Harmonização legal mínima para a proteção consumerista no MERCOSUL

Resumo:  O Mercosul, como qualquer integração econômica, tem por desiderato o efetivo incremento da atividade econômica, sobretudo, na potencialização do comércio e do consumo intra-bloco, visando a melhoria do acesso aos bens de consumo de melhor qualidade da sociedade envolvida. Inegavelmente, o consumidor como vetor principal e destinatário final na aquisição e experimentação dos produtos e serviços à ele ofertados, deve possuir normas que regulem a sua segura proteção diante de importante novel mercado.

Sumário: 1.A concretização de uma harmonização legal mínima para o mercosul. 2. Consumidor. 3. Fornecedor. 4. Relação de consumo. 5. Produto 6. Serviços 7. Conclusão 8. Referências bibliográficas.

1. A CONCRETIZAÇÃO DE UMA HARMONIZAÇÃO LEGAL MÍNIMA PARA O MERCOSUL

Diante da análise dos “considerandas” que envolvem o próprio tratado instituidor da Integração Mercosulina – Tratado de Assunção – e aí, no tocante à figura do consumidor como vetor  efetivo na propulsão da presente integração e a profunda necessidade de ampará-lo em tal contexto a que se propõe o Mercosul, ou seja, a construção de um verdadeiro e efetivo mercado comum, fundamental se faz traçar uma análise comparativa de tópicos essenciais à proteção daquele ator dentro das legislações dos países-membros do referido bloco econômico, tudo com o fito de se alcançar uma real possibilidade de harmonização legislativa mínima, dadas as possíveis assimetrias normativas existentes entre tais países, superando as dificuldades por hora vivenciadas pela própria Comunidade Européia, hoje modelo de integração.

É de se afirmar, por outro lado, que dita harmonização[1] se faz essencial na medida em que, além de procurar concretizar proteção à figura do consumidor mercosulino, elevando a qualidade de vida dos habitantes do bloco, se presta, por conseguinte, a refletir na defesa da competição e na igualdade para uma livre concorrência leal no Mercado Comum do Sul, a partir de uma maior oferta de bens e serviços, certamente com melhor qualidade, alimentando, neste sentido, a própria existência deste mercado.[2]

Neste sentido, é o que empreenderá nos tópicos a seguir, tendo como análise central 5 (cinco) dos principais elementos componentes de uma relação consumeristas, quais sejam: Consumidor, Fornecedor, Relação de Consumo, Produto e Serviços.

2. CONSUMIDOR

. Brasil – Lei 8.078/90, art. 2º:

“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza um produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único – Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.”[3]

.Argentina – Lei 24.240/93, arts 1º e 2º:

“Se consideran consumidores o usuários, lãs personas físicas o jurídicas que contratan a título oneroso para su consumo final o beneficio próprio o de su grupo familiar o social:

a) la adquisición o locación de cosas muebles;

b) la prestación de servicios;

c) la adquisición de inmuebles nuevos destinados a vivienda.Incluso los lotes de terreno adquiridos com el mismo fin, cuando la oferta sea pública y dirigida a persona indeterminada.(…)

No tendrán el carácter de consumidores o usuarios, quienes adquieram, al macenen, utilicen o consuman bienes o servicios para integrarlos en procesos de producción, transformación, comercialización o prestación a terceros.”

O art. 1º do Decreto argentino 1.798 de 13/10/1994, que regulamenta a Lei 24.240/93, determina que:

“a) Serán considerados asimismo consumidores o usuários quienes, em función de uma eventual contratación a título oneroso, recibam à título gratuito cosas o servicios (por ejemplo : muestras grátis).

b) Em caso de venta de viviendas prefabricadas, de los elementos para construirlas o de inmuebles nuevos destinados a vivienda, se facilitarán al comprador una documentación completa suscripta pro el vendedor en la que se defina en planta a escala la distribución de los distintos ambientes de la vivienda y las características de los materiales empleados.

c) Se entiende por nuevo el inmueble a construirse, en construcción o que nunca haya sido ocupado.”

. Paraguai – Lei 1.334/98, art. 4º, alínea a:

“a) Consumidor y usuario: a toda persona física o jurídica, nacional o extranjera que adquiera, utilice o disfrute como destinatario final de bienes o servicios de cualquier naturaleza;”

. Uruguai – Lei 17.189/99, art. 2º:

 “Consumidor es toda persona física o jurídica que adquiere o utiliza productos o servicios como destinatario final en una relación de consumo o en función de ella.

No se considera consumidor o usuario a aquel que, sin constituirse en destinatario final, adquiere, almacena, utiliza o consume productos o servicios con el fin de integrarlos en processos de producción, transformación o comercialización.”

Observa-se que as legislações brasileira, paraguaia e uruguaia escolheram um conceito de consumidor amplo e genérico, com capacidade de estender a norma a todos os consumidores do mercado, contudo a lei argentina serviu-se de um critério legislativo pouco claro, que impede a compreensão ampla do conceito, não obstante haver grau de similitude com as demais.

Inicialmente, ao vincular o conceito de consumidor à contratação onerosa, a lei argentina restringe-o de certa forma, ou seja, para tal lei apenas existirá consumidor na medida em que se realize um contrato a título oneroso, sendo que este instrumento deve estar incluído nas hipóteses previstas nos incisos do artigo 1º. Ao mesmo tempo em que tais incisos estipulam o quadro genérico de bens e serviços no mercado, limitam-no em função da taxatividade expressa na norma.

