A imprescindibilidade da atuação dos ministérios públicos estaduais na fiscalização eleitoral

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Resumo: O presente artigo objetiva apresentar, ainda que sucintamente, a imprescindível atuação dos Promotores de Justiça, integrantes que são dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal, na fiscalização eleitoral. Para isso, o ponto de partida será a configuração dada ao Estado Brasileiro pela Constituição de 1988, que passou a designá-lo como República Federativa do Brasil e a reconhecê-lo como Estado Democrático de Direito. A partir disso, a Carta Política determina a realização de eleições periódicas em todo o país para os cargos eletivos, conferindo ao Ministério Público a defesa dessa ordem jurídica e do próprio regime democrático. *

Palavras-chave: Estado Democrático de Direito; Sufrágio; Eleições; Fiscalização; Ministério Público.

Sumário: I. Introdução. II. O estado democrático de direito como um novo paradigma. O modelo brasileiro (1988) e o ministério público como instituição defensora da ordem jurídica e do regime democrático. III. O direito de sufrágio, a periodicidade das eleições e a fiscalização pelo ministério público. IV. A imprescindível atuação dos ministérios públicos estaduais perante os juízes e juntas eleitorais: uma imposição fática. V. Últimas palavras. Referências bibliográficas.

I. INTRODUÇÃO

A reflexão central deste texto é o exercício da função eleitoral pelos Promotores de Justiça. Isso não está dissociado de um contexto maior de ordem histórica, política e jurídica. A discussão lançada contém em si mesma alguns pressupostos como a existência de eleições periódicas, de um “Ministério Público Eleitoral”, da busca de transparência no processo de escolha dos candidatos, da necessária fiscalização, tudo perpassando pelo próprio regime democrático adotado pela Constituição brasileira.

São feitos, num primeiro instante, apontamentos sobre o Estado Democrático de Direito como um novo paradigma frente ao Estado Social e ao Estado Liberal, modelos mais recentes na história. O Estado Social procurou superar o Estado Liberal, e este, por sua vez, contrapôs-se ao Regime Absolutista, no qual prevalecia a vontade e a autoridade do soberano (e do papa). No caso brasileiro, a Constituição vigente nomina o Brasil de “República Federativa” e apresenta-o como “Estado Democrático de Direito”. A Constituição é o documento que disciplina o exercício do poder político, apontando não apenas a estruturação do poder, mas também os mecanismos de fiscalização do seu exercício, o que se dá de forma mais evidente numa Constituição democrática. Nessa perspectiva, o constituinte originário elegeu o Ministério Público como instituição essencial e guardiã da ordem jurídica e do regime democrático.

Está nítida no Texto Constitucional a soberania popular. Esta é uma consequência natural do princípio democrático, que assegura ao povo, periodicamente, a escolha de representante, ou, dependendo da situação, o exercício do poder de forma direta. As eleições são uma das formas de materialização do princípio democrático. Embora a Constituição de 1988 não tenha expressamente se reportado ao “Ministério Público Eleitoral” e nem mesmo a sua função eleitoral, esse silêncio não impede que se perceba a nitidez das atribuições conferidas a essa instituição, quando lhe outorga a defesa da ordem jurídica e do regime democrático.

A regulamentação da função eleitoral somente veio com a Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, que reconhece recair sobre o Ministério Público Federal o exercício dessa função; porém, por questões de ordem estrutural – e isso não está dito no texto legal, mas parece ser a razão –, ficou reservado aos Promotores de Justiça, membros dos Ministérios Públicos Estaduais, o cumprimento do ofício eleitoral perante o primeiro grau de jurisdição (Juízes e Juntas Eleitorais). A partir desse ponto, a abordagem feita neste escrito ocupa-se em discorrer sobre alguns aspectos do cumprimento do mister eleitoral pelos Promotores de Justiça.

II. O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO COMO UM NOVO PARADIGMA. O MODELO BRASILEIRO (1988) E O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO INSTITUIÇÃO DEFENSORA DA ORDEM JURÍDICA E DO REGIME DEMOCRÁTICO

Já são transcorridos mais de vinte anos desde a promulgação da Carta Política de 1988. Esse verdadeiro “monumento” legislativo é o referencial maior da transição de um período que não se quer mais de volta para uma nova época cujo prenúncio é percebido logo nos seus primeiros dispositivos. A agora nominada “República Federativa do Brasil” constitui um Estado Democrático de Direito, expressão que, por si só, diz muito. Além disso, apenas para destacar esses dois aspectos, a tradicional formula típica da Democracia – “todo o poder emana do povo”[1] [2], e a consagração, positivação e promoção dos direitos e garantias fundamentais também aparecem logo na introdução, anunciando um novo modelo de Estado.

