que,


“no judicium rescindens, é constitutiva a decisão que acolhe pedido, pois cria situação jurídica nova, ao desfazer a autoridades da coisa julgada. A que o julga improcedente é de natureza declaratória (negativa), pois se limita a declarar a inexistência de motivo legal para desconstituir a sentença impugnada. No judicium rescisorium, o pronunciamento do tribunal substitui a sentença primitiva e será, naturalmente, a mesma natureza dela, se coincidir com o seu teor. Mas poderá ser de sentido contrário, hipótese em que as respectivas naturezas são diversas em que a decisão do tribunal, destarte, poderá assumir todas as feições admissíveis, quais sejam: declaratória, constitutiva ou condenatória, conforme a prestação jurisdicional apresentada às partes”[109]


Seguindo ao ponto crítico da abordagem, verifica-se que o artigo 495 do CPC narra que “o direito de propor ação rescisória se extin­gue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão”.


O prazo é decadencial e não prescricional[110], conforme se depreende da emenda que o Congresso introduziu no projeto do Ministro Buzaid, para substituir a expressão “prescreve” por “extin­gue-se” no texto do art. 495.


“Não se dá, em face do caráter decadencial, a possibilidade de suspensão ou interrupção do prazo extintivo do direito de propor rescisória, ao contrário do que ocorre com a prescrição. Como, no entanto, os prazos processuais não vencem em dias não úteis, pre­valece o entendimento na jurisprudência de que “concluído o prazo para ingresso da ação rescisória durante as férias forenses, fica o mesmo prorrogado até o primeiro dia útil seguinte ao térmi­no daquele período”[111]


Interessante assinalar, nesse tópico, que não existe uma discus­são acentuada, tanto doutrinária quanto jurisprudencial, a casos de inaplicabilidade deste artigo. Considera-se que o prazo de dois anos é fatal para todas as situações jurídicas, não existindo hipóteses, por mais especiais que fossem, que estariam resguardadas da aplicação da norma processual infraconstitucional.


Vale dizer que, no direito pátrio, haveria apenas uma exce­ção à desconstituição da coisa julgada sem a previsão de prazo deca­dencial: a revisão criminal pro reo.


Considerando a totalidade de nosso ordenamento jurídico e os diferentes direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição, entende-se no mínimo como inquietante a solução de que só, e somente só, única e exclusivamente, poderia haver um “erro judicial” relevante, que permitisse uma mitigação da garantia constitucional da coisa julgada, nos casos de ofensa ao status liberta tis (dignitatis) oriun­do de ação penal.


Segundo Porto, para explicitar a similitude das duas ações impugnativas autônomas, em tempos de reformas processuais, parece oportuna a revisão das hipóteses de cabimento de ação rescisória e, quiçá, até mesmo, o exame da vigência do prazo decadencial existente, observando, por derradeiro, que no plano criminal a revisão – irmã siamesa da rescisória – não goza desta limitação, em face da natu­reza relevante do direito posto em causa e, ao que consta, tal cir­cunstância não gera uma crise social intolerável[112].


Ora, existem diversos direitos e garantias fundamentais previstas constitucionalmente que se encontram no mesmo patamar da garantia da coisa julgada ou do resguardo ao status libertatis do cidadão. Assim, acredita-se que deve existir algu­ma outra hipótese, ou algumas, que permitam a desconstituição da coisa julgada, ainda que ultrapassado o prazo da ação rescisória.


4.2 AÇÃO DECLARATÓRIA


Outro instrumento conveniente para desconstituir a coisa julgada inconstitucional é a ação declaratória de nulidade. Trata-se de ação autônoma, processada pelo rito ordinário, a ser ajuizada em primeiro grau de jurisdição, com a finalidade de atacar o caráter imutável da decisão judiciária e declarar a ineficácia do decisum, promovendo sua desconstituição e restaurando o direito lesado.


Tem suas origens na actio querela nullitatis. A ação declaratória de nulidade é oriunda do direito romano, era usada na Idade Média com vistas a refutar a sentença contaminada por vício insanável, baseada na idéia de que alguns vícios são tão graves que nem o esgotamento dos recursos ou o transcurso do tempo seriam aptos a convalidá-lo.


A jurisprudência do STJ é no sentido de possibilitar a entrada em juízo por meio da querela nullitatis, com o objetivo de declarar a nulidade do processo no qual não houve citação do réu ou tendo esta ocorrido, restou manifestamente nula.


“A tese da querela nullitatis persiste no direito positivo brasileiro, o que implica em dizer que a nulidade da sentença pode ser declarada em ação declaratória de nulidade, eis que, sem a citação, o processo, vale falar, a relação jurídica processual, não se constitui, nem validamente se desenvolve. Nem por outro lado, a sentença transita em julgado, podendo, a qualquer tempo, ser declarada nula, em ação com esse objetivo, ou em embargos à execução, se for o caso”.[113]


Em outro julgado é esclarecedor o entendimento do STJ no sentido de admitir a utilização da ação declaratória de nulidade para desconstituir a decisão judicial:


1. Os defeitos processuais das decisões judiciais são corrigidos por via da ação rescisória, mas os defeitos da base fática que retiram da sentença a sua sedimentação, tornando-a nula de pleno direito ou inexistente podem ser corrigidos, como os demais atos jurídicos, pela relatividade da coisa julgada nula ou inexistente.


2. Se a sentença transitada em julgado, sofre ataque em sua base fática por parte do Estado, que se sente prejudicado com a coisa julgada, pode o Ministério Público, em favor do interesse público, buscar afastar os efeitos da coisa julgada.


3. O ataque à coisa julgada nula fez-se incidenter tantun, por via de execução ou por ação de nulidade. Mas só as partes no processo é que têm legitimidade para fazê-lo[114].


4.3 EMBARGOS A EXECUÇÃO


Em sede de embargos, tem-se admitido a execução da sentença inquinada de inconstitucionalidade. Segundo França Junior, os embargos à execução da sentença, ganhou “força no Direito Positivo a partir da edição da Medida Provisória n.º 2.180-35/2001, em vigor em face da cláusula de convalidação prevista no art. 2.º da Emenda Constitucional n.º 32/2001, cujo ato normativo prevê a seguinte regra no âmbito do CPC:”[115]


Art. 741. Na execução fundada em título judicial, os embargos só poderão versar sobre: […]


II – inexigibilidade do título; […]


Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal.”


Trata-se, como se vê, de uma nova causa de inexigibilidade do título judicial, consistente na declaração de inconstitucionalidade, pelo Supremo Tribunal Federal, da lei ou ato normativo que lhe serviu de fundamento, ou mesmo em razão de aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal.


Diante da regra supracitada,


“não há dúvida de que a parte executada em uma ação que tenha por objeto a aplicação do comando de uma Lei já declarada inconstitucional ou “em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal” pode perfeitamente se valer dos embargos à execução para desconstituir a sentença (“título judicial”) que inconstitucionalmente encampou a tese contrária ao entendimento do Pretório Excelso”.[116]


A Constituição, como Lei maior, está acima de todas as leis, portanto, qualquer decisão judicial deve a ela adequar-se. Assim, os atos que a contrariarem são nulos de pleno direito, não produzindo efeitos.


CONCLUSÃO


A nossa Magna Carta erigiu a coisa julgada ao status de dogma constitucional mas, essa mesma constituição não concede poderes ilimitados à coisa julgada, pois faculta ao cidadão o amplo acesso ao judiciário, e a lei prevê casos em que, apesar de existir uma sentença transitada em julgado, a mesma, viciada de alguma forma, pode ser passiva de uma ação que a inutilize.


