Na saúde, na doença e na violência

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Resumo: O presente artigo vem com o objetivo de identificar, por meio da revisão da literatura, fatores que podem levar sujeitos que compõe um casal e vivenciam a violência conjugal, a permanecerem na conjugalidade. Para tanto optou-se por uma pesquisa de cunho descritivo-exploratório de método qualitativo. Verificou-se como possibilidade a influência sócio-histórica da moral cristã; outro ponto para se pensar foi o medo das consequências ocasionadas por uma possível mudança do ciclo familiar, com a dissolução da conjugalidade, somado a preocupação com os filhos do casal, se houver; dentre outros fatores apresentados no artigo. O movimento feminista mostra-se como marco nas mudanças em questões de relação de gênero e com isso no entendimento de violência conjugal. Porém, algumas construções sociais e subjetivas parecem se transformar a passos mais lentos, causando na atualidade, um entrelace de concepções novas e arcaicas acerca da problemática e possibilidades de idas e vindas dos casais. Portanto, tendo em vista à resolução dos maus tratos no contexto da conjugalidade, faz-se necessário, trabalhos voltados a reflexões acerca dos modelos de gênero, relações de poder, conjugalidade, conscientização e fortalecimento do senso crítico do casal.

Palavras- Chave: Conjugalidade. Separação. Violência conjugal. Movimento feminista. Gênero.

Abstract: This article aims to identify, through literature review, factors that can lead individuals who make a couple and live the conjugal violence, to remain in the marital. Therefore we chose a descriptive-exploratory qualitative method for the research. It was found as a possibility socio-historical Christian morality influence; another point to think was the afraid of consequences caused by a possible change in the family cycle, with the dissolution of the marital, in addition the concern with the couple's children, if any, among other factors set forth in article. The feminist movement shows up as a boundary in the transitions in matter of gender relations and thus the understanding of domestic violence. However, some social and subjective constructions seem to turn lower steps, actuality resulting, in an interlink of new and archaic conceptions about the problems and possibilities of comings and goings of couples. Thus, in order to solve the abuse in the context of marital, it is necessary the work focused to reflections about the models of gender, power relations, marital, awareness and strengthening on the critical sense of the couple.

Keywords: Stable relationships. Separation. Marital violence. Feminist movement. Gender.

Sumário: Introdução. 1. Conjugalidade. 1.1. Dissolução Conjugal. 2. Violência. 2.1. Violência Conjugal. 3. Discussão. Considerações Finais. Referências.

Introdução

O presente artigo científico foi motivado por inquietações que surgiram em 2009, durante observações no estágio voluntário realizado no (na época, recém inaugurado) Centro Humanitário de Apoio a Mulher (CHAME-RR).

Enquanto estagiária, na equipe de trabalho multidisciplinar (entre direito, psicologia e serviço social) criada para atender mulheres em situação de violência doméstica, participava do acolhimento da requerente, triagem, mediação (caso necessário) e atendimento psicológico individual, seja terapia breve ou orientação, onde se verificava a necessidade de encaminhamento para demais órgãos da rede.

Essas atividades possibilitaram uma observação muito rica, por vezes até da dinâmica entre o casal que se apresentava ali, o que sempre foi motivo de dúvidas inquietantes na equipe: Por que essas mulheres não se desvencilham dessa situação de violência, sempre retornando com as mesmas queixas, dos mesmos companheiros? O que faz elas continuarem nessa relação?

Por conseguinte, a problemática começa a ser vista sob a perspectiva relacional, onde ambos são atuantes no processo, constroem tanto o ambiente de conjugalidade como da violência e fazem a manutenção do mesmo, presos em um ciclo onde não há telespectadores, mas protagonistas (ALVIM; SOUZA, 2005).

Contudo, com o intuito de um olhar mais abrangente da situação, chegou-se a seguinte problemática: O que faz, não apenas a mulher, mas esse casal viver em situação de conflito tão eminente, parecendo não saber geri-los, ao ponto de causarem e sofrerem violência e continuarem juntos? O que sustenta essa união?

Segundo estudos realizados pela Organização Mundial da Saúde, divulgado pela página da internet da Rádio das Nações Unidas (2010), estima-se que no mundo, uma em cada três mulheres já foi vítima de algum tipo de violência.

Dados resultantes de pesquisa feita no Brasil pela Fundação Perseu Abramo (2001) indicam percentil variando entre 53% a 70%, da violência praticada contra a mulher são causadas por seus parceiros, por serem as pessoas mais íntimas a elas. Outros autores de violência contra mulher comumente citados são o ex-marido, o ex-companheiro e o ex-namorado, que somados ao marido ou parceiro constituem maioria em todos os casos.

Recorda-se outros dados em que a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2005), desde estudos pioneiros em 2005, mostra sua preocupação com o assunto em questão. Em uma reportagem declara que a violência doméstica está generalizada e possui um grave impacto sobre a saúde. Dessa forma, esse fenômeno, que anteriormente era assunto restrito apenas a segurança pública, amplia seu campo de ação, passando também a ser interesse de estudo, combate e prevenção em saúde pública, que avança em pesquisas e medidas de combate nessa área.

Outra contribuição vem do instituto de pesquisa IBOPE (2009), que nos mostra o percentil de 55% dos brasileiros afirmando conhecer uma mulher que viveu ou vive em situação de violência com seu parceiro.

Tratando-se de questões econômicas, o Brasil é o país que mais sofre com a violência doméstica, perdendo cerca de 10,5% do seu PIB em decorrência desse grave problema (BARSTED, 1998 apud TAVARES, 2000).

Entretanto, como a violência, sobretudo a doméstica, ainda velada entre as quatro paredes, é algo mais complexo do que apenas apontar vítima e algoz, faz-se necessário, ser investigada de forma mais profunda, ou seja, levando em consideração aspectos individuais, familiares, históricos de valores e modelos sociais na conjuntura desses relacionamentos.

Segundo Alvim e Souza (2005), a ótica relacional sob a violência doméstica vem quebrar com alguns paradigmas, da mulher vista apenas como vítima e seu companheiro o autor da violência. Essa abordagem não descarta a intensidade dos dados alarmantes da violência praticada contra mulher por seus parceiros, mas traz a elas o papel participativo na construção e manutenção tanto da conjugalidade quanto da violência, por discutir também a relação de gêneros e poder.

As consequências do abuso são profundas, indo além da saúde e da felicidade individual, afetando o bem-estar de comunidades inteiras, por se tratar de um problema centrado na família, porém com grandes alcances. Mesmo com essa demanda não há, na América Latina, uma ampla pesquisa feita com casais em situação de violência doméstica se comparados a pesquisas com mulheres vítimas de violência, pois o que se evidencia é a vitimização da mulher, há poucos estudos voltados para o autor da violência contra mulher e raríssimos os que veem sob a perspectiva relacional a construção do ambiente violento entre o casal (DEEK at col, 2009).

Os mesmos autores afirmam que estudos por essa perspectiva com homens autores de violência contra mulher, no Brasil, ainda são escassos. Por outro lado, ainda no contexto brasileiro, tem-se Beiras (2009), com uma linha de pesquisa nessa área, em um trabalho de aplicabilidade da teoria, com esse grupo de homens. O grupo busca a discussão das relações de gênero, para ressignificação de seus modelos de masculinidade, como também reflexões acerca da conjugalidade e dificuldades construídas social e individualmente. Logo, uma intervenção que engloba a família é fundamental, por voltar um olhar para além da violência.

Diante do que foi exposto, a violência conjugal não diz respeito apenas a quem a pratica ou quem sofre diretamente dela, como agressor ou vítima na família nuclear. O fato que está cada vez mais evidente é seu raio de impacto em toda a sociedade, em setores como: segurança e saúde pública e até na economia do país, passando a ser assunto de todos nós, enquanto responsabilidade social.

Em virtude dos dados apresentados, justifica-se esta pesquisa, pelo propósito de compreensão do fenômeno, especialmente acerca dos fatores que levam o casal que vivencia a violência conjugal a permanecer tanto com a violência, quanto com a conjugalidade. Além de resgatar saberes, pretende-se com isso, levantar novos questionamentos para auxiliar os profissionais da área de Psicologia, Direito, Saúde Pública e afins. Outra proposta está em servir de alicerce para futuras pesquisas, tendo em vista a realidade local, na busca de usufruir ao máximo do órgão já existente no estado, o Centro Humanitário de Apoio a Mulher. Como também servir de subsídio para possíveis ações de políticas públicas não apenas no combate, mas na prevenção deste tipo de violência que assola nosso país.

Esta pesquisa objetiva identificar, por meio da revisão da literatura, fatores que levam os sujeitos que compõe o casal, que sofrem e causam violência conjugal a permanecerem juntos em situação de violência. Mais especificamente pretende-se acompanhar o desenvolvimento do conceito de conjugalidade, tendo como marco inicial o movimento feminista; indicar a complexidade do fenômeno violência; identificar questões de gênero envolvidas no contexto de violência conjugal e apontar questões sociais, a partir da literatura, que estariam envoltas na decisão dos sujeitos que compõe o casal em violência, a permanecerem na conjugalidade.

Tendo em vista os objetivos propostos, a pesquisa foi elaborada com cunho descritivo-exploratório de método qualitativo, por meio de revisão de literatura, “que consiste em uma pesquisa na bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, (…) não sendo uma mera repetição daquilo que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras” (MARCONI; LAKATOS, 1990, p. 66).

As fontes utilizadas para subsidiar a pesquisa foram: revistas científicas e livros impressos, meios eletrônicos com auxílio de sítios de pesquisa, periódicos eletrônicos, scielo, bvs-psi e periódicos CAPES.

Conforme Macedo (1994) a pesquisa bibliográfica envolve uma série de procedimentos, divididos nas seguintes etapas: inicialmente procura-se localizar e obter documentos pertinentes ao estudo, levantando a bibliografia básica; por seguinte, elaborar um esquema provisório de planejamento de leitura, com lista de autores da área, para ser usado como guia nas anotações dos dados; transcrever em fichas os assuntos interessantes de cada documento encontrado; enriquecer a primeira investigação bibliográfica pelo fichamento dos primeiros documentos analisados; e reformular o esquema provisório dando início a redação da pesquisa, partindo para discussão do tema.

Utilizou-se como técnica a análise de conteúdo, proposta por Minayo (1994), que conceitua análise como interpretação minuciosa dos dados da pesquisa, em que cronologicamente é composta pelas seguintes etapas: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação. Por sua vez, para a presente pesquisa optou-se pela definição de categorias já pré-estabelecidas, tendo em vista, alcançar todos os objetivos propostos.

A escolha por esse tipo de pesquisa se deu pela necessidade de resgate teórico, devido ao restrito tempo disponível para aprofundar questões relevantes na literatura e ainda resultados da pesquisa de campo. Contudo, por haver uma demanda social, apresenta-se como intuito de vir a ser subsídio para futuras pesquisas de campo no âmbito de pós-graduação e mestrado, na busca de aprimoramento das ferramentas, para uma análise mais detalhada e minuciosa da realidade local.

Visando responder a problemática em questão, optou-se pela perspectiva Rizomática de Deleuze e Guattari (2000) que entende o viés de uma pesquisa qualitativa na área das Ciências Humanas, como não linear, mas que dentro de um contexto, apresenta diversas linhas, onde não se sabe ao certo o início ou fim de cada uma, apenas que se entrelaçam de forma que uma influencia e faz parte da outra, formando um emaranhado similar a um rizoma. Termo esse resgatado da botânica que o define como “sistemas de caules subterrâneos de plantas flexíveis que dão brotos e raízes adventícias em sua parte inferior” (GUATTARI, F; ROLNIK, S, 1986).

Para isso, iniciaremos tal jornada de descobertas, com o capítulo dedicado a conjugalidade, em que iremos acompanhar o conceito de conjugalidade, obtendo como marco inicial, o movimento feminista.

Em um segundo momento, será desenvolvido o capítulo sobre separação e divórcio, para salientar a tentativa de responder as inquietações propostas pela pesquisa, do por que esse fenômeno, que é a dissolução conjugal, não ocorrer em alguns casais que vivenciam a violência.

Apresentando-se como terceiro capítulo: violência, que irá expor uma diversa gama de significados que a palavra violência traz, seu impacto, origens e perspectivas futuras para algumas correntes teóricas.

Por fim, o quarto capítulo trará consigo as motivações, ciclos e tipos de violência conjugal, finalizando a exposição de ferramentas que contextualizará e dará corpo a discussão dessas ramificações entrelaçadas, aqui cuidadosamente expostas, acompanhadas e debatidas, na tentativa de possibilitar uma clara e deliciosa busca pelo conhecimento de tema tão paradoxal.

1. Conjugalidade

O conceito conjugalidade está em constante transformação, por envolver uma série de fatores, sociais, culturais e subjetivos. Logo, não se trata de uma tarefa simples descrever as diversas abordagens teóricas que serão aqui atravessadas e discutidas.

No Brasil, até o final do século XIX, a Igreja Católica oferecia a única forma de reconhecimento da conjugalidade perante a sociedade, por meio do casamento religioso. A Proclamação da República em 1889, rompe com a hegemonia da Igreja Católica, no entanto manteve nas legislações brasileiras a fundamentação do Direito Canônico e uma forte influência de tais diretrizes no conceito de conjugalidade. Inclusive nas legislações referentes ao Direito da Família, mantendo a definição do casamento como sociedade formada pela união para toda vida de um homem e de uma mulher, amparados pela lei, a fim de regularem suas relações sexuais, com organização de deveres bem marcadas (GOMES et al., 2005).

Nesta época, os papéis dos gêneros estavam bem definidos, baseado no modelo hierárquico de direitos entre homem e mulher. O marido tomava todas as decisões importantes para a manutenção da família, à mulher por outro lado, era encarregada dos afazeres domésticos e da assistência moral da família (CARBONERA, 1998; CANTERA, 2004).

A partir da década de 1960, devido às transformações nas relações de gênero, podemos observar mudanças significativas para o que conhecemos hoje como conjugalidade. Após a Segunda Guerra Mundial, que durou de 1939 a 1945, ampliou-se o número de mulheres no mercado de trabalho e ocorreram movimentos de contracultura – como os hippies, de “faça amor não faça guerra”, nos Estados Unidos e os Universitários na Europa (como o Maio de 1968, na França) – que proporcionaram o cenário para o desencadeamento de mudanças nas relações de gênero. O marco dessas alterações foi o Movimento Feminista – movimento moderno, com suas raízes nas idéias iluministas e transformadoras das Revoluções Francesa e Americana – que buscaram a princípio, direitos sociais e políticos, questionando os papéis de gênero (COSTA, 2005).

As contestações e reivindicações feministas, através de lutas pacifistas, dos papéis que estavam sendo assumidos pela mulher, somadas aos movimentos estudantis e hippies, posteriormente, mobilizaram alguns países da América Latina, como por exemplo, o Brasil, que teve como maior arma a favor da divulgação das idéias do movimento, mulheres que trabalhavam nos setores de comunicação do país.

“O movimento significou uma redefinição do poder político e da forma de entender a política ao colocar novos espaços no privado e no doméstico. Sua força está em recolocar a forma de entender a política e o poder, de questionar o conteúdo do formal que se atribuiu ao poder a as formas em que é exercido” (COSTA, 2005, p. 03).

Ao consolidar a luta das mulheres por direitos políticos e independência econômica, por questionamentos levados do ambiente privado para o público, o movimento feminista, conquista para as mulheres direito à autonomia de seu corpo, ao facilitar o acesso às pílulas anticoncepcionais e com isso a possibilidade de desvincular sua sexualidade da procriação (COSTA, 2005).

Cria-se a necessidade de novas condutas, mais flexíveis, por romper com padrões femininos rígidos e antigos, consequentemente, gerou mudanças nos padrões de masculinidade, produzindo transformações significativas tanto na união do casal como no processo de dissolução dessa união (ALVIM; SOUZA, 2005).

No Brasil, o impacto dos acontecimentos da época exigiu mudanças na legislação e em 1962, a Lei 4121 (Estatuto da Mulher Casada), possibilita capacidade jurídica plena às esposas, entretanto, a única forma de separação legal era o desquite, não havendo a possibilidade jurídica de um novo casamento. Porém, como dito anteriormente, o catolicismo se faz presente no princípio de moralidade cultural de nosso país, desse modo os casais que procurassem tal dissolução, eram visto de forma negativa pela sociedade (GOMES et al., 2005).

Apenas em 1977, após muitas lutas e discussões no judiciário, como resultado das transformações históricas, sociais e culturais, somado ao incentivo dos militares. Sobretudo, do General Ernesto Geisel, que teria interesse em ser general e concorrer a Presidência da República (nenhum dos cargos poderiam ser usufruídos por divorciados), foi aprovada a Lei 6515 (Lei do Divórcio), regulamentando a separação judicial, que seria o antigo desquite, porém agora com a possibilidade do divórcio e nova união conjugal legalizada.

Ainda segundo os mesmos autores, no contexto familiar, pouco mais de uma década ter se passado, a Constituição Federal de 1988 altera alguns pontos no Direito da Família; amplia o conceito de família, quando reconhece a união estável entre homem e mulher como entidade familiar. Outro modelo de família reconhecida legalmente a partir desse marco é formado por apenas um dos genitores e seus descendentes, o que ocorreria em casos de pais separados, ou ainda os que optaram por não estarem juntos enquanto casal, antes mesmo do nascimento de seu(s) filho(s). A constituição Federal de 1988 supera também discriminações legislativas ao conceder às mulheres igualdade de direitos e permitir a dissolução de sociedade conjugal através do divórcio (desligamento Legal total entre os cônjuges), desde que atendidos os requisitos previstos em lei.

Com as transformações histórico-sociais, há uma mescla de princípios, que resgatam como papel das mulheres, o cuidado da manutenção dos laços familiares, principalmente a qualidade da relação conjugal. Ao passo que tem agora uma jornada dupla de trabalho, dentro e fora de casa.

Atualmente, os homens mostram-se mais receptivos para resolver problemas familiares de ordem afetiva (antes apenas designado as mulheres). Contudo, ainda são vistos como auxiliar da esposa no lar. Pois, mesmo com todas essas mudanças, há uma pressão para que o sujeito do gênero masculino não exponha seus sentimentos, seja objetivo e compromissado, por não ser o comportamento compatível ao seu gênero. Devido a esses fatores, segundo Silva (2004), na família, a figura masculina estaria passando por uma desvalorização e a mulher, passa a assumir uma nova pluralidade de papéis, com jornada dupla de trabalho. Contudo, continua ganhando menos que os homens  (SILVA, 2004; SANTOS, MORAIS e MENEZES, 2008).

Dessas transformações nos gêneros: masculino e feminino, novos arranjos conjugais surgem (FIGUEIRA, 1987) e o compromisso matrimonial mostra-se como realização de desejo entre alguns casais, em um processo de envolvimento pessoal que se concretiza na ação do ritual do casamento, o que exige também um processo de regulamentação legal, ou seja, jurídico. Cabe aqui frisar que a ritualização do casamento, não se trata de um pré-requisito obrigatório para o surgimento da conjugalidade, mas que a sociedade tal como se apresenta agora, ainda mostra-se em uma busca por um ideal de família, com o reflexo da formação clássica que tinha-se, quando os papéis de cada membro estavam bem claros, há um entrelace entre as mudanças ocasionadas pelas transformações nos papéis de gênero  e um resgate de preceitos morais arcaicos, bem enraizados, gerando uma crise em o que “seguir, como agir e pensar, no embate entre o novo e o arcaico (FIGUEIRA, 1987; BEIRAS, 2008).

A linha histórica traçada até aqui dá margem para discutir-se a atualidade, Bauman (2004) faz uma crítica a forma de como vivencia-se o amor na sociedade capitalista, que atualmente é a estima base para surgimento da conjugalidade. O autor alega fragilidade nos vínculos humanos, devido ao fato dos indivíduos tratarem uns aos outros como mercadorias, que a todo o momento, são substituídas quando encontram falhas ou “modelos” mais agradáveis. Com laços superficiais, deixam-se essas pessoas de lado e tecem novas relações com certa facilidade. No amor romântico (amor que é o direcionado ao parceiro íntimo ou a quem se pretende ter maior intimidade como parceiro), por exemplo, o autor observa uma falta de compromisso, de declarações (quando tem), pouco se espera do outro e consequentemente pouco se doa ao outro. Quando esses mesmos relacionamentos são duradouros, aparecem suspeitas de uma dependência emocional. Todas essas transformações repentinas na sociedade acabam refletindo na sexualidade desta época, vista por Bauman (2004) com um fim em si mesma, por ter se desvinculado do amor, mostra-se  muitas vezes decepcionante, com momentos de felicidade passageira.

Beiras (2008) complementa a idéia de Bauman (2004), afirmando que neste contexto não se tem apenas um, mas vários conceitos de família, a mulher vem cada vez mais conquistando direitos igualitários e o homem redefinindo seu papel e espaço. A praticidade e a individualidade, não são apenas palavras-chave da cultura de consumo a qual se é exposto. Atinge também a conjugalidade, tornando cada vez mais difícil a construção e manutenção de uma vida a dois. Por tudo se focar no prazer imediato, as pessoas descartam não apenas suas roupas e acessórios que compraram ontem e hoje já são considerados ultrapassados, mas também uma as outras, mantendo vínculos curtos e superficiais. É importante frisar que em contrapartida, há a permanência de um ideal de conjugalidade e de família, com o sonho da realização do ritual do casamento. Este fenômeno interessante faz alusão também a tentativa de nomear as distintas formas das novas relações, como amizade colorida, “namorido”, entre outras (BEIRAS, 2008).

No entanto, pesquisadores como Ferés- Carneiro (1998) e Singly (2007) nos mostram que há um aumento na expectativa dos noivos com relação ao casamento, e não a desvalorização do mesmo, como muitos devem pensar. Isso ocorre por ambos se cobrarem em demasia para atender as suas expectativas, ao passo que idealizam o parceiro e não estão conseguindo corresponder ambas as idealizações. Esse fenômeno, que aponta para uma desvalorização do ideal do casamento eterno, nos remete a frase de ditos populares “que seja eterno enquanto dure” e pode justificar o crescente número de separações e recasamentos.

Essas perspectivas podem ser ponto de partida de explicação para os dados apresentados no último senso do IBGE (2010), mostrando que em 2008, o total de casamentos registrados foi cerca de 5% superior ao número observado em 2007 e simultaneamente ao crescimento da taxa de nupcialidade legal, está a elevação dos recasamentos. Os recasamentos representaram, em 2008, 17,1% do total das uniões formalizadas em cartório. Em comparação ao ano de 1999, este conjunto de formalizações das uniões totalizava apenas 10,6%.

Entretanto, existem diferenças entre os sexos nessa idealização, de acordo com pesquisa feita por Ferés-Carneiro (1998), ao que tudo indica, a mulher vê o casamento como o ápice do seu relacionamento amoroso, se concretizando na união do casal para a sociedade. O homem por sua vez, o vê como investimento familiar, o momento para a formação de uma família na oportunidade de ser pai.

Giddens (1993) em sua obra A transformação da intimidade – Sexualidade, amor e erotismo, traz contribuição sociológica para a questão da idealização da relação amorosa e a vivência diferenciada, da mesma, entre os gêneros. O autor coloca a mulher no centro da discussão da revolução sexual que a sociedade atual estaria enfrentando. Para ele, a idéia do amor romântico como algo ideal, no encontro de um ser que irá completar o outro, em uma perfeita harmonização, é utópica. Por essa perspectiva tem-se de um lado o homem, a fazer de tudo para ter seu perfeito objeto de desejo e idolatrá-lo. E do outro, a mulher a esperar por esse príncipe encantado e assim viver por e para o seu amado, por isso também Giddens (1993) afirma que essa concepção de amor romantizado está associada à manutenção da subordinação da mulher, podendo ser uma possibilidade de explicação das estatísticas apresentadas pelo IBGE.

O casamento, por muitas vezes, acaba sendo lugar da realização de uma série de necessidades afetivas dos que optaram por ele. Um palco de acontecimentos, em que ao mesmo tempo em que os dois se tornam um, por cederem um ao outro na tentativa de estreitar os laços ou mantê-los, cada um é um ser único com necessidades específicas (DIAS, 2000).

“O compromisso assume a forma ideal de um “eu” no seio de um “nós” pouco expressivo, de um “nós” que só tem valor se referente a expectativas dos dois “eus” que compõe o grupo conjugal ou doméstico” (SINGLY, 2007, p. 135), ou seja, o compromisso ideal assume a forma de um “nós”, que para a preservação dessa condição, haverá a anulação dos sujeitos que compõe o casal, nomeados por Singly como “eus”.

Para Feliciano (2005), o ritual do casamento exerce grande significância por mostra-se enquanto pacto perante a sociedade civil, religiosa e comunidade presente, a promessa de compartilharem um projeto de vida comum. Tem início, não apenas no momento de celebração dos votos, mas na escolha da data, passando por todo processo de preparativos, para mudança da vida dos noivos, de solteiros para casados.

No momento da celebração o casal passa, oficialmente, a ser reconhecido, pela comunidade, como parceiros.

“Tal é o mecanismo inconsciente que explica, não apenas o ritual jurídico, mas o ritual festivo, a celebração profana dos casamentos, transformados em noites de sonhos, nas quais se misturam e explicam gastos elevados (as despesas chegam, não raro, ao preço de uma casa), as intermináveis sessões fotográfi­cas, as trocas entre as famílias e entre os nubentes, os quais, como centro das celebrações, recuperam as fantasias infantis de príncipe e de princesa” (ZIMERMAN; COLTRO, 2008, p. 457).

A constituição e a manutenção do casamento contemporâneo estão sendo influenciados pelos valores individuais, pois a sociedade atual está valorizando, sobretudo, a autonomia e a satisfação de cada indivíduo. O que por outro lado para construir uma vida a dois, faz-se necessário pontos de identificação, companheirismo e identidade conjugal (FERÉS- CARNEIRO, 1998).

Ao analisar a construção do espaço conjugal na contemporaneidade, podemos reco­nhecer expectativas e ilusões para a realização de projetos individuais, como também a cumplicidade com o seu parceiro e na maioria das vezes, nenhum desses aspectos são conscientes. Esses projetos podem variar em função das escolhas individuais e abrangem o campo social, familiar e profissional.  É o que defende Singly (2007), propondo a seguinte visão:

“Em um mundo social onde o valor de referência se tornou o self, a família conserva uma utilidade: a de ajudar cada um a se construir como pessoa autônoma. (…) Os elos de independência são ao mesmo tempo, necessários e negados. (…) Essa oscilação entre a necessidade de laços de interdependência e negação dessa necessidade cria tensão entre os cônjuges, no âmbito das famílias contemporâneas” (SINGLY, 2007, p. 134- 135).

Na relação existe uma espécie de acordo tácito, elaborado pela expectativa de ambos sobre o funcionamento do casamento, que costumam incluir: fidelidade, respeito, compreensão, atenção a detalhes pessoais, entre outros. Sua violação leva a uma quebra de confiança, motivo para surgimento dos conflitos, porém, por ser dinâmico pode ser constantemente renegociado ou definitivamente quebrado (JOSÉ FIORELLI; MARIA FIORELLI; JUNIOR, 2008).

Nesse espaço de encontro de “eus” haverá sujeitos que poderão ter afinidades, mas as diferenças de ordem psíquica, financeira, de trabalho, em sua história de vida e expectativas sempre estarão presentes. A evidência dessas disparidades contribui para o aparecimento de conflitos, que para Batistella (2006) e Maldonado (2008) o aparecimento de tal fenômeno se dá de forma contínua na vida dos seres humanos. Nas relações ocorre por cada um carregar histórias particulares, o que possibilita uma gama de condutas, valores, poderes e interesses que diferem uma pessoa da outra. Portanto, na conjugalidade, quando esse conflito não é gerido pelo casal de forma satisfatória para ambos, pode ocasionar a separação dos cônjuges e/ou à violência.

Diante do que foi exposto, como e por que este histórico da construção do casal reflete na violência conjugal?  E, sobretudo como valores sociais contemporâneos influenciam a permanência da conjugalidade em casais que vivenciam a violência?

1.1. Dissolução Conjugal

Para entendermos as possibilidades que alguns casais enfrentam ao vivenciar a violência conjugal e não romperem laços conjugais será apresentado nesse capítulo as questões jurídicas e emocionais envolvidas no processo do rompimento conjugal, e como esses sujeitos que compõem o casal, de acordo com a literatura, se sentem frente à situação.

Para Brito (1999) a subjetividade permeia quase todas as questões do direito da família, tomada aqui, com o foco na conjugalidade, com início na união de dois sujeitos do sexo oposto que desenvolveram conjuntamente uma cadeia de significados no amadurecimento do relacionamento.

As partes envolvidas no processo apresentarão não apenas o discurso objetivo, mas uma carga emocional presente na subjetividade, fazendo-se indispensável uma atenção a essa área, para compreensão do indivíduo em seu contexto, que nesse caso trata-se da relação familiar conflituosa. Brito (1999), destaca também, que na Vara da Família o aspecto subjetivo pode até emergir com mais frequência que o objetivo.

No que diz respeito ao Direito, a partir da Lei 6.515, de 26/12/77, torna-se possível realizar a dissolução total da sociedade conjugal, por meio do divórcio, e o termo desquite é substituído por separação judicial, que passa a ser a primeira etapa obrigatória para que o casal viesse a se divorciar. Por ser uma medida preparatória da ação do divórcio, não rompia o vínculo matrimonial, obrigava os separados a passarem no mínimo dois anos nessa condição, para posteriormente solicitar a dissolução do casamento de fato com o divórcio. A idéia era que os sujeitos pudessem ter um tempo para refletir antes de tomar a decisão definitiva de rompimento marital (MEIRA, 1998).

Com a atualização e nova regulamentação da Lei do Divórcio pelo Congresso Nacional, no dia 13 de julho de 2010, torna-se facultativo o pré-requisito da separação judicial, para que ocorra o divórcio. A proposta dessa emenda constitucional de nº 66 facilita a dissolução do casamento civil, ao eliminar a exigência vigente de separação judicial prévia por mais de um ano, ou separação de fato por mais de dois anos, para que os casais possam se divorciar.

O processo do divórcio implica na resolução de algumas pendências jurídicas que consequentemente nortearão aspectos psicológicos. Por se tratar de uma crise não-previsível na estrutura familiar, afetar todos os seus membros, interferindo a ordem conjugal, familiar, social e financeira. “Trata­-se de situação complexa e delicada, em que as transformações, se possível, devem levar a mudanças na qualidade das relações” (CEZAR- FERREIRA, 2007, p. 73).

Partindo desse princípio percebe-se a dissolução do laço afetivo como uma série desencadeante. Com início na tomada de consciência desse fim, passando por um processo doloroso até a decisão do rompimento definitivo. Logo, cabe ser designada como processo não apenas jurídico, mas emocional. Devido a isso, o rompimento jurídico, não implica necessariamente em um desligamento emocional e vice-versa. Engloba mais que mudar documentações e decidir a divisão de bens, mas estará presente da mesma forma, o fim de um ciclo e início de outro, coberto por simbolismo (BRITO, 1999; CEZAR- FERREIRA, 2007).

Pereira (2003A) afirma que o discurso comum entre os sujeitos que estão em processo seja de casamento, seja de dissolução dessa união, é a busca pela felicidade. Mostrando-se como desejo propulsor da conduta humana, teoria que vem em concordância com Gomes (2009).

“Nesse caminho, quando há infelicidade pessoal no casamento, somado à vontade de maior autonomia dos consortes, a separação e/ ou o divórcio são remédios juristas que solucionarão e eliminarão a insatisfação gerada no convívio conjugal” (GOMES, 2009, p. 34).

Segundo o último censo publicado pelo IBGE (2010) os dados sobre as dissoluções formais dos casamentos revelaram um contínuo aumento dos divórcios. No período de 1999 a 2008, as taxas gerais de divórcios cresceram, chegando a 1,5% maior.

Como exposto anteriormente, no capítulo de conjugalidade, por haver um aumento nas expectativas dos noivos com relação ao casamento, que se tornou mais idealizado, pode também esses dados justificar o crescente número de dissolução de conjugalidade, apresentadas pelo IBGE (2010). Foi dito anteriormente, outrossim, que há diferenças entre os sexos na idealização acerca do casamento. Segundo pesquisa feita por Ferés- Carneiro (1998), os homens veem o casamento como a realização de um projeto de vida e as mulheres como ápice do relacionamento amoroso.  Talvez por isso haja uma maior relutância na maioria dos homens em aceitar o divórcio, sendo geralmente a mulher a primeira a dar entrada no processo, pela decepção da não correspondência da sua idealização do matrimônio. Enquanto que para o homem não se justifica puramente a falta de amor romântico, a decisão de por fim ao casamento, essa situação traz consigo sofrimento devido o fracasso do seu projeto de vida (FERÉS- CARNEIRO, 1998).

O divórcio embora possa ser, muitas vezes, a melhor solução para o casal que não está mais conseguindo manter-se na relação de forma sadia e harmoniosa, produz profundo estresse na alteração da dinâmica familiar. Mesmo que acentuado no homem, não é exclusivo o seu sentimento de fracasso, como também são provocados, em ambos, sentimentos de luto pela perda, que pode em alguns casos ser mais difícil que a elaboração do luto pela morte (CARUSO, 1989).

“A dissolução conjugal é um momento de perdas, de lutos, como, por exemplo: ter que lidar com investimentos perdidos, sonhos desfeitos, quebra de alicerces. Para os filhos, surge a preocupação com o que vai lhes acontecer, a idéia de falta de proteção, o sentimento de solidão que provoca baixa autoestima com a possibilidade de regressão, comportamento que pode vir acompanhado de sentimentos de raiva, ódio, insegurança e medo” (GOMES, 2009, p.35).

Ainda nesse contexto de perdas, lutos e sonhos desfeitos, Caruso (1989) afirma que em todo caso, essa crise precisará ser superada e, a depender da dinâmica dessa superação, os indivíduos poderão sair fracassados ou fortalecidos. Ao contrário de outros pesquisadores como, Ferés- Carneiro (1998) e Caruso (1989), que enfatizam o sentimento de fracasso, Cezar – Ferreira (2007) alega que essa segunda alternativa (a da saída fortalecida da situação) é possível. Contudo, supõe mudanças na qualidade das relações a partir de uma superação criativa da crise com a possibilidade de um novo equilíbrio psíquico.

Por vezes, as discussões acerca do patrimônio, pensão dos filhos, visitas e outros problemas, parecem tomar uma proporção maior do que a própria separação afetiva entre os amantes, conflitos que se multiplicam quando há uma má elaboração emocional de ambos ou de uma das partes. Essa situação pode resultar na transformação da justiça em campo de batalha (FERÉS-CARNEIRO, 1998; BRITO, 1999).

Há casais que conseguem resolver de forma privada suas questões e procuram a justiça apenas para homologar o acordo. Outros, com conflitos mais acentuados, não conseguem resolvê-lo sem a ajuda da intervenção do Estado. A esse respeito, uma conclusão na concepção de psicólogos jurídicos é a de que a maioria dos casais litigantes não reflete suas próprias necessidades e a dos outros envolvidos, para agir de maneira coerente e não conseguem ter consciência do porque brigam (BRITO, 1993).

Pereira (2003B) conceitua a figura do juiz como representação simbólica dos regimentos morais de uma determinada sociedade (lei), atuando nesse contexto como gerenciador, no processo de rompimento judicial da relação conjugal. O que complementa a idéia de Donzelot (2001) do juiz como regulador social, designado pelo Estado para tomada de decisões nessas questões.

De qualquer modo, as relações humanas envolvidas em uma sepa­ração conjugal, não raro chegam ao ponto de necessitar de uma regulagem através de agentes externos, já que o interno pareceu não dar conta satisfatoriamente.

Nesse capítulo foi apresentado o que implica o fim da conjugalidade, mas o que acontece quando o casal que vivencia conflitos tão acentuados decide permanecer no relacionamento violento? O que caracterizaria a violência? Como ela se apresenta? O que pensa-se como violência hoje, seria o mesmo conceito de outrora?

2. Violência

No decorrer da história da humanidade nota-se que a violência ganha contornos diferentes a depender do momento histórico, da sociedade e cultura, ou seja, o que poderia ser considerado violência hoje, ao analisar determinado momento histórico, no instante que aconteceu era uma ação aceitável socialmente. Por não ser a expressão meramente de defesa para a sobrevivência, pode até mostra-se de formas sutis, quase imperceptíveis (ODÁLIA, 1983).

Com isso, compartilha-se o pensamento do mesmo autor de que por tudo está em constante transformação, em um processo dialético, não cabe aprisionar a conceito de violência em determinado momento histórico, seja ele passado, presente, ou ainda ser determinista com seu futuro.  Conforme Minayo e Souza (1998) deve-se explorar suas diversas definições para compreensão do fenômeno, por seus contornos estarem em constantes oscilações até em uma mesma época e em culturas diferentes, a começar pela principal barreira para definição da violência, a própria interpretação de sua pluricasualidade.

“O termo violência é usado nos mais diferentes contextos e, consequentemente, com os mais diferentes significados, inclusive em função das diferentes linhas ideológicas e teóricas de pensamento. Assim, fala-se em violência: dos criminosos, da ação policial, da ação política, das leis, do modelo econômico, da fome, da miséria, do analfabetismo, da ação pedagógica, da educação dos pais, dos fenômenos da natureza, das doenças, das intervenções cirúrgicas, entre muitos outros contextos e situações” (SÁ, 1999, p. 123).

Como pode-se perceber, a definição de violência é complexa e se configura em diversos contextos, tipos e atuações (SÁ, 1999). Logo há diversas definições de violência, algumas focam nos aspectos biológicos, outras nos sociais e, ainda, outras nas questões dos Direitos Humanos. Serão apresentadas algumas correntes de pensamentos sobre o conceito, para enfim evidenciar a que direcionou a presente pesquisa.

As linhas de pensamento, que tem o foco no biológico compreendem a violência como um fenômeno presente em todas as classes, atemporal e universal, constituindo mero instrumento técnico para a reflexão sobre as realidades sociais. Essa teoria fundamenta-se na premissa de violência comparada ao termo de agressividade e como tal, natural e inevitável, uma característica inata da natureza humana e os conflitos vividos em sociedade, são vistos como eterno e natural (MINAYO; SOUZA, 1998).

Por advir de teorias biologias, “o termo agressividade é entendido como parte do instinto de sobrevivência e forma natural de reação dos animais em certas condições e situações, tendo, portanto, conotação de 'neutralidade' e 'naturalidade'” (MINAYO; SOUZA, 1998, p. 04).

Entretanto, reconhecer a violência como inato ao homem é admiti-la como eternamente permanente, como necessária, portanto, é banalizá-la. Compreende-se aqui, o instinto agressivo, necessário, não a violência, por ele se tratar de um instinto voltado à luta pela sobrevivência do organismo, esse é seu objetivo final, não o desejo de aniquilar ou prejudicar o outro, é uma questão de necessidade e não de desejo. É evidente que a violência, tem suas raízes na agressividade, contudo trata-se de um estado perverso desse instinto (SÁ, 1999).

Por outro lado temos uma segunda linha, apresentada por Amoretti (1992 apud SÁ, 1999, p. 02), que define violência como dano, por meio de uma ação: “Violência pode ser definida como o ato de violentar, determinar dano físico, moral ou psicológico através da força ou da coação, exercer pressão ou tirania contra a vontade e a liberdade do outro” (p. 41).

Outro conceito mais contemporâneo resgata a convenção dos Direitos Humanos, conquistados por movimentos que iniciaram com a Revolução Francesa, passamos então a ser sujeito de direito. Esta terceira linha conceitua violência como ação, que rouba da sua vítima a autonomia, o livre-arbítrio, ao qual ela teria direito de decidir como se comportar, ser, pensar, enfim de conviver e viver, inclusive direito a dúvida frente à decisão a ser tomada ou executada. Significado esse dado por Odália (1983), ao considerar a violência:

(…) “sob a forma de privação. Com efeito, privar significa tirar, destruir, despojar, desapossar alguém ou alguma coisa. Todo ato de violência é exatamente isso. Ele nos despoja de alguma coisa, de nossa vida, de nossos direitos como pessoas e como cidadãos” (ODÁLIA, 1983, p. 86).

A quarta linha a ser apresentada está na violência vista pelo aspecto social, como ações que nem sempre estão aparentes, ou seja, facilmente identificável. A perpetuação dessas ações se dá pela desvalorização do maior direito humano, o respeito à vida, substituindo, dessa forma, valores éticos, por valores morais (MINAYO; SOUZA, 1998; PORTO, 2010). Exemplos disso estão nas “razões, costumes, tradições, leis explicitas ou implícitas, que cobrem certas práticas violentas normais na vida em sociedade, dificultam compreender de imediato seu caráter” (ODALIA, 1983, p. 23). Segundo essa linha teórica, a violência social subjuga a condição humana de viver em sociedade, esse tipo de violência desrespeita o indivíduo, por lhe privar essa condição.

Nota-se, portanto, que há formas de violência implícita, como a miséria e a pobreza, que muitas vezes, na sociedade contemporânea ocidental, esses extremos são tomados como uma situação irreversível, impossível de ser modificada, por qualquer ação do homem, visto como impotente perante a grandiosidade que o termo carrega.

Ainda por essa perspectiva, temos a idéia de Porto (2010) da violência como causa/efeito do controle determinado por instituições que normatizam a sociedade podendo a última acatar, reivindicar, ou burlar tais formas de organização. Podemos tê-la também, como opção dentre um leque de recursos a serem utilizados como estratégia na resolução de conflitos, empregada como demonstração no controle de uma situação de poder, “uma hierarquia valorativa; passa a ser questão de eficácia, oportunidade, afirmação de identidades socialmente negadas, explosão de raivas, frustrações, dentre tantas outras possibilidades” (PORTO, 2010, p.154).

A definição do fenômeno violência da Organização Mundial de Saúde (OMS) vem com uma proposta mais atual e ampla da violência, onde engloba não apenas a concretização do ato, como também sua intencionalidade, independente do resultado. “(…) Define a violência como o uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação” (DALHBERG; KRUG, 2007, p.1165).

Partindo deste princípio, esta definição considera a relação entre os fatores individuais e contextuais, ou seja, vê a violência como produto de múltiplos fatores que influenciam o comportamento. Tratando-se, por isso, de um modelo ecológico que enfatiza a multiplicidade de suas causas, denominadas fatores de risco, que operam do contexto familiar a comunidades inteiras, de forma cultural, econômica e social.

Pondo uma lupa sob a sociedade, percebendo agora o sujeito enquanto unidade tem-se mais uma corrente de idéias ao observar o ser de forma mais subjetiva:

“As análises psicológicas da violência refletem, à sua maneira, as contradições existentes na realidade: o crescimento das tendências anti-sociais, o isolamento, o medo coletivo e individual, o estado de intolerância, a alienação dos indivíduos e a espetacularização dos dramas particulares. Seria incorreto negar o mundo subjetivo em que se baseia toda a vida social e privada” (MINAYO; SOUZA, 1998, p. 05).

Minayo e Souza (1998) apresentam essas diversas linhas, contudo não argumentam a favor de nenhuma enquanto prioridade. As autoras partem da relação dialética existente entre as correntes sociais e as individuais, que carregam consigo um contexto: o aspecto histórico. Segundo as autoras (p. 514): “A violência consiste em ações humanas de indivíduos, grupos, classes, nações que ocasionam a morte de outros seres humanos ou que afetam sua integridade física, moral, mental ou espiritual”.

Com base na idéia defendida pelas autoras, o caráter relacional, vem em consonância ao modelo ecológico definido pela OMS. Por reafirmar a pluricasualidade dada a violência, assumindo-a como algo complexo. É sob essa perspectiva de violência que esta pesquisa será orientada. Por ser um conceito mais completo e atual, utilizado recentemente para compreender as relações causadas por parceiros íntimos (DALHBERG; KRUG, 2007). Traz uma ótica dinâmica que entende os sujeitos que compõe o casal, ora vítimas ora algozes, por mais que desempenhem em determinado momento, mais um papel (vítima/algoz) que outro.

Os autores que compreendem a violência e mais especificadamente a violência conjugal como relacional, não visam eximir a responsabilidade dos autores da violência, mas ampliar a discussão para além da vitimização feminina e estereotipia violenta do gênero masculino. Entendem que ambos estariam alimentando e proporcionando a perpetuação do ambiente violento, como será discutido a seguir, no o capítulo: violência conjugal.

2.1 Violência Conjugal

Até a década de 1970, momento em que o movimento feminista se intensificou e começa-se a observar mudanças mais profundas na sociedade. A condição da mulher na família e as relações de gênero não eram assuntos tão debatidos ou, se quer, questionados por ambos os gêneros (COSTA, 2005). Com isso, essa relação de poder tão pouco era levada em conta como um dos possíveis fatores desencadeantes de conflitos e violência no âmbito familiar. Quando o movimento feminista trouxe a tona discussão acerca da violência contra mulher, veio com ela o foco na violência ocorrida no ambiente familiar, principalmente a praticada pelo cônjuge e estendendo-se a outras situações em que a desigualdade de poder causada pela hierarquia da relação de gênero atuasse (PAZO, 2007).

Frente à contextualização histórica de 1970, “Influenciados pela nova perspectiva de gênero, os estudos sobre violência contra as mulheres no Brasil passaram a usar a expressão violência de gênero” (SANTOS; IZUMINO, 2005, p.11). Começa-se a falar sobre a relação de poder entre os gêneros, onde o conceito engloba de forma mais geral, a violência praticada não apenas de um gênero contra outro, mas contra seu próprio gênero, seja ele masculino ou feminino. Ainda que ocorra com mais frequência do gênero masculino contra o feminino, abrange a violência doméstica e a violência intrafamiliar.

Como violência familiar os autores entendem que se trata da violência entre membros de uma mesma família, nuclear ou extensa, podendo ocorrer no ambiente doméstico e fora dele, como é o caso de brigas entre pais e filhos, maridos/esposas, avós, tios (SANTOS; IZUMINO, 2005).

Ainda segundo a mesma perspectiva, a violência doméstica por sua vez, sobrepõe à familiar, não exigindo necessariamente que ocorra entre consanguíneos, mas com pessoas que habitam o domicílio do autor da violência. Portanto, exemplos desse tipo de violência também estão nos maus tratos a empregadas domésticas e agregados da família.

Apesar de ser usado muita das vezes como sinônimo, o termo violência de gênero abrange muito mais que apenas a violência contra mulher. Por essa perspectiva, violência conjugal diz respeito a relação de gênero e de poder, que ocasionam ações violentas entre parceiros íntimos (SANTOS; IZUMINO, 2005).

Partindo dessa visão, tem-se a abordagem do Ciclo da violência de Walker, citada por Cantera (2004) como maior clássico de modelo do processo da violência gerada pelo homem contra sua parceira. Tal modelo perpassa as seguintes etapas: A primeira é denominada acumulação de tensão, tem como características insultos, frequentes ameaças, hostilidade e ansiedade tensionada. Consequentemente a segunda etapa, denominada descarga da violência, é caracterizada por episódios de violência física, que expõe a tensão dos conteúdos latentes da fase anterior. A lua de mel é a terceira etapa do ciclo, marcada pelos pedidos de desculpas, sinais de “arrependimento”, com atitudes mais generosas e promessas de mudanças – descrita como mais passageira à medida que o ciclo se reinicia, mas fundamental para a manutenção do mesmo, que pode ser retomado logo após a passagem por essa fase.

Essa teoria descreve e apresenta uma possibilidade do motivo de muitas pessoas permanecerem nesse ciclo de violência com seus parceiros. Contudo a autora faz uma crítica ao modelo, por ser relativamente individualista, trata apenas pelo viés vítima- agressor. Traz novamente a imagem de uma vítima passiva, totalmente dependente da situação que se encontra, mostrando poucas possibilidades para intervenção com mulheres que rompam o ciclo, considerando ainda um pensamento patriarcal (CANTERA, 2004).

Alguns autores como Alvim e Souza (2005) acreditam que uma possibilidade da aceitação da visão vitimizada da mulher na relação é o fato de ser mais socialmente aceito uma mulher agredir seu companheiro, pois os homens são considerados potencialmente mais fortes e agressivos que as mulheres, que alegariam a autodefesa. Logo, atitudes violentas utilizadas como ferramenta na tentativa de resolução de conflitos, podem ser empregadas tanto por homens quanto por mulheres.

As pesquisas de ordem feminista, embora finalmente trouxessem para o espaço público o que se confinava entre as quatro paredes, também trazem contribuições para a que a situação fosse vista como vitimização da mulher (ALVIM; SOUZA, 2005). Entretanto, há uma extensa caminhada já cumprida pelo movimento feminista na transformação da legislação e no campo da saúde, com a promulgação de vários estatutos que regulamentaram, definiram e propuseram intervenções para o enfrentamento da problemática. No contexto de violência contra a mulher, apontada como uma das maiores conquistas do movimento no Brasil está a promulgação da Lei n° 11340 (Lei Maria da Penha), em 2006 que (…) “Categoriza e criminaliza a violência doméstica e familiar contra a mulher, além de propor medidas integradas de prevenção e assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar. A lei ainda dispõe sobre a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, retirando os casos de violência doméstica da competência dos Juizados Especiais Criminais (JECRIM), destino de todos os crimes considerados de menor potencial ofensivo; altera dispositivos do código penal de modo a agilizar os tramites legais necessários para prisão em flagrante do agressor, sua punição, afastamento do lar e a separação conjugal; agiliza o acesso aos direitos de pensão e guarda dos filhos e direitos patrimoniais, além de orientar trabalhos de sensibilização e educação de gênero para agentes policiais e judiciais” (PAZO, 2007, p.32).

Diante desta categorização e criminalização a lei Maria da Penha inclui cinco tipos de violência de gênero no meio intrafamiliar: a violência física, moral, patrimonial, psicológica e sexual.

A violência física é caracterizada por qualquer ação ou omissão que coloque risco ou cause dano a integridade física da mulher. A ação com intenção de injuriar, caluniar ou difamar honra ou a reputação da mulher, trata-se da violência moral. Por sua vez, a violência patrimonial está no ato de que implique em dano, subtração, destruição ou retenção de objetos, documentos pessoais, bens e valores do casal e/ou da mulher. Tem-se por violência psicológica, a ação ou omissão destinada a degradar ou controlar os comportamentos, crenças e decisões da mulher. Por fim, violência sexual, trata-se de qualquer conduta que obrigue a mulher a observar, manter contatos sexuais com o autor da violência, ou ser coagida a realizar com terceiros.

Na experiência que teve-se no centro criado com base na Lei Maria da Penha (CHAME), em trabalho com casais que vivenciaram ou vivenciam a violência conjugal, percebeu-se que mesmo com as diferenças existentes entre os gêneros e os movimentos de poder e hierarquização, ora via-se o poder ser regido pelo gênero feminino, ora pelo o gênero masculino, de formas distintas. O gênero feminino se caracterizava por uma maior prática da violência psicológica e o masculino a violência física, confirmando resultados encontrados em pesquisas como a exposta por Matos (2006).

Diante disso, buscou-se referências sob a ótica do viés relacional, com a necessidade de perceber a conjugalidade violenta. Mesmo presenciando constantes situações de violência conjugal que levaram a crer, que em grande parte dos casos “a mulher sofre consequências físicas e emocionais mais graves, em decorrência das diferenças biológicas e simbólicas” (OLIVEIRA; SOUZA, 2006, p. 40).

As produções científicas em violência conjugal que começaram a questionar o enfoque teórico da mulher como vítima e do homem como autor da violência, a qual essa pesquisa se apóia, veem sendo construída desde 1990. Como pode-se observar:

“As relações conjugais violentas passaram a ser discutidas, considerando os diversos fatores que possibilitam o exercício de múltiplos papéis entre homens e mulheres numa relação afetiva violenta. Esse referencial relacional não ignora as produções culturais em torno do gênero e da etnia, que produzem diferenças de poder entre o casal, entretanto defende que a compreensão das violências entre cônjuges não pode ser reduzida à idéia de subalternidade feminina” (OLIVEIRA; SOUZA, 2006, p 31-32).

A violência entre parceiros é construída diante de um contexto social, cultural, político econômico e, sobretudo, afetivo. Esse afeto está inserido em uma rede de relações, que se articulam de forma complexa, é caracterizado por construções simbólicas e dinâmicas (OLIVEIRA; SOUZA, 2006; CANTERA, 2004; BEIRAS, 2009).

Portanto, a violência em um relacionamento amoroso afeta tanto os homens quanto as mulheres, podendo ser um ou outro e até ambos, agentes atuantes na mesma. Logo, é necessário ser contextualizada para compreensão e erradicação do fenômeno.

Partindo desse pressuposto, torna-se reducionista tal questão ser analisada apenas pelo foco teórico da vitimização feminina. Por não ser sempre uma escolha de ação unilateral, é preciso investigar a construção, o funcionamento do relacionamento conjugal, com todas suas nuanças, e seus efeitos nos sujeitos, em sua interação, onde por mais que estejam envolvidos emocionalmente, possuem diferenças e precisam negociá-las (CANTERA, 2004).

“Afirmar a necessidade do olhar relacional não significa desconsiderar as diferenças históricas de poder entre mulheres e homens e ignorar as demandas de cada gênero. Entretanto, existem várias maneiras de se vivenciar tais assimetrias, assim como diante das pequenas mudanças em torno das relações de poder entre os gêneros que caracterizam a sociedade atual, são criadas diversas formas de experimentar, no cotidiano, a convivência entre homens e mulheres” (OLIVEIRA; SOUZA, 2006, p. 42).

No contexto nacional, tem-se um alto índice de violência praticada por homens contra suas companheiras. Contudo, infelizmente poucos estudos são realizados com homens autores de violência contra mulher. Porém, pode-se aqui citar Beiras (2009) e Beiras, Reid e Toneli (2011), que defende a idéia de que essa violência quando exercida pelo homem está estreitamente ligada a construção do gênero masculino, que emerge de forma desesperada na tentativa de manter a dominação pelo poder frente à mulher.

Não se pode negar a importância da relação de gênero nesta problemática. Por ser um conceito relacional, só existe a definição de um gênero quando comparado com o que lhe é diferente, neste caso, o contraste com o gênero oposto. São vistos como intrinsecamente distintos, como duas faces opostas de uma mesma moeda. Possivelmente em toda sociedade haverá o ideal de comportamento característico do gênero masculino e gênero feminino, embora não haja um conceito de masculinidade e feminilidade única e geral, mas sim diferentes conceitos até em uma mesma sociedade. Isto pode ser um indicativo de que a construção de modelos de gênero não se dá de forma isolada, sendo um processo tanto individual quanto coletivo (BEIRAS, 2009; BEIRAS; REID; TONELI, 2011).

As problemáticas envolvidas no processo de violência conjugal apresentam na sociedade uma série de mitos, que para serem repensados faz-se necessário vencer alguns preconceitos na visão de padrões de comportamentos designados aos gêneros masculino e feminino, ainda muito fortes na atualidade. Como a crença do homem ser dominador e a mulher submissa, do homem ser regido pela razão e a mulher pela emoção, do homem ser naturalmente violento e a mulher pacificadora, etc (CANTERA, 2004).

Ainda que se configurem como principais autores de violência contra mulher no contexto conjugal, deve-se refletir sobre o mito que designa apenas a eles esse papel, não os eximindo de suas responsabilidades quanto aos seus atos quando o forem, mas ampliando a análise de tal temática (ALVIM; SOUZA, 2005).

Alguns desses mitos Cantera (2004) discute em sua dissertação de doutorado. O primeiro mito apresentado pela a autora vem da premissa de que as mulheres não agridem os homens, e como foi exposto anteriormente, ambos podem assumir o papel de vítima ou algoz.  Outro mito relatado pela autora é o de que a mulher só chegaria a praticar a violência contra seu parceiro em situação de autodefesa. Segundo a autora, as mulheres que agridem seus parceiros, expõem razões similares as dos homens autores de violência contra mulher, não se tratando apenas de casos de autodefesa. O fato das mulheres não serem tão fortes quantos os homens e por isso não causarem tantos danos quando agridem, também é apresentado como mito, assim como a crença de que  não é um grande problema, visto até de forma jocosa, o homem que é agredido por sua mulher. No entanto, trata-se sim, de uma grave circunstância, por uma pessoa está usando da violência para controlar outra. Por fim, o último mito exposto, está na afirmação de não haver dados significativos, em processos judiciais, de homens maltratados por suas companheiras. Ainda que sejam escassos, até por motivos de vergonha, devido à cultura e valores que a sociedade se apóia, há taxas significativas da ocorrência de violência doméstica causada por mulheres contra seus parceiros.

Devido às diferenças encontradas em todo meio social, sempre haverá um enorme potencial para o surgimento de conflitos, que exige uma constante negociação, o que não é diferente nas relações de gênero. A nova configuração dessa relação tenta discutir o que anteriormente não se fazia e para isso necessita de um sistema de reciprocidade, construído sócio-historicamente. Por vezes a permanência das representações de modelos e valores mais tradicionais, pode ocasionar a impossibilidade da mediação do conflito, evoluindo para uma possível violência. Tendo isso em vista, para que ocorra uma negociação:

“É imprescindível haver consenso em relação a uma noção de justiça concebida como valor comum, consenso que é difícil mesmo em grupos reduzidos como a família ou o casal. (…) Estas concepções sobre o que é ser homem ou mulher favorecem a produção de violência na medida em que um se julga superior ao outro e procura submeter o outro aos seus interesses e desejos” (ALVIM; SOUZA, 2005, p. 04).

Não se pode deixar de frisar, que isto não significa que a maioria das negociações de conflitos, nas relações conjugais, ocorra de forma violenta. Contudo, em algumas dinâmicas conjugais, parte delas pode chegar à utilização de mecanismos violentos, fundamentados em concepções de gênero.

Várias são as questões que reforçam as condições facilitadoras para o aparecimento de atitudes violentas entre parceiros, tais como: dificuldade de comunicação, histórico familiar de violência, estresse, dependência química, dificuldades financeiras, desemprego, insegurança, valores e modelos culturais que justifiquem condutas violentas em conflitos conjugais, ciúmes, disputa de poder, entre outros (MATOS, 2006).

Com relação à prática da teoria da violência conjugal relacional, tem-se o exemplo do trabalho realizado por Beiras (2009) com grupos de homens autores de violência, que busca a ressignificação da problemática, objetivando o abandono da violência física e emocional, utilizadas por esses homens como forma de manutenção de poder no ambiente familiar. Beiras (2009) não nega a dificuldade dos membros do grupo com a comunicação, mas afirma que o trabalho não deve se limitar a estereotipar papéis e a perspectiva relacional tem-se mostrado bastante eficaz para essa proposta de intervenção.

Por esse viés, não há causas determinantes de maus tratos, mas de condições facilitadoras para surgimento do ambiente violento na relação amorosa, que só se romperá com o ciclo de violência ao considerar e atuar nos reais fatores que o alimentam, tanto nos sociais quanto nas dificuldades enfrentadas pelo casal (CANTEIRA, 2004; BEIRAS, 2009).

3. Discussão

Este capítulo trará para o debate os temas apresentados anteriormente. Contudo, não com a pretensão de fechar a discussão, mas de gerar novas reflexões, tendo em vista que tudo está em constante construção e mudança. Recorda-se que utilizou-se a perspectiva rizomática de Deleuze e Guattari (2000), por se  tratar de uma problemática complexa, de pluricasualidade, que impossibilita a pesquisa abranger todos os fatores envolvidos. É importante lembrar com isso, que as linhas (fatores) estão interligadas, porém serão expostas separadamente, para uma melhor compreensão e apreciação didática.

Desse modo levantou-se alguns fatores (linhas) que podem influenciar na decisão do casal que vivencia a violência a continuar na conjugalidade, são eles: a influência da moral cristã (na sociedade, no direito e na subjetividade), que traz a concepção de indissolubilidade do matrimônio; outro ponto para se pensar é mudança do ciclo familiar, juntamente com a preocupação com os filhos; questões de relação de gênero, que atravessam diversas outras como a dependência financeira e a responsabilidade dada a mulher da qualidade e durabilidade do relacionamento; a visão da violência como forma de resolver conflitos entre o casal; fatores individuais; e, por fim, as possibilidades sociais e subjetivas no entrelace de concepções novas e arcaicas acerca da problemática. Irá ser descrito e discutido nesta etapa do trabalho, cada um desses fatores apresentados. Lembrando que por ser uma questão complexa e multifatorial, são apenas algumas dentre várias outras possibilidades da permanência desse casal na conjugalidade.

Uma das alternativas levantada foi a influência da moral cristã para a permanência da conjugalidade em casais que vivenciam a violência. Tem-se na construção de várias conjugalidades um ideal de vida, baseado num laço abençoado por Deus e que por isso não pode ser rompido.  Mas como poderia tais princípios morais influenciar na conduta de tantos brasileiros, ainda que não se considerassem cristãos?

Até o final do século XIX, apenas a Igreja Católica, com o casamento religioso, oferecia um reconhecimento social da união conjugal. A Proclamação da República em 1889 foi a tentativa de regulamentar essa ocorrência de forma jurídica, mas há de se convir que a mesma tem sua base no Direito Canônico, e rege nossa sociedade, independente da crença de cada indivíduo. Por isso mostra-se também uma grande influência na construção do conceito de conjugalidade (GOMES et al., 2005).

Conforme os mesmos autores, foi tão evidente essa herança de moralidade, sobretudo no que se diz respeito ao Direito da Família, que a legislação que surge com a Proclamação da Republica manteve a definição de casamento da Igreja, já exposto anteriormente neste trabalho.

O peso de conceitos como “O que Deus uniu o homem não separa." (Mc. 10:9) e a promessa do casal perante a sociedade de “viver na saúde e na doença, na alegria e na tristeza até que a morte os separe”, não atinge apenas o indivíduo, enquanto ser subjetivo, que traz consigo uma bagagem moral. No que tange as legislações houve mudanças que possibilitaram o rompimento do laço conjugal, entretanto, ocorreram de forma gradativa e à custa lutas. Passou-se pelo movimento feminista, a regulamentação do Estatuto da Mulher Casada (Lei 4121) em 1962, que no que concerne à dissolução conjugal, possibilitou o desquite – única forma de separação judicial, mas não poderia haver recasamentos. Mesmo assim, os casais desquitados, eram descriminados pela sociedade (BRITO, 1993). Logo, a manutenção da conjugalidade, mesmo com a violência pode basear-se em uma moral cristã construída historicamente e, ainda, mantida por muitas religiões brasileiras

Apenas em 1977, com a Lei 6.515, que surge a possibilidade jurídica da dissolução conjugal de forma definitiva. O processo denominado divórcio, tinha obrigatoriamente como pré-requisito para sua concretização, a passagem desse casal pelo processo de separação judicial, termo que substituiu o desquite, mas nesse contexto poderia ter um desfecho o rompimento jurídico do laço conjugal (MEIRA, 1988). Então são apenas algumas décadas que tem-se a aceitação jurídica, para a dissolução do laço marital. Registrando que apenas em 2010 com a promulgação da Nova Lei do Divórcio é que se apresentaram facilidades para o processo, por não exigir mais que os casais passem pela separação judicial. Visto que as transformações mais práticas ocorreram há tão pouco tempo, o que traz a reflexão: a que passo estão as transformações mais subjetivas da sociedade?

Entretanto, por que mesmo hoje havendo a possibilidade do divórcio, facilitada pela recente promulgação da Lei do Divórcio, no ano de 2010, alguns sujeitos com muitos conflitos permanecem casados? Como outra linha a ser apresentada como alternativa de resposta está a mudança a ser enfrentada no ciclo familiar, caso o rompimento conjugal ocorra. Por essa perspectiva, a dor vivida nesse processo ou ainda, a expectativa, o medo do futuro e da possível dor. Para alguns casais pode ser um maior sofrimento que o de vivenciar a violência conjugal. O que leva à reflexão do porquê de muitos casais que enfrentam essa problemática, separarem-se judicialmente, e/ou se divorciam e continuarem emocionalmente ligados, presos em ídas e vindas. O processo Jurídico pode ter finalizado, mas não o emocional, como já afirmava pesquisadores como Brito (1999) e Cezar- Ferreira (2007).

Entretanto, de que mudanças estão sendo faladas? Elas têm seu início na desilusão de expectativas dos noivos de um casamento cheio de realizações. O que Ferés- Carneiro (1998) e Singly (2007) nos mostra é que cada sujeito que compõe o casal pode está se cobrando tanto, ao ponto de não estarem conseguindo suprir suas próprias expectativas, nem tão pouco as idealizações do parceiro.

Ferés- Carneiro (1998) traz a contribuição de interessantes dados: a diferença da idealização entre os gêneros, que irá refletir consequentemente, nas distintas vivências de possíveis desilusões, quando tiverem contato com o que de fato for real. Para a maioria das mulheres, a união do casal será o ponto alto do relacionamento amoroso. Os homens por outro lado, veem no casamento a oportunidade de realização de um projeto de vida familiar.

Para quem optou por essa união, acabará fazendo dela palco de diversas realizações de ordem afetiva (DIAS, 2000).  Muito antes da ritualização do casamento, já começará um processo de mudança de status social identitário, de solteiro para casado e com isso haverá investimento afetivo e econômico (FELICIANO, 2005).

Há uma grande probabilidade de todos esses significados, símbolos, expectativas e sonhos, ruírem quando passam por um processo de separação (FERÉS- CARNEIRO, 1998; GOMES, 2009). O caminhar rumo ao rompimento, não é uma crise prevista pela família, afetando todos os membros de forma emocional, financeira e social, o que pode causar uma desestrutura, mesmo que momentânea (CEZAR- FERREIRA, 2007). O processo então poderá ser doloroso, por ser uma série desencadeante que inicia na conscientização do término da conjugalidade, culminando no rompimento definitivo da relação (BRITO, 1999).

A negação do fim do relacionamento pode ser mais uma possibilidade para não enfrentar a dor causada pela separação. Assumir a chegada desse fim é arcar com o sofrimento motivado pelo fracasso das suas idealizações amorosas e projetos de vida (FERES- CARNEIRO, 1998). O estresse pode se fazer presente na mudança da dinâmica familiar. Como também poderão ser provocados no homem e na mulher sentimentos de luto, pela perda do parceiro e rotina familiar, havendo a possibilidade de ser pior que o luto vivenciado pela morte de um dos cônjuges (CARUSO, 1989).

Ainda que esses sentimentos sejam evidenciados nesse momento de perdas (GOMES, 2009), essa crise precisará ser superada. No entanto, com a possibilidade de um dos cônjuges não sair fortalecido, mas com a sensação de fracasso (FERÉS-CARNEIRO, 1998). Pode isso acontecer devido ao desgaste vivido quando o casal não consegue entrar em um consenso sobre a guarda dos filhos, pensão, horário de visitas e divisão de bens (BRITO, 1999; MATOS, 2006).

“Quando se trata do fim de um casamento com filhos, as conseqüências podem ser ainda mais tristes e complexas” (GOMES, 2009, p. 14), que pode ser mais um fator para a permanência conjugal do casal em situação de violência. Para os filhos, podem surgir sentimento de desamparo, raiva, medo e solidão, somado à preocupação com o que lhes vai acontecer, o que pode provocar uma baixa autoestima e até comportamentos que sinalizem regressão (GOMES, 2009).

Quando a relação conjugal se rompe, fazendo emergir as figuras dos “exs”, o mesmo não acontece com os filhos, tratando-se de uma relação que deve continuar sendo mantida. Autores como Brito (1993) salientam a importância da convivência familiar para o desenvolvimento emocional das crianças, ainda que seus pais não formem mais um casal.

O que se percebe é que há a possibilidade dos parceiros serem agressivos um com o outro, mas terem uma postura diferenciada enquanto pais. Com relação a essa perspectiva, pode justificar a esperança na mudança do parceiro? Como estariam esses sujeitos se percebendo e diferenciando em seus papéis na conjugalidade e na parentalidade?

Romper com uma relação conjugal abusiva envolve um processo ainda mais delicado, dado origem ao medo e insegurança que a violência sofrida causa na mulher. Aumenta assim o tempo de permanência na relação, com preocupações recorrentes acerca da sua segurança e dos filhos, quando os tem. A monoparentalidade é mais uma responsabilidade a ser enfrentada, assim como a possibilidade da continuidade do abuso mesmo após a separação (MATOS, 2006). Sente-se falta de estudos com homens, pois como será enfrentado por ele o processo de saída dessa relação, ainda que seja autor da violência?

Frente ao que foi exposto, há uma problemática extensa a qual o jurídico, em um raciocínio linear e racional tenta abarcar e acaba simplificando a questão e para contemplá-la exige conhecimento extra. A psicologia vem a contribuir com um olhar especializado no fator emocional. Fator esse que dificilmente vai ser prático e objetivo, pelo contrário, é instável e variável. Essa dinâmica apresenta pessoas que não são totalmente boas ou más, amigáveis ou odiáveis, mas que transitam por esses mundos (BRITO, 1999).

O histórico pessoal dos sujeitos que compõem o casal não deve ser deixado de lado o. Portanto, o fator individual apresenta-se como mais uma alternativa, por cada sujeito que compõe o casal, ainda que tenham pontos em comum, terão características individuais diferenciadas, pois cada um vem com uma bagagem de história de vida, como diferenças psíquicas e biológicas e essas são apenas algumas das dicotomias que podemos citar dentre tantas (BATISTELLA, 2006; MALDONADO, 2008).

Assim como condições facilitadoras para o surgimento da violência no âmbito conjugal, a insegurança e exacerbada agressividade, gerada por uma autoestima abalada somada a um histórico familiar de violência, também podem ser fatores para a permanência desse casal violento, no convívio conjugal (MATOS, 2006). A dependência afetiva pode fazer com que as mulheres consigam conciliar o afeto sentido por seu parceiro e o sofrimento causado pelos maus tratos.

Estudos feitos pela mesma autora apontam que são necessários múltiplos e contínuos esforços, para que a mulher saia da situação de abuso. Caracteriza-se como um percurso que demanda muito tempo, com alternância em acreditar e desacreditar na mudança do parceiro, tolerar ou revidar, enfim sair ou ficar na relação, o que ajuda a compreender as ídas e vindas deste casal. Para que aconteça o rompimento deste casal, há a relevância do processo cognitivo da mulher e do significado atribuído as situações conflituosas. O que mulheres que passam por essas circunstâncias considerariam violência? E se considera violência o vivenciado, consideraria como ato criminoso? Mesmo aparentemente redundante as duas perguntas, podem levantar questões interessantes para futuras pesquisas.

Outra opção que se pode tecer para responder a problemática em voga, neste emaranhado de possibilidades, é a utilização da violência pelos cônjuges como uma ferramenta para resolução de conflitos (ALVIM; SOUZA, 2006). Mas estariam esses conflitos tão presentes na vida do casal?

No que tange a sociedade, a mesma será passível de conflito em todas suas instâncias, uma vez que é motivado pelas diferenças entre os indivíduos, o que exigirá uma constante negociação. Logo, não será diferente nas relações conjugais. Por historicamente ter-se modelos de gêneros rígidos e hierárquicos, algumas das dificuldades encontradas para a resolução do conflito nessa instituição social é a de resolver de forma adversarial, diferente do que se tem na mediação do mesmo. A mediação busca uma visão igualitária de direitos e um denominador comum entre as partes envolvidas, porém é uma abordagem nova na resolução de conflitos até no judiciário. No caso de funcionamento conjugal arcaico, a dificuldade se instala por ser pré-requisito da mediação um consenso na noção de justiça e a forma adversarial neste contexto pode facilitar o aparecimento de condutas violentas (ALVIM; SOUZA, 2006).

Pode-se encontrar nas relações conjugais um acordo tácito e a quebra desse acordo bastante significativo na vida a dois, pode levar a desconfiança, facilitando o surgimento dos conflitos. Por ser dinâmico, tal acordo pode ser constantemente renegociado ou definitivamente quebrado (JOSÉ FIORELLI; MARIA FIORELLI; MARCOS JUNIOR, 2008).

Por estar presente no desenvolvimento do ser humano, o conflito tem um papel em destaque nas relações, existindo a possibilidade de ser um grande problema quando há uma dificuldade de comunicação entre o casal, ponto esse de suma relevância na conjugalidade (DIAS, 2000). Essa mesma dificuldade é um dos pontos trabalhados por Beiras (2009) em grupos com homens autores de violência contra a mulher, por também ser uma problemática constantemente apontada neste grupo. Portanto, o que se observa é que esses conflitos quando não geridos de forma satisfatória por ambos os parceiros, podem provocar o aparecimento da violência e/ ou a separação dos cônjuges (BATISTELLA, 2006; MALDONADO, 2008).

Resultados da pesquisa feita por Dias (2000) mostram que atualmente há uma maior receptividade dos homens para resolver conflitos afetivos na família, o que anteriormente era um papel socialmente esperado apenas da mulher. No entanto, a maioria dos homens reclama da forma que as mulheres encontram para resolver essas desavenças e elas as dele, havendo desse modo, uma diferença quando tratada essa questão.

Partindo dessa perspectiva, a violência em um relacionamento amoroso, afeta tanto o gênero masculino quanto o feminino, podendo existir uma alternância na figura do autor da violência, ou até ambos atuarem simultaneamente na mesma (CANTERA, 2004; MATOS, 2006). Vista como processo, a violência faria parte da relação, uma alternativa de funcionamento da comunicação, mesmo que apresentada de forma perversa.

Sob as linhas da perspectiva social e da relação de gênero, podemos apontar mais algumas possibilidades. No Brasil, até 1960, os papéis de gênero estavam claros e aparentemente fixos, de forma hierarquizada o marido comandava a família e buscava proventos para manutenção do lar, a mulher incumbida de repassar valores familiares, com um cuidado acolhedor e responsabilidade mediadora para boa convivência entre todos os integrantes da família, sobretudo na qualidade da conjugalidade (CARBONERA, 1998; COSTA, 2005).

O movimento feminista vem de encontro a esses modelos de gênero. Com princípios em raízes de manifestações européias, logo chega aos Estados Unidos, unindo-se a outros movimentos estudantis e hippies, em lutas pacifistas em todo o país. Mais tarde atinge a América Latina, redefinindo aos poucos esferas políticas, sociais, jurídicas, econômicas e, principalmente, a figura da mulher nessas instâncias (COSTA, 2005). As consequências dessas novas condutas acabam por atingir e romper com padrões de masculinidade, altera configurações patriarcais, refletindo nas relações de poder e dominação masculina e, desse modo, atinge o funcionamento da dinâmica conjugal (ALVIM; SOUZA, 2005).

A mulher que se apresenta nos dias de hoje, carrega consigo uma mescla de valores atuais, com os das gerações anteriores (arcaicos) (FIGUEIRA, 1987), fazendo com que seu comportamento também transite sob esses dois mundos. Elas têm iniciativa para escolha do parceiro, reclamam se não são tratadas como acreditam que merecem, mas ainda esperam encontrar o homem perfeito que irá lhes completar e assim viver um “feliz para sempre” (SANTOS; MORAIS; MENEZES, 2008).

Devido às transformações histórico-sociais, essa guerra de princípios, resgata como papel das mulheres, a manutenção dos laços familiares, ao passo que ela adentra o mundo do trabalho. No entanto, Silva (2004) alega que ainda que essa mulher assuma uma jornada dupla de trabalho, continua sendo mais desvalorizada financeiramente que o homem, ao ter salários inferiores. Tais mulheres dependem financeiramente de seus companheiros, assim como seus filhos e existindo uma relação violenta sob essas circunstâncias, a dependência financeira pode fazer com que não haja o rompimento marital.

Têm-se também como mais uma alternativa para a permanência desse casal violento na conjugalidade sem ainda romper com a violência, o que foi citado anteriormente, socialmente ainda designa-se a mulher a manutenção e qualidade da relação conjugal (GIDDENS, 1993), como também o papel de cuidado. Justifica aqui seus esforços nessa área, a crença de que o outro vai melhorar, que foi apenas daquela vez e questionamentos como: o que será do pai dos seus filhos sem ela? Podem fazer com que ela mantenha-se no ciclo de violência de Walker exposto por Cantera (2004).

A sociedade, ainda sustentada por questões culturais arcaicas, tem a mulher como um ser emocional, dócil e mediadora de conflitos, tornando-se um ideal de comportamento do gênero feminino. Nesse sentido, o gênero masculino é tido como naturalmente agressivo, rude e racional.  Essa expectativa social facilita a idéia de vitimização da mulher e aceitação do papel de agressor para o homem, aspectos esses que podem banalizar esse tipo de violência, como também deixar tênue a linha da aceitação da intensidade de conflitos entre o casal (CANTERA, 2004).

Por outro lado, um fato atual que pode confirmar a nova concepção da mulher como sujeito de direitos, recaindo sobre si a expectativa de ser uma pessoa autônoma (financeira e emocionalmente) e segura, está nos dados debatidos por Matos (2006). A autora informa que a rede de apoio social em volta dessa mulher, composta por integrantes da família ou amigos, a aconselha a sair da relação e a manter a separação. Essa afirmativa se dá pela constatação de que quanto maior o número de reconciliação do casal em questão, menor a frequência de apoio emocional dado por amigos e familiares e onde muitos podem até desistir de ajudar.

Todavia, uma dúvida pode surgir para o leitor nesse momento, se houve tantas lutas e transformações com o movimento feminista, por que ainda hoje em alguns setores socioculturais parece não ter havido mudanças?