Esses fatos constatados na Constituição brasileira não foram postos ao acaso ou como mera escolha de uma teoria político-jurídica. Quando a Constituição “consagra” o princípio democrático, faz, na verdade, uma “ordenação normativa para um país e para uma realidade histórica”. Com a Constituição de 1988 não foi diferente. O que se tem na Carta brasileira é a imbricação de dois princípios: o princípio do estado de direito e o princípio democrático. Na expressão de José Joaquim Gomes Canotilho, o Estado Democrático de Direito é um princípio “jurídico-constitucional com dimensões materiais e dimensões organizativo-procedimentais”. Esse princípio democrático pode ser visto, ainda segundo o constitucionalista português, como um princípio informador do Estado e da sociedade, pois aponta “para um processo de democratização extensivo a diferentes aspectos da vida económica, social e cultural.”[3]

Esse novo paradigma – o Estado Democrático de Direito – contrapõe-se (ou formou-se a partir de) a etapas superadas no tempo (historicamente)[4]. O Estado Liberal formatado pelos ideais decorrentes das Revoluções Americana (1776) e Francesa (1789) propunha-se a superar o Ancien Régime e a concentração do poder absoluto nas mãos do soberano (e também da Igreja). Bonavides refere-se ao que chama de “trauma revolucionário de 1789”[5], pois daí surgiram novas bases no terreno econômico, político, social e filosófico. Esse modelo liberal, por conta de diversos fatores, que não cabe aqui analisar, como a Revolução Industrial e as péssimas condições de vida dos trabalhadores e da população em geral, veio à bancarrota, dando ensanchas ao Estado Social. O que a Revolução Francesa foi para o Estado Liberal a Revolução Russa (1917) foi para o Estado Social[6]. Dois documentos legislativos são importantes para essa época: a Constituição Mexicana (1917) e a Constituição de Weimar (1919), que contemplaram direitos sociais e trabalhistas. Assim como ocorreu quanto ao Estado Liberal, o Social também passou por crises, entre as quais as duas grandes guerras e a forte influência dos efeitos delas no mundo inteiro. Não bastava mais uma concepção meramente formal de Democracia. O que se pretendia agora era a instauração de “um processo de efetiva incorporação de todo o povo nos mecanismos de controle das decisões e de sua real participação nos rendimentos da produção”[7] [8]. Desse evolver histórico nascem formulações que conduzem à concepção do Estado Democrático de Direito.

A República Federativa do Brasil, à luz da Constituição (1988), é um Estado Democrático de Direito. O reconhecimento desse modelo é um fato histórico, e não uma simples deliberação legislativa, que impõe uma nova ordenação para o Estado brasileiro. É em meio a isso, e sobretudo com a Carta de 1988, que surge um Ministério Público com características singulares e feições únicas no mundo, a ponto de Sadek dizer que “Podemos encontrar instituições análogas na América Latina, no mundo Europeu e na América do Norte”, mas em nenhum lugar no mundo “vamos nos deparar com um Ministério Público que apresente um perfil institucional semelhante ou que ostente igual conjunto de atribuições.”[9] O que se tinha antes no Direito Brasileiro quanto ao Ministério Público não se compara com a inovação constitucional, nem antes da Carta de 1988 e nem em nenhum outro país. Emanando do povo o poder, que é sua fonte de legitimidade, o Ministério Público, doravante, tem o dever constitucional de ser o guardião do regime democrático e da ordem jurídica.

III. O DIREITO DE SUFRÁGIO, A PERIODICIDADE DAS ELEIÇÕES E A FISCALIZAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

O disciplinamento constitucional (1988), em diversos dispositivos, quando trata, por exemplo, das eleições para os cargos eletivos da República Federativa do Brasil, reconhece a periodicidade dos mandatos. Nem mesmo a reeleição introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda Constitucional n. 16, de 4 de junho de 1997, alterou a necessidade de realização das eleições ao término de cada período de mandato (ou até mesmo antes, em situações excepcionais[10]). A república cria, juntamente com a liberdade individual, segundo Bauman, “uma comunidade que se autofiscaliza” e que usa “essa liberdade na busca comunitária do bem comum”. Os cidadãos, portanto, “fazem parte da república através da ativa preocupação com os valores promovidos ou desprezados pelo Estado.”[11]

