A polêmica dos crimes hediondos

O que é um crime hediondo?  Fácil intuir do próprio nome, se tratar de uma barbárie, ato brutal inaceitável para os civilizados.

Daí o senso comum, com natural prevenção, emitir voz contrária,      a tudo que assinale qualquer abrandamento de pena, a quem pratica ato de tamanha insensatez.

A lei sobre os crimes hediondos, criada em 1990, trouxe o elenco dos fatos típicos nela enquadráveis, a exemplo, o  latrocínio, extorsão mediante seqüestro, atentado violento ao pudor, etc; e previu tratamento mais rigoroso a estas espécies.

Dentre as medidas de reprimenda ao crime nela previstas, vedou a possibilidade da progressão do regime, sistema que permite ao apenado, após o cumprimento considerado satisfatório da fração de 1/6 da pena, pleitear a modificação a outro menos rigoroso. Do regime fechado, pode progredir ao semi-aberto e daí ao aberto.

Assim, aos agentes incursos nestes crimes, de maior potencial lesivo, a pena deveria ser cumprida em regime integralmente fechado, como previsto no § 1º do  art. 2º desta lei.

Porém, recentemente, no dia  23 de fevereiro de 2006, o Supremo Tribunal Federal, concluiu o julgamento de um processo de Habeas Corpus,  no qual declarou inconstitucional este parágrafo, já que a lei maior do País, a Constituição Federal de 1988, condensa princípios voltados à regeneração do apenado.

A abertura da possibilidade da progressão também nos crimes hediondos, através desta decisão, corajosa e independente, já que, sob  forte indignação de boa parte da opinião pública, veio num sentido, corrigir uma distorção, que ficou evidente ao longo dos 16 anos de existência desta lei, ao ponto, de alguns operadores do direito se referirem a ela, jocosamente como,  lei hedionda.

Porque, alguém a exemplo, condenado por vender ou mesmo fornecer gratuitamente um cigarro de maconha a outrem, fato que configura tráfico de entorpecente, estaria submetido – embora não à mesma pena – a idêntico regime de cumprimento, daquele que distribuiu um caminhão do entorpecente.

Idem nos denominados crimes contra os costumes. No atentado violento ao pudor, que não tenha havido violência real,  mas a presunção, o regime seria igual ao que praticou o crime usando de  violência real.

Havia assim, uma desproporção, ou desigualdade, na forma da  reprimenda,  porque, mesmo  nestas circunstâncias menos danosas, e ainda que o condenado fosse primário, de bons antecedentes, demonstrasse condições de ressocialização e não fosse considerado periculoso, estaria sujeito ao regime fechado, e a longa jornada no cárcere, em prejuízo da própria sociedade.

Porque é notório que atualmente, os presídios – ponto de encