A empresa rural: função social & planejamento global.

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Resumo


A finalidade precípua do presente trabalho é avaliar, nas bases doutrinárias, jurisprudencial e legal, a possibilidade de programação do contribuinte para que, exclusivamente assistido pelo direito, possa diminuir ou evitar um tributo que por fim acaba estigmatizando seu empreendimento. Em que pese o escopo empresarial ser o lucro, não se pode abster-se o empresário quanto seu dever no que tange à função social da propriedade-empresa.


A dinâmica mercadológica implica em concorrência acirrada. Pressuposto para concorrência é estar o empresário, legalmente habilitado para exercer sua atividade. Em sentido lato, essa habilitação se dá quando do cumprimento da função social da propriedade. Em sentido estrito, quando o lucro é obtido sem que haja prejuízo tanto ao Fisco, quanto ao empresário e principalmente quanto à sociedade consumidora.


Em linhas finais se mostra viável, interessante e necessário o planejamento global. Viável porque autorizado por lei a seguir nesse caminho; interessante pois desafoga o empresário desta esquife tributária e necessário pois só assim conseguirá obter o esperado lucro e competitividade sem ofender seu dever social quanto a produtividade de seu negócio.


Palavras-chave: planejamento tributário, planejamento global, função social da propriedade, direito do consumidor, integração empresarial.


Sumário: INTRODUÇÃO; 1. ESTADO DEMOCRÁTICO SOCIAL DE DIREITO; A PROPRIEDADE NO ESTADO DEMOCRÁTICO SOCIAL DE DIREITO; 3. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE; 4.       A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NO DIREITO BRASILEIRO; 5. INSTRUMENTOS DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE (lato sensu); 5.1 Instrumentos Constitucionais; 5.2 Instrumentos Infraconstitucionais; 5.3     Instrumentos do Novo Código Civil; 6. REFORMA AGRÁRIA COMO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO SOCIAL; 7. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO OU PLANEJAMENTO GLOBA; 8.INTERVENÇÃO ESTATAL E O DIREITO AO PLANEJAMENTO GLOBAL; 9.     DIFICULDADES NACIONAIS; 9.1 Complexidade, Morosidade e Injustiça; 10. PLANEJAMENTO GLOBAL COMO FERRAMENTA DO EMPRESÁRIO; 11 CONCEITUAÇÃO; 12. MODUS OPERANDI 13. ELISÃO, EVASÃO E SONEGAÇÃO FISCAL; 14. NORMA GERAL ANTI-ELISÃO; 14.1 Princípio da Legalidade; 14.2 Princípio da Estrita Legalidade; 14.3 Princípio da Tipicidade Tributária; 15. TEORIAS LIMITADORAS DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO; 15.1 Teoria da Interpretação Econômica do Direito Tributário; 15.2 Teoria do Abuso de Formas; 15.3 Teoria do Abuso de Direito; 16. ATUAL FOCO DO PLANEJAMENTO GLOBAL; CONCLUSÃO; BIBLIOGRAFIA.


Introdução


… a propriedade é tanto um poder quanto um dever, mercê das implicações de ordem econômica e social a que está adstrita…”[1]. Nesse viés se desenvolve o presente trabalho, explicitando que o proprietário deve atentar para função social da propriedade em consonância com a lei, mas nem por isso deve arcar com uma onerosidade despropositada, tendo como ferramenta para seu suporte um sério estudo visando economia de tributos por meio do planejamento global.


Nos últimos dois séculos, a humanidade experimentou mudanças com velocidade e intensidade sem par na história em praticamente todos os campos de atividades. O Estado passou do absolutismo monárquico para um modelo Liberal – iluminista e posteriormente para um modelo de Estado Social. O conhecimento passou a ser formulado sob bases científicas criteriosas. O modelo econômico sofreu todas as influências da Revolução Industrial e hoje se vislumbra mais um salto evolutivo às expensas da tecnologia e do capitalismo.


O Direito enquanto ciência não se alheou a essas transformações que se reproduziram em seu âmbito, senão uniformemente, com certeza em toda sua extensão. O Direito Agrário e o Direito Tributário, como ramos do Direitos que são, também não ficaram indiferentes a esse processo, antes pelo contrário constituíram campo de vanguarda dentro do conjunto de matérias especializadas que compõem o sistema jurídico.


Abordando mais especificamente o campo do planejamento tributário e da função social da propriedade, a legislação incorporou à sua disciplina as mais recentes conquistas da dogmática jurídica que procuraram tornar ainda mais eficientes esses potentes mecanismos de fomento da política, desenvolvimento e educação, colocando-os em consonância com os esforços gerais na busca dos objetivos colimados pela sociedade, sem que para isso seja necessário dispêndio fiscal maior do que o estritamente legal.


Assim o Direito Agrário e dentro dele o Planejamento Tributário Agrário tendo por objetos diversas atividade, é um setor onde mais sensíveis e prementes se tornaram as modificações sócio-político-jurídicas, tudo sob a luz da função social da propriedade e os reflexos emanados dela.


Em face dessa realidade, faz-se mister, em qualquer estudo acerca do presente tema, abordar a função social da propriedade. Princípio que hoje é a face mais saliente das novas concepções político-jurídico-sociais e encontra-se dentre as normas constitucionais sujeitas ao grau máximo de rigidez. Traduz um instituto jurídico em posição de alicerce dentro do Planejamento Global. Objetiva-se aqui efetuar uma panorâmica sobre o Planejamento Tributário com foco na função social da propriedade rural, dando especial enfoque à irradiação de sua influência no campo social, político e de desenvolvimento da nação.


No que tange ao planejamento, propriamente dito, parte-se do pressuposto de que havendo tributo poderá haver também planejamento tributário; feito sob a égide legal e tidas como pertinentes a cada caso concreto, deverá ser o meio utilizado para que o empresário consiga acompanhar a evolução globalizante que estende seus tentáculos à todos.


Em que pese haja opositores, o planejamento global se apresenta viável, pertinente e um direito a ser estimulado. Aquele que segue por este caminho está à procura de melhor posicionamento no mercado, do contrário, estará fadado a pagar mais do que realmente deveria, conseqüentemente, minando seus negócios.


1. ESTADO DEMOCRÁTICO SOCIAL DE DIREITO


Não bastasse a natural propensão do ser humano ao convívio em sociedade, somos compelidos a um tal comportamento pela capacidade de sapiência da qual somos dotados ante a constatação de que em grupo, com a soma de esforços, eleitos objetivos comuns, podemos atingi-los com maior facilidade.


Ocorre que o convívio em grupo implica sempre, em maior ou menor grau, interferência dos atos individuais na esfera alheia. Da mesma forma, a existência de um sem fim de atos que se devem condicionar pelo respeito a fins comuns, quer seja positivamente buscando produzir condições favoráveis à consecução desses objetivos, quer negativamente, abstendo-se de práticas prejudiciais ao atendimento dos objetivos comuns, compondo uma estrutura complexa e intrinsecamente interativa, implica a inarredável necessidade de coordenação. Na junção desses dois fatores, ou seja, da interferência recíproca dos comportamentos e do condicionamento da ação individual aos objetivos da coletividade, reside a gênese das noções de Estado e de Direito.


É bem verdade que primitivamente as noções de Estado e de Direito estiveram mais associadas à imposição da força de um indivíduo ou grupo sobre os demais, impelidos pelo réprobo intuito de dominação. Isto, porém, não invalida que a existência do Estado e do Direito se constituíssem sobretudo emanações da aquiescência individual embasada nas duas conclusões acima referidas, o que se aproxima da concepção de Estado preconizada pelo jus naturalismo contratualista de Hobbes e Locke.


A força, entendida como poder de soberania do Estado e imposição aos seus súditos, ou seja, como o próprio jus imperii, não é um componente desprezível, muito pelo contrário é um fator essencial, pois da mensuração de sua intensidade se extrai a inspiração mais ou menos totalitária de um Estado, com maior ou menor espaço para o indivíduo.


Essas considerações são fundamentais à compreensão da transição de um Estado de modelo liberal – iluminista para um Estado de modelo social.


O desenvolvimento da humanidade faz-se por ciclos que se sucedem e se repetem opondo-se o conseqüente ao antecedente. Cada ciclo, que se identifica por características específicas, contrapõe-se ao anterior, o qual é por ele negado. Ao repetir-se, no entanto, não apresenta a mesma configuração da anterior ao ciclo ao qual se contrapõe. Há sempre um fator, ou conjunto de fatores, que atua, via de regra de forma constante, e que faz com que os ciclos reapareçam sempre diferenciados. As concepções do Estado e do Direito não fogem a essa característica.


Em um dado momento um determinado Estado toma uma feição mais autoritária, fazendo preponderar o seu interesse. Segue-se um ciclo mais liberal em que se reduz a presença do Estado. Há um fator que altera o ciclo que se repete e que é, segundo o chamava Pontes de Miranda[2], o “princípio da redução do quantum despótico”. Em tal ordem de idéias, a cada ciclo, na expansão do poder estatal essa expansão é menor, ao passo que a cada ciclo de retração, maior é a retração com a conseqüente ampliação da auto – afirmação individual.


Assim, o conjunto de princípios que regem a ordem jurídica de um Estado em dado momento está fundamentalmente ligado à concepção do modelo do próprio Estado. A função social da propriedade é um princípio cuja gênese está intimamente relacionada à concepção de um Estado Democrático Social de Direito. Com efeito, não podemos compreender em profundidade a função social da propriedade sem compreender o modelo de Estado em que ela surge e vige, e para tanto se faz necessário analisar a evolução recente do Estado.


Obviamente não se adentrará em profundo acerca do Estado para o que se recomenda uma consulta a diversas obras de Teoria Geral do Estado e Direito Constitucional. Diga-se en passant, um tal esforço desloca-se por completo do âmbito deste trabalho. Por isso interessam especialmente as três últimas fases do modelo de Estado.


Pois bem, até a Revolução Francesa (1789), a concepção de Estado amoldava-se ao modelo do chamado Estado Absolutista, cuja principal característica residia na concentração quase absoluta de poderes em mãos de um monarca que representava a personificação do próprio Estado. É bem verdade que havia um conjunto de limitações a esse poder que variava de ordenamento para ordenamento e cuja gênese remonta à Magna Carta do Rei João Sem-Terra (1215), sem que com essa limitação se pudesse afirmar atingido o alicerce da concentração de poderes.


Durante séculos esse modelo, cuja origem identifica-se com a formação das grandes nações européias por volta dos séculos XII e XIII, preponderou absoluto.


Ocorre que a política mercantilista, impulsionada pelo ciclo das navegações e pelo colonialismo, com forte incremento da atividade comercial, foi paulatinamente modificando a extratificação social. Não demorou para que a burguesia, nova classe que surgia baseada na concentração de dividendos econômicos e sob o pálio da filosofia iluminista, suceder à nobreza no poder, tendo por ponto culminante a ruptura traumática da Revolução Francesa.


Surge então o Estado Liberal sob a fórmula de um Estado de Direito o que deu origem à nomenclatura Estado Liberal de Direito. O escopo maior era dar ampla liberdade e garantia para o exercício de suas atividades e, citando Macridis[3], identificam-se três núcleos da democracia liberal:


“O núcleo moral, baseado no postulado da liberdade individual e social, esta última correspondendo ao direito de ascensão social. O núcleo econômico cuja a base é a economia capitalista fundamentada na liberdade de ação e na propriedade privada. O núcleo político tem como princípios o consentimento individual, o governo representativo, o constitucionalismo e a soberania popular”.


José Afonso da Silva[4] identifica como características do Estado Liberal de Direito: a submissão ao império da lei, entendida como ato emanado formalmente do poder legislativo; divisão de poderes; enunciado e garantia dos direitos individuais.


Seguiu-se à Francesa a Revolução Industrial, transformando a matriz econômica sob os auspícios da filosofia liberal. Ocorre que o modelo capitalista preconizado pelo liberalismo, ou seja, um modelo em que a atividade econômica é levada a cabo sem qualquer controle, começou a produzir um quadro de graves desigualdades sociais e exclusão, ou seja, gerando nova forma de estratificação social.


A Revolução Industrial, que se faz sentir em especial nos países europeus mais adiantados e a posteriori na América, contribui para a urbanização de significativas massas humanas outrora dedicadas às atividades agrícolas. As massas de assalariados, submetidas a uma igual condição de submissão econômica e sujeitas a uma jornada desumana, começam a se organizar em sindicatos e movimentos sociais. Tal é o quadro que, a partir de meados do século XIX, começam a surgir movimentos reivindicatórios sob a égide do socialismo e do anarquismo. Fourier, Owem, Saint Simon e depois Marx e Engels constroem a doutrina socialista que visa abolir a luta de classes e a exploração do trabalho pelo capital. O anarquismo vai além e propugna o fim do Estado. As novas ideologias que se opõem ao modelo liberal, sobretudo no aspecto econômico, irão redundar em episódios como a Comuna de Paris e, no iniciar do século XX, em movimentos revolucionários como as Revoluções Mexicana e Russa.


Nos Estados onde não se implantaram regimes embasados nas novas ideologias, elas tiveram o mérito de apontar as falhas e contradições do modelo liberal iluminista. Sob o ponto de vista jurídico, o modelo liberal concebe a lei sob uma ótica essencialmente formal, dissociada da realidade. Em tal ordem de idéias, a norma jurídica protetiva mais se afigura uma emanação inócua e meramente enunciativa do que um verdadeiro comando revestido do jus imperii.


Ante a evidência de que o modelo então vigente chegava a ser contraditório nos seus resultados na medida em que os postulados de igualdade e justiça permaneciam longe de se constituírem realidades palpáveis, e que a opressão e a desigualdade deveriam ser atacadas antes de tudo como fatos do mundo concreto, o modelo liberal começou a ceder espaço a um conteúdo social. A pressão para que isso acontecesse intensificou-se também, na medida em que as populações evoluíram em termos intelectuais.


Surge então o Estado Democrático Social de Direito que, na lição de José Afonso da Silva[5], busca a fusão de dois elementos, quais sejam o modelo capitalista e a consecução do bem estar social geral.


A recepção do ideário Democrático Social no Direito Positivo faz-se na Constituição Mexicana (1917) e na Constituição de Weimar (1919). A partir de então em grande parte das Constituições ocidentais reservam-se capítulos voltados aos direitos sociais. Sob o ponto de vista jurídico, ou seja, sob o ponto de vista da influência do conceito de Estado Democrático Social de Direito, a lei transcende do seu aspecto meramente formal para adquirir um contorno material. Somam-se aos direitos individuais direitos econômicos e sociais e principalmente buscam-se meios de tornar esses direitos uma realidade efetiva e concreta.


Impende notar, no entanto, que as noções de Estado Democrático de Direito e de Estado Social podem existir independentes uma da outra, conforme lembra José Afonso da Silva[6] trazendo-nos exemplos de Estados Sociais que não eram democráticos como os Estados Nazistas e Fascistas.


O Texto Político de 1988 indubitavelmente possui franca inspiração social, até por isso sendo chamada de Constituição Cidadã, consagrou diversos dispositivos na busca de um conteúdo mais solidário e humanitário, embora a situação econômica do Estado e da maior parte da sociedade seja um óbice considerável a que os objetivos colimados tornem-se uma realidade palpável.


Importante deixar registrado o papel da Igreja. Sem dúvida a presença eclesial na discussão sobre o uso da terra não se ateve em Tomás de Aquino (que vê na propriedade um direito natural que deve ser exercido com vistas ao bem comum).


Surge pelas mãos do Sumo Pontífice Leão XIII (Gioachino Pecci) a encíclica Rerum Novarum, de 15 de maio de 1891, seguida, quarenta anos depois, pela encíclica Quadragesimo Anno de Pio XII (Achille Ratt) em 1931 e, em 15 de maio de 1961, a encíclica Mater et Magistra de João XXIII (Ângelo Giuseppe Roncalli). Todas asseveram, em algum momento, a importância da inclusão social via trabalho e distribuição das riquezas.


Segundo Telga de Araújo[7]:


“.para a Igreja, a propriedade não é uma função social a serviço do Estado, pois assenta sobre um direito pessoal que o próprio Estado deve respeitar e proteger. Mas tem uma função social subordinada ao bem comum. É um direito que comporta obrigações sociais.”


A Constituição de Weimar adotou a função da propriedade como condicionada ao bem da sociedade. O artigo 153 do referido diploma legal estabeleceu, em apenas duas palavras, um princípio que se tornou intensamente difundido: Eigentum verpflichtet (A propriedade obriga). E acrescenta: Sein Gebrauch soll zugleich Dienst sein für das Gemeine Beste (Seu uso constitui, conseqüentemente, um serviço para o bem comum)[8]. Já restava evidente que o cultivo e a exploração da terra representam um dever para com a comunidade.


2. A PROPRIEDADE NO ESTADO DEMOCRÁTICO SOCIAL DE DIREITO


Antes de adentrar ao estudo da função social da propriedade, é imperioso fazer uma breve análise da evolução histórica da propriedade, ponto base para bem compreender a função social que a ela se apõe hodiernamente, mesmo porque a função social é consectário lógico da evolução do conceito de propriedade.


A propriedade, compreendida como a potestate individual excludente da ingerência de outrem sobre um bem, está fundamentalmente ligada aos meios de produção.


No primitivismo dos primeiros agrupamentos humanos não há lugar para a propriedade como a conhecemos hoje, senão sob a forma rudimentar de domínio sobre um mínimo de bens individuais de uso pessoal. A própria situação de nomadismo daqueles grupos dificulta que se consiga o acúmulo de riqueza.


Conforme Pedro e Cáceres[9], o incremento da produção agrícola e a “revolução dos metais” possibilitaram saltos evolutivos que permitiram a criação de condições que levaram à evolução do conceito de propriedade para a propriedade individual. A noção de propriedade individual ampla será firmada especialmente na Grécia e em Roma, fundada em um modelo de família gentílica em que o pater familias desenvolvia a liderança no grupo. Assim, a propriedade familiar se sobrepõe à propriedade comunitária. Com a queda do modelo gentílico consolidou-se uma propriedade realmente individual, porém não se pode falar que fosse absoluta, pois submetia-se a certas restrições como as decorrentes de vizinhança.


Com a queda do Império Romano, segue-se o modelo feudal, cuja principal característica está na concentração da propriedade e na exploração indireta da terra. A propriedade concentra-se em mãos de poucos senhores feudais (suseranos) que permitiam a seus servos explorar as terras em troca de vassalagem. Com a unificação das nações européias e o absolutismo monárquico surge um terceiro componente corporificado no poder do rei, que é o senhor absoluto nos limites do reino. É de se observar que o poder que exerce é mais formal que concreto já que, no feudo, é o senhor feudal titular de poder absoluto.


O desenvolvimento da burguesia, que culminará na Revolução Francesa, implicará a retomada do conceito romano de propriedade individual. O Código de Napoleão, diploma legislativo que influenciará profundamente os séculos XIX e XX, em seu artigo 554 contempla a propriedade como “um direito de dispor das coisas de forma absoluta, desde que não se faça delas uso proibido pelas leis“. A própria Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão previa que o direito de propriedade só se limitaria na medida em que atingisse o direito alheio. Tal concepção influenciou as codificações da segunda metade do século XIX, tendo penetrado inclusive no Código de Bevilácqua no artigo 524 e sido aprimorado pelo artigo 1228 do Códex Civil de 2002 no concernente à função social que rege a propriedade.


Contrapondo-se ao caráter absoluto do direito de propriedade, surgiu a teoria do abuso do direito que teve como prosélitos Saleilles, Charmont e principalmente Josserand, aos quais se antepuseram Planiol, Rarde e Esmeim. Mas o grande golpe na propriedade individualista começou a ser urdido por Léon Duguit com “Lês Transformations Générales du Droit Prive Français dépuis lê Code Napoléon” que, sem negar a propriedade privada, identificava a necessidade de submissão do seu exercício a um direito coletivo.


Após adveio o constitucionalismo social a que se somou à intervenção da Igreja através das Encíclicas Rerum Novarum, de Leão XIII, Quadragesimo Anno, de Pio XI e Mater et Magistra, conforme visto acima. Estava aberto o caminho para a função social da propriedade.


Nasce assim a moderna concepção de propriedade, com a sua função social bem determinada, geradora de trabalho e de empregos, apta a produzir novas riquezas e a contribuir para o bem geral da nação. É a propriedade dos novos tempos, a eliminar a propriedade estéril e improdutiva.


3. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE


Roberto Wagner Marquesi cita Antonino C. Vivanco para definir a função social da propriedade ao dizer[10]:


“…, la función social es ni más ni menos que el reconocimiento de todo titular del dominio, de que por ser un miembro de la comunidad tiene derechos y obligaciones con relación a los demás miembros de ella, de manera que si él ha podido llegar a ser titular del dominio, tiene la obligación de cumplir con el derecho de los demás sujetos, que consiste en no realizar acto alguno que pueda impedir u obstaculizar el bien de dichos sujetos, o sea, de la comunidad”.


Uma das grandes questões acerca da função social está na sua vinculação ou não ao termo propriedade. Afinal, quem detém a função social, a terra ou a propriedade? No dizer de Alcir Gursen de Miranda[11], a função social é atributo da terra:


“Função social da terra, pode-se afirmar que constitui o princípio central do Direito Agrário, do qual a função social da propriedade da terra é um subtema, bem como todo e qualquer princípio ou instituto que tenha como objeto a terra”.


Então, a analise da função social da propriedade, como é nomeada no País, não pode olvidar dois fatos:


a) quem se coloca como meio de produção é a terra, sendo a propriedade um atributo conferido a esta;


b) o desenvolvimento humano e o respeito ao meio ambiente devem sempre ser considerados privilegiadamente em relação ao direito de propriedade.


Em sintonia com o artigo 5º, XXII, da Constituição Federal é garantido o direito de propriedade, mas de forma a que se atenda sua função social. Neste sentido assevera Paulo T. Borges[12]


“Proprietário, sim: proprietário com titularidade garantida; proprietário com direitos assegurados; mas proprietário com deveres sociais, justamente pelo fato de ser proprietário”.


Proprietário que precisa trabalhar a terra, ou fazê-la trabalhada. Proprietário que tem responsabilidade pelo bem-estar dos que, com ele, labutam na terra. Proprietário que faça a terra produzir como mãe dadivosa e fértil, mas sem exauri-la, sem a esgotar, porque as gerações futuras também querem tê-la produtiva.


É oportuno abordar o famoso contra-senso entre os artigos 185, II e 186 da Constituição Federal. Enquanto o segundo artigo elenca as condições para cumprimento da função social, o primeiro coloca a propriedade produtiva no pedestal da insucetibilidade de desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária. A exegese desses artigos deve ser feita em sintonia com a análise histórica do processo constituinte que produziu o Texto em vigor. Os dois artigos refletem o embate entre as forças conservadoras e as progressistas.


Ora, não é preciso ser um grande hermeneuta para saber que há situações em que o cumprimento da função social da propriedade já se faz de todo impossível – trabalho escravo, descumprimento contumaz das leis trabalhistas, agressão irremediável ao meio ambiente. Os prejuízos sócio-ambientais não podem ser maquiados com reparações cosméticas, porquanto suas chagas psico-sociais e a agressão ambiental não poderem ser simplesmente corrigidas, pois suas marcas são por vezes perenes.


Grosso modo, podemos simplificadamente conceituar a função social da propriedade como a submissão do direito de propriedade, essencialmente excludente e absoluto pela natureza que se lhe conferiu modernamente, a um interesse coletivo. Leon Duguit[13] já afirmava que:


“O proprietário, é dizer, o possuidor de uma riqueza tem, pelo fato de possuir esta riqueza uma ‘função social’ a cumprir; enquanto cumpre essa missão, seus atos de propriedade estão protegidos. Se não os cumpre, ou deixa arruinar-se sua casa, a intervenção dos governantes é legítima para obrigar-lhe a cumprir sua função social de proprietário, que consiste em assegurar o emprego das riquezas que possui conforme seu destino”.


Luiz Ernani B. de Araújo[14] afirma, quanto à propriedade à luz da função social, que antes de se pensá-la a partir dos interesses individuais, ela deve ser pensada pelo interesse da coletividade, da sociedade e adiante segue:


“Em outros termos, da exigência de que a propriedade rural cumpra sua função social, passa-se a vê-la como ela sendo a própria função social, determinada pelo exercício do direito à terra, como forma de alcance da justiça social no campo”.


Luciano de Souza Godoy[15], de sua parte, afirma que:


“A propriedade privada, como um direito individual e funcionalizado, isto é, que tem presente uma função social, apresenta um conceito não absoluto de propriedade – pela função social que lhe é inerente. Essa fórmula é adotada em grande parte dos países, como conceito de propriedade juridicamente correto”.


Inobstante alguma doutrina, escassa, e alguns sistemas legislativos ainda neguem a função social da propriedade, hoje ela é uma realidade, um principio adotado e defendido por doutrinadores de escol posição.


Observe-se, contudo, que a função social da propriedade não grava todos e quaisquer bem indiscriminadamente.


Eros Grau[16], embora considere que somente a propriedade dos bens de produção é que estaria adstrita ao cumprimento da função social, distingue, ainda, no tocante àqueles, determinadas circunstâncias nas quais a propriedade desempenha uma função individual, daquelas outras em que o cumprimento da função social poderá ser exigido, ao explicar:


“… enquanto instrumento a garantir a subsistência individual e familiar – a dignidade da pessoa humana, pois – a propriedade consiste em um direito individual e, iniludivelmente, cumpre função individual. Como tal, é garantida pela generalidade das Constituições de nosso tempo, capitalistas e, como vimos, socialistas. A essa propriedade não é imputável função social; apenas os abusos cometidos no seu exercício encontram limitação, adequada, nas disposições que implementam o chamado poder de polícia estatal”.


A discussão acerca da função social que a propriedade deve necessariamente desempenhar não é recente no âmbito do direito privado.


Carbonnier[17], embora destacando o mérito de Léon Duguit ao abordar o assunto em sua conhecida obra de 1912, Les transformations générales du droit prive depuis le Code Napoleón, aponta que Augusto Comte, em sua obra Système de politique positive, de 1850, já via na propriedade uma indispensável função social, …destinée à former et à administrer les capitaux dans lesquels chaque génération prépare les travaux de la suivante[18].


Na abalizada opinião de Fachin[19], a propriedade deve ser “menos exclusão e mais abrigo, menos especulação e mais produção“.


É dentro deste contexto que a doutrina especializada vem afirmando não poder mais subsistir o conceito romanístico de propriedade, de conotação francamente individualista. Observa-se, ao contrário senso, nos dias atuais, que o individualismo da propriedade perdeu espaço para o interesse coletivo, de modo a subordiná-la, cada vez mais, ao bem comum.


São de Marquesi[20], citando a Abelmar R. da Cunha as seguintes e pertinentes observações:


“… já não é possível admitir que o titular empregue seu imóvel em atenção a fins puramente individuais. Cumpre-lhe, ao contrário, fazê-lo de uma forma útil à sociedade, usando-o como um instrumento de riquezas e visando à felicidade de todos. E, de fato, sendo escassos os bens naturais postos à disposição do homem, exige-se que seu uso se faça para proveito de todos, ainda que se deva respeitar a propriedade como um direito subjetivo individual, em contraposição às combalidas teorias marxistas. O predicado da função social, diz Trotabas, citado por Ribeiro da Cunha, não constitui uma ameaça ao direito do proprietário; antes, completa e enriquece a noção de propriedade”.


A propriedade, assim, constitui-se em um verdadeiro encargo social voltada ao bem estar da coletividade.


Segundo André O. Gondinho[21], “socialmente funcional será a propriedade que, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana, contribua para o desenvolvimento nacional e para diminuir a pobreza e as desigualdades sociais”.


A quem se destinaria, contudo, o mandamento constitucional de que a propriedade deverá cumprir a sua função social?


Conforme o mesmo autor[22], a “função social da propriedade tem destinatários específicos: o titular do direito de propriedade, o legislador e o juiz”.


Para o primeiro, continua o jurista, “a função social assume uma valência de princípio geral”, isto é, o proprietário não pode perseguir, ao exercer seus atos e atividades, uma função anti-social ou até mesmo, antijurídica, ao passo em que deve ter garantido a tutela jurídica a seu direito.


O legislador é destinatário da função social da propriedade porque este não pode conceder ao titular do direito de propriedade, através de normas infraconstitucionais, poderes extravagantes ou em contrário ao interesse social previamente tutelado.


