Uma breve análise crítica e atual acerca das formas alternativas de solução dos conflitos e a sua aplicabilidade no século XXI

Atualmente prepondera o entendimento de que não existe e talvez não exista num futuro ainda distante, uma sociedade sem direito. Haja vista, que a tarefa do direito é de proporcionar a paz social, ou seja, harmonizar as relações sociais intersubjetivas. O se humano é um ser por natureza social, vive em sociedade formando vários grupos com interesses distintos para a efetiva satisfação de suas necessidades.


Neste âmbito surge o que parece ser inerente à vida em sociedade: o(s) conflito(s). Como bem ensina o eminente doutrinador J. E. Carreira Alvim (2006, p. 6):


“Como os bens são limitados, ao contrário das necessidades humanas, que são ilimitadas, surge entre os homens, relativamente a determinados bens, choques de forças que caracterizam o conflito de interesses, e os conflitos são inevitáveis no meio social.”


Destarte, surgindo o conflito de interesses por obviedade nascerá à necessidade de sua eliminação da vida em sociedade que poderá se verificar por atuação de um ou de ambos os envolvidos no conflito, ou por terceiros. Neste aspecto será que somente o Estado teria o poder de por fim aos conflitos? Já que a Constituição da República no seu art. 5º, inc.XXXV, preceitua que: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.


Numa leitura apresada do referido artigo a resposta poderia ser positiva, aparentemente o Poder Judiciário teria o monopólio para a solução dos conflitos, pois tal mandamento constitucional de inafastabilidade de acesso a justiça apresenta-se como um direito fundamental, todos têm direito de julgamento por tribunal competente e imparcial. No entanto, o princípio da inafastabilidade da jurisdição não veda que as partes interessadas na solução de seus conflitos excluam da apreciação judicial suas questões, isto é, procurem uma solução através de meios alternativos. Entendemos que a melhor solução para os conflitos é através da via de negociação, no entanto, por uma questão cultural, o Judiciário cada vez mais fica congestionado.


A maioria das partes envolvidas em conflitos espera que o Estado através da jurisdição mostre quem tem razão, por ser a expressão do poder político, como bem destaca Dinarmaco ( 2004, p. 193):


“Assim a jurisdição, como expressão do poder político. Saindo da extrema abstração consistente em afirmar que ela visa à realização da justiça em cada caso e, mediante a prática reiterada, à implementação do clima social de justiça, chega o momento de com mais precisão indicar os resultados que, mediante o exercício da jurisdição, o Estado se propõe a produzir na vida em sociedade.


Por esse aspecto, a função jurisdicional e a legislação estão ligadas pela unidade do escopo fundamental de ambas: a paz social.”


Mas, não podemos olvidar que temos outros instrumentos que poderão igualmente proporcionar uma solução dos conflitos, assim, lentamente os meios alternativos vão ganhando força na pacificação social, pois o fundamental é a solução dos conflitos de maneira efetiva quer seja pelo Estado ou por meios não estatais como os meios alternativos de solução de conflitos.


A adoção de medidas alternativas parece ser a solução mais adequada para o século XXI diante do gigantesco número de pedidos de solução de conflitos que chegam ao Poder Judiciário, tornando a jurisdição estatal não célere e pior ainda, prolatando suas decisões, às vezes ou em um grande número, sem o mínimo de efetividade o que não encerra o conflito apesar de ser decisão estatal. Quando falamos em meio alternativo é no sentido de coexistência com o ordenamento jurídico e não algo desvirtuado do Estado de Direito.


Os meios alternativos apresentam as seguintes características: a) efetividade, pela maior rapidez na solução; b) desformalização dos procedimentos; c) maior celeridade; d) redução de custos; e) aplicação aos direitos disponíveis, estas características consubstanciam um maior acesso à justiça.


A proposição de meios alternativos positivados, como a criação de Juizados Especiais para solucionar de forma simplificada determinados conflitos, nasceu no século passado como idéia para descongestionar o Judiciário, houve uma desformalização do procedimento, no entanto, hoje já não mais atende o seu objetivo, pois já estão sendo marcadas audiências nos JEC para o ano de 2011, assim o meio alternativo positivo não cumpre o seu objetivo maior o de solucionar com efetividade os conflitos.


O tempo é aliado da efetividade, no sentido de que quanto mais rápido for solucionado o conflito maior será sua efetividade, não é o item fundamental mais com o atendimento a trilogia: tempo, meio alternativo, efetividade ter-se-ia a satisfação das crises.


Neste momento é oportuno destacar o pensamento do Mestre Dinamarco (2004, p. 372-73) sobre a efetividade do processo:


“Tudo quanto foi dito ao longo da obra volta-se a essa síntese muito generosa que na literatura moderna leva o nome de acesso a justiça. Falar em instrumentalidade do processo ou em sua efetividade significa, no contexto, falar dele como algo posto à disposição das pessoas com vista a fazê-las mais felizes (ou infelizes), mediante a eliminação dos conflitos que as envolvem, com decisões justas. (…).”


E somente com a desformalização dos procedimentos e que se poderá dar uma maior celeridade. Os meios alternativos de pacificação social como a conciliação, a mediação, o arbitramento e o termo de ajustamento de conduta surgem atualmente como exemplos de instrumentos para alcançar as soluções desejadas.


A conciliação é o meio alternativo mais aplicado e se traduz pela informalidade onde um terceiro tentará trazer as parte a um acordo. Tendo como objetivo primordial harmonizar e ajustar, de maneira amigável a questão controvertida, acerca de um negócio, um contrato ou uma estipulação qualquer. Pode ela se dar tanto na via judicial quanto amigavelmente em momento anterior ao ajuizamento de uma demanda judicial.