Da mesma forma que todo o nosso ordenamento jurídico protege a coisa julgada, visando dar segurança às decisões do judiciário, também não deve ser permitido que essa mesma proteção sirva de instrumento para que o julgador transforme atos ilegais (nulos) em legais, por estarem cobertos, neste momento, com o manto da chamada coisa julgada.


Os atos nulos, assim com os instrumentos que os combatem e as sentenças que, apesar de transitada em julgado, são viciadas de alguma forma, visando rescindi-las, são previstos tanto na legislação formal como na material e, nesse momento, apresentamos uma sistematização de cada assunto, assim como um pouco dos entendimentos doutrinários sobre o tema.


Esta pesquisa teve como objetivo a reflexão sobre a possibilidade da relativização da coisa julgada inconstitucional. É imprescindível uma posição da doutrina e, especialmente, da jurisprudência, sobre o instituto da coisa julgada, quando violadora da Constituição, em face da perplexidade que provoca a diversidade de julgados contraditórios, especialmente quando há, entre eles, um que afronta a Constituição.


Sabe-se que o objetivo do direito e da segurança jurídica é sempre a justiça e que antes de ser uma finalidade, é uma condição sine qua non, uma característica do próprio do direito em si.


Apontamos os instrumentos existentes em nosso sistema processual capazes de atacar a res judicada inconstitucional. Porém, da forma como a jurisprudência vem tratando a ação rescisória, tal remédio jurídico não é suficiente para corrigir uma decisão tida como inconstitucional, depois do trânsito em julgado.


O sistema jurídico brasileiro está embasado em diversos princípios que dão sustentação ao ordenamento, como os da hierarquia das normas, os da legalidade, isonomia e separação de Poderes, os quais deverão ser observados pelo julgador ao aplicar a norma.


A sentença que afronta um princípio constitucional deve ser tida como nula, por sua incoerência com o ordenamento jurídico vigente.


Há de ser entendida como de perplexidade, a situação de um jurisdicionado que vai ao Judiciário e se depara com uma decisão contrária à Constituição e não tem como remediar esse erro, o que leva o órgão estatal a sofrer pesadas críticas e ser, logicamente, incompreendido em sua real função.


Como forma de se corrigir, o quanto antes, mesmo sem necessidade de reforma da lei ou da Constituição, essa suposta omissão instrumental, seria a jurisprudência aceitar a ação rescisória com fundamento da inconstitucionalidade do julgado e sem prazo de decadência, como forma mais prática e eficaz da ação declaratória desconstitutiva de coisa julgada inconstitucional, a qual se compatibiliza e harmoniza com o ordenamento jurídico brasileiro.


Conforme proclama Alexandre Freitas Câmara, (2004, p.28), “é preciso, pois, relativizar a coisa julgada material, como forma de se manifestar crença na possibilidade de se criar um mundo mais justo”.


 


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Notas:

[1] Trabalho de conclusão de curso apresentado à Coordenação de Direito do Centro Universitário do Distrito Federal – UDF, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito Orientador: Fábio Francisco Esteves.

[2] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito processual Civil. 1° vol., 3ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, pag. 336-337.

[3] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. MENEGALE, Guimarães (Trad.). 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1969, v.1, p. 374.

[4] NEVES, Celso, Coisa julgada civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1971, p.53.

[5] LIEBMAN, Enrico Tulio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. BUZAID, Alfredo (trad.); AIRES, Benvindo (trad.). Rio de Janeiro; Forense, de 4ª ed., 2006, p. 54.

[6] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 22 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. V.1, p. 525.

[7] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 1° vol., 16ª ed., Lumem Júris, 2007, pág. 488.

[8]PRADO, Rodrigo Murad do. Coisa Julgada Inconstitucional. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7233. Acesso em 28 de março de 2009.

[9] Ibidem

[10] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 22 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. V.1, p. 525.

[11] GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 11 Ed. São Paulo: Saraiva, 1996, V. 2, p 265.