Em referência à atividade judicante, o magistrado e os demais operadores jurídicos devem encarar a função social da propriedade como um “critério de interpretação e aplicação do direito, deixando de aplicar as normas que lhe forem incompatíveis[23].


Visto isso, deve-se entender que a função social é um limite encontrado pelo legislador para delinear a propriedade, em obediência ao princípio da prevalência do interesse público sobre o particular, pois aquele representa a vontade da coletividade. Se a função social da propriedade não for cumprida, ficará sujeito o proprietário ao conteúdo do artigo 184 da Constituição Federal de 1988, qual seja, a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária.


4. A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NO DIREITO BRASILEIRO


Até a independência regeu-se o Brasil pela legislação portuguesa corporificada nas Ordenações Manoelinas, Afonsinas e Filipinas. A primeira legislação pátria independente surge em 1824, com a Constituição Imperial outorgada por D. Pedro I. Seu artigo 179, inciso XXII, sob inspiração liberal, consagrava que “É garantido o direito de propriedade em toda a sua plenitude”. Embora fosse permitido a desapropriação por bem público, não se pode inferir que se houvesse aí contemplado qualquer homenagem à uma função social.


A Constituição de 1891 acrescentou como causas para a desapropriação a necessidade ou utilidade pública, mas a primeira Constituição Republicana, em 1891, estava dominada pelo mesmo fervor individualista na concepção do direito de propriedade. Destaca-se que a Emenda Constitucional de 1926 consistiu a primeira limitação ao direito de propriedade. A esta limitação, que se referia às minas e jazidas minerais, a Constituição de 1934 somou a concernente às quedas d’água e ainda ressalvou, em seu artigo 113, nº. 17, que o exercício do direito de propriedade não se poderia fazer contra o interesse social ou coletivo. Os mesmos princípios foram mantidos no Texto de 1937, art. 122, nº. 14, e 143, e na Lei Constitucional nº. 5, de 1942.


A Constituição de 1946, francamente voltada a contrariar o anterior período de exceção, procurou condicionar o exercício da propriedade ao bem estar social e a preconizar a justa distribuição da propriedade com igualdade de oportunidades para todos[24].


Às Constituições de 1967[25] e 1969[26] deve-se a inserção da função social como condicionante da propriedade.


A Constituição de 1988 dedicou diversos dispositivos à disciplina da propriedade. José Afonso da Silva enumera vários[27].


Interessam especialmente, até por hierarquia legislativa, os artigos 5º, incisos XXII e XXIII, 170, II e III, 182 e 186. O inciso XXII do art. 5º afirma que: “é garantido o direito da propriedade“. O inc. XXIII afirma que “a propriedade atenderá sua função social“. O art. 170, dando início ao capítulo que trata Da Ordem Social e Econômica prescreve: “art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:II – propriedade privada, III – função social da propriedade”. O art. 186, por seu turno, dentro do capítulo da Política Agrícola e Fundiária e Da Reforma Agrária, elenca os requisitos da função social da propriedade rural de forma clara, verbis:


“art. 186 – A Função Social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I – Aproveitamento racional adequado; II – Utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III – Observância das disposições que regulam as relações de trabalho e IV – Exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e dos trabalhadores”.


Em primeiro plano, é de invocar o magistério de José Afonso da Silva acerca da natureza pública da função social da propriedade. Segundo o eminente constitucionalista, os juristas brasileiros, privatistas e publicistas, concebem o regime jurídico da propriedade privada como subordinado ao Direito Civil, considerado direito real fundamental e que essa é uma perspectiva dominada pela atmosfera civilista, que não levou em conta as profundas transformações impostas às relações de propriedade privada, sujeita hoje à estreita disciplina do Direito Público, que tem sua sede fundamental nas normas constitucionais.


Além do caráter publicístico, nota-se uma conjugação complexa de requisitos na construção da função social da propriedade, de tal modo que a definição do artigo 186 valeu de Ismael Marinho Falcão[28] o seguinte comentário:


“Diante de tal conceituação resta evidente que é pelo trabalho e não pelo simples fato do título que o homem conquistará o direito de propriedade sobre a terra”.


E, conforme o Professor Ernani Bonesso de Araújo[29] “a propriedade passa, então, a ser vista como um elemento de transformação social”.


Faz-se mister apresentar que à luz do artigo 186 e incisos, a função social da propriedade rural é constituída por um elemento econômico (aproveitamento racional e adequado), um elemento ambiental (utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente) e um elemento social (observância das normas que regulam as relações de trabalho e exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e trabalhadores). Logo, Somente cumpre a função social a propriedade rural que atenda simultaneamente aos elementos econômicos, ambiental e social.


É importante observar que não se está negando o direito de propriedade, apenas se está introduzindo um interesse preponderante, que corresponde ao interesse da coletividade, em busca de que a propriedade seja um mecanismo de justiça social. Busca-se assim a conciliação do modelo econômico capitalista com uma política social que almeje reduzir desigualdades e promover a dignidade humana, enquanto princípios e fins da Constituição e norteadores da ação estatal. Junto a Paulo Tormin Borges a doutrina é no sentido de que é necessário que o proprietário faça a terra produzir como mãe dadivosa, mas sem exaurir, sem esgotar, porque as gerações futuras também querem tê-la produtiva.


5. INSTRUMENTOS DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE (lato sensu)


 Inúmeros são os instrumentos de cumprimento da função social da propriedade. Em virtude da importância assumida no Texto Constitucional vigente, apresentam-se de diversas formas e são geralmente revestidos de eficácia e aplicabilidade advindas de fontes distintas.


 Destarte vale observar que referidos instrumentos emergem fundamentalmente do Texto Constitucional, são regulamentados por vasta e complexa legislação infraconstitucional, bem como dos principais dispositivos apresentados pelo Código Civil de 2002, interpretados sob a ótica do direito privado.


5.1. Instrumentos Constitucionais


Erigido ao nível dos direitos e garantias fundamentais, direitos e deveres individuais e coletivos, o direito à propriedade é preliminarmente contemplado no caput do art. 5º da Constituição Federal de 1988. Ainda no mesmo artigo, o inciso XXII garante o direito constitucional de propriedade e o XXIII determina o atendimento de sua correspondente função social.


O artigo 21 caput e respectivo inciso XX do Código Supremo vigente estabelecem a competência da União sobre diretrizes para o desenvolvimento urbano, incluindo habitação, saneamento básico e transportes urbanos. A proteção de documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos, bem como do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas e a preservação das florestas, fauna e flora, são de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, é o que estabelece o caput e incisos III, VI, VII, respectivamente do art. 23 do texto constitucional vigente.


O art. 30, por meio de seu caput e inciso VIII, delega aos Municípios a competência de promover, no que couber, o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, e o inciso IX transfere, também aos Municípios, a competência para promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.


A preocupação do legislador constitucional sobre o tema ambiental transparece, particularmente, no caput do art. 225, cujo texto garante a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.


No já citado art. 23, VI e em outros dispositivos constitucionais, como o art. 170, que apresenta em seu caput a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, como a responsável por assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados entre outros: a função social da propriedade, inciso III e a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado, conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação, inciso VI.


O bem-estar dos habitantes das cidades é assegurado pela política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme  diretrizes gerais fixadas em lei, que têm por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, de acordo com o determinado pelo caput do art. 182 e § 2º que estabelece o cumprimento da função social da propriedade urbana pelo atendimento às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, bem como o aproveitamento adequado do solo urbano expresso no respectivo § 4º. Garante assim o art. 182 da Norma Vértice o regramento do desenvolvimento das cidades e da função social destes aglomerados populacionais observando a forma de como cumprir a função social da propriedade urbana, referindo-se ao plano diretor de cada município, respeitando as peculiaridades locais.


Outras atividades de função predominantemente sociais foram contempladas pela Carta Magna de 1988, como o prestígio da moradia da população de baixa renda (art. 183); produtividade, aproveitamento racional, preservação ambiental, respeito aos direitos trabalhistas e ao bem-estar dos proprietários e trabalhadores (arts. 184 a 186); a progressividade do IPTU (art. 156, § 1º), nos termos da lei municipal, assegura o cumprimento da função social da propriedade.


Roberto Senise Lisboa define usucapião constitucional como sendo a forma de aquisição da propriedade imóvel, pela posse contínua mansa e pacifica do bem, por tempo igual ou superior a cinco anos. Usucapião extraordinário de imóveis rurais, art. 191, e especial urbano, art. 183 e parágrafos, cujo conteúdo diminui o prazo prescricional, são, indubitavelmente, dispositivos constitucionais reconhecedores do direito explicito de acesso à propriedade.


A Constituição Cidadã não permite que o proprietário fique totalmente impedido de exercer seu direito de usar, dispor, e fruir de seu bem. O ato normativo que deliberar nesse sentido pode não ser considerado inconstitucional, mas certamente garantirá o seu direito à indenização, pois será caracterizada uma desapropriação indireta.


 5.2. Instrumentos Infraconstitucionais


Os instrumentos infraconstitucionais da função social da propriedade são condicionamentos ao direito de propriedade, objetivam preservar interesses e valores específicos, integram uma legislação dirigida a impor restrições diretas ao proprietário.


Legislação extravagante, o Estatuto da Terra- Lei n. 4.504 de 30 de novembro de 1964 e o Código Civil estão em vigor no que não contrariarem o Texto Constitucional vigente.


O Estatuto da Terra, Lei n. 4.504/64, prevê que a propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente:


“favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; mantém níveis satisfatórios de produtividade; assegura a conservação dos recursos naturais; observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem.”


O Dec. Federal n. 95.715/88 regulamenta as desapropriações para efeitos de reforma agrária, relaciona o respeito da propriedade rural aos princípios da ordem econômica e social, na exploração da propriedade rural, ao:


1. cumprimento da legislação trabalhista e de contratos de uso temporário da terra;


2. ao aproveitamento das potencialidades ou obtenção de grau mínimo de produtividade, por meio de métodos e técnicas adequadas;


3. à preservação de recursos ambientais; e


4. ao desenvolvimento de atividades compatíveis com a vocação ou utilização econômica (art. 3º).


Leciona Celso Antonio Bandeira de Mello ser o direito de propriedade onerado diretamente em favor de utilidade pública pelo instituto da servidão administrativa, impondo ao proprietário restrição específica sobre seu bem.


A Lei Federal n. 6.938/81 dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. Cria mecanismos de controle do uso da propriedade por particulares, a fim de preservar o meio ambiente. O Decreto-Lei n. 3.365/41, art. 5º, lista os inúmeros casos de utilidade pública que autorizam a perda da propriedade. A Lei Federal n. 4.132/62 aponta hipóteses de interesse social que fundamentam a desapropriação, bem como demonstram o objetivo de promover a justa distribuição da propriedade e de condicionar seu uso ao bem-estar social, efetivas ações de política fundiária e de justiça social.


Diversos interesses são tutelados por meio de legislação estadual e municipal, especificamente, a lei de uso e ocupação do solo, o código de obras e o código sanitário, condicionam o proprietário a respeitar, respectivamente: a segurança da edificação (fundações e estrutura); o conforto ambiental (ventilação, circulação, iluminação, condições térmicas etc…); o urbanismo (uso e ocupação de solo, permeabilidade do solo; gabarito das edificações, estética, etc.); a segurança de instalações (gás, eletricidade, incêndio); a saúde (água e instalações sanitárias) e o meio ambiente (coletas de esgoto e de lixo).


5.3. Instrumentos do Novo Código Civil


 O novo Código Civil contempla a função social do contrato na parte do Direito das Obrigações, bem como da propriedade. O legislador infraconstitucional, no art. 2.035, e parágrafo único observou também a eficácia temporal, fazendo retroagir os efeitos da nova norma a negócios que contrariem os preceitos provenientes da ordem pública voltados a garantir a função social da propriedade.


Distinto da Constituição Federal de 1988, que define e descreve a forma para o atendimento da função social da propriedade nos incisos I a IV do art. 186, o novo Código Civil define os limites temporais de negócios conforme segue:


a) negócios realizados antes de 11.01.2003 são regidos por leis do tempo de sua celebração; b) os efeitos desses negócios seguem a regra do tempo do contrato, até o limite de 10.01.2003; c) os efeitos devem seguir a nova lei (novo Código Civil), a partir de 11.01.2003; d) se o negócio previu exceção, podem os efeitos não ser atingidos pelo novo Código Civil, desde 11.01.2003; e) ainda que tenha sido prevista exceção imunizando o contrato das conseqüências de regras de ordem pública relacionadas à função social da propriedade, dos contratos ou outra, sofrerá limitação na autonomia privada, perdendo efeito a exceção e sendo limitada pela nova norma (novo Código Civil).


Além do art. 187 do novo Código Civil, não há outra referência expressa à função social. Entretanto, mereceu a função social do contrato referência expressa pelo art. 421, ao restringir a liberdade de contratar com a função social. Estabelece o inciso III do art. 1.275 do novo Código Civil a perda da propriedade pelo abandono de seu proprietário. O § 2º do art. 1.276 do Código Civil de 2002 trata da arrecadação dos imóveis abandonados e o § 1º prevê a arrecadação dos imóveis rurais, após três anos de desinteresse pelo proprietário, demonstrando outra inequívoca intenção de destinação social da propriedade em face da inação e descaso do proprietário.


Para Silvio Venosa a propriedade assume uma nova perspectiva no novo Código Civil, seu sentido social. Nesse sentido a redação do art. 1228, § 2º é determinante ao proibir atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, utilidade ou vantagem e sejam motivados pela intenção de prejudicar outrem.


O § 1° do mesmo diploma legal estabelece as diretrizes gerais da função social da propriedade em consonância com os dispositivos constitucionais expressos pelos artigos 5º, XXIII e 170, III.


A seguir são listados os principais artigos, conexos ao 1.228, e correspondentes disposições: 186 e 187 (abuso de direito); 952 (usucapião ou esbulho, indenização); 1.231 (propriedade presume-se plena e exclusiva); 1.275,V (perda da propriedade, desapropriação); 1.277 (direito de vizinhança); 1.359 (propriedade resolúvel); 1.784 (abertura de sucessão); 2.030 (disposições transitórias, prazos).


6. REFORMA AGRÁRIA COMO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO SOCIAL


Construir um novo modelo de desenvolvimento sustentável no campo e promover uma reforma agrária tendo em vista a função social da propriedade. Esses são os princípios que norteiam as discussões dos fóruns e encontros realizados para lapidar questões acerca desse tema em todo o mundo.