Em relação à mediação fiquemos com a preciosa lição de Warat:


“A diferença do que ocorre em um processo judicial, no qual na realidade são os advogados que intervêm e manejam o conflito, na mediação são as partes os principais atores, as donas do conflito que mantêm, em todos os momentos, o controle do mesmo, dizendo quais são as questões que estão envolvidas, assim como o modo de resolvê-las. O acordo decorrente de uma mediação satisfaz, em melhores condições, as necessidades e os desejos das partes, já que estas podem reclamar o que verdadeiramente precisam e não o que a lei lhes reconheceria. Permite o encontro de alternativas que escapam das possibilidades que a justiça ou o árbitro podem oferecer, limitados pelas disposições legais e jurisprudenciais.”


O mediador é um terceiro neutro não tem autoridade de decidir o resultado da disputa e sim conduzir a um caminho onde as partes consensualmente produzam um acordo.


Destacamos sua aplicabilidade atual por proporcionar soluções efetivas. Na mediação há também sigilo, pois não tem publicidade como ocorre no processo comum, à solução fica apenas entre as partes, desformalização do procedimento e o único gasto é com o mediador que será dividido entre as partes envolvidas.


De acordo com a doutrina de Cintra (2008, p.34), a mediação e conciliação acabam tendo o mesmo resultado, suas diferenças são mínimas:


“A mediação assemelha-se à conciliação: os interessados utilizam a intermediação de um terceiro, particular, para chegarem à pacificação de seu conflito. Distingue-se dela somente porque a conciliação busca sobretudo o acordo entre as partes, enquanto que a mediação objetiva trabalha o conflito, surgido o acordo como mera conseqüência. Trata-se mais de uma diferença de método, mas o resultado acaba sendo o mesmo.”


Apesar de existir expressa previsão legal, a arbitragem é pouco utilizada devido a tradição brasileira que super valoriza a decisão judicial em detrimento de outras formas. Alguém não investido de funções jurisdicionais seria competente para solucionar os conflitos? Diante de uma visão romanista e tradicional, não.


A arbitragem é um procedimento extrajudicial e voluntário, entre pessoas físicas e jurídicas capazes de contratar, no âmbito dos direitos patrimoniais disponíveis onde as partes litigantes elegem em compromisso arbitral, uma ou mais pessoas denominadas árbitros ou juízes arbitrais, de confiança das partes, para o exercício neutro ou imparcial do conflito de interesse, submetendo-se a decisão final dada pelo árbitro, em caráter definitivo, uma vez que não cabe recurso.


Ao árbitro cabe a função de conduzir o procedimento, porém de maneira mais rápida e com um grau menor de formalidades, onde a decisão deverá ser dada por especialista, de acordo com o conflito do caso concreto. A celeridade é uma de suas maiores vantagens, pois desafoga o Judiciário e atende ao seu escopo que é a solução do conflito.


A mediação diferencia-se da arbitragem pois nesta o árbitro decide o conflito, enquanto que na primeira, o mediador apenas tenta facilitar a negociação usando suas habilidades para que juntas as partes encontrem uma solução adequada.


O termo de ajustamento de conduta se assemelha aos meios supracitados por ser também meio de solução consensual de conflitos entre as partes, ocorrendo em momento pré-processual. No entanto, no TAC não ocorre a interveniência de um terceiro entre as partes em conflito, refere-se ele exclusivamente a direitos transindividuais, que possuem a natureza material indisponível, inadmitindo por isso transação e, ainda, os legitimados para a sua celebração não são os titulares únicos dos direitos (Lei 7.347/85).


O termo de ajustamento foi criado pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11/09/1990), que em seu artigo 113 determinou o acréscimo do § 6° ao artigo 5º, da Lei 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública).


É o instrumento utilizado pelos legitimados para a ação civil pública onde o violador dos direitos transindividuais assume o compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações de penalidades e com eficácia de título executivo extrajudicial.


Enfim, diante de um mundo globalizado onde as coisas acontecem cada vez mais rápidas, as formas alternativas de solução de conflitos figuram como a melhor maneira de ser promover a paz social, sua aplicabilidade no século XXI é a mais moderna ferramenta para promover ou tentar a solução dos conflitos, haja vista, que o método tradicional, a sentença judicial, por inúmeros motivos não tem conseguido solucionar os conflitos apresentados, pois como destaca Bobbio (2002, p.25): “o problema grave de nosso tempo, com relação aos direitos do homem, não era mais o de fundamentá-los, e sim o de protegê-los”.


Por conseguinte, temos a garantia de acesso a Justiça, mas a proteção efetiva, a garantia deste direito somente é plena se como corolário tivermos também efetividade nas decisões. E para tal mister se faz que a sociedade comece a utilizar os meios alternativos para a solução de seus conflitos e como conseqüência lógica a obtenção da paz social já que vivemos em sociedade, a não ser que se queira voltar aos tempos de Robinson Crusoé, mas lembrem-se: antes da chegada do índio Sexta-Feira.


 


Referências bibliográficas:

ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

BOBBIO, Noberto. A Era dos Direitos. 15 ed. Rio de Janeiro:Campus, 1992

CINTRA, Antonio de Araújo & GRINOVER, Ada Pellegrine & DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 12 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

WARAT, Gisela Betina.. Mediação: Uma possibilidade de transformação das relações e das pessoas. I.n: Warat. Luiz Alberto. (Org.). Em nome do acordo. A mediação no direito. Argentina: ALMED, s/d.


Informações Sobre o Autor

Ana Paula Soares da Silva de Castro

Advogada. Pós-graduanda em Direito Processual lato sensu.


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