[12] Ibidem

[13] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 22 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. V.1, p. 168.

[14] LIEBMAN, E. T. apud THEODORO JÚNIOR, A Ação Rescisória e o Problema da Superveniência do Julgamento da Questão Constitucional. In Revista de Processo – 79. p. 167..

[15] Vocabulário Enciclopédico de Tecnologia Jurídica e Brocardos Latinos. apud VITAGLIANO, J. A. Coisa julgada e ação anulatória. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4206. Acesso 28 fevereiro de 2009.

[16] VITAGLIANO, José Arnaldo. Coisa Julgada e ação anulatória. Disponível em: htt:jus2.uol.com.br /doutrina/texto.asp?id=4206. Acesso em 28 fevereiro de 2009.

[17] CAMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007., v.1, p.488.

[18] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 5 ed. rev. E atual. São Paulo: Malheiros, 2001. V. 3, p. 293-327, p. 295.

[19] MARQUES. J. F. Instituições de direito processual civil. apud VITAGLIANO, J. A., op. cit

[20] VITAGLIANO, J. A. Coisa Julgada e ação anulatória. Disponível em: htt:jus2.uol.com.br /doutrina/texto.asp?id=4206. Acesso em 28 fevereiro de 2009.

[21] VITAGLIANO, J. A. Coisa Julgada e ação anulatória. Disponível em: htt:jus2.uol.com.br /doutrina/texto.asp?id=4206. Acesso em 28 de fevereiro de 2009.

[22] Ibidem

[23] Idem

[24] CAMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.v.1, p.489.

[25] VITAGLIANO, J. A., op. cit.

[26] GONÇALVES, Marcos Vinícius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil, São Paulo: Saraiva, 2005. v. 2, p. 19-32, p. 20.

[27] Vocabulário Enciclopédico de Tecnologia Jurídica e Brocardos Latinos. apud VITAGLIANO, J. A. Op cit

[28] RIBEIRO, P. B. FERREIRA, P. M. C. R. apud VITAGLIANO, J. A., op. cit.

[29] SANTOS, M. A. apud VITAGLIANO, J. A., op. cit

[30] GRECO FILHO, V. apud VITAGLIANO, op. cit.

[31] CAMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.v.1, p.491.

[32] VITAGLIANO, J. A. Coisa Julgada e ação anulatória. Disponível em: htt:jus2.uol.com.br /doutrina/texto.asp?id=4206. Acesso em 29 de fevereiro de 2009.

[33] PRADO, Rodrigo Murad do. Coisa Julgada Inconstitucional. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7233. Acesso em 22 março 2009.

[34] Ibidem

[35] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, Rio de janeiro, Forence, 1990,v. 1, p. 578.

[36] CAMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.v.1, p.497.

[37] PELISSARI, Marcia. Estudo Dirigido Coisa Julgada. Disponível em: http://recantodasletras.uol.com.br/textosjuridicos/157749. Acesso em 22 março 2009

[38] CAMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.v.1, p.501.

[39] Art. 5º, LV da Constituição Federal: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

[40] PRADO, Rodrigo Murad do, op. cit.

[41] DlNAMARCO, Cândido Rangel de. apud PRADO, Rodrigo Murad do, op. cit.

[42] PRADO, Rodrigo Murad do, op. cit.

[43] LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Contribuição à Teoria da Coisa Julgada. RT. São Paulo. 1.997, p. 38.

[44] PRADO, Rodrigo Murad do, op. cit.

[45] PRADO, Rodrigo Murad do, op. cit.

[46] AZAMBUJA, Carmen. Rumo a uma nova coisa julgada. Livraria do Advogado. Porto Alegre. 1.994, p. 60.

[47] LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Contribuição à Teoria da Coisa Julgada. RT. São Paulo. 1997, p. 133.

[48] Ibidem

[49] BASTOS, Celso R. Curso de direito constitucional. 17ª ed. São Paulo , 1996, p.405.

[50] CAETANO, Marcelo. Direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 401.

[51] NEVES, Marcelo. Teoria da inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, p.73.

[52] NEVES, Marcelo. Teoria da inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, p.74.

[53] VITAGLIANO, José Arnaldo. Coisa julgada e ação anulatória. 2ª edição. Curitiba: Juruá, 2008, p. 73.

[54] VITAGLIANO, José Arnaldo. Coisa julgada e ação anulatória. 2ª edição. Curitiba: Juruá, 2008, p. 80.

[55] TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 406.

[56] ROCHA, Cármen Lúcia Antunes (Org.). Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. Estudos em homenagem a José Paulo Sepúlveda Pertence. 2. ed. rev. e ampl., Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 165.

[57] Idem.

[58] Ibidem.

[59] TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 406-414

[60] DELGADO, José Augusto. Efeitos da coisa julgada e os princípios constitucionais. (in A Coisa Julgada Inconstitucional – coord. NASCIMENTO, Carlos Valder). 5ª ed. Rio de Janeiro: América Jurídica. 2005. p.101-103

[61] Apud NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento (org.). Coisa Julgada Inconstitucional, 4. ed., Rio de Janeiro : América Jurídica, 2003

[62] NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento, op. cit.

[63] Apud NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento (org.). Coisa Julgada Inconstitucional, 4. ed., Rio de Janeiro : Editora América Jurídica, 2003

[64] Ibidem

[65] Idem

[66] Idem

[67] NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento (org.). Coisa Julgada Inconstitucional, 4. ed., Rio de Janeiro : América Jurídica, 2003

[68] Ibidem

[69] Ibidem

[70] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Apud NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento (org.). Coisa Julgada Inconstitucional, 4. ed., Rio de Janeiro : Editora América Jurídica, 2003

[71] NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento (org.), op. Cit.

[72] ASSIS, Araken, apud NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento, op. cit.

[73] NASCIMENTO, Carlos Valder. Por uma teoria da coisa julgada inconstitucional. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2005

[74] DELGADO, José Augusto. Efeitos da Coisa Julgada e os Princípios Constitucionais. Palestra proferida em 20-12-2000, no 1º Simpósio do Direito Público da AGU – 5ª Região. Fortaleza.

[75] NASCIMENTO, Carlos Valder. Por uma teoria da coisa julgada inconstitucional. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2005

[76]OLIVEIRA, Daniel Gomes de. Coisa julgada inconstitucional. 2003. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5087. Acesso em: 15 abr. 2008.

[77] SILVA, Juary C. Responsabilidade Civil do Estado por Atos Jurisdicionais. Revista Direito Público. São Paulo: nº 20, abr./jun. – 1972, p. 170.

[78] NASCIMENTO, Carlos Valder. Por uma teoria da coisa julgada inconstitucional. Rio de Janeiro: Lúmen, 2005.

[79] Ibidem

[80] ALVIM, José Eduardo Carreira. Elementos de Teoria Geral do Processo. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 285.

[81] NASCIMENTO, Carlos Valder, op. Cit.

[82] SILVA, José Afonso. Constituição e Segurança. In: ROCHA, Cármem Lúcia Antunes (coord.). Constituição e Segurança Jurídica: Direito Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa Julgada. Ed. Fórum: Belo Horizonte, 2004, p. 22-23

[83] Ibidem, p. 29.

[84] Idem, p. 22-23

[85] RAMIRES, L. H. D. . As provas com instrumentos de efetividade no processo civil. 1ªed. São Paulo:, 2002. v. 01. p. 152.

[86] idem

[87] BERMUDES, Sérgio. Coisa Julgada Ilegal e Segurança Jurídica. ln: ROCHA, Cármem Lúcia Antunes (org.). Constituição e Segurança Jurídica: Direito Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa Julgada. Belo Horizonte: Ed. Fórum: 2004, p. 135.