O Brasil é um país com grande potencial para a atividade de agricultura, com terras férteis e mão-de-obra. No entanto, as terras brasileiras não estão distribuídas como deveriam. Por fatores históricos, esses imóveis ainda se concentraram em mãos de poucos, geralmente determinando-se o latifúndio monocultor. Esse talvez seja o principal problema da agricultura brasileira, com influência na oferta de empregos, na qualidade de vida no campo e atentadora à função social da propriedade.


Marquesi[30] acrescenta:


“Saber como e por que essa minoria, e não outra, logrou assegurar para si o monopólio da terra é problema político, que se esgota na forma de dominação de poder. Os argumentos amiúde sustentados por certas ideologias, no sentido de o espaço físico ter sido conquistado pelo emprego da força ou ser fruto de privilégios, não afasta a constatação de que, no sistema de propriedade privada, haverá sempre uma minoria detentora dos meios de produção primária, vale dizer, os titulares do direito de propriedade.”


O objetivo da reforma é desapropriar terras improdutivas (mediante indenização) e dividi-las para assentamento. Contudo, a desapropriação é um meio difícil, pois há, como visto acima, questões políticas que são empecilhos.


Quantidades absurdas de terra são passíveis de desapropriação no Brasil, pois são improdutivas. Havendo uma mudança significativa na divisão de terras no país, ter-se-á avanço em questões sociais e econômicas. A começar pelo aumento de produção agrícola. Isso representa maior exportação, transformando-se numa alternativa para alcançar o equilíbrio na balança comercial. Haveria geração de empregos, não só no ambiente rural, mas também nos grandes centros, pois a migração diminuiria. A qualidade de vida se elevaria, diminuiria a expansão de cortiços urbanos, além de outros problemas que poderiam ser sanados.


O interesse social está ao centro dessas relações entre maioria e minoria. Esta confere legitimidade ao direito de propriedade daquela, mas, em contrapartida, impõe e exige a observância de certas condições como as que compreendem no princípio da função social e econômica.


Segundo o artigo 16 do Estatuto da Terra:


“A Reforma Agrária visa a estabelecer um sistema de relações entre o homem, a justiça social, o progresso e o bem estar do trabalhador rural e o desenvolvimento econômico do País, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio.”


Assim, entende-se a reforma agrária como instrumento através do qual o Estado, valendo-se da política de redistribuição da terra, visa ao incremento das riquezas produzidas no campo e à redução das desigualdades sociais, tendo como pano de fundo o respeito ao direito de propriedade e a observância de sua função social e econômica.


7. Planejamento Tributário ou Planejamento Global


Partindo do pressuposto de que onde há tributo, há também oportunidade para o planejamento tributário, exceto no cenário de sonegação onde todos perdem; e tomando por paradigma, entre outras, a empresa rural[31], segue-se o estudo com o intuito de apresentar sob quais vieses deverá seguir o empresário, sobretudo o rural, se pretender amenizar essa pecha tributária, bem como se tornar mais competitivo no mercado global sem passar ao largo da função social que grava seu bem.


Com o intuito de ser perene, o estudo não abordará valores ou percentagens específicas para cada tributo, senão em exemplos. Ante a patente variação dos impostos estaduais e municipais, prestamo-nos a mencionar os tributos e a tese sob a qual se dará o ajuste tributário em cada um deles.


Apesar de ser o setor da economia com menor tributação no Brasil, a agricultura tem um dos maiores índices em comparação com outros países. A desoneração é primordial para seguir no sentido de uma melhora no crescimento geral, tanto no que tange a tributação direta como a indireta.


O Fisco considera atividade rural a exploração da agricultura, pecuária, extração e exploração vegetal e animal, exploração da apicultura, avicultura, cunicultura, suinocultura, sericicultura, piscicultura e outras culturas animais, além da captura in natura do pescado.


Atualmente, só há tributação reduzida para produtos in natura; quando há qualquer processo que agregue valor ao produto rural, os impostos aumentam consideravelmente, como no caso do óleo de soja e da farinha, para citar alguns exemplos[32].


No caso de empresas rurais, numa visão generalizada, incidem o Imposto de Renda Pessoa Jurídica, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, PIS/Pasep e Cofins. Todavia poderão existir outras incidências a depender de cada caso em específico.


Não se perca de vista a certeza de que, em nenhum ser humano, em qualquer país, há o desejo incontido de pagar tributos, logo, sobre essa premissa se constrói o Planejamento Tributário, visando a economia tributária, a competição mercadológica, o desenvolvimento e expansão da empresa e, como reflexo, a fidelização do consumidor com a desoneração do valor final do produto.


Como se verá comprovado adiante, filosoficamente pode-se entender que em verdade, o que se chama de Planejamento Tributário é sim, um Planejamento Global; em que pese o escopo final seja redução de tributos é ainda condição sine qua non, uma otimização de todo o organismo da empresa, por meio de planejamento logístico, planejamento administrativo, planejamento contábil, planejamento político, planejamento jurídico e planejamento social. Essa interação de todos os setores é fundamento para denominar o tema como planejamento de âmbito global e não apenas tributário.


Acompanha o entendimento dessa interação o advogado tributarista José Augusto S. Leite[33], para quem:


“Embora a conceituação pareça simplista, a implantação do planejamento tributário jamais pode ser confundida com uma análise contábil-financeira ou com um estudo restrito a regulamentação legal dos tributos usualmente pagos pela empresa contribuinte. Na verdade, o planejamento tributário tem de fazer parte do planejamento estratégico da empresa, desde quando a sua implantação reclama a análise dos mesmos elementos essenciais à definição da gestão empresarial, tais como: ramo de atividade econômica; natureza do produto ou serviço; matérias-prima e fornecedores; definição da localidade da sede e filiais; opção pelos processos de produção que serão utilizados e a forma de constituição adotada pela sociedade.”


8. Intervenção Estatal e o Direito ao Planejamento Global


O poder fiscal do Estado intervém diretamente no patrimônio pessoal do contribuinte, logo, está diretamente ligado ao poder de destruir.


 “O poder fiscal envolve o poder de destruir.”[34]


Todavia, não se pode simplesmente abstrair a figura estatal; a teoria minimalista de Estado não pode ser aplicada, visando única e exclusivamente ao interesse particular. Tanto é assim, que o povo de um Estado outorga ao seu governo o direito de impor contribuições sobre si próprio e sobre seus bens, e como as exigências do governo não podem ser limitadas, inexiste limite ao exercício deste direito, confiado no interesse do legislador e na influência dos eleitores sobre seus representantes, para a proteção contra seu abuso.


Assim, da mesma forma que o Estado busca avançar no patrimônio do contribuinte, esse busca meios para opor-se à invasão e diminuir a carga tributária; vislumbra-se uma atitude legítima à luz das afirmações de que ninguém é obrigado a seguir pelo caminho mais oneroso e, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer nada, senão em virtude de lei.


Por mais paradoxal que possa parecer, evitar ou diminuir a tributação não é necessariamente ilegal. O planejamento global se atém às formas lícitas de minorar ou evitar o pagamento de tributos.


Posto que existam aqueles afirmando ser o planejamento global uma forma de burlar a lei, entendemos, como acima demonstrado, que ninguém está obrigado a agir de maneira pela qual resulte maior carga de impostos e é assim que o planejamento ajudará na escolha do melhor caminho que representará o menor ônus para cada atividade específica num exercício de liberdade indubitavelmente assistida pelos princípios basilares da Constituição Federal Brasileira.


Nas palavras de Hugo de Brito Machado[35]:


“Admitir-se que a interpretação da lei tributária pode configurar crime equivale a abolir as garantias constitucionais do contribuinte, deixando-o obrigado a adotar, sempre, a interpretação da qual resulte maior ônus tributário, pois do contrário estará em todos os casos sujeito à imputação de cometimento criminoso.”


Nasce desta forma, acompanhando a festejada contribuição de Cinthia Ribeiro[36], o Direito ao Planejamento tributário:


“Também chamado de direito à economia de tributos, o direito ao planejamento tributário aparece como uma permissão legal para a pessoa organizar seus negócios da maneira legítima e mais eficiente. É uma decorrência lógica do princípio da liberdade de contratar, direito fundamental, que também é base para os direitos de liberdade econômica e de livre iniciativa – também relacionados ao direito ao planejamento tributário – conforme se extrai dos artigos 1º e 170 da Constituição Federal de 1988.”


Escol doutrina na mesma linha de raciocínio traz Diva Malerbi[37]:


“A liberdade proporcionada pela não-regulação tributária representa, na verdade, um limite jurídico ao poder do Estado, em uma de suas manifestações (a ação estatal de tributar), e uma área de proteção jurídica do particular, porquanto o Estado nela não pode interferir, sob pena de inconstitucionalidade.


Vale dizer, o ordenamento jurídico brasileiro não só permite a existência de uma esfera de liberdade na tributação (não-regulação), mas também a protege, por impor ao Estado a obrigação de não interferir nessa área reservada ao particular (além do limite: a lei).”


Sob esse prisma traz-se a lume uma afirmação pontual: O Planejamento Global é além de um direito do empresário em diminuir o avanço do Estado sobre seu patrimônio, um dever a ser estimulado para que se possa melhor e mais seguramente gerir sua empresa e atender a função social, não se furtando ao lucro (objetivo final).


9. Dificuldades Nacionais


Pesa sobre o empresário uma carga tributária incompatível com o retorno oferecido pelo Poder Público à sociedade. Constata-se isso com atenção ao sistema educacional que se apresenta caótico, a segurança pública eivada de falhas e corrupção, a previdência social inoperante, o sistema habitacional em colapso e o Poder Judiciário anhoto[38].


Vários tributos cobrados no país foram declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, mas, ainda assim, para que o contribuinte possa ter a sua restituição deve recorrer ao Poder Judiciário. Exemplos são numerosos: majoração da alíquota do FINSOCIAL para as empresas comerciais e industriais; empréstimo compulsório sobre combustíveis, aquisição de veículos e passagens para o exterior; PIS calculado sobre a receita bruta (Decretos-Leis nº 2.445 e 2.449/88); entre outros.


Não há como precisar a quantia de normas que regem todo o Sistema Tributário Nacional. Há muito, a doutrina não mais avalia os tributos de forma quantitativa. Mas para se ter uma idéia, o IBPT[39] estima que em 2005 foram necessários 140 dias de trabalho para pagar a tributação sobre os rendimentos, consumo, patrimônio entre outros, e que o valor total chegou a 38,35% do rendimento bruto do contribuinte naquele ano.


Leve-se em conta ainda que o contribuinte deverá gastar com serviços privados[40] em substituição àqueles que deveriam ser fornecidos pelo Poder Público, logo, o percentual acima mostra-se aquém da realidade por não incluir essas “nuanças” trazidas pela mazela estatal.


Numa escatológica visão numérica, contabilizam-se mais de 3,4 milhões de normas nos 17 anos da Carta Constitucional vigente. Estudos do IBPT citados acima trazem ainda que:


“Desde 05 de outubro de 1988 (data da promulgação da atual Constituição Federal), até 05 de outubro de 2005 (seu 17º aniversário), foram editadas no Brasil 3.434.805 (três milhões, quatrocentos e trinta e quatro mil, oitocentas e cinco) normas que regem a vida dos cidadãos brasileiros. Isto representa, em média 554 normas editadas todos os dias ou 812 normas editadas por dia útil”.


Por conta dessa legiferância, que nem sempre é técnica, o sistema tributário nacional é complexo, moroso e injusto.


Em sendo assim, é premente a interação entre todos os setores da empresa (contadores, advogados, administradores, diretoria, RH, et cetera), bem como um estudo multidisciplinar e atualizado na realidade normativa de cada atividade exercida, para assim o planejamento global ser satisfatório e viabilizar uma melhora significativa com reflexos inclusive para a sociedade.


9.1 Complexidade, Morosidade e Injustiça


Certamente o Sistema Tributário do Brasil é injusto, desrespeitando dentre outros princípios, o da capacidade contributiva e o da não-cumulatividade. Não se contestam os princípios constitucionais tributários, mas sim, seu desrespeito por parte do Governo. Furtar-se aos princípios é ferir de morte os alicerces do Direito.


É também complexo e moroso por conta da quantidade de tributos e leis, excessivos prazos e recursos favorecendo o governo nas execuções fiscais e da “agilidade” do Judiciário para julgar cada uma destas ações.


O custo tributário indireto (pessoal, equipamentos, materiais, enfim, burocracias) que as empresas arcam para tentar cumprir com suas obrigações é, por reflexo, demasiado. E pior, não há certeza de se estar procedendo corretamente.


Mais contundente é Danilo Polacinski[41]:


“Com o advento de sucessivas leis, os contribuintes sentem-se perdidos quanto ao cumprimento de suas obrigações. E, ainda para agravar o quadro, as inúmeras propostas de anistia para os devedores de impostos (REFIS, por exemplo), consolidam a máxima brasileira: ‘quem paga em dia seus tributos paga mal’”. (destacado)


Outro problema de capital envergadura é a multiincidência de tributos sobre uma mesma operação[42]. V.g. o IPI que incide sobre o ICMS; o PIS e a COFINS que incidem sobre o ICMS. O Princípio da Não-cumulatividade visa justamente evitar o efeito “cascata” da tributação dos impostos. Quando há um ciclo econômico composto de várias etapas, a incidência de um imposto em uma operação servirá como base de cálculo do imposto incidente na etapa posterior, gerando a cumulatividade da tributação.


No que tange ao efeito cascata são conhecidos dois tipos. O primeiro deles, denominado horizontal, é marcado pela incidência repetidas vezes de um mesmo tributo nas várias etapas de produção ou circulação; o outro é chamado de vertical, ocorre quando da incidência de um determinado imposto sobre o valor de outros impostos. É o caso do PIS e da Cofins incidindo sobre o ICMS, o INSS e o IRPJ.


10. Planejamento Global como ferramenta do empresário


Atualmente a minoração tributária deixou de ser uma mera opção ao contribuinte. Trata-se de uma necessidade empresarial. Sendo o custo tributário o principal na composição do preço final de qualquer produto ou serviço, compete ao bom empresário reduzi-lo ao máximo, possibilitando maior competitividade.


Com a globalização da economia, e conseqüente entrada de produtos estrangeiros no mercado nacional, a empresa deve se atentar para o planejamento global, como uma questão de sobrevivência, e não se furtando à sua obrigação, deverá ainda assegurar que cumpra a função social.