Nessa linha, aspecto marcante como direito dos cidadãos, que agem para buscar livremente o bem comum escolhendo representantes para o exercício de mandatos, é o direito de sufrágio[12], que deve ser geral, igual, direto, secreto e periódico. Abordando a relação entre o princípio democrático e o direito de sufrágio, Canotilho elenca os seguintes princípios: (I) princípio da universalidade do sufrágio, que implica na proibição do sufrágio restrito, pois todos os cidadãos devem ser alcançados para que tenham e exerçam o direito de voto[13]; (II) princípio da imediaticidade, significando que o eleitor, por si mesmo e sem intermediários, manifesta a sua vontade através do voto; (III) princípio da liberdade: propicia ao eleitor o livre exercício do voto, isto é, a expressão de sua vontade não pode ser resultado de qualquer tipo de coação física ou psicológica; (IV) princípio do voto secreto: o voto não pode ser marcado, identificado, sinalizado, pois o voto, além de pessoal e livre, não pode ser exposto sob qualquer forma; (V) princípio da igualdade: o voto de um cidadão deve ter o mesmo valor do voto de qualquer outro. É a proibição de que um voto tenha mais valor que outro, e também que um eleitor tenha direito a mais votos que outro; (VI) princípio da periodicidade: decorre deste princípio a necessidade de submeter o preenchimento dos cargos à vontade dos eleitores em períodos determinados, o que se dá com a realização de eleições periódicas segundo a duração dos mandatos constantes na Constituição; (VII) princípio da unicidade: o eleitor só vota uma vez, isto é, para cada eleitor um voto (one man, one vote).[14]

Para os fins aqui abordados, cabe destacar o princípio das eleições.  É a Constituição que dispõe sobre o exercício periódico do sufrágio e a realização de eleições para determinados cargos de acordo com a duração dos mandatos. Isso tem por objetivo evitar a vitaliciedade no exercício dos mandatos. No caso brasileiro, isso fica mais evidente com a disciplina, no âmbito constitucional e infraconstitucional, das inelegibilidades[15], pois se procura impedir não só que indivíduos exerçam indefinidamente, o mandato[16] como também impossibilitar a perpetuação e a instalação de famílias no exercício do poder.

O Ministério Público desempenha função de grande importância nesse processo de manifestação do voto e escolha dos eleitos. O rol de atribuições conferidas ao Ministério Público é extenso, contudo, para os efeitos do que aqui se pretende será destacada apenas a defesa da ordem jurídica e do regime democrático (art. 127). São atribuições que estão vinculadas de forma indissociável, pois o regime democrático (democracia), na expressão de Ritt, “é a ordem jurídica constitucional que embasa um Estado de Direito e que determina e garante a democracia.”[17] Além disso, é da natureza do regime democrático brasileiro que o poder, que é do povo, seja exercido por intermédio de representantes eleitos ou diretamente. Quis assim a Constituição. Ora o povo exerce diretamente o poder, ora elege representantes para fazê-lo,[18] e o Ministério Público cumpre papel fundamental na defesa (diga-se ativa[19]) do regime democrático brasileiro.

A Constituição (1988) determina (art. 128) que o Ministério Público abrange (I) o Ministério Público da União, que compreende o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, e (II) os Ministérios Públicos dos Estados. Silenciou quanto ao Ministério Público Eleitoral. Na verdade, sequer a Constituição reporta-se à função eleitoral do Ministério Público, o que não deixa de ser um descompasso, pois a Justiça Eleitoral e todos os seus órgãos são previstos constitucionalmente (art. 118). Apesar disso, a Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, no art. 72 e seguintes, regulamentou o exercício da função eleitoral pelo Ministério Público, cabendo aos Promotores de Justiça[20] atuar nessas funções perante os Juízes e Juntas Eleitorais, e as demais funções perante os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e perante o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) caberão a membros do Ministério Público Federal.

Embora haja o silêncio do Texto Constitucional quanto às funções eleitorais do Ministério Público, a defesa da ordem jurídica e do regime democrático conferida ao órgão ministerial abrange – e não poderia ser diferente – aquelas funções. É uma consequência necessária. E não é só isso. A lei complementar impõe a participação do Ministério Público em “todas as fases e instâncias do processo eleitoral”, portanto, no mesmo sentido pretendido pela Constituição. Em todos os feitos eleitorais e em quaisquer atos promovidos pela Justiça Eleitoral, relacionados às suas funções, o Ministério Público Eleitoral tem interesse para atuar.[21] Adota-se aqui, quanto à atuação do Parquet, uma amplitude que vai além do que se tem denominado de “processo eleitoral”, expressão a respeito da qual há muitas controvérsias sobre o seu significado.[22], [23], [24]

IV. A IMPRESCINDÍVEL ATUAÇÃO DOS MINISTÉRIOS PÚBLICOS ESTADUAIS PERANTE OS JUÍZES E JUNTAS ELEITORAIS: UMA IMPOSIÇÃO FÁTICA