Por outro lado, o Decreto Regulamentar Argentino, aprovado em 1994, aumentou o campo de situações relativas à configuração do conceito de consumidor, ao agregá-lo também a questões relativas a bens enviados como amostras gratuitas, mas sempre submetidos a um contrato oneroso. Inclui ainda um caso muito particular de contratos onerosos de casas pré-fabricadas.

Acerca da característica da onerosidade, a doutrina argentina não fecha os olhos para tal limitação. Neste sentido, expressa VÁZQUEZ FERREYRA E ROMERA:

“ La ley exige como requisito que la contratación sea a título oneroso para que el consumidor reciba su tutela, Aquí sí creemos que podemos encontrar situaciones de desamparo. Si bien la necesidad de protección se hace imprescindible en la contratación onerosa, no se nos escapa que para burlar la ley se disfracen operaciones comerciales bajo el ropaje de la gratuidad, Además, es de público conocimiento que las grandes empresas recurren constantemente a campañas publicitarias que brindan premios o beneficios a los consumidores. Dichas ventajas se las ofrece a ‘título gratuito’, por lo cual quedarán al margen de la ley de defensa del consumidor. No obstante ello, la realidad indica que frente a situaciones tales, es necesario brindar también protección al consumidor para evitar fraudes o engaños que en definitiva redundan en benefício de la empresa.”[4]

Observam-se na lei argentina, quanto à prestação de serviços públicos, verdadeiros avanços, ao  estabelecer expressamente nos artigos 25 a 31 uma seção especial de direitos e obrigações dos usuários de tais serviços, o que, em igual formato, acaba ausente nas demais legislações mencionadas. É possível que tal inclusão na lei argentina responda ao processo em encaminhamento de privatização de serviços públicos no instante da sanção da lei de defesa do consumidor .

Convém ressaltar ainda que as legislações consumeristas brasileira, argentina[5] e uruguaia trataram da figura dos bystanders, quer dizer, daqueles cidadãos que podem ser alcançados por eventos relativos a uma relação de consumo sem, entretanto, serem considerados consumidores em sentido estrito, cabendo ao Código Civil paraguaio o tratamento protetivo de tal questão.[6]

De certo, deve-se reconhecer, ante o exposto, o aspecto harmônico das legislações supra no que concerne ao destinatário final, mais precisamente aquele entendido como fático, isto é, aquele que retira o bem ou serviço do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo, ou mesmo o destinatário final econômico – aquele que adquire o bem ou serviço, colocando fim à cadeia de produção, cabendo, por conseguinte, vislumbrar similitudes no que se refere à extensão do seu conceito.[7]

3. FORNECEDOR

No que diz respeito ao conceito de fornecedor, expresso nas legislações de língua espanhola como provedor, foram estabelecidos os seguintes conceitos:

. Brasil – Lei 8.078/90, art. 3º:

“Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação.”

. Argentina – Lei 24.240/93, art. 2º:

“(Provedores de cosas o servicios) Quedan obligados al cumplimiento de esta ley todas las personas físicas o jurídicas, de naturaleza pública o privada que, en forma profesional, aun ocasionalmente, produzcan, importen, distribuyan o comercialicen cosas o presten servicios a consumidores o usuarios. Se excluyen del ámbito de esta ley los contratos realizados entre consumidores cuyo objeto sean cosas usadas.”

. Paraguai – Lei 1.334/98, art. 4º, alínea b:

“Toda persona física o jurídica, nacional o extranjera, pública o privada que desarrolle actividades de producción, fabricación, importación, distribución, comercialización, venta o arrendamiento de bienes o de prestación de servicios a consumidores o usuarios, respectivamente, por los que cobre un precio o tarifa.”

 . Uruguai – Lei 17.189/99, art. 3º:

 “Provedor es toda persona física o jurídica, nacional o extranjera, privada o pública, y em este último caso estatal e no estatal, que deserrolle de manera profesional actividades de producción, creación, construcción, transformación, montaje, importación, distribución y comercialización de productos o servicios en una relación de consumo.”

Observa-se que o conceito de fornecedor é, praticamente, semelhante nas quatro legislações. Em princípio, parece não necessitar de um grande esforço para a sua harmonização, objetivando uma futura legislação comum.

Ressalte-se, à guisa da análise dos conteúdos normativos, que a característica marcante no fornecedor é o exercício profissional de uma atividade que consiste fundamentalmente na produção ou circulação de bens ou serviços.[8]

Nota-se que, muito embora a profissionalidade no exercício de determinada atividade constitua um elemento necessário para a caracterização de um fornecedor, não é o bastante para, por exclusão, afirmar que tal ente não possa ser considerado também como um consumidor.

Assim é possível que uma pessoa física ou jurídica seja considerada fornecedora porque pratica habitualmente determinada atividade que implique na produção ou circulação de bens e/ou serviços, não significando, contudo, que esta mesma pessoa possa, em certas situações, ser considerada consumidora, bastando para tanto que venha, por exemplo, adquirir um bem desde que este não seja utilizado no processo produtivo de outros produtos ou serviços.

Destaca a lei Argentina, na parte final do artigo ora em comento, que não serão abrangidos por ela os contratos celebrados entre consumidores tendo por objetos coisas móveis.

Na verdade, tal exclusão é absolutamente desnecessária, visto que nos contratos pactuados entre consumidores, os contratantes, conforme dicção da própria lei no tocante à definição de fornecedor, não exerceriam profissionalmente, ainda que em caráter eventual, a específica atividade de aquisição e alienação de bens usados, o que, por si só, já seria suficiente para afastar a legislação em tela.

Se o objetivo do legislador argentino era o de excluir da área de abrangência da lei a proteção quanto a bens móveis usados, o intento não foi logrado, visto que da redação do referido artigo não se permite outra interpretação que não a literal.

Detalhe que merece atenção é o fato de a legislação paraguaia exigir, para a caracterização do fornecedor, a presença de remuneração em contrapartida à circulação de bens ou serviços. Dito requisito não se faz presente nas legislações dos outros Estados-membros aparecendo, contudo, na legislação argentina quando esta se refere a consumidor, determinando ser onerosa a aquisição de produto ou serviço.

A questão acima pode ter semblante irrelevante, no entanto, pode também suscitar sérias controvérsias no que concerne a situações práticas, como no caso de serviços prestados gratuitamente, especialmente aqueles que envolvem vigilância ou guarda de bens, v.g., um veículo estacionado em um shopping center, bastando para tanto que o estacionamento não seja remunerado; o mesmo podendo ocorrer com as denominadas amostras grátis, estas que, por não serem fornecidas sob quaisquer remunerações, poderiam não ser alcançadas pelas leis protetivas do consumidor.

Há de se concluir que o próprio conceito de consumidor é, como já dito, sede própria, ampla e genérica, agrupando situações de aquisição, utilização e desfruto de bens e serviços de qualquer natureza, não restando dúvidas quanto à proteção do consumidor diante das relações de consumo não onerosas.

4. RELAÇÃO DE CONSUMO

. Paraguai – Lei 1.334/98, art 5º:

“Relación de consumo es la relación jurídica que se estabelece entre quien, a título oneroso, provee un producto o presta un servicio y quien lo adquiere o utiliza como destinatario final.”

. Uruguai – Lei 17.189/99, art 4º:

 “Relación de consumo es el vinculo que se establece entre el proveedor que, a título oneroso, provee un producto o presta un servicio y quien lo adquiere o utiliza como destinatario final.

La provisión de productos y la prestación de servicios que se efectúan a título gratuito, cuando ellas se realizan en función de una eventual relación de consumo, se equiparan a las relaciones de consumo.”

Constata-se que, dentre as leis de proteção ao consumidor nos Estados-membros do Mercosul, apenas a paraguaia e a uruguaia definem precisamente o que vem a ser relação de consumo.

Tais definições são praticamente idênticas no seu caput, sendo que a definição da lei uruguaia inclui ainda, em sua parte final, aquelas situações em que se carece de título oneroso, mas que se sujeitam a uma eventual relação de consumo.

Observa-se, diante das supracitadas legislações, que a onerosidade está presente como nota característica das relações de consumo, não bastando, a princípio, sobretudo, para lei paraguaia, o vínculo que se estabelece entre fornecedor e consumidor, senão em virtude da transferência de valor econômico do patrimônio do primeiro para o segundo.

Na realidade, não se deve perder de vista que a relação de consumo resulta do vínculo que une o fornecedor ao consumidor, onde aquele entrega e este recebe bens e serviços, traduzindo-se em um conceito que, verdadeiramente, complementa os conceitos identificadores de fornecedor e consumidor.

Sendo assim, ao atuarem nestas perspectivas funções, forma-se uma relação de consumo[9], devendo, por certo, insistir no reconhecimento da lei quanto à vulnerabilidade do consumidor, justificando exatamente a sua proteção[10]. Nestes propósitos, o critério lógico que deve confirmar a existência de uma relação de consumo e a área de sua proteção é a identificação da presença de um consumidor[11], através da definição literal deste, reconhecidamente expressa em todas as legislações dos países do bloco mercosulino, como já analisadas anteriormente.

De tal análise, pode-se verificar a amplitude do conceito de consumidor, não somente relacionada à especificidade onerosa, mas indo mais além, atingindo conteúdo amplo e genérico, inclusive dando proteção àqueles que não participaram direta e efetivamente da aquisição do bem ou serviço.

Deste modo, cumpre reconhecer que mesmo as legislações paraguaia e uruguaia – esta, não em absoluto – que, como visto, conceituam a relação de consumo ligando-a ao caráter oneroso, não o fazem quando da delimitação conceitual de consumidor, justificando, portanto, a não necessidade da presença da onerosidade no conceito de relação de consumo.

Já as leis brasileira e argentina não definiram formalmente a relação de consumo, no entanto o raciocínio desenvolvido no contexto retro as atinge diretamente, resultando, neste sentido, a relação de consumo, a noção jurídica de consumidor e sua amplitude em confronto com a definição legal de fornecedor.  

Por tais termos, poder-se-ia vislumbrar, certamente, uma similitude em tal quesito, desobstruindo eventuais óbices quanto a uma possível harmonização legal.

5. PRODUTO

A respeito do conceito de produto, este, importante elemento no que se refere à proteção do consumidor, porquanto objeto imediato das relações de consumo, foram determinadas as seguintes definições:

. Brasil – Lei 8.078/90, art. 3º, § 1º:

“Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.”

. Paraguai – Lei 1.334/98, art. 4º, alínea “c”:

“Productos: a todas las cosas que se consumen com su empleo o uso y las cosas o artefactos de uso personal o familiar que no se extinguen por su uso.”

 . Uruguai – Lei 17.189/99, art. 5º:

 “Produto es cualquier bien corporal o incorporal, mueble o inmueble.”

Nota-se que as legislações brasileira e uruguaia possuem harmoniosa sintonia ao se referirem, de forma ampla, à aplicação protetiva a qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial (“corporal” ou “incorporal”), portanto, bens econômicos, suscetíveis de apropriação, que podem ser duráveis, não duráveis, de conveniência, de uso especial etc.

Trata-se assim de qualquer objeto de interesse em dada relação de consumo e destinado a satisfazer uma necessidade do adquirente como destinatário final.

Numa interpretação à lei brasileira extensiva aqui à lei uruguaia, pode-se sustentar a observação de LUIS ANTÔNIO RIZZATO NUNES[12], ao tratar basicamente no que concerne à materialidade ou imaterialidade do produto, objeto da relação de consumo protegida:

“Mas, por conta do fato de o CDC ter definido produto como imaterial, é de perguntar que tipo de bem é esse que poderia ser oferecido no mercado de consumo. Afinal, o que seria um produto imaterial que o fornecedor poderia vender e o consumidor adquirir?

Diga-se, em primeiro lugar, que a preocupação da lei é garantir que a relação jurídica de consumo esteja assegurada para toda e qualquer compra e venda realizada, por isso, fixou conceitos os mais genéricos possíveis (‘produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial’). Isso é que é importante. A pretensão é que nada lhe escape. (grifo nosso)

Assim, a designação de ‘produto’ é utilizada, por exemplo, nas atividades bancárias (mútuo, aplicação em renda fixa, caução de títulos etc.). Tais ‘produtos’ encaixam-se, então, na definição de imateriais.”

Quanto à legislação paraguaia, esta, em sentido literal, se refere às coisas que, quando usadas ou utilizadas, esgotam-se no seu próprio uso, sendo o caso, por exemplo, dos alimentos.

De outro modo, atingem também as coisas ou objetos que, quando usados, não se extinguem, isto, quando do uso pessoal ou familiar.

Nota-se que o legislador paraguaio não cuidou de esclarecer, expressamente, acerca de bens materiais ou imateriais, o que poderia, em nível interpretativo, suscitar eventuais dúvidas.

Afirma-se, contudo, que, diante do que expressa o artigo 7º, em sua parte final da própria legislação paraguaia – “En caso de duda se estará a la interpretación más favorable al consumidor”- poder-se-ia clarear ou mesmo esclarecer as questões pertinentes a tal omissão, o mesmo que se diga quanto a bens duráveis e não duráveis.

Tal omissão ainda não poderia ser encarada como óbice a uma eventual harmonização, até porque, além da já referida parte final do artigo 7º, este mesmo artigo, em seu caput, expressa claramente que “Los derechos previstos en esta ley no excluyen otros derivados de tratados o convenciones internacionales de los que la República del Paraguay sea signataria (…)”,não havendo nesta lei empecilho para reconhecimento e proteção daqueles bens não esclarecidos, como já anteriormente sustentado.

Com relação à lei argentina, esta carece de uma definição expressa do que se considera produto.

O Código Civil Argentino, em seu art. 2311, estabelecia definição específica para ‘coisa’: “Se llaman cosas en este Código, los objetos materiales susceptibles de tener un valor. Las disposiciones referentes a las cosas son aplicables a la energía y a las fuerzas naturales susceptibles de apropriación.”

Os tribunais argentinos têm agregado tal conceito à observância de quando se trata de coisas destinadas a um uso final, conforme sustenta o artigo 1º da lei argentina protetiva do consumidor[13].

Importante ressaltar que dito artigo 1º em suas alíneas “a” e “c”, menciona a proteção do consumidor acerca da aquisição e locação de bens móveis e de imóveis novos destinados à moradia, inclusive lotes de terrenos adquiridos com o mesmo fim, quando a oferta seja pública e dirigida a pessoas indeterminadas, entretanto, a própria doutrina rechaça tal limitação, denominando-a, até mesmo, de ambígua e confusa[14].

VÁZQUEZ FERREYRA e OSCAR ROMERA afirmam, taxativamente, que o rol de bens contidos no artigo 1º é meramente exemplificativo, demonstrando isso através de decisões judiciais, onde se observa a necessidade de conceder uma proteção especial ao consumidor argentino, mesmo em situações que não se enquadram em nenhum dos casos previstos naquele artigo.

Concluem, portanto, que: “En definitivo, se trata de casos en los cuales realmente es necesario brindar una protección especial al consumidor, y no encontramos motivos para que así no sea.”[15]

Observa-se, neste caso, uma tendência à amplitude conceitual e flexível quanto à dimensão de produto, a ponto de se chegar a uma sintonia com as demais legislações dos Estados-membros do bloco no tocante a tal elemento.

6. SERVIÇOS

. Brasil – Lei 8.078/90, art. 3º, § 2º:

‘Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”

. Paraguai – Lei 1.334/98, art. 4º, alínea “d”:

 “Servicio: a cualquier actividad onerosa, suministrada en el mercado, inclusive las de naturaleza bancária, financeira, de crédito o de seguro, com excepción de las relaciones laborales.”[16]

. Uruguai – Lei 17.189/99, art. 5º, 2ª parte:

 “Servicio es cualquier  actividad remunerada, suministrada en el mercado de consumo, com excepción de las relaciones laborales.”

A legislação de Defesa do Consumidor Argentina faz, em três ocasiões, menções em torno de serviços.

Assim, Serviço Técnico (art. 12):

“Los fabricantes importadores y vendedores de las cosas mencionadas en el artículo anterior, deben asegurar un servicio técnico adecuado y el suministro de partes y repuestos.”

Regulação da prestação de serviços (art. 19 e seguintes):

“Art. 19 ( modalidades de prestación de servicios) quienes presten servicios de cualquier naturaleza están obligados a respetar los términos, plazos, condiciones, modalidades, reservas y demás circuntancias conforme a las cuales hayan sido ofrecidos, publicitados o convenidos.”

Serviços públicos domiciliares (art. 25 e seguintes):

“Art. 25 (…) Las empresas prestadoras de servicios públicos a domicílio deben entregar al usuario constancia escrita de las condiciones de la prestación de los derechos y obligaciones de ambas partes contratantes. (…).”

É de se observar que nenhuma das tais referências citadas define, expressamente, o que se entende por serviços em um sentido geral.

Para o entendimento prático e extensivo acerca do que se entende como serviço e sua devida proteção no território argentino, devemos nos ater ao que bem expressa a doutrina deste país.

Informa LORENZETTI[17] que as leis de proteção ao consumidor não distinguem, habitualmente, entre obras e serviços, englobando-os em um mesmo conceito de prestação.

 Já VÁZQUEZ FERREYRA e ROMERA[18] expõem, especificando ainda mais a questão: “pensamos que cuando la ley del consumidor se refiere a prestación de servicios, lo hace en relación a una ‘matriz jurídica’, un género del cual se desprenden la locación de cosas, la de servicios propiamente dicha, la de obra, los servicios públicos, y todo otro servicio que se preste a los consumidores. Excluímos del concepto y sobre todo a los efectos de la ley del consumidor al servicio que configura el contrato de trabajo. (grifo nosso)

Desde un puento de vista económico, existe servicio cuando se presta una función intangible al adquirente, que no incluye un producto.”[19]

Com relação às leis paraguaia e uruguaia, estas, como se percebe neste ponto, reproduziram basicamente o conteúdo e núcleo da legislação brasileira, excluindo da abrangência de serviços as questões resultantes de relações laborais.

Importante ressaltar que, não obstante o texto uruguaio não se referir, expressamente, no artigo supra, às atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, não resta dúvida quanto à inclusão destas na lei protetiva do consumidor, pois que o art. 21 da própria lei vem reparar tal omissão, ao tratar da oferta de serviços, mencionando explicitamente quanto aos serviços financeiros, a sua submissão às especificações ditadas por tal ordenamento.[20]

A legislação brasileira, tal qual já se observou com relação a consumidor, fornecedor e produto, definiu bem o alcance da tutela no que se refere a ‘serviços’.

Demonstra a legislação, de imediato, que a atividade fornecida no mercado de consumo deverá ser remunerada para se configurar, nos termos do CDC, serviço.

Acerca do entendimento da expressão ‘remuneração’ e sua amplitude no que diz respeito à proteção consumerista, adverte JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO que neste caso “não se inserem os ‘tributos’, em geral, ou ‘taxas’ e ‘contribuições de melhoria’, especialmente que se inserem no âmbito das relações de natureza tributária.

Não se há de confundir, por outro lado, os referidos tributos com as ‘tarifas’; estas sim, inseridas no contexto dos ‘serviços’ ou, mais particularmente, ‘preço público’, pelos ‘serviços’ prestados diretamente pelo poder público, ou então, mediante sua concessão ou permissão pela iniciativa privada.

O que se pretende dizer é que o ‘contribuinte’ não se confunde com ‘consumidor’, já que, no primeiro caso, o que subsiste é uma relação de direito tributário, inserida a prestação de serviços públicos, genérica e universalmente considerada, na atividade precípua do Estado, ou seja, a persecução do bem-comum.”[21]

Por outro lado, não será serviço a que a lei oferece tutela, aqueles oriundos de prática gratuita como v.g. “atos de camaradagem e os decorrentes de parentesco e vizinho, os conhecidos ‘favores’(…).”[22]

Além da característica vinculada à remuneração contida na norma ora em comento, o CDC brasileiro, na definição de serviço, se refere, de maneira bem ampla, a qualquer atividade fornecida ou prestada no mercado de consumo, realçando, de maneira inequívoca, que as atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária estão submetidas ao seu regramento protetivo[23], excetuando aquelas decorrentes das relações laborais.

É certo, portanto, que, muito embora se quisesse criar algum óbice quanto à extensão do CDC às atividades supracitadas[24], do texto não restam dúvidas quanto ao alcance claro e efetivo ao qual o Código por bem delineou.

Assevera JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO[25] estar evidenciado que as atividades desempenhadas pelas instituições financeiras, tanto no que toca às prestações de serviços aos seus clientes – v.g., cobrança de contas, de água, de luz, expedição de extratos, dentre outros serviços – quanto no que se refere à concessão de mútuos e financiamentos para a aquisição de bens, estão englobados no conceito amplo de serviços.

In verbis, o aludido autor finaliza a questão: “(…) o código fala expressamente em atividade de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, aqui se incluindo igualmente os planos de previdência privada em geral, além dos seguros propriamente ditos, de saúde etc.”[26]

7. CONCLUSÃO

Diante de tudo aqui exposto e em síntese apertada, é de se afirmar, notadamente, a similitude no que diz respeito ao alcance da proteção consumerista no âmbito das legislações dos Estados-membros do Mercosul, possibilitando, notoriamente, a viabilidade de harmonização legislativa quer na temática quer na sua extensão à qual a mesma se propõe, sem qualquer prejuízo ao conteúdo protetivo do consumidor no âmbito dos Estados-partes. 

 

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STIGLITZ, Gabriel A. e STIGLITZ, Rubén S.La defensa del Consumidor em Argentina. In: MARQUES, Cláudia Lima (coord.) A proteção do consumidor no Brasil e no MERCOSUL. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1994,p.140,157 e159.
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WAMBIER, Luiz Rodrigues. Os Contratos Bancários e o Código de Defesa do Consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor, n.18, São Paulo, RT, mar./ jun./1996, p.127.
 
Notas:
 
[1]Sobre os modelos adotados em sede de blocos econômicos com o fito de minorar as assimetrias legislativas, proporcionando possíveis e qualitativos enlaces nas relações entre os Estados-Membros, ver o nosso A Proteção do Consumidor no Mercosul. São Paulo: LTr, 2004, p.152 e ss.

[2] Cabe destacar que a legislação brasileira de defesa do consumidor é considerada, por sua qualidade e abrangência, uma espécie de lei modelo para o Mercosul quanto às relações de consumo.
Sustenta-se assim que uma harmonização legislativa na matéria, deveria ocorrer em torno da referida legislação, como observa LORENZETTI, Ricardo. (La Relación de Consumo: Conceptualización Dogmática en Base al Derecho del  Mercosur. Revista de Direito do Consumidor, n. 21,São Paulo, RT, jan./mar./1997, p.11):
“Esta circunstancia se basa em la realidad actual, en la que los agentes económicos deben someterse a la aplicación de la Lei 8078 del Brasil, la que a su vez tiene fundamento constitucional que dificulta su modificación en deterioro del principio protectorio (…) dada la inmodificabilidad de la legislación brasileña, la harmonización gira en derredor de ella a fin de superar los desnivetes mediante un ascenso de las demás legislaciones.”
É de ser alertado que, quando da afirmativa do aludido autor, ainda não se faziam presentes as legislações específicas acerca da proteção ao consumidor no Paraguai e Uruguai, dado este, novo, e de enfrentamento na presente tese, não somente com relação à legislação recente, mas, sobretudo, toca à produção intelectual referente à matéria ora em comento.
Sobre o CDC brasileiro em amplo sentido – “fundamento constitucional” citado por LORENZETTI – sustenta MARQUES, que tal código brasileiro é considerado como “…uma destas leis de função social, as quais têm o mérito de positivar as novas noções valorativas orientadoras da sociedade, procurando assim assegurar a realização dos modernos direitos fundamentais (direitos econômicos e sociais) previstos nas Constituições.” MARQUES, Cláudia Lima. A responsabilidade do transportador aéreo pelo fato do serviço e o Código de Defesa do Consumidor. Antinomia entre norma CDC e de leis especiais. In: Revista de Direito do Consumidor, n.3, São Paulo, RT, 1992, p.15.

[3] Conforme sustenta DE LUCCA, o conceito de consumidor no CDC é plurívoco dadas as hipóteses dos arts. 2º, parágrafo único (equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo), 17 (equipara-se a consumidor todas as vítimas do evento, quando sofrerem conseqüências em decorrência de defeito do produto ou serviço) e 29 (equipara-se a consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas ás práticas comerciais e aos contratos). DE LUCCA, Newton. La Relación de Consumo: Conceptualización Dogmática en Base al Derecho del  Mercosur. Revista de Direito do Consumidor, n. 21,São Paulo, RT, jan./mar./1997, p.46.

[4] FERREYRA, Roberto A. Vásquez; ROMERA, Oscar E. Protección e Defensa del Consumidor. Ley 24.240. Buenos Aires: Depalma, 1994, p.6.

[5] Noticiava, em 1994, STIGLITZ, Gabriel A. e STIGLITZ, Rubén S., (La defensa del Consumidor em Argentina. In: MARQUES, Cláudia Lima (coord.) Estudos sobre a Proteção  do Consumidor no Brasil e no Mercosul…,p.140,157 e159) que na legislação argentina carecia de proteção, por exemplo, o pedestre lesionado por um veículo com defeito da fábrica, ou mesmo um convidado que sofre consequência oriunda de um alimento servido por quem o convida. Por outro lado, sustentavam, como a doutrina majoritária argentina, a subsistência textual do regime de responsabilidade objetiva por danos derivados de produtos elaborados, implicitamente emergente no Código Civil, arts. 1.198 (dever de segurança) no âmbito contratual e 1.113 (coisas perigosas ou com vício) no campo extracontratual, tornando, por isto, inoperante o veto presidencial ao art. 40 da lei protetiva do consumidor.
Hoje se tem restabelecida na lei originária de defesa do consumidor, a obrigatoriedade das garantias e a responsabilidade solidária e objetiva por danos no campo extracontratual, eliminando-se, com isso, o aludido veto presidencial ao art. 40, através da Lei 24.999 de julho de 1998. Ver, ACCIARRI, Hugo; BARBERO, Andrea; CASTELLANO, Andréa. Garantias Legales en la Ley de Defensa del Consumidor: Elementos para un Análisis Económico. Disponível em: http://www.aaep.org.ar/.

[6] Arts.1846 a 1854 do CC.
É passível de se admitir que a omissão da legislação de proteção ao consumidor paraguaia tenha sido em virtude de que o próprio Código Civil já regula a matéria.

[7] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 2ed. São Paulo: RT, 1995, p.100.

[8] Na verdade, o requisito da profissionalidade constante dos conceitos legais de fornecedor advém do conceito de empresário contido no Código Civil Italiano, art.2.082, que expressa: “É imprenditore chi esercita professionalmente un’ attività econômica organizzata al fine della produzione o dello scambio di beni o di servizi.” MAJO, Adolfo di.(org.). Codice Civile com la Costituzione,Il Trattato C.E.E. e Le principali norme complementari. 10ed. Milano: Giuffrè , 1996, p.472.

[9] NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do, conceitua relações de consumo como “aquelas relações jurídicas relativas à aquisição ou utilização de produtos e serviços, em que o adquirente, ou utente, aparece como destinatário final.” Responsabilidade Civil no Código do Consumidor. Rio de Janeiro : Aidê,1991, p.11.

[10]  BATISTI,Leonir. Direito do Consumidor para o Mercosul. Curitiba: Juruá, 2002, p.206.

[11]  No mesmo sentido, afirma GIANPAOLO POGGIO SMANIO:
“O conceito de consumidor não pode ser atendido se não inserido numa relação de consumo. O consumidor é aquele que participa de uma relação jurídica de consumo.
Essa relação jurídica envolve duas partes bem definidas: de um lado, o adquirente de um produto ou serviço, chamado consumidor, enquanto, de outro lado, há o fornecedor ou vendedor de um produto ou serviço. Destina-se à satisfação de uma necessidade privada do consumidor que, não dispondo de controle sobre a produção de bens ou de serviços que lhe são destinados, submete-se ao poder e condições dos produtores e fornecedores dos bens e serviços. É a chamada hipossuficiência ou vulnerabilidade do consumidor (art.4º, I, CDC)
Essa relação de consumo pode ser efetiva (exemplo:compra e venda de automóvel) ou potencial (exemplo:propaganda). Portanto, para termos relação de consumo (…), não é necessário que o fornecedor concretamente venda bens ou preste serviços, basta que, mediante oferta, coloque os bens à disposição de consumidores potenciais.” SMANIO. Gianpaolo Poggio. Interesses Difusos e Coletivos. 2ed. São Paulo: Atlas,1999, p.41-42.

[12] NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000, p.95.
Sobre o assunto, mais especificamente sobre o alcance do conteúdo relativo a bens corpóreos e incorpóreos, lembrando, inclusive, SAVATIER, ver, por todos, SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. Lei n. 8.078, de 11.9.90. 3ed. São Paulo: LTr, 1998, p.82 – 85.

[13] FERREYRA, Roberto A. VÁzquez; ROMERA, Oscar E. Protección e Defensa del Consumidor. Ley 24.240. Buenos Aires : Depalma, 1994,  p. 9 – 10.

[14] É a opinião de JUAN M. FARINA, indagando ainda acerca da proteção quanto a imóveis usados: “Cuántos años ha de tener un inmueble para ser calificado de nuevo? (…) Como se probará, llegado el caso, si el inmueble antes de su venta estuvo ocupado o no? (el decreto se refiere  a ocupación, no a dominio ni a posesión).”
Neste final, o autor se refere ao Decreto Regulamentar 1.798/94, que, em seu art. 1º, alínea “c”, assegura que se deve entender por novo o imóvel a construir-se, em construção ou que nunca tenha sido ocupado. FARINA, Juan M. Defensa del consumidor y del usuário. Buenos Aires: Astrea, 1995, p. 65.

[15] Op. cit., p.10.

[16] Importante frisar que a Legislação Paraguaia traz ainda inserido no conteúdo do artigo em tela e a título de inovação  os seguintes conceitos que merecem ser citados:
 “Anunciante: al proveedor de bienes o servicios que há encargado la difusión pública de un mensaje publicitario o de cualquier tipo de información referida a sus productos o servicios;
Actos de consumo: es todo tipo de acto, próprio de las relaciones de consumo, celebrado entre proveedores y consumidores o usuarios,referidos a la producción, distribución, depósito, comercialización, venta o arrendamiento de bienes, muebles o inmuebles o a la contratación de servicios;
Consumo sustentable: es todo acto de consumo, destinado a satisfacer necesidades humanas, realizado sin socavar, dañar o afectar significativamente la calidad del medio ambiente y su capacidad para dar satisfacción a las necesidades de las generaciones presentes y futuras.     (…)
Intereses colectivos: son aquellos intereses supraindividuales, de naturaleza indivisible de los que sean titulares un grupo, categoría o clase de personas, ligadas entre sí o com la parte contraria por una relación jurídica, cuyo resguardo interesa a toda la colectividad, por afectar a una pluralidad de sujetos que se encuentren en una misma situación.”

[17] LORENZETTI, Ricardo Luis. La economía de servicios y los contratos. In: Revista de Derecho Privado y Comunitario, v. 3, Buenos Aires, Rubinzal – Culzoni, 1993, p.295.

[18]  Op. cit., p.63 – 64.

[19] Citados autores acrescentam ainda, sobre o assunto, uma proposta de diretiva, no âmbito da Comunidade Européia, segundo a qual “se debe entender por servicio a toda prestación realizada a título profesional o di servicio público, de modo independiente, a título oneroso o gratuito, cuyo objeto directo y exclusivo no es la fabricación de bienes o la transferencia de derechos reales o intelectuales.”Idem, p.64.

[20] Vale ressaltar que, com relação ao citado art. 21, a APROBASE (Associação de Agentes e Corretores de Seguro), encara este preceito como um verdadeiro protetor de categoria, já que os estabelecimentos financeiros, ao outorgarem crédito, impunham a realização de um seguro, notadamente através de sua própria corretora.
Com a inclusão dos serviços financeiros na lei protetiva do consumidor, tal prática restaria amenizada. APROBASE. Sanción Legislativa de Norma de Defensa del Consumidor. Disponível em: http://www.cronicas.com.uy/.

[21] GRINOVER, Ada Pellegrini et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor… p. 41. No mesmo sentido, ver SAAD, Eduardo Gabriel. Op. cit., p. 86 – 87.

[22]  ALMEIDA, João Batista. A Proteção Jurídica do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000, p.43.
Especificando ainda mais o assunto em tela, NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Op. cit., p.100-101, sustenta que, para se entender o alcance da expressão “remuneração” no contexto protetivo do consumidor, é preciso que esta seja entendida no sentido estrito de absolutamente qualquer modalidade de cobrança ou repasse, direto ou indireto.
Assim, preceitua ele: “É preciso algum tipo de organização para estar diante de um serviço prestado sem remuneração, será necessário que, de fato, o prestador do serviço não tenha, de maneira alguma, se ressarcido de seus custos, ou que, em função da natureza da prestação de serviço, não tenha cobrado o preço. Por exemplo, o médico que atenda uma pessoa que está passando mal na rua e nada cobre por isso enquadra-se na hipótese legal de não recebimento de remuneração. Já o estacionamento de um shopping no qual não se cobre pela guarda do veículo disfarça o custo, que é cobrado de forma embutida no preço das mercadorias.”

[23] Tal enumeração de atividades é apenas exemplificativa, não se exaurindo no rol por ora enquadrado.
Podem outras atividades ser incluídas, v.g., a prestação de serviços educacionais ou mesmo de administração imobiliária, merecendo destaque, inclusive, os serviços prestados ao público, tais como transporte, saúde, telefonia, alguns deles operados por empresas ou entidades governamentais, outros através de concessões a empresas privadas ou privatizadas.
Ainda não escapam da abrangência da legislação os “entes despersonalizados” mencionados expressamente no art. 3º, caput, evitando-se, assim que tal falta de personalidade jurídica venha a ocasionar prejuízo ao consumidor quando da prestação de um serviço.

[24] Sobre o assunto, ver por todos, WALD, Arnoldo. O Direito do Consumidor e suas repercussões em relação às Instituições Financeiras. In: Revista de Informação Legislativa, n.123, a.31, Brasília, Senado Federal, jul./set./1994, p.85-98; PASQUALOTTO, Adalberto. Os Serviços Públicos no Código de Defesa do Consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor, n.1, São Paulo, RT, 1992, p.147; MARINS, James. Proteção Contratual do CDC a Contratos Interempresariais, inclusive Bancários. In: Revista de Direito do Consumidor, n.18, São Paulo, RT, mar./jun./1996, p.94-104.; SMANIO, Gianpaolo Poggio. Op. cit., p. 44; EFING, Antônio Carlos. Responsabilidade Civil de Agente Bancário e Financeiro, segundo as normas do Código de Defesa do Consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor, n.18, São Paulo, RT, mar./jun./1996, p.106 – 124.

[25] GRINOVER, Ada Pellegrini et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores do Anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998, p. 41.
Em nota uníssona com o respectivo raciocínio, ver, dentre outros, NERY JÚNIOR, Nélson. Os princípios Gerais do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor, n. 3, São Paulo, RT, set./dez./1992, p.54; NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Op. cit., p. 98 – 99; ALMEIDA, João Batista. Op. cit., p.42; ALVIM, Arruda et alii. Código do Consumidor Comentado. 2ed. São Paulo: RT, 1995, p. 39 – 40.
Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça conclama pela mesma idéia.
Em ac. un. da 4ª turma, no Resp. 57.974 – O – RS, em 25/04/95, cujo relator foi o Ministro Ruy Rosado de Aguiar, decidiu-se pelo reconhecimento da aplicação do CDC nas atividades bancárias: “Os bancos, como prestadores de serviços, especialmente contemplados no art. 3º, § 2º, estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor. A circunstância de o usuário dispor do bem recebido através da operação bancária, transferindo-o a terceiros, em pagamento de outros bens ou serviços, não o descaracteriza como consumidor final dos serviços prestados pelo banco.” In: Revista de Direito do Consumidor, n. 18…, p. 173 – 175.

[26] Idem, ibidem.
Convém aqui ressaltar, como salienta WAMBIER, Luiz Rodrigues. Os Contratos Bancários e o Código de Defesa do Consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor, n.18, São Paulo, RT, mar./ jun./1996, p.127, que não devem ser reconhecidas como relações de consumo as operações bancárias em que o tomador não seja o destinatário final, como as factoring.   
Este também é o mesmo entendimento de FÁBIO ULHOA COELHO, para quem, se o tomador do dinheiro junto ao banco “apenas intermedia o crédito, a sua relação com o banco não se caracteriza, juridicamente, como consumo, incidindo na hipótese, portanto, apenas o direito comercial.” COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 4ed. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 429 – 430.


Informações Sobre o Autor

Antônio Pereira Gaio Júnior

Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra – PT. Doutor em Direito pela Universidade Gama Filho. Mestre em Direito pela Universidade Gama Filho. Pós-Graduado em Direito Processual pela Universidade Gama Filho. Professor e Coordenador de Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito. Membro do IBDP. Membro Efetivo das Comissões Permanentes de Direito Processual Civil e Direito da Integração do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB. Advogado


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