A preocupação principal do empresário é a redução do custo do seu negócio pois, aliada à qualidade do produto ou serviço, o consumidor procura preço; existe ainda o interesse coletivo que, além de preço e qualidade, agregam outras exigências como a função e a responsabilidade social.


Assim, trata-se de item importantíssimo, senão o de maior importância, a se considerar quando do planejamento empresarial. Como a sonegação fiscal tem sido combatida através da aplicação de leis cada vez mais punitivas se torna indispensável a utilização do planejamento global como elemento diferenciador de uma gestão empresarial voltada à lucratividade sob a égide da licitude.


11. CONCEITUAÇÃO


Trata o planejamento global de um procedimento por meio do qual se escolhe entre as alternativas de ações ou omissões lícitas, prévias a ocorrência do fato gerador e que objetive direta ou indiretamente a redução, diferimento ou postergação do ônus tributário, interligando para isso, todos os setores envolvidos direta ou indiretamente com a relação tributária[43].


O planejamento é recurso lícito a serviço do contribuinte, que tem o direito de planejar, organizar e administrar seus negócios ou seu acervo patrimonial em moldes tais que o sujeitem a menor carga fiscal possível.


O contribuinte ou empresário, quando adota procedimentos de planejamento global, está bem gerindo seus negócios, porquanto reduzindo custos. Trata-se de uma decisão análoga à compra de determinada mercadoria por preço menor, em igualdade de condições.


E como bem pontua Alfredo Becker[44]:


“Ora, todo indivíduo, desde que não viole regra jurídica, tem a indiscutível liberdade de ordenar seus negócios de modo menos oneroso, inclusive tributariamente. Aliás, seria absurdo que o contribuinte, encontrando vários caminhos legais (portanto, lícitos) para chegar ao mesmo resultado, fosse escolher justamente aquele meio que determinasse pagamento de tributo mais elevado.”


Com a doutrina, também os tribunais têm reconhecido essa possibilidade desde há tempo. Neste sentido, o extinto Tribunal Federal de Recursos[45] assentou:


“O Contribuinte, no entanto, seja empresa, ou pessoa natural, tem o direito de ordenar sua atividade negocial como lhe parecer conveniente; é direito do contribuinte diligenciar por eximir-se às incidências fiscais como suposto, notadamente em matéria de imposto de renda, atividade negocial fruto da livre manifestação da vontade do contribuinte. Assim, se este considera que já conta, previamente, com determinados rendimentos, cabe-lhe o indisputável direito de decidir, em face da legislação vigente, por desenvolver ou restringir sua atividade, ante a perspectiva de ganhos de tal ou qual montante”.


Nos Estados Democráticos de Direito, as Constituições têm consagrado a regra de que ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Dedução óbvia: para que o contribuinte seja obrigado a adotar caminho tributariamente mais dispendioso é absolutamente necessário defenestrar garantias constitucionais.


Vige no sistema jurídico o que Victor Ucmar, jurista italiano, denominou de princípio da auto-tributação. Ao contrário do que ocorria no Império, no Estado de Direito cabe ao povo, por meio de seus representantes no Parlamento e nas Casas Legislativas, a autorização para que seja retirado do seu patrimônio particular a parcela chamada tributo e a dimensão dessa retirada; referência e conteúdo do princípio da legalidade tributária[46]. A tributação representa uma exceção ao princípio maior, o da propriedade privada, postulado fundamental do regime da livre iniciativa, pelo qual nossos constituintes de 1988 optaram[47].


Por isso, se fala em direito tributário, no princípio da estrita legalidade ou da tipicidade cerrada. Toda a hipótese do fato, nos seus vários aspectos, as pessoas envolvidas, a base de cálculo e a alíquota de qualquer tributo têm que estar minuciosamente previstas em lei, sob pena dele não poder ser exigido.


12. Modus operandi


O principal método de planejamento é aquele feito de modo personalizado, atentando-se para características peculiares da empresa, tais como o histórico, a composição societária, o ramo em que atua, a filosofia empresarial, qualidades subjetivas e perfis dos clientes, bem como dos fornecedores, e ainda o tipo de operações financeiras que realiza, et cetera.


Buscar um modelo pronto no mercado não traz resultados satisfatórios e, inclusive, pode gerar perdas, pois cada grupo empresarial, ou cada empresa, tem mecanismos diferentes entre si, ainda que de mesmo ramo e instaladas em áreas geográficas próximas.


Muitas das vezes, mudanças nas práticas e rotinas das empresas permitem uma substancial economia no montante gasto com os tributos e um melhor gerenciamento em relação ao momento de sua exigibilidade.


Em análise à empresa, o planejamento global põe foco nas esferas administrativa, fiscal, contábil e judicial.


Na esfera administrativa, visa identificar e adotar hipóteses que possam desonerar a carga tributária global nas empresas. No campo fiscal, o foco é para o devido cumprimento das obrigações acessórias, que possam incentivar um processo de fiscalização. Outro ponto a ser considerado é a legalidade de determinados procedimentos realizados pelas empresas, buscando a alternativa mais econômica. Já, contabilmente, deve-se observar a validade dos dados fornecidos que dão suporte às operações.


O Planejamento tributário, em sentido estrito, tem três finalidades, quais sejam, evitar a incidência do tributo, reduzir o montante do tributo devido e postergar o momento de sua exigibilidade. Com efeito, o que deve ser observado para realizar um planejamento tributário responsável são os procedimentos contábeis e operacionais da empresa. No caso da empresa estar realizando atos que gerem acréscimo em sua carga tributária, a função dos analistas consiste em estudar e optar pelas alternativas operacionais que, respaldadas em lei, possam desonerar seus encargos.


Conhecido o plano de atuação estratégica da empresa, com todas as particularidades acima descritas, o planejamento identificará todos os processos e variantes que geram a implementação de fatos geradores de tributos e a variação da carga tributária pela diferenciação de alíquotas em função dos locais de produção e/ou distribuição.


A partir de então, partirá para o estudo da viabilidade jurídica e empresarial da supressão e/ou modificação de determinados procedimentos em confronto com os conseqüentes impactos na inexigibilidade tributária ou na redução dos valores devidos.


O planejamento in loco é o único que pode resultar em real economia para a empresa, sem a preocupação com posteriores complicações com o Fisco. A análise das rotinas e procedimentos operacionais, além de visualizar a empresa globalmente, deve assegurar que fornecedores e clientes sejam considerados na sistemática empresarial como um todo inserido no mercado, não como células isoladas.


Em representação esquemática dos parágrafos acima tem-se que, com foco na redução da carga tributária, o procedimento do planejamento global atua basicamente de quatro maneiras, quais sejam:


a) Preventivamente, de forma a evitar que se concretize a hipótese de incidência do tributo;


b) impedir ou retardar a ocorrência do fato gerador;


c) minimizar ou eliminar a alíquota ou a base de cálculo aplicável;


d) elastecer os prazos de recolhimento dos tributos.


Podendo operar em diferentes esferas:


a) No âmbito da própria empresa, através de medidas gerenciais que possibilitem a não ocorrência do fato gerador do tributo, que diminua o montante devido ou que adie o seu vencimento. V.g. para possibilitar a diminuição do ICMS a empresa poderá mudar a sua sede para outro Estado.


b) No âmbito da esfera administrativa que arrecada o tributo, buscando a utilização dos meios previstos em lei que lhe garantam uma diminuição legal do ônus tributário. V.g. para adiar o pagamento de um auto de infração pode o contribuinte impugná-lo na esfera administrativa, contestando a sua imposição. No mínimo ganhará tempo para pagá-lo, suspendendo a execução da dívida até a decisão final.  Com essa atitude, o valor do débito passa a ser somente corrigido pelo índice oficial, não havendo aumento da multa ou dos juros.


c) No âmbito do Poder Judiciário, através da adoção de medidas judiciais, com o fim de suspender o pagamento (adiamento), diminuição da base de cálculo ou alíquota e contestação quanto à legalidade da cobrança. V.g. como existem tributos sendo cobrados com alguma ilegalidade (ou mesmo inconstitucionalidade) pode o contribuinte recorrer ao Poder Judiciário para contestá-lo. Outro fator favorável é relativo à quantidade de normas tributárias, ocorrendo, muitas vezes contradição entre elas. Como no Direito Tributário vige o princípio da dúvida em favor do contribuinte, compete a ele, então, descobrir estas contradições e utilizar-se delas sempre que possível.


A interação subjetiva que ocorre na empresa é no sentido de que mais vale a informação circulando do que o conhecimento retido. Assim, advogado, contador, diretor e demais empregados deverão agir e informar quais as vantagens para cada um dos respectivos setores, em assim fazendo, as ações que deverão ser tomadas antes da incidência do fato gerador, o serão com mais precisão e garantia de sucesso.


Visando, sobre tudo, três finalidades:


a) evitar a incidência do imposto: tomam-se providências com a finalidade de evitar a ocorrência do fato gerador do tributo. Ex.: Para que a empresa não precise pagar o INSS sobre o “Pro-Labore“, os sócios fixam um valor pequeno de retiradas, e sacam a maior parte como lucros, pois desde janeiro de 1996 eles não sofrem incidência do IR nem na fonte nem na declaração.


b) reduzir o montante do tributo: as providências são no sentido de reduzir a alíquota ou a base de cálculo do tributo. Ex.: Empresa estabelecida no Paraná, em que a maior parte das suas vendas são estaduais (alíquota de 17% de ICMS), podem transferir sua sede para um Estado vizinho e então fazer operações interestaduais de ICMS, em que a alíquota seja de 12%.


 c) retardar o pagamento do tributo: o contribuinte adota medidas que têm por fim postergar (adiar) o pagamento do tributo, sem a ocorrência da multa.  Para tanto é necessária a adoção de medidas administrativas ou judiciais. Ex.: no caso de dúvida quanto à incidência de determinado tributo sobre uma operação, a empresa pode ingressar com uma consulta fiscal pleiteando pagar uma alíquota menor e calcular o tributo sobre uma base de cálculo menor.  Enquanto não julgada a consulta a empresa poderá pagar o menor valor de tributo, evitando assim a multa.


O planejamento, visto ser a opção por hipóteses lícitas e juridicamente capazes de realizar o mesmo efeito com menor onerosidade, sugere fundamentalmente uma atividade de cunho preventivo, isto é, deve ser adotado (preferencialmente) antes da ocorrência do fato gerador, somente então terá eficácia de impedir ou diferir a constituição do crédito tributário.


Ademais, deverá atuar sobre fatos e circunstâncias que se situem dentro da realidade econômica subjacente. Não deverá ter por objeto operações inexistentes, criadas tão somente para esquivar-se ao pagamento do imposto, pois, nestas circunstâncias, provavelmente, haverá simulação.


13. ELISÃO, EVASÃO E SONEGAÇÃO FISCAL


Em que pese a existência de grandes divergências doutrinárias acerca das características e classificação da evasão – como o fluxograma de evasão proposto por Sampaio Dória[48], bem como a divisão da simulação em absoluta e relativa metodicamente trabalhada por Alberto Xavier[49] – foge ao escopo deste trabalho se aventurar a descrever as nuanças de cada corrente. Adota-se aqui o pensamento tido por moderno, que retrata os elementos essenciais da evasão, elisão e sonegação sem se preocupar com preciosismos de questionável aplicação prática.


Tendo em mente o conceito e os elementos caracterizadores do fato gerador[50], a compreensão da diferença entre planejamento tributário, evasão e sonegação fiscal torna-se mais clara, porquanto somente se revestem de legitimidade e licitude as condutas que efetivamente evitam a concretização do ato ou fato que geraria a incidência do tributo.


Em contrapartida, a omissão de fato gerador já concretizado ou mesmo a utilizações de meios fraudulentos ou ardis para mascarar ou ocultar futuras hipóteses de incidência tributária caracteriza a prática de procedimentos ilícitos de evasão ou sonegação fiscal.


Ressalte-se que a prática de fraude, para fins de caracterização de evasão ou sonegação fiscal, depende da adoção de condutas que não são próprias a evitar a concretização do fato gerador, mas que se destinam, exclusivamente, a mascarar ou ocultar a sua ocorrência.


A elisão fiscal consiste no ato, ou série de atos, praticados antes da realização do fato jurídico tributário, visando economia fiscal mediante a utilização de alternativas menos onerosas e legalmente admitidas.


Diva Malerbi[51], em sua magistral obra Elisão Tributária, discorre sobre a elisão:


 “Expressa-se assim, o comportamento elisivo na prática de atos ou negócios jurídicos que são fundamentalmente motivados pelos efeitos tributários (mais benéficos dela decorrentes). A escolha de tais atos ou negócios é essencialmente determinada pela intenção de evitar-se determinada incidências tributárias, equiparando-se o resultado prático obtido aos daqueles atos ou negócios jurídicos sujeitos ao regime tributário desfavorável.”


Nas palavras de Miguel Hilu Neto, proferidas em aula de pós-graduação na Universidade Estadual de Londrina, tem-se por elisão:


 “… um expediente utilizado pelo contribuinte para atingir um impacto tributário menor, em que se recorre a um ato ou negócio jurídico real, verdadeiro, sem vício no suporte fático, nem na manifestação de vontade, o qual é lícito e admitido pelo sistema jurídico brasileiro. É um proceder legalmente autorizado, que ajuda a lei tributária a atingir a sua finalidade extra-fiscal, quando presente. Pressupõe a licitude do comportamento do contribuinte. É uma forma honesta de evitar a submissão a uma hipótese tributária desfavorável.”


Nada obsta, por exemplo, que o pai de família integralize todos os seus bens imóveis no capital de sua empresa e, posteriormente, doe as quotas da sociedade a seus filhos, evitando assim a incidência do imposto sobre doações.


A elisão é permitida pela legislação, e a ela não se aplica o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional. Em contrario senso, essa norma estaria eivada de inconstitucionalidade, por desrespeitar os princípios constitucionais da segurança jurídica, certeza do direito e legalidade.


A Lei Complementar 104/01, nesse aspecto, introduziu no artigo 116 do CTN o seguinte parágrafo único:


 “A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária“.


Dissimular, neste caso, quer significar ocultação, disfarce. Uma hipótese de evasão fiscal. É a figura que mais costuma ser confundida com elisão fiscal, mas guarda diametral diferença.