Recentemente, José Edvaldo Pereira Sales, em um pequeno escrito tratando da composição dos Tribunais Regionais Eleitorais e o exercício da jurisdição em primeiro grau, procurou demonstrar a necessidade de modificações na composição dos TREs e apontar fundamentos no sentido de que a competência para o exercício da jurisdição em primeiro grau cabe aos Juízes de Direito. Os argumentos podem ser resumidos em quatro: (I) o tratamento dispensado pela legislação passada e atual (constitucional e infraconstitucional); (II) a interpretação dada pela jurisprudência do TSE; (III) o posicionamento da doutrina; (IV) os aspectos estruturais com destaque para a presença física do magistrado na Zona Eleitoral. Quanto ao último objetivo, foi apresentada uma relação entre o número de Juízes Federais no país (cargos providos: 1.360) e o número de Zonas Eleitorais (3.037)[25] para se perceber a discrepância entre uma coisa e outra. Foram rebatidos dois argumentos contra o exercício da jurisdição eleitoral em primeiro grau pelos Juízes de Direito: a designação preferencial de Juízes Federais e a maior independência deles em relação aos Juízes de Direito. Foi sustentado, ainda que sem maiores aprofundamentos, que “Todos os argumentos suscitados aplicam-se, mutatis mutandis, no âmbito da primeira instância, aos membros do Ministério Público Eleitoral. Hoje essa função é desempenhada pelos promotores de justiça.”[26] Na sessão de 29 de março de 2012, o TSE, julgando processo a respeito do assunto (PET n. 33.275), Relator o Ministro Gilson Dipp, decidiu, por maioria, manter as atribuições de juízes eleitorais ao magistrados estaduais[27].

Assim, concentrando-se agora nas extensas atribuições do Ministério Público Eleitoral, Mazzilli lista, a partir de vários dispositivos legais, um rol de funções que devem ser exercidas.[28] Acima, foi sustentado que a atuação do órgão ministerial alcança não apenas o processo eleitoral em sentido amplo, isto é, desde um ano antes do pleito até a diplomação dos eleitos, mas todos os feitos e atos eleitorais. É que as ações da Justiça Eleitoral, por mais (aparentemente) “simples” que sejam, como um registro de filiação partidária ou um alistamento eleitoral, têm reflexos diretos no regime democrático brasileiro. O interesse para a atuação ministerial flui da natureza do ato. Por isso é que qualquer legislação infraconstitucional que queira mitigar essa ampla legitimidade do Ministério Público Eleitoral estará viciada de inconstitucionalidade.[29]

A Justiça Eleitoral é Justiça Especializada da União. Esse é um fato inconteste. Outro é que a função eleitoral, quanto ao Parquet, foi conferida ao Ministério Público Federal. O silêncio da Constituição levou o pelo legislador infraconstitucional à interpretação de que se a jurisdição de primeiro grau foi conferida aos Juízes de Direito Estaduais[30] a função eleitoral perante o Juízo Eleitoral caberia, ainda que por designação, aos Promotores de Justiça. Essa relação, todavia, não é de todo idêntica. É que, quanto aos Juízes de Direito, a competência deles decorre do próprio texto constitucional; já a função eleitoral exercida pelos Promotores de Justiça é fruto de lei complementar. No primeiro caso, a modificação do exercício dessa competência deve ocorrer via emenda constitucional; no outro, contudo, basta a alteração por lei complementar. Não parece, contudo, que uma coisa caminhe apartada da outra.

A escolha feita tanto pela Constituição e pela LC n. 75/93, valendo-se de motivos fundados na estrutura de funcionamento da Justiça Federal Comum e da Justiça Estadual Comum, quanto pelo legislador infraconstitucional, pelas mesmas razões (estrutura do Ministério Público Federal e dos Ministérios Públicos Estaduais), tem produzido importantes efeitos práticos para a Justiça Eleitoral e para o Ministério Público Eleitoral. Mesmo com projetos de interiorização da Justiça Federal e do MPF, ainda assim existe uma ausência física e, logo, estrutural muito grande na maioria dos municípios brasileiros. Diversamente, a Justiça Estadual Comum e o Ministério Público Estadual estão presentes física (a pessoa do juiz e a do promotor) e estruturalmente em todos os municípios, e até mesmo naqueles onde não há Comarca ou Promotoria instaladas existe uma vinculação a outra próxima, o que viabiliza o acesso dos cidadãos à justiça (eleitoral). É comum o Procurador Regional Eleitoral expedir ofícios, recomendações ou fazer reuniões, mesmo não se tratando de eleições municipais, para solicitar aos Promotores Eleitorais que fiscalizem o cumprimento da legislação eleitoral nas zonas eleitorais. Isso se dá não apenas por força do atual regramento, mas por impossibilidade (mais uma vez física e estrutural) do próprio Procurador Regional Eleitoral.

V. ÚLTIMAS PALAVRAS

As palavras finais são aqui lançadas como ponto de reflexão sobre a atuação dos membros do Ministério Público em geral, mais especificamente aos que desempenham a função eleitoral.

Não há dúvidas sobre a relevante missão institucional do Ministério Público como defensor do regime democrático e da ordem jurídica, e isso fica mais evidente no âmbito eleitoral, pois é por intermédio das eleições que o povo – o legítimo detentor do poder – manifesta sua vontade soberana escolhendo seus representantes. Embora a Carta Política (1988) não tenha expressamente se reportado a um “Ministério Público Eleitoral” e nem mesmo à “função eleitoral do Ministério Público”, a leitura do rol de atribuições conferidas à instituição ministerial, por um outro viés, legitima a atuação dos membros do Parquet para todos os feitos e atos relacionados às eleições e ao que a elas estiver vinculado de forma direta ou não.

Todavia, e daqui para diante as observações aspeadas são de Comparato, é necessário apagar os traços genéticos da vinculação que ainda existe entre o Ministério Público e o Chefe do Executivo. É um ranço de monarquia absoluta. Nos sistemas presidencialistas, como é o caso do Brasil[31], o chefe da instituição ministerial, seja no âmbito nacional ou estadual, é nomeado pelo titular do Executivo e é “o único agente público competente para denunciá-lo em processos criminais”. Embora isso não contamine, por si só, as ações daquele que for escolhido – e de regra não ocorre –, essa ingerência deve acabar, a fim de transmitir à população em geral, de forma nítida, a desvinculação entre a instituição ministerial e o Chefe do Executivo. O Ministério Público não pode – e certamente, quando isso ocorre, são atos isolados de membros descompromissados com a instituição e, porque não dizer, com a democracia brasileira –, servir a interesses político-partidários, qualquer que seja o governo. Cabe-lhe defender a ordem jurídica e o regime democrático.

Nas palavras de Comparato, “a denominação do órgão [Ministério Público] indica, já por si, a natureza das suas atribuições. Trata-se de um servidor do povo, não de um dependente ou agregado governamental. Para que o Ministério Público possa, portanto, defender com absoluta autonomia o bem comum do povo, é indispensável desvincular totalmente o órgão do Poder Executivo, retirando-se deste a atribuição de nomear qualquer dos seus integrantes.”[32]

O que se exige do membro do Ministério Público, sobretudo daquele que desempenha funções eleitorais, é que seja atuante, agente e não sujeito inerte; independente, submisso apenas aos ditames da Constituição; imparcial, sem paixões político-partidárias no seu mister, sem cores ou bandeiras; parcial (em favor da democracia), na medida em que defenda a ordem jurídico-constitucional e o regime democrático, logo, o bem comum; presente, não apenas nas manifestações processuais, mas em pessoa (física), para que inspire a confiança da população da Zona Eleitoral e verifique, por si, as irregularidades. Assim atuando, reafirmada será, a cada instante, a imprescindibilidade da atuação dos membros do Ministério Público, em particular (leia-se, no primeiro grau), dos Ministérios Públicos Estaduais, na fiscalização eleitoral.

 

Referências bibliográficas
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VELOSO, Zeno. Presidencialismo e parlamentarismo. Belém: CEJUP, 1991.
 
Notas:
* Este artigo com algumas atualizações corresponde ao que foi publicado, inicialmente, no livro “Ministério Público: o pensamento institucional contemporâneo”, lançado pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG), p. 202-219. A publicação original é com a coautoria de Antonio Eduardo Barleta de Almeida.
[1] É a conhecida fórmula de Lincoln: “governo do povo, pelo povo e para o povo”.

[2] Fazendo a relação entre Constituição e soberania popular como critério de legitimação do poder político, Antonio G. Moreira Maués pontua: “Essa associação [Constituição e estabilidade] advém das próprias características do constitucionalismo moderno, cuja originalidade não reside apenas na positivação em um único documento dos princípios da garantia de direitos e da divisão de poderes, mas também no reconhecimento da soberania popular como critério de legitimação do poder político. Isso implicava que a Constituição, emanada diretamente da vontade do povo, deveria sobrepor-se inclusive ao poder legislativo, estabelecendo limites para sua atuação.” (MAUÉS, Antonio G. Moreira. Dez anos de constituição, dez anos de reforma constitucional. In: Constituição e democracia. MAUÉS, Antonio G. Moreira (Org.). São Paulo: Max Limonad, p. 9-37, 2001).

[3] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 7ª ed. Coimbra: Edições Almedina, 2003, p. 281-283.

[4] Eduardo Ritt alerta para o fato de que “embora o mundo tenha se transformado, como de fato se transformou, com a mutação da sociedade, do Estado e do Direito, até hoje percebemos o mundo a partir das concepções do ideal liberal, ainda que inconscientemente, reproduzindo um modelo superado.” (RITT, Eduardo. O Ministério Público como instrumento de democracia. In: Revista do Ministério Público, Porto Alegre, v. 42, 2000, p. 82-105.

[5] BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 6ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros Editora, 1996, p. 67.

[6] BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 6ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros Editora, 1996, p. 211.

[7] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16ª ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros Editora, 1999, p. 122. (os itálicos são do original).

[8] Estabelecendo essa relação entre o Estado Liberal, o Estado Social e o Estado Democrático de Direito, Lenio Streck diz: “Resta cristalino que o Direito não se imuniza aos saltos paradigmáticos do Estado. O perfil nitidamente intervencionista que caracterizou o Estado Social e que continua presente no atual estágio do Estado Democrático de Direito aponta para um Direito de conteúdo não apenas ordenador (Estado Liberal) ou promovedor (Estado Social), mas, sim, potencialmente transformador. (STRECK, Lenio Luiz. Ministério Público e jurisdição constitucional na maioridade da Constituição – uma questão de índole paradigmática. In: RIBEIRO, Carlos Vinícius Alves (Org.). Ministério Público: reflexões sobre princípios e funções institucionais. – São Paulo: Atlas, p. 183-212, 2010).

[9] SADEK, Maria Tereza. A construção de um novo Ministério Público resolutivo. Revista Jurídica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais – De Jure, Belo Horizonte: MP.MG, n.12, p. 130-139, jan./jun. 2009.

[10] Por exemplo, nos casos determinados pela Justiça Eleitoral em face de cassação de mandatos.

[11] BAUMAN, Zygmunt. Em busca da política. Tradução Marcus Penchel. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000, p. 169,171.

[12] José Afonso da Silva faz a distinção entre sufrágio, voto e escrutínio: “As palavras sufrágio e voto são empregadas comumente como sinônimas. A Constituição, no entanto, dá-lhes sentidos diferentes, especialmente no seu art. 14, por onde se vê que o sufrágio é universal e o voto é direto, secreto e tem valor igual. A palavra voto é empregada em outros dispositivos, exprimindo a vontade num processo decisório. Escrutínio é outro termo com que se confundem as palavras sufrágio e voto. É que os três se inserem no processo de participação do povo no governo, expressando: um, o direito (sufrágio); outro, o seu exercício (voto), e o outro, o modo de exercício (escrutínio).” (SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16ª ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros Editora, 1999, p. 350).

[13] As exceções estão relacionadas com a falta de capacidade eleitoral, pois, como consequência do princípio da universalidade, tem-se a proibição de discriminação qualquer que seja o fundamento (sexo, raça, rendimento, instrução, ideologia). (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 7ª ed. Coimbra: Edições Almedina, 2003, p. 294).

[14] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 7ª ed. Coimbra: Edições Almedina, 2003, p. 294-298.

[15] No Brasil, as inelegibilidades têm tratamento direto na Constituição e também, por determinação do texto constitucional (art. 14, § 9º), pela Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990.

[16] Cabe esclarecer que, no Executivo, a reeleição é permitida no Brasil, impedindo-se, todavia, um terceiro mandato consecutivo. Possível, portanto, será pleitear o terceiro mandato, desde que não consecutivo ao segundo. Quanto aos cargos do Legislativo, não existe a restrição do exercício consecutivo de mandatos. Portanto, quando se fala em “princípio da periodicidade”, está-se, sobretudo, destacando a realização de eleições periódicas para que os eleitores manifestem sua vontade através do voto, mantendo ou não os que exercem mandatos.

[17] RITT, Eduardo. O ministério público como instrumento de democracia e garantia constitucional. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 154.

[18] Correta, nesse sentido, a assertiva de Eduardo Ritt, para quem “Tal princípio [princípio democrático] implica tanto a teoria democrática representativa como a democracia participativa, ou seja, ao mesmo tempo em que estrutura a democracia através de órgãos representativos, eleições periódicas, pluralismo político e divisão de funções, também estrutura processos que ofereçam aos cidadãos efetivas possibilidades de aprender a democracia, participar nos processos de decisão, exercer controle crítico na divergência de opiniões e produzir inputs políticos democráticos.” (RITT, Eduardo. O ministério público como instrumento de democracia e garantia constitucional. – Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 158).