Figueira (1987) tenta responder essa inquietação. A sociedade não poderia se tornar moderna de repente, mas tudo está em constante transformação, sendo a dimensão da subjetividade a mais difícil de obter mudanças significativas. Pode-se concluir que a sociedade ainda não apresenta mudanças profundas, sobretudo nos papéis de gênero dentro da família e conteúdos novos e arcaicos coexistem, lutando por um espaço. A nova conjuntura dos papéis sociais tem uma linha tênue entre o certo e o errado. A incerteza e o desconhecido se instalam. Há uma maior possibilidade de atuação, contanto que o espaço do próximo seja respeitado.

O que acontece na realidade brasileira é a sobreposição do arcaico pelo novo, sem modificar verdadeiramente o funcionamento. Isso quer dizer que os modelos antigos de conduta e valores continuam presentes, mesmo que de forma inconsciente, e o modelo moderno seria “o núcleo daquilo que desejaríamos ser” (FIGUEIRA, 1987).

Mas quais serão os conteúdos arcaicos que influenciariam na questão desta pesquisa? Muitos já foram expostos como a influência da moral cristã; o ideal de uma conjugalidade e família, que são passados para os filhos; e as construções dos comportamentos de gênero baseados na hierarquia, provocando por muitas vezes o surgimento de conflitos, geralmente geridos de forma adversarial, por não haver uma forma igualitária de poder.

A partir do momento que se é repensado os papéis de gênero, questiona-se também o que é violência nesta relação de poder. Houve o reconhecimento da existência de violência contra mulher. Mais tarde ampliaram as discussões para violência de gênero, fazendo com que se pensasse na violência nos lares, lugar que deveria acolher essa mulher e devido às estatísticas, volta-se os olhos até a pessoa que prometera amá-la e respeitá-la, seu companheiro (SANTOS; IZUMINO, 2005). Conclui-se que a violência conjugal passa a ser considerada ao passo que a mulher começa a ser vista como sujeito de direitos. Pesquisas como de Matos (2006) veem mostrando o quanto a sociedade atual espera que essa mulher saia da relação violenta, podendo até desistir de apoiá-la, por acreditar que ela não deve aceitar esse tipo de situação. Cada momento histórico traz consigo uma expectativa social sob os indivíduos. O que outrora tinha-se como prioridade a manutenção do casamento não importando o que acontecesse, hoje pode-se conceber como obrigatório pela sociedade, a separação quando há incompatibilidade de gênios, ainda mais em casos de violência.

Os conteúdos internos profundos do sujeito, como a subjetividade sofrem influência das regras sociais. Independente de a idéia ser nova ou arcaica, o indivíduo parece sentir-se obrigado a seguir determinada atitude ou valor, sem antes refletir suas reais necessidades para ver cada idéia como uma como opção e não como obrigação, fato que pode levar a uma anulação das ações e das responsabilidades. Reafirmando que a idéia pode ser nova, mas o mecanismo ainda é arcaico e a verdadeira modernização, virá quando a idéia independente de ser arcaica ou nova, tiver um funcionamento moderno, ou seja, flexível e crítico (FIGUEIRA, 1987).

No que diz respeito à violência conjugal, será que apenas o discurso da mulher contemporânea é o de sujeito de direito, quando na verdade ela ainda é um objeto da sociedade e do direito? Diante disso, resgatando a perspectiva ecológica adotada pela OMS de violência (DALHBERG; KRUG, 2007): a pressão social para que seja rompido nesses casos os laços conjugais, não seria também uma violência causada contra essa mulher? Pela possibilidade de estar forçando-a a fazer algo que talvez não tenha condições para suportar as consequências naquele momento? A questão aqui apresentada não é a do apoio a esse tipo de maus tratos, mas de realçar como Figueira (1987), salientou a necessidade de um trabalho voltado ao senso crítico e conscientização dos sujeitos envolvidos nessa conjugalidade violenta, na busca de uma maior responsabilização de seus atos e autonomia nas decisões acerca das suas reais necessidades.

Considerações Finais

Neste artigo, foi apresentado um levantamento bibliográfico com início no campo da construção e vivência da conjugalidade. Passou-se posteriormente para o levantamento de questões que envolvem o processo de dissolução conjugal. Na sequência, foram expostos os diversos tipos e definições de violência e finalmente, foram indicadas teorias sobre o tema central do trabalho, a violência conjugal. Na discussão, os pontos anteriormente recordados, foram tomados como alicerces preciosos no levantamento de possibilidades de respostas para motivos que poderiam influenciar na permanência da conjugalidade em casais que vivenciam a violência. Tais possibilidades se apresentaram enquanto linhas que se entrelaçam (DELEUZE; GUATTARI, 2000) e foram apresentadas separadamente para uma maior clareza e apreciação dos dados.

Pôde-se verificar conteúdos “arcaicos” (FIGUEIRA, 1987) na subjetividade de sujeitos contemporâneos, como a influência da moral cristã, como um dos fatores que poderia sustentar tal união. Pelo fato de historicamente estar atrelada as legislações, independente da crença, muitas pessoas estiveram e ainda estão sujeitas a tais preceitos morais, mesmo as que não foram casadas no religioso (BRITO, 1992; GOMES et al., 2005).

As consequências a serem enfrentadas com a mudança no ciclo familiar, caso o fim do relacionamento ocorra, foi mais uma alternativa pensada. Sonhos e expectativas são investidos quando se decide levar uma vida a dois (DIAS, 200).

Por isso, listou-se também a negação do fim da conjugalidade, como outro fator para não assumir a dor vivenciada no rompimento afetivo, provocada pelo sentimento de fracasso (FERES – CARNEIRO, 1998). Devido a isso, sensações de estresse e sentimentos de luto pela perda do parceiro e diferença na dinâmica familiar, podem ser sentidas (CARUSO, 1989).

Em uma união com filhos, parece ser mais difícil a saída da relação. Tem-se ainda o princípio de repassar um modelo de família nuclear para os descendentes, que podem se sentir desamparados diante da situação de separação do que para eles continua unido: pai e mãe, possibilitando o sentimento de revolta e insegurança (GOMES, 2009).

A pesquisa salientou que quando se trata de romper uma relação abusiva, a preocupação com a segurança dos filhos aumenta, como também o peso da responsabilidade da guarda, discussões acerca de pensão e visitas (MATOS, 2006).

Sem dúvida, compreende-se que características individuais apresentam-se como uma possibilidade de resposta para a problemática. Pesquisas mostraram que o histórico de vida pessoal, desenvolvimento emocional, psíquico e biológico, motivam conflitos que podem evoluir para situações de maus tratos (BATISTELLA, 2006; MALDONADO, 2008).

Como mais uma opção, teceu-se a possibilidade de alguns casais estarem utilizando a violência como forma de resolver conflitos de ordem conjugal. Conflitos esses que existem no desenvolvimento pessoal, nas diversas camadas da sociedade e na relação conjugal (ALVIM; SOUZA, 2006; BATISTELA, 2006; MALDONADO, 2008), podendo ser uma problemática quando o casal tem dificuldade de dialogar (DIAS, 2000).

A perspectiva da relação de gênero trouxe algumas alternativas fundamentais. O movimento feminista mostrou-se como marco inicial na discussão acerca da violência contra mulher. Rompe com modelos de gênero antigos, possibilitando o surgimento novos pensamentos e condutas, tanto para mulheres como para homens (COSTA, 2004).

A busca por direitos deu a mulher grandes conquistas, mas também responsabilidades, como a de ser independente, conquistar o mundo do trabalho e de não aceitar que seus direitos humanos sejam violados.  No entanto, continuam ganhando menos que os homens (SILVA, 2004), o que torna difícil o desvencilhamento conjugal sob essas circunstâncias.

Outro ponto que foi levantado foi o de ainda ser designado ao gênero feminino à qualidade do relacionamento (GIDDENS, 1993), podendo emergir o sentimento de responsabilidade do fracasso do envolvimento afetivo, como há a possibilidade de se fazer presente o sentimento de esperança de mudança do cônjuge.

O que se pode concluir é que mesmo com todas as transformações desencadeadas pelo movimento feminista, valores novos e antigos coexistem, frente a essa mulher e a esse homem contemporâneo. Nos casos de violência haverá fatores a influenciar a permanência dos dois enquanto casal, como também o incentivo do rompimento do laço.

As pesquisas expostas se apóiam sob esses aspectos, porém, entre a ansiedade que a cultura consumista traz (BEIRAS, 2008) e a rigidez das idéias arcaicas, há a permanência do critério de escolha ser ditado socialmente, fazendo com que os sujeitos não reflitam verdadeiramente sobre suas reais necessidades. Quem poderia trazer a resposta de quão fortalecido esses indivíduos estão para enfrentar a separação do vínculo de maus tratos ou para manter essa relação? Mesmo que a última opção possa parecer absurda, qual o significado dado a cada um desses possíveis acontecimentos? Quais desses sujeitos que compõem o casal suportariam, não com mais facilidade, mas com menor sofrimento o rompimento de um laço conjugal violento?

Notou-se que a separação não diz respeito apenas a um recurso de prática jurídica. Por ter a variante da violência torna-se uma problemática mais complexa, com vasta possibilidade de fatores para a permanência da conjugalidade, diante de toda adversidade (BRITO, 1999).

Para além disso, não estaria a sociedade contemporânea a violentar, sobretudo a mulher que decide permanecer na relação? Esta mulher não velaria ainda mais a violência sofrida, por vergonha da sua decisão ir de encontro à idéias “modernas”?

Um trabalho no sentido de combater esse tipo de violência, estaria em incitar questões reflexivas nessa mulher, que pode ter sido vítima, mas atuante nas transformações da sua vida e precisa refletir acerca das vantagens e desvantagens na sua decisão de permanecer ou sair da relação. Levantar questionamento nas suas concepções de violência, criminalidade, conjugalidade e relações de gênero é fundamental. Como também reflexões acerca da sua autoestima. Fortalecer dessa forma seu senso crítico, para que ela decida qual caminho estará disposta a seguir.

Todavia tem-se a necessidade de um trabalho de reflexões e ressignificações como de Beiras (2009) com homens autores da violência, pois os mesmos ainda que rompam laços, podem vir a adentrar em outras relações violentas. Nesse sentido, ao analisarmos tal problemática torna-se primordial um olhar sistêmico sobre o sujeito como um todo, não deixando de lado as influências externas.

Diante do panorama exposto, restaram algumas indagações para futuras pesquisas: Quando se trata de um casal que vivencia os maus tratos, como o ideal de família coabita com a violência sofrida?  Como é visto pela (o) parceira (o) que a mesma pessoa que lhe agride pode ser um excelente pai (mãe) para seus filhos? Entretanto, e os casais que optaram pela separação como eles lidaram com a situação? Muitos voltaram a viver com seus parceiros ou se mantiveram firmes na sua decisão?  Por fim, com todas essas metamorfoses e momento de transição em que se vive de idéias novas e arcaicas, será que esse casal tem que se separar?

 

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Informações Sobre os Autores

Larissa Paula Briglia de Souza

Bacharel em Psicologia pela Universidade Federal de Roraima – UFRR, Pós-Graduanda da UNIARA, Psicóloga do Centro Humanitário de Apoio a Mulher de Roraima

Carime Lima dos Santos

Bacharel em Psicologia pela Universidade Federal de Roraima – UFRR, Pós-Graduanda da UNIARA

Renata Hirano Junes

Bacharel em Psicologia pela Universidade Federal de Roraima – UFRR, Pós-Graduanda da UNIARA


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