Na simulação tem-se a pactuação de algo distinto daquilo que realmente se almeja, com o fito de se obter vantagem. Uma verdade aparente (jurídica) encobrindo uma verdade real, que não é claramente perceptível.


O fato de as exposições de motivos constantes da Lei Complementar em comento considerarem que os planejamentos fiscais implicam diminuição de arrecadação, e que por isso deveriam, por meio da lei, ser combatidos, não significa ter sido essa a hipótese contemplada pela norma; se na elisão fiscal não há fato gerador ocultado ou disfarçado, pois o fato típico foi licitamente evitado, não há como haver desconsideração do mesmo, com o conseqüente estabelecimento da verdade jurídica.


Significa dizer que o simples fato de um pai vender um imóvel ao seu filho não pode, por si só, conduzir à conclusão de que o negócio jurídico efetivamente ocorrido foi o de doação com base tão-somente na menor ou maior incidência do tributo em uma ou noutra operação.


Nunca é demais lembrar que o Código Tributário Nacional e, desde 2002 o Novo Código Civil prevêem a responsabilização pessoal dos Administradores e responsáveis em caso da realização de práticas dolosas prejudiciais aos cofres públicos e em caso de abuso da personalidade jurídica.


Na evasão fiscal, o contribuinte busca, antes ou depois da submissão a uma hipótese tributária desfavorável, um modo de mascarar seu comportamento de forma fraudulenta. Aí é diferente e cabe ao Fisco utilizar suas prerrogativas de função administrativa para evitar o ilícito.


Assim sendo, considera-se a evasão fiscal como proibida, pois fraudulenta. Contra ela, e em prejuízo exclusivamente dela, o parágrafo único do artigo 116 do CTN se volta. Evasão conceitua-se como o ato omissivo ou comissivo, de natureza ilícita, praticado com o fim único de diminuir ou eliminar a carga tributária, ocultando o verdadeiro ato ou a real situação jurídica do contribuinte.


Como exemplos, podemos citar duas situações: 1) consta do contrato social da empresa que seu estabelecimento é em determinado Município, em que a alíquota do ISS é baixa, mas, no entanto, esta pessoa jurídica está estabelecida, de fato, em outra cidade, em que não é contribuinte do imposto; 2) pessoa jurídica celebra contrato de compra e venda de mercadorias com empresa e bens inexistentes, aproveitando-se dos pretensos créditos de ICMS constantes de notas fiscais frias;


Esses atos, assim, deverão ser desconstituídos pela autoridade fiscal, que presumirá a ocorrência do evento descrito no fato jurídico e arbitrará a base calculada dos respectivos tributos[52], já que, no primeiro exemplo, o contribuinte dolosamente ocultou o fato de não estar estabelecido no Município cuja alíquota é mais vantajosa, apenas formalmente encontrando-se naquele território e, no segundo há um aumento artificial de créditos, implicando a diminuição do ICMS a pagar quando os mesmos forem opostos aos débitos.


No que concerne à sonegação, costuma haver certa confusão na situação em que alguém pode ser sonegador ou apenas devedor de determinado tributo.


Maria Lúcia A. dos Reis e José C. Borges[53] apresentam com clareza a referida dúvida:


“De um modo geral, a imprensa costuma confundir o leitor sobre o conceito de sonegação fiscal. Fala-se com a maior rapidez, Fulano é sonegador, quando, na realidade, o Fulano apenas não pagou o tributo no seu devido tempo. Deixar de pagar tributo, nos prazos previstos em lei, é infração à legislação tributária sujeita à sanção pecuniária, mas não necessariamente crime contra a ordem tributária tipificado como sonegação. Para que a infração possa ser caracterizada também como crime é imprescindível a existência de outros elementos, como o dolo e a exigibilidade do tributo.”


Nos crimes contra a ordem tributária, previstos nos artigos 1° e 2° da Lei 8.137/90, a atividade do autor consiste em suprimir ou reduzir tributo ou contribuição social, ou qualquer acessório, mediante a prática das condutas descritas em seus incisos. A intenção do agente, chamada de dolo, que constitui o elemento subjetivo do tipo penal, deve estar, necessariamente, voltada para o não pagamento do tributo. Se não estiver, ou se a existência dessa intenção não for comprovada, não se pode falar em sonegação, ou crime contra a ordem tributária, pois o elemento subjetivo (dolo) é pressuposto do tipo penal.


Em se tratando de infração pura e simples a legislação tributária, o elemento dolo, ou seja, a vontade do agente, é totalmente prescindível. Se cuida aqui de responsabilidade objetiva, que resulta apenas da prática do ato contrário à lei tributária. Pouco importando, se o contribuinte quis pagar o tributo e não conseguiu. O simples fato de não pagar, por si só, já caracteriza infração à legislação tributária, porque, no caso, a responsabilidade é objetiva.


Há crimes cuja caracterização independe da vontade do agente, posto serem punidos a título de culpa resultante de imprudência, imperícia ou negligência.


O crime contra a ordem tributária jamais é punido a título de culpa, pois se trata de crime que exige o elemento subjetivo para sua configuração. Outro elemento necessário à configuração do crime contra a ordem tributária é a exigibilidade do tributo. Uma vez que o tributo tem a natureza jurídica de obrigação prevista em lei, a exigibilidade deve estar, intrinsecamente, ligada à uma causa jurídica e esta causa jurídica, por sua vez, não pode contrariar a Constituição, ou a lei complementar que o disciplina.


Se o tributo contrariar, por exemplo, o princípio da legalidade tributária, por ter sido instituído por meio de decreto, ao invés de lei, esse tributo torna-se inexigível face à ausência da causa jurídica que o legitima. O contribuinte não é obrigado a pagá-lo e não se pode dizer que cometeu crime contra a ordem tributária, porque deixou de fazê-lo, uma vez que se trata de obrigação destituída de exigibilidade. Obviamente, enquanto a ilegalidade do tributo não for declarada pelo STF e a exigência não for suspensa por resolução do Senado, recomenda-se que conteste a cobrança junto ao Judiciário, pois, assim estará protegendo o direito de não pagar.


Portanto, não é sonegador aquele que simplesmente deixou de pagar o tributo; pode este contribuinte não estar obrigado a fazê-lo ou pagar a menor por erro de fato. Na esfera jurídica qualquer palavra tem um peso muito maior do que no cotidiano, razão pela qual deve ser tratada com a maior cautela possível, e sobre essa falta de tecnicismo ou lacuna legislativa é que atua o empresário por meio do planejamento global.


14. NORMA GERAL ANTI-ELISÃO


Após o advento da Lei Complementar 104/2001, muito se tem discutido na doutrina a respeito da norma geral anti-elisão, que se trata de uma norma dirigida ao aplicador da lei tributária, autorizando-o a fugir dos limites da norma tributária definidora da hipótese de incidência do tributo, para alcançar situações nela não previstas.[54]


Parte da doutrina assevera que o parágrafo introduzido trata de norma anti-elisão. E dentre estes doutrinadores, uns entendem pela constitucionalidade desse parágrafo, enquanto outros por sua inconstitucionalidade.


Aqueles que se posicionam favoravelmente buscam fundamento no critério de interpretação da norma, que deveria ser orientado pela busca do pluralismo de valores com equilíbrio entre a liberdade, justiça e segurança jurídica[55].


Ainda dentro dessa linha dois regimes poderiam ser compreendidos na Lei Complementar nº 104/2001.


O primeiro consistiria na previsão de norma anti-elisiva geral disposta no Código Tributário Nacional associada à legislação ordinária meramente procedimental dos membros da Federação, sendo que alguns requisitos deveriam ser preenchidos para que a norma anti-elisiva geral pudesse ser considerada constitucional. Primeiramente, o aplicador da norma tributária deveria ponderar interesses na solução do conflito e atuar de forma motivada e transparente, sempre à luz de critérios objetivos e em respeito a lei ordinária de cada ente federativo.


Por outro lado, o contribuinte deveria ter a garantia de uma ampla defesa, contraditório e controle do ato de desconsideração. O segundo regime disporia sobre a norma anti-elisiva genericamente no Código Tributário Nacional e deixaria a cargo do legislador de cada ente federativo a confecção de norma anti-elisiva específica, contendo a lista dos atos ou negócios não oponíveis à autoridade tributária. Também neste regime o Fisco deveria atuar de forma clara, motivada e através da ponderação de interesses, garantindo ao devedor oportunidade para se defender.


Há, por sua vez, vertente que defende a inconstitucionalidade da LC 104/2001, pois, dentre outras afrontas à Constituição Federal, entendem a norma anti-elisiva violar os princípios da estrita legalidade e da segurança jurídica.


É certo que se a LC 104/2001 houvesse instituído a norma geral anti-elisão seria ela inconstitucional pelas razões expostas nessa segunda corrente. Não há que se falar em constitucionalidade de tal norma no sistema jurídico positivo brasileiro, pois nosso sistema consagra o princípio da estrita legalidade, conferindo-lhe a posição de cláusula pétrea. É, pois, a norma anti-elisão absolutamente incompatível com nosso ordenamento.


No entanto, uma análise mais acurada do parágrafo único em comento permite concluir que, apesar dos acalorados debates acerca de suas inconstitucionalidades, não foi instituída norma anti-elisão alguma.


Como dito acima, dispõe o parágrafo único do artigo 116 que:


 “a autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”. (destaque).


A palavra-chave dessa proposição normativa é o termo “dissimular” que já foi mencionado parágrafos acima.


Dadas as definições enunciadas neste trabalho e seguindo os passos de substancial parte da doutrina, é o entendimento no sentido de que dissimulação nada mais é que sinônimo de simulação.


E simulação, além de estar prevista no artigo 149, inciso VII, do Código Tributário Nacional, é tema tratado pelo artigo 167, § 1º. do Código Civil Brasileiro, que  prevê a nulidade do negócio jurídico praticado conforme os incisos daquele parágrafo, bem como pelo artigo 102 do Código Civil de 1916.


Vale ressaltar, no entanto, que a intenção do Fisco com a inserção do parágrafo único no art. 116 do CTN não era somente dispor da simulação expressamente para fins tributários, mas sim tratar de norma anti-elisão, conforme se extrai da Exposição de Motivos do Projeto de Lei Complementar 77/99, que resultou na promulgação da LC 104/01, em seu item 6:


 “A inclusão do parágrafo único ao art. 116 faz-se necessária para estabelecer no âmbito da legislação brasileira, norma que permita à autoridade tributaria desconsiderar atos ou negócios praticados com finalidade de elisão, constituindo-se, desta forma, em instrumento eficaz para o combate aos procedimentos de planejamento tributário praticados com abuso de forma ou de direito.”


No entanto, Exposição de Motivos não tem qualquer validade jurídica; importa tão-somente o conteúdo da lei. Desse modo, conclui-se que o parágrafo introduzido pela referida lei complementar nada veio a acrescentar ao ordenamento positivo brasileiro.


Questão central das discussões concernentes ao planejamento tributário reside no entendimento dos limites de manifestação de vontade do aplicador da norma tributária no caso concreto. Fundamental, pois, a exposição dos princípios da legalidade, estrita legalidade e da tipicidade tributária, que estabelecem de forma clara o papel do legislador e do aplicador do direito em matéria tributária.


14.1. Princípio da Legalidade


O princípio da legalidade “geral” vem expresso na Constituição Federal, em seu art. 5º, II, ao enunciar que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Esse princípio é apanágio do próprio Estado Democrático de Direito, uma vez que nele é assegurado o “império da lei“. Por óbvio não estamos a tratar de princípio exclusivamente tributário, mas é certo que emana peculiaridades nesta esfera[56].


Tal princípio é uma forma de proteção da liberdade, visto que impede uma intervenção do Estado sobre a pessoa que não advenha de lei. É oportuna a citação do artigo 6º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789[57]:


“A liberdade consiste no poder de fazer tudo o que não ofende outrem; assim o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem outros limites além daqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo destes mesmos direitos. Estes limites não podem ser estabelecidos senão pela lei.”


A legalidade é a situação de conformidade com o direito positivo, independentemente do consenso social, de maneira que norma, embora formalmente perfeita, pode ser ilegítima, se não tiver, na sua origem, órgãos autênticos da representação popular.


14.2. Princípio da Estrita Legalidade:


Como visto, o princípio da legalidade é basilar, aplica-se a todos os ramos do Direito. Bastava que figurasse somente nestes termos genéricos para que tivesse eficácia da mesma forma também no âmbito tributário.


A diferença seria que estaríamos defronte de um princípio da legalidade tributária implícito. No entanto, capital é a importância deste princípio e de tal monta que o legislador constituinte optou por deixar expresso na Constituição o princípio específico da legalidade para a área tributária, com o intuito de proteger o contribuinte[58].


“Art. 150 (…), I – Sem prejuízo de ouras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.[59]


Ocorre que o sistema jurídico brasileiro é ainda mais rigoroso na matéria tributária, pois vige o princípio da estrita legalidade tributária, pelo qual se entende lei em seu sentido estrito. Assim, somente lei ordinária[60] pode criar o tributo. Ou seja, não basta que, por exemplo, o Município expeça um decreto para que o tributo esteja sob a legalidade. O sistema brasileiro prescreve que a lei que cria ou aumenta tributo deve ser editada somente pelo poder legislativo mediante lei ordinária. E ainda, este poder legislativo deve ser o competente para tanto.


Deve-se esclarecer precisamente o que esse princípio quer significar. O seu conteúdo afirma que a norma tributária que cria ou aumenta tributo seja detalhadamente definida pela lei ordinária. Devendo ser descrito abstratamente “sua hipótese de incidência, seu sujeito passivo, seu sujeito ativo, sua base de cálculo e sua alíquota.(…) Portanto, as exigências do princípio da legalidade tributária são cumpridas quando a lei delimita, concreta e exaustivamente, o fato tributável.[61]


14.3. Princípio da Tipicidade Tributária:


O princípio da tipicidade enuncia que não basta simplesmente exigir-se lei formal e material para criação do tributo, pois é necessário que a lei que crie um tributo defina tipo fechado, cerrado, todos os elementos da obrigação tributária, de modo a não deixar espaço algum que possa ser preenchido pela Administração em razão da prestação tributária corresponder a uma atividade administrativa plenamente vinculada.