[19] A respeito da atuação do Ministério Público, que ora atuaria como parte ora como fiscal da lei (custos legis), tem razão Hugo Nigro Mazzilli em dizer que a atuação do Parquet sempre fiscaliza o cumprimento da lei. Segundo esse autor “A rigor, na técnica processual, as expressões fiscal da lei e parte imparcial não requerem dizer absolutamente nada. Fui, há muitos anos, alertado para isso por Cândido Rangel Dinamarco. Dinamarco convenceu-me de que o Ministério Público sempre fiscaliza o correto cumprimento da lei, não só quando interveniente, mas também quando órgão agente.” (MAZZILLI, Hugo Nigro. O Ministério Público é parte imparcial?. Revista dos Tribunais, São Paulo: RT, v.100, n.913, p. 289-297, nov./2011).

[20] A LC n. 75/93 prescreve que “O Promotor Eleitoral será o membro do Ministério Público local que oficie junto ao Juízo incumbido do serviço eleitoral de cada Zona” (art. 79). Todavia, existem várias Zonas Eleitorais que abrangem território onde vários Promotores de Justiça desempenham suas funções. Qual deles exercerá a função eleitoral? O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) expediu a Resolução n. 30, de 26 de fevereiro de 2008, que estabelece parâmetros para a indicação e a designação de membros do Ministério Público para exercer função eleitoral em 1º grau. No art. 1º, III, consta que “nas indicações e designações subsequentes, obedecer-se-á, para efeito de titularidade ou substituição, à ordem decrescente de antiguidade na titularidade da função eleitoral, prevalecendo, em caso de empate, a antiguidade na zona eleitoral”. Parece, contudo, que o melhor critério seria o da antiguidade na entrância, com exercício de titularidade na Zona Eleitoral, para privilegiar e uniformizar o tratamento dispensado às demais situações no âmbito do Ministério Público.

[21] Sobre essa ampla atuação, Hugo Nigro Mazzilli entende que “Considerando-se a destinação institucional do Ministério Público, qual seja a de defesa da ordem jurídica e do regime democrático, sustentamos o imediato cabimento de sua atuação fiscalizadora em todo o procedimento eleitoral” (itálicos do original). (MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. – 7. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2008, p. 217).

[22] Em mais de uma ocasião, o TSE e o STF puderam enfrentar o tema; em todas, os votos e as conclusões dos julgamentos foram divergentes. O STF enfrentou o tema, por exemplo, nas Ações Diretas de Inconstitucionalidades ns. 354 (Lei n. 8.037, 25.5.1990), 3.685 (Emenda Constitucional n. 52, de 08.03.2006), 3.741 (Lei n. 11.300, de 10.5.2006), 4.307 (Emenda Constitucional n. 58, de 23.9.2009) e RE 633703 (Lei Complementar n. 135, de 4.6.2010).

[23] O Min. Celso de Mello, por ocasião do julgamento da ADI n. 354, entendeu “processo eleitoral” da seguinte forma: “Tenho para mim que o processo eleitoral, enquanto sucessão ordenada de atos e estágios causalmente vinculados entre si, supõe, em função do tríplice objetivo que persegue, a sua integral submissão a uma disciplina jurídica que, ao discriminar os momentos que o compõem, indica as fases em que ele se desenvolve: (a) fase pré-eleitoral, que, iniciando-se com a apresentação de candidaturas, estende-se até a realização da propaganda eleitoral respectiva; (b) fase eleitoral propriamente dita, que compreende o início, a realização e o encerramento da votação e (c) fase pós-eleitoral, que principia com a apuração e contagem de votos e termina com a diplomação dos candidatos eleitoral, bem assim dos seus respectivos suplentes.”

[24] Ainda a respeito do “processo eleitoral” e a atuação do Ministério Público, Marum entende que: “Assim, a todo o processo eleitoral em sentido amplo, que vai desde o alistamento dos eleitores, passando pelo registro das candidaturas, pela campanha eleitoral, pelo exercício do sufrágio e pela apuração até chegar à proclamação dos vencedores e consequente diplomação dos eleitos, deve o Ministério Público estar atento e vigilante, para o bem do regime democrático que lhe cabe defender. Qualquer burla, qualquer desrespeito às normas que regem o processo eleitoral deve ensejar a pronta e eficiente intervenção do Ministério Público, sob o risco de ferir-se a própria democracia.” (MARUM, Jorge Alberto de Oliveira. Ministério Público Eleitoral. In: VIGLIAR, José Marcelo; MACEDO JÚNIOR, Ronaldo Porto (Coord.). Ministério Público II: democracia. – São Paulo: Atlas, p. 150-176, 1999).

[25] Esses números foram colhidos dos sítios do Conselho da Justiça Federal e do Tribunal Superior Eleitoral.