[88] Ibidem

[89] ROCHA, Cármen Lúcia Antunes (org.). Constituição e Segurança Jurídica: Direito Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa Julgada. Belo Horizonte: Ed. Fórum: 2004, p. 135.

[90] Ibidem

[91] Idem

[92] Idem

[93] DINAMARCO, Cândido. Instituições de direito processual civil, v.I, nº 96, p. 249.

[94] Apud NASCIMENTO, Carlos Valder do (org.). Coisa Julgada Inconstitucional, 4. ed., Rio de Janeiro : América Jurídica, 2003

[95] Ibidem

[96] Idem

[97] idem

[98] WAMBIER, Tereza Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da coisa julgada: hipóteses de relativização. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

[99] BRANDÃO, Fabrício dos Reis. Coisa julgada. São Paulo: MP Editora, 2005.

[100] BARROSO, Luiz Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro, Ed. rev.. Atual. São Paulo, Editora Saraiva, 2009.

[101] INTERESSE PÚBLICO. Ano 5, nº 22, novembro/dezembro de 2003, Porto Alegre: Notadez, 2003, p.96.

[102] idem

[103] BARROSO, Luiz Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro, Ed. rev.. Atual. São Paulo, Editora Saraiva, 2009.

[104] FRANÇA JR, Fausto F. de. A coisa julgada inconstitucional e seu controle por meio de ADPF. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6590. Acesso em: 30 abril 2009.

[105] THEODORO JUNIOR, Humberto e FARIA, Juliana Cordeiro de. A coisa jukgada inconstitucional e os instrumentos processuais para o seu controle, in NASCIMENTO, Carlos Valter (org.), Coisa julgada inconstitucional, 2002, p. 2002;

[106] SILVA, José Afonso. Constituição e Segurança, apud ROCHA, Cármem Lúcia Antunes (coord.). Constituição e Segurança Jurídica: Direito Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa Julgada. Ed. Fórum: Belo Horizonte, 2004.

[107]Apud NASCIMENTO, Carlos Valder do (org.). Coisa Julgada Inconstitucional, 4. ed., Rio de Janeiro : América Jurídica, 2003, p. 612-613

[108] THEODORO JUNIOR, Humberto. A reforma do processo de execução e o problema da coisa julgada inconstitucional. Revista Brasileira de Estudos Políticos, n. 89, p. 63-100, jan./jun. 2004.

[109] Idem

[110] AMORIM FILHO, Agnelo, 1997; FIÚZA, César, 1999, apud THEODORO JUNIOR, Humberto, op. cit.

[111] STJ, Resp. 51.968-3/SP – 94 (THEODORO JÚNIOR, 2004, p. 633, op. Cit.).

[112] PORTO, Sérgio Gilberto, apud THEODORO JUNIOR, Humberto. A reforma do processo de execução e o problema da coisa julgada inconstitucional. Revista Brasileira de Estudos Políticos. n. 89, jan./jun. 2004.

[113] RESP 12586/SP, Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA. Data da decisão: 08/10/1991, DJ 04/11/1991, p.15684. Relator WALDEMAR ZVEITER. Disponível em: http://www.stj.gov.br/ , Acesso em: 27 maio 2009

[114]RESP 445664/AC, Órgão Julgador: Segunda Turma, Data da decisão: 15/04/2004, DJ 07/03/2005, p. 194 Relator(a) Francisco Peçanha Martins. Disponível em: http://www.stj.gov.br/ , acesso em 27 maio 2009.

[115] FRANÇA JR, Fausto F. de. A coisa julgada inconstitucional e seu controle por meio de ADPF. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6590. Acesso em: 27 maio 2009.

[116] FRANÇA JR, Fausto F. de. A coisa julgada inconstitucional e seu controle por meio de ADPF. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6590. Acesso em: 27 maio 2009.


Informações Sobre o Autor

Hudson Rocha de Oliveira

Bacharel em Direito


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