Diverge a doutrina quanto à questão de ser ou não esse um princípio autônomo ou ser um dos aspectos do princípio da legalidade ou, ainda, confundir-se com o princípio da legalidade. Alberto Xavier entende que a tipicidade é “a expressão mesma deste princípio (legalidade) quando se manifesta na forma de uma reserva absoluta de lei.” [62]


Por sua vez, Sacha Calmon N. Coêlho ensina que “enquanto o princípio da legalidade diz respeito ao veículo (lei), a tipicidade entronca com o conteúdo da lei (norma)” e ainda que “tipicidade ou precisão conceitual é o outro nome do princípio da legalidade material[63] e [64]


15. Teorias Limitadoras do Planejamento Tributário


O Fisco e sua claque têm se utilizado de teorias que em maior parte derivam do ordenamento jurídico teutônico, para ampliar a caracterização de situações proibitivas de planejamento tributário. Relevantemente citadas nesse ponto enquanto doutrina, todavia carecedoras de aplicação no ordenamento jurídico brasileiro porquanto afrontam princípios constitucionais.


Asseclas dessas teorias entendem que o direito tributário utiliza-se de cláusulas gerais e princípios indeterminados; Dessa forma impedem o fechamento total dos conceitos. São teorias que “elastecem” o princípio da estrita legalidade tributária, alterando seu alcance e significado, tornando-o aberto à interpretação e à complementação judicial.


15.1. Teoria da Interpretação Econômica do Direito Tributário


Denominada, também, de teoria da consideração econômica ou da preponderância do conteúdo econômico dos fatos, essa teoria tem por finalidade buscar o significado econômico das leis tributárias, respaldando-se nos princípios da isonomia e da capacidade contributiva, bem como no artigo 109 do CTN.


Os adeptos da interpretação econômica em Direito Tributário pregam a dilatação da interpretação da norma tributária, conferindo poderes para autoridade fiscal desconsiderar o fato jurídico tributário na forma jurídica adotada pelo sujeito passivo (menos onerosa), em prol da real atividade econômica praticada (mais onerosa).


Em outras palavras, a interpretação econômica seria, na visão de seus seguidores, o instrumento de aplicação do princípio da igualdade, onde situações econômicas iguais devem ser tratadas de maneira igual, independente da forma jurídica adotada na operação, visando a uma distribuição uniforme dos encargos sociais. Nessa visão, atos de substância econômica equivalente e indicativos de análoga capacidade contributiva deveriam sofrer tributação idêntica.


Com base no artigo 109 do CTN, deseja-se autorizar o intérprete a tributar igualmente duas situações jurídicas distintas, que demonstrem o mesmo resultado econômico, mas que somente a primeira tem seu fato gerador expressamente previsto em lei.


Para essa teoria o que interessa é o substrato econômico do fato e não a forma jurídica adotada (nomen iuris). O critério de tributação utilizado é a igualdade de conteúdo econômico demonstrado na operação, não importando qual a forma jurídica usada para realizar o negócio.


Em razão dos fundamentos apresentados por essa teoria, mister se faz proceder uma análise mais aprofundada do art. 109 do CTN, que trata das relações entre direito tributário e direito privado. In verbis:


 “Art. 109Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.”


Na verdade, ao contrário do que afirma a doutrina da interpretação econômica do Direito Tributário, o artigo acima especificado vem tão-somente deixar claro que os princípios gerais de direito privado não se utilizam para a definição de efeitos tributários. Significa dizer que os efeitos civis de determinado instituto de direito civil se restringem ao direito privado, sendo que o mesmo instituto pode ter efeitos tributários distintos dentro do direito tributário.


Exemplificando, o fato de um particular, aderente de contrato de adesão, desfrutar de posição favorável nas relações de direito privado, não o acarretará posição privilegiada na análise dos efeitos tributários do negócio celebrado perante o Fisco.[65]


Assim, não é conferido nesse artigo permissivo algum à autoridade fiscal para avaliar os negócios jurídico-privados pela sua substância econômica, desconsiderando sua substância jurídica.


Aliás, bastante oportuna a consideração de Luciano da Silva Amaro[66] quanto aos limites de atuação do intérprete tributário:


 “Se a lei tributária, referindo um instituto de Direito Privado, quiser dar efeitos iguais para outros institutos de Direito Privado (por exemplo, menciona a compra e venda e quer dar os mesmos efeitos fiscais à doação, ao aporte na integralização de capital etc.), isso é possível. Mas é a lei tributária que (se quiser e quando puder) deve dá-los, e não o intérprete.”


Qualquer exegese do art. 109 do CTN em prol da possibilidade de modificação da lei para considerar-se a substância econômica do ato, representa uma afronta aos princípios da legalidade e da segurança jurídica.


Até mesmo no que tange o princípio da isonomia supra referido; a regra não é tratar iguais de forma igual, data máxima vênia, tal princípio se concretiza ao tratar de forma desigual os desiguais na medida de sua desigualdade. Isso quer dizer que se há mais de uma opção para licitamente conseguir atingir o mesmo final, não está obrigado o empresário a seguir pelo caminho mais oneroso apenas porque outros que não fazem o planejamento seguem. Se trabalhando de forma diferenciada, deverá haver tratamento diferenciado nos tributos, na medida de sua diferenciação legal.


Ora, o planejamento tributário se vale de formas jurídicas alternativas e indiretas, porém plenamente de acordo com o princípio da legalidade e da tipicidade, que realmente representam o evento tributável, para atingir seus fins. Se não está existindo simulação ou fraude, não pode o Fisco desconsiderar a substância jurídica do ato, invocando sua substância econômica, simplesmente porque foi menos oneroso.


Atitude nesse sentido da autoridade fiscal fere de morte o princípio da estrita legalidade, que garante ao contribuinte o respeito à substância jurídica dos atos ou negócios jurídicos adotados.


Também entendendo pela incompatibilidade da interpretação econômica do direito tributário no ordenamento positivo brasileiro, o ilustre professor Xavier[67] é contundente ao discorrer sobre os principais motivos de repulsa a essa doutrina:


 “Pode, pois, dizer-se que a doutrina da interpretação econômica foi o cavalo-de-Tróia pelo qual se pretendeu legitimar a importação da analogia – até então vedada – para dentro dos muros dos tipos legais tributários. A doutrina da interpretação econômica das leis e dos fatos tributários, bem como a da aplicação analógica em caso de abuso de direito ou de abuso de formas foram e continuam sendo tentativas de “elastificação” dos tipos legais tributários, de modo a dotá-los de uma capacidade expansiva suscetível de atingir situações não previstas nas palavras da lei, ainda que corretamente interpretadas pelo método jurídico.


Desta expansibilidade elástica resulta, como conseqüência inevitável, uma simétrica expansão dos poderes dos órgãos de aplicação do Direito, principalmente do Fisco, que passam a ficar dotados de poderes de criação, embora derivada, do Direito, usurpando prerrogativas do Poder legislativo e introduzindo um elemento de imprevisibilidade da atividade estatal atentatórios da segurança jurídica.”


Em suma, o sistema jurídico positivo brasileiro não comporta a doutrina da interpretação econômica do direito tributário, pois colide com os princípios da isonomia, da legalidade e da segurança jurídica. O sentido da lei deve ser compreendido dentro do sistema constitucional, aplicando-se, exclusivamente, conceitos e critérios eminentemente jurídicos.


15.2. Teoria do Abuso de Formas


Essa teoria também busca sua justificativa essencialmente nos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, valendo-se da analogia para sua aplicação.


Como desdobramento da interpretação econômica, haveria abuso de forma quando do uso de uma forma jurídica incomum, atípica, anormal ou desnecessária para concretizar um dado negócio jurídico, visando não se enquadrar o negócio na forma jurídica típica, sobre a qual incidiria maior carga tributária.


A grande celeuma dessa teoria reside em deixar ao arbítrio do aplicador da lei no caso concreto a decisão sobre a normalidade da forma utilizada. Poderia se chegar ao extremo de o contribuinte, para não fugir à normalidade, ter que sempre verificar se a forma de negócio que deseja adotar é o mais freqüentemente utilizado.[68]


De fato, não existe critério lógico e objetivo para desconsiderar a forma atípica ou anormal e adotar-se a forma típica ou mais comum para o negócio. A Administração Pública não pode considerar abusiva a forma jurídica adotada numa operação, se esse meio utilizado é perfeitamente autorizado em lei. O dia-a-dia empresarial é pautado pela dinamicidade da busca incessante por novas oportunidades. E o empresário tem como proteção e segurança a letra da lei ao tomar suas decisões negociais. É imprescindível, pois, que o direito cumpra seu papel assecuratório, garantindo os atos praticados pelo empresário em respeito à norma.


Essa teoria, assim como a interpretação econômica do direito tributário, não é aplicável ao ordenamento positivo brasileiro, pois estar-se-ia invadindo os invioláveis campos da estrita legalidade e da segurança jurídica.


Na verdade, o particular, quando se deparar com mais de uma forma jurídica para realizar seu objetivo, deve ter a liberdade de revestir seu negócio jurídico com a forma mais conveniente, desde que essas formas jurídicas sejam legítimas, e desde que não haja desvio de sua função.


15.3. Teoria do Abuso de Direito


Caracteriza-se por considerar ilegítimo o comportamento do contribuinte que pretende tão-somente pagar menos tributos, fundamentando-se no uso imoral do Direito. Deixa essa teoria uma brecha para o aplicador do direito analisar o caso individual e concreto segundo suas convicções de ordem moral, conferindo-lhe poder para criar uma nova norma em cada situação específica. Seu campo de incidência é o plano da moral, o que rejeita, assim como verificado na interpretação econômica do direito e na teoria do abuso de formas, o princípio da legalidade e da segurança jurídica.


Aqueles que defendem essa teoria associam-na ao princípio da solidariedade, onde o Estado tem a prerrogativa de tributar e o indivíduo tem o dever de participar do custeio das despesas públicas.


No entanto, não há que se aceitar esse argumento, dado que o ordenamento brasileiro está arraigado ao princípio da estrita legalidade. O cidadão é livre, dentre várias alternativas lícitas oferecidas pelo ordenamento, para escolher qual caminho lícito tomar. Não se pode obrigar alguém a pagar mais tributos se há solução lícita dentro do ordenamento que o autorize a pagar menos. O que existe é o dever de pagar tributos, o dever de custear as ações destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social, o dever de contribuir para satisfazer as necessidades sociais, mas não o de optar pelo pagamento da maior carga tributária, dado um ato ou negócio poder se enquadrar em duas ou mais normas tributárias.


Essas teorias possuem o mesmo efeito da interpretação econômica, pois elas proporcionam ao intérprete desprezar a forma ou a realidade jurídica para considerar tão somente o conteúdo econômico da operação.


Conclusivo é Alberto P. Xavier[69]:


 “… essa doutrina malsã, quer é restringir a função protetora da tipicidade, aparentando respeitá-la. A conseqüência é que estraçalhada a função protetora do catálogo de tipos, a capacidade contributiva extravasaria o tipo legal para atingir a situação extra-típica, teoricamente praticada com abuso de direito, com a agravante de ser o Fisco o senhor da primeira palavra de acusação com espeque no abuso das formas de direito privado a que se referia, no início do século XX, o nazista Enno Becker.”


16. Atual foco do Planejamento Global


 A visão tradicional do planejamento tributário, tanto por parte dos profissionais que atuam no campo, quanto dos seus clientes, está ligada somente à redução do custo tributário da empresa onde está se aplicando os procedimentos.


Conforme exposto supra, um dos problemas do Sistema Tributário Brasileiro é a multi-incidência de tributos, ou efeito cascata. Principalmente as Contribuições Sociais (COFINS, PIS, CPMF) e alguns impostos (ISS) são cumulativos nas várias etapas da cadeia produtiva ou da cadeia de circulação da mercadoria ou serviço.


Estudar o perfil tributário dos fornecedores do grupo visando à diminuição do ônus tributário antes que a matéria-prima, insumo ou serviço seja entregue a uma das empresas, resultará na redução do valor a ser pago ao fornecedor. Custo menor é possibilidade de preço de venda menor, e maior competitividade mercadológica.


Esta análise pode se estender por toda a cadeia produtiva ou de circulação, inclusive, desde o setor primário da economia (todo produto ou mercadoria tem como elemento integrante um insumo originário deste setor). Um produto alimentício, por exemplo, mesmo que industrializado, tem componentes gerados na agricultura, ou pecuária, etc.


A implantação de um modelo de planejamento tributário eficaz pode se preocupar com o reflexo tributário dos elementos que comporão o produto final da empresa, buscando mecanismos de parcerias de gestão com os fornecedores, reduzindo o custo e possibilitando a oferta de menores preços ao cliente.


CONCLUSÃO


O Direito Agrário, que representa ramo autônomo de estudo, pelo alto grau de especialização que demanda, trata-se de uma área do Direito inteiramente permeada pela prevalência de valores sociais, ainda assim, não se furta às interações com outros ramos do Direito, a citar o Direito Tributário, porquanto intimamente dependentes numa visão jurídico social.


Na base do primeiro estão a propriedade do solo e a produção agropecuária, ambas demandando a presença de interesse público. No segundo está a norma em sentido abstrato e a legalidade do tributo quando da sua concretização assistindo também ao interesse privado.


A função social da propriedade e o planejamento global, contrapondo-se às noções de propriedade absoluta individualista preconizada pelo Code Napoleón, bem como na suposta ilegalidade da elisão fiscal, inspirada não só no liberalismo como também nos princípios constitucionais, reconhecem na propriedade imprescindível mecanismo de justiça social dando ao proprietário o direito de não se tornar escravo dos tributos que incidem sobre seu patrimônio.


A função social é um conceito complexo que não está relacionado exclusivamente à produtividade, mas também ao trabalho e à proteção do meio ambiente e do potencial produtivo do solo.


Constatou-se que a propriedade é garantida, constitucionalmente, como direito fundamental do indivíduo, uma vez que o artigo 5º da Constituição Federal garante o direito à propriedade como algo inviolável, portanto, como garantia fundamental. Para tanto, a propriedade deve cumprir sua função social.


Verificou-se que a função social da propriedade é um princípio solidamente assentado sobre uma base doutrinária e legislativa, tendo sido erigida em princípio constitucional como se pode atestar em várias passagens de nosso Texto Político. Como a propriedade é um instituto de vasta aplicação jurídica o princípio da função social, inserindo-se no conteúdo da propriedade, irradia efeitos por igual extensão.


Importante salientar, como ficou comprovado na presente pesquisa, o efeito importantíssimo da função social da propriedade definida como Direito Fundamental, e também de constar no rol das cláusulas pétreas do artigo 60, § 4º, IV da Constituição Federal de 1988. Ou seja, enquanto viger a Constituição Federal de 1988, a função social da propriedade e seu conteúdo não poderão ser alterados.


Especificamente abordado o sistema de planejamento global eficaz, mostrou-se imprescindível levar em conta todos os tributos incidentes na operação empresarial. Assim, após a análise personalizada da empresa e do tributo, é necessário confrontar a redução do ônus fiscal individual com os reflexos nos demais tributos.


Reduzir o ônus do PIS e COFINS numa operação não importa na certeza absoluta de que houve uma redução do custo tributário global. Poderá haver reflexo no ICMS ou no IPI que invalidará financeiramente o procedimento.


Para se ter uma eficácia da economia legal de impostos e contribuições, também se faz necessária a integração de todos os departamentos da empresa. Em nada adianta ter um comitê interno de planejamento, se as decisões são tomadas sem o conhecimento de pessoas importantes para o sucesso do intento.


O estudo e análise das alternativas de redução do custo tributário passam pelo convencimento de todas as pessoas que tenham ligação direta ou indireta com o funcionamento da empresa. Implementar um sistema de diminuição da carga tributária é muito mais complexo do que possa parecer.


O resultado positivo da técnica está em demonstrar ao conjunto das pessoas que o ganho será da empresa e não somente dos sócios ou acionistas e diretores. Baixar constantemente o custo é uma missão corporativa de sobrevivência no mercado.


Ineficaz é a tomada de decisão de um gestor tributário, visando à economia de determinado tributo se ele desconhece os aspectos peculiares do seu cliente (qual o seu porte, regime tributário, localização geográfica, et cetera). Tal subsídio ele obterá com o departamento de vendas.


Portanto, a integração de todas as pessoas e departamentos é fundamental para um resultado efetivo. Da mesma forma, todas as empresas e unidades do grupo empresarial devem ser alcançadas pela gestão tributária, objetivando através da análise da carga tributária global traçar metas de redução constante do custo.


Como a incidência tributária é permanente, e os períodos de apuração são cada vez menores, a redução do custo tributário deve ser uma prática do dia a dia da empresa.


A ótica do planejamento tributário voltado ao cliente é um mecanismo inteligente de atração e fidelização. O planejador ou gestor tributário deve ter em mente que não são mais as informações o elemento diferenciador, mas sim a capacidade de transformá-las em conhecimento.


Não basta ter em mãos todas as informações do cliente, é necessário utilizá-las em proveito do negócio. As informações tributárias do cliente também são fundamentais: qual o regime de tributação do imposto de renda e contribuição social sobre o lucro (real, presumido, simples), a operação que ele pratica tem ou não substituição tributária (ICMS, IPI, PIS e COFINS), ele tem empresas ligadas, controladas ou coligadas (reflexo na CPMF e no IOF), etc.


Diante da realidade brasileira, conclui-se que o Planejamento Global, quando realizado de forma responsável pelas empresas e objetivando a otimização dos procedimentos e rotinas internas e externas, pode resultar em grande economia nos ônus tributários, sem caracterizar a dissimulação nas hipóteses de incidência e lesar o Fisco.


Em suma, a correta compreensão da função social da propriedade e do planejamento global, depende indubitavelmente da atuação do jurista em interação com várias fronteiras de conhecimento que envolvem a empresa. Para qualquer que seja a atividade empresarial a ser desenvolvida esta é uma singela contribuição.


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_____________. Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Antielisiva. São Paulo: Dialética, 2002.




Notas:


[1] MARQUESI, Roberto Wagner. Direitos Reais Agrários & Função Social. Ed. Juruá. 2001. p. 39




[2] MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de; Tratado do Direito Privado, t. LIII, Bossói, Rio, 1958.




[3] MACRIDIS, Roy C. Ciência Política comparada – Disponível em: <http://www.vergleichende-politiwissenschaft.de/macridis.htm> Acesso em: 18/12/2005.




[4] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, 9ª ed., 1992.




[5] Op. cit.




[6] Op. cit.




[7] ARAÚJO, Telga de. A propriedade e sua função social. p.159. In: Direito agrário brasileiro / Raymundo Laranjeira – coordenador. – São Paulo: LTr, 1999. Vários autores.




[8] Tradução livre.




[9] PEDRO e CÁRCERES, História Geral; São Paulo, ed. Moderna, 1982.




[10] MARQUESI, Roberto Wagner. Direitos Reais Agrários & Função Social. Ed. Juruá. 2001. p. 93.




[11] MIRANDA, Alcir Gursen. Teoria de direito agrário. Belém, 1989,p. 84




[12] BORGES, Paulo Torminn. Institutos básicos de direito agrário. 11. ed. São Paulo: Saraiva,1998. p. 9




[13] DUGUIT, Leon. Des fonctions de l’Etat moderne, Rev. intern. de sociologie, 1894.




[14] ARAÚJO, Luiz Ernani Bonesso de. Acesso à Terra no Estado Democrático de Direito, Ed. URI, 1998.




[15] GODOY, Luciano de Souza. Direito Agrário Constitucional, O Regime da Propriedade. Atlas Jurídica, São Paulo, 1998.




[16] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 4ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 252 e ss.




[17] CARBONNIER, Jean. Droit Civil: les biens. 19 ed. Paris: Puf, 2000. p. 139




[18] “… destinada a formar e gerenciar o capital em que todos trabalharão para sua geração e as gerações futuras”. Tradução livre.




[19] FACHIN, Luís Edson. A Cidade Nuclear e o Direito Periférico (Reflexões sobre a Propriedade Urbana). São Paulo: RT, vol. 743, 1996. p. 107




[20] Op cit. p. 95




[21] GONDINHO, André Osório. Função Social da Propriedade. In Problemas de Direito Civil – Constitucional. Gustavo Tepedino (Coord.). Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 397 – 433.




[22] Op. cit. p. 421




[23] Op. cit. p. 422




[24] Artigos 141, § 16 e 147.




[25] Artigos 150, § 22 e 157 e parágrafos.




[26] Artigos 153, § 22 e 161.




[27] Artigos 5º, XXIV a XXX, 170, II e III, 176, 177, 178, 182, 182, 183, 184, 185, 186, 191 e 222.




[28] FALCÃO, Ismael Marinho; Direito Agrário Brasileiro, EDIPRO, 1995.




[29] ARAÚJO, Luiz Ernani Bonesso de; Acesso à Terra no Estado Democrático de Direito, Ed. URI, 1998.




[30] MARQUESI, Roberto Wagner. Op. cit. p. 152




[31] Empresa rural entendida como as áreas superiores ao módulo rural, inferiores ao latifúndio e cumpridoras de sua função social.




[32] PIRES, Cristine. Reportagem: Carga Pesada. Revista A Granja. Edição de outubro de 2005.




[33] LEITE, José Augusto Silva. Planejamento Tributário. Disponível em:


 <http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?op=true&cod=3671> Acesso em 12/12/2005.




[34] Marshall – leading case Mc.Culloch X Maryland – Corte Suprema dos Estados Unidos da América – 1819.




[35] MACHADO, Hugo de Brito. Planejamento e Crime Tributário. Disponível em:


 <http://www.neofito.com.br/artigos/art01/tribut4.htm> acesso em 21/01/2006




[36] RIBEIRO, Cinthia Daniela Bertan. O Direito ao Planejamento Tributário. Universidade Estadual de Londrina. 2002. p. 08.




[37] MALERBI, Diva Prestes Marcondes. Elisão Tributária. São Paulo: RT, 1984. p. 75-76.




[38] Dicionário Houaiss: Diacronismo antigo: sem rapidez; lento, lerdo, vagaroso.




[39] Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – http://www.ibpt.com.br




[40] Exemplos: hospitais; creches, escolas e universidades particulares; segurança privada; et cetera.




[41] POLASCINSKI, Danilo. Planejamento Tributário.  Disponível em:


<http://www.fema.com.br/.~danilo/cadeiradeplanejamento.html> Acesso em: 15/11/2005.




[42] Esta multiincidência de tributos sobre uma mesma operação é denominado pela doutrina como “efeito cascata”.




[43] “Planejamento Tributário é o processo de escolha de ação ou omissão lícita, não simulada, anterior à ocorrência do fato gerador, que vise, direta ou indiretamente, economia de tributos.” (MALKOWSKI, Almir. In “Planejamento Tributário e a Questão da Elisão Fiscal”. Editora de Direito, p. 22. São Paulo – SP.) “É aspiração naturalíssima e intimamente ligada à vida econômica, a de se procurar determinado resultado econômico com a maior economia, isto é, com a menor despesa (e os tributos que incidirão sobre os atos e fatos necessários à obtenção daquele resultado econômico, são parcelas que integrarão a despesa).” (BECKER, Alfredo José. Teoria Geral do Direito Tributário. Ed. Saraiva. São Paulo – SP, p. 122).




[44] BECKER, Op.cit. em nota de rodapé.




[45] 4º Turma, em sessão de 14/05/84. Rel. Min. Romildo Bueno de Souza.




[46] Constituição Federal de 1988 – artigos 5º, II e 150, I.




[47] Constituição Federal de 1988 – artigos 170, III e 173 caput.




[48] DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e Evasão Fiscal. 2a. ed. São Paulo: Ed. Bushatsky, 1977. p. 45-46.




[49] XAVIER, Alberto. Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Antielisiva. São Paulo: Dialética, 2002, p. 53-58.




[50] “A norma tributária, como qualquer outra norma jurídica, tem sua incidência condicionada ao acontecimento de um fato previsto na hipótese legal, fato este cuja verificação acarreta automaticamente a incidência do mandamento. Ocorrido o fato “João recebeu honorários”, incide o mandamento “quem receber honorários pagará 10% ao Estado. Hensel expressa, com a segurança e síntese que lhe são características: “O comando: deves pagar imposto é sempre condicionado à frase: se realizas o fato imponível…” (Direito Tributário, Giuffrè, Milão, 1956, p. 148, trad. De Dino Jarach). “Do que se vê que a incidência do comando “pague” dá-se pelo acontecimento do fato previsto na respectiva hipótese.” (ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. Noções Introdutórias. São Paulo – março de 2001. Ed. Malheiros Editores, 6ª edição, p. 46).




[51] MALERBI, Diva Prestes Marcondes. Elisão Tributária. São Paulo: RT, 1984, p.15.




[52] Ver artigo 148 do Código Tributário Nacional.




[53] REIS, Maria Lúcia Américo dos e Borges, José Cassiano. Conceito de Sonegação. Gazeta Mercantil. Disponível em < http://www.portaltributário.com.br/noticias/conceitode_sonegacao.htm> acesso em 18/12/2005.




[54] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 112.




[55] TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário. 2ª ed. Vol. III. Rio


de Janeiro: Renovar, 1999, p. 97




[56] CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional tributário. São Paulo, Malheiros 1999.




[57] Declaração de Direitos de 1789 apud CARRAZZA, op. cit.,p. 212.




[58] CARRAZZA, op. cit.,p. 214.




[59] Constituição Federal de 1988.




[60] ressalvadas as exceções dos empréstimos compulsórios, impostos residuais da União e das contribuições sociais do parágrafo 4o artigo 195 da Constituição Federal, que necessitam de lei complementar para sua validade.




[61] CARRAZA, op. cit. pp. 216-217.




[62] XAVIER, Alberto. Os princípios da legalidade e da tipicidade da tributação. São Paulo: RT, 1978. p. 70.




[63] COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988 – Sistema tributário. 6 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 283.




[64] A respeito das semelhanças entre a tipicidade tributária e a tipicidade penal, trazemos o seguinte artigo: “(…) Concluímos que; apesar de serem duas matérias complexas e levadas por ramos divergentes; existem mais semelhanças do que diferenças entre os tipos penal e tributário. Tomando-se por base a Constituição Federal, e sendo assim os princípios constitucionais tanto os penais como os tributários, notamos (…) que ambos possuem alguns princípios em que são muito semelhantes suas estruturas. Sendo eles o princípio da Legalidade, princípio da anterioridade, princípio da taxatividade e ainda o princípio da isonomia. Além das semelhanças no que tange os princípios constitucionais, encontramos pontos comuns e semelhantes entre a estrutura dos dois tipos. No sujeito ativo e no sujeito passivo notamos que a estrutura dos tipos, tanto o penal como o tributário são muito parecidas. O sujeito ativo da obrigação tributária é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento, portanto somente a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem ser o sujeito ativo da obrigação tributária. No direito penal, aquele que pratica o fato típico é o sujeito ativo do crime. Somente o homem, isoladamente ou associado a outros, pode ser sujeito ativo do crime. O sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa jurídica ou física obrigada, por lei, ao cumprimento da prestação tributária, seja ela principal ou acessória, estando ou não em relação direta ou pessoal com a situação que constitua o respectivo fato gerador. Já no direito penal, o sujeito passivo é o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado pela conduta criminosa. Em um mesmo delito, podem existir dois ou mais sujeitos passivos, para isso precisam ter sido lesados ou ameaçados em seus bens jurídicos referidos no tipo, necessário é, portanto, serem vítimas do crime. A tipicidade no crime é quando o comportamento do agente se subsume ao tipo penal. A tipicidade no direito tributário é quando o comportamento do contribuinte se adequa ao tipo tributário. (hipótese material de incidência ou tipo tributário em abstrato, previsto em lei). Como podemos notar, (…) há muitas semelhanças, não só no que tange os princípios constitucionais penais e tributários, como também na estrutura dos dois tipos. Os dois tipos possuem mais pontos comuns do que incomuns.” – HADDAD, Mariana Branco. Comparações entre tipo penal e tipo tributário. Disponível em:


<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3507&p=218>. Acessado em 15/05/2005




[65] AMARO, Luciano da Silva. Planejamento Tributário. Revista de Direito Tributário. São Paulo, n. 71, p.45-53, 2000, p. 49




[66]  idem.




[67] XAVIER, Alberto. Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Antielisiva. São Paulo: Dialética, 2002, p. 44.


 [68] AMARO, Luciano da Silva. Planejamento Tributário. in. Revista de Direito Tributário. São Paulo, n. 71, p. 45-53, 2000, p. 51




[69]XAVIER, Alberto Pinheiro. Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Antielisiva. São Paulo, Dialética, 2002.




Informações Sobre o Autor

Eduardo Faria de Oliveira Campos

Advogado em Londrina – PR. Especialista em Direito Civil e Direito Empresarial.


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