[26] SALES, José Edvaldo Pereira. Composição dos Tribunais Regionais Eleitorais e o exercício da jurisdição em primeiro grau. In: Revista do Centro de Apoio Operacional de Defesa dos Direitos Constitucionais e Interesses Difusos e Coletivos/Procuradoria Geral de Justiça. Belém: MP.PA, v. 05, n. 07, (jan./jun.); p. 29-38, 2011.

[27] Notícia veiculada pelo TSE (Disponível em: <http://agencia.tse.jus.br/sadAdmAgencia/noticia Search.do?acao=get&id=1465133
>. Acesso em: 11 abr.2012.

[28] “Afora o encargo de o Ministério Público promover a ação penal pública nos crimes eleitorais, na matéria eleitoral só se fazem referências esparsas à sua intervenção, tais como: a) no processo das infrações penais; b) na cobrança de multas; c) na discriminação das atribuições dos procuradores-gerais, como, v.g., exercer a ação penal pública em todos os feitos de competência originária do tribunal; oficiar em todos os recursos; representar ao tribunal para observância e aplicação uniforme da legislação eleitoral; efetuar requisições; d) na fiscalização da abertura das urnas; e) na promoção de responsabilidade por nulidade de eleição; f) na arguição de suspeição; g) nos pedidos de registro de partidos e de seus órgãos dirigentes; h) no pedido de cancelamento de registro de partido; i) no pedido de desaforamento; j) nas justificações e perícias; l) na impugnação de registro de candidato; m) na propositura de ação visando à declaração da perda ou suspensão de direitos políticos.” (MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. – 7. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2008, p. 216).

[29] Não pode, portanto, o legislador infraconstitucional limitar a atuação do Ministério Público Eleitoral. Para citar dois exemplos, tem-se a Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, que em seu art. 96 não apontou o Ministério Público como parte legítima para o ajuizamento de representações e reclamações perante a Justiça Eleitoral pelo descumprimento da lei eleitoral, e o caso semelhante ocorrido com a Lei n. 9.096, de 19 de setembro de 1995, com redação dada pela Lei n. 12.034, de 29 de setembro de 2009, que em seu art. 45 aponta como parte legítima para o ajuizamento de representação por irregularidade na propagada partidária somente o partido político. Ambos os dispositivos devem ser receber interpretação conforme, pois o art. 127 da Constituição (1988) ao atribuir ao Ministério Público a função de defesa da ordem jurídica e do regime democrático, impediu o legislador, pela via infraconstitucional, de limitar essa atuação do órgão ministerial.

[30] “É sabido que todos os juízes são ‘de direito’. Entretanto, referindo-se ao art. 121 da Constituição, doutrinadores – e apenas para mencionar estes – como Carlos Velloso e Walber de Moura Agra dizem que esses juízes são os ‘componentes da magistratura comum, estadual’. O constitucionalista José Afonso da Silva assevera expressamente que ‘Os juízes eleitorais são os próprios juízes de direito da organização judiciária dos Estados ou do Distrito Federal’ (itálicos do original). Outra não é a posição de Manoel Gonçalves Ferreira Filho para quem ‘Embora o art. 121 [da Constituição] deixe para a lei complementar dispor, as funções de juízes eleitorais são exercidas pelos juízes da justiça estadual comum’.” (SALES, José Edvaldo Pereira. Composição dos Tribunais Regionais Eleitorais e o exercício da jurisdição em primeiro grau. In: Revista do Centro de Apoio Operacional de Defesa dos Direitos Constitucionais e Interesses Difusos e Coletivos/Procuradoria Geral de Justiça. Belém: MP.PA, v. 05, n. 07, (jan./jun.); p. 29-38, 2011).

[31] Sobre essa concentração de poder nas mãos do Presidente da República e criticando o sistema presidencialista, Zeno Veloso diz que “Na América Latina, lamentamos dizer, o presidencialismo tem sido uma forma de ‘ditadura legal’. Na lição de Ruy Barbosa, no presidente se encarna ‘o poder dos poderes, o grande eleitor, o grande nomeador, o poder da bolsa, o poder dos negócios, o poder da força”.  Continua, mais adiante: “No Brasil, o quadro é desolador. O sistema, entre nós, nem mesmo tem sido presidencialista, mas hiperpresidencialista, e o que se vê, na prática, é o caudilhismo incontrolável. Em décadas  de história, em um século de experiência, o presidencialismo conseguiu produzir alguns hiatos de democracia e longos períodos de autoritarismo, ciclos intermináveis de quebras institucionais e ditaduras de triste memória.” (VELOSO, Zeno. Presidencialismo e parlamentarismo. Belém: CEJUP, 1991, pág. 12-14).

[32] COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. – São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 679.


Informações Sobre o Autor

José Edvaldo Pereira Sales.

Mestre e Doutorando em Direito PPGD/UFPA. Promotor de Justiça Estado do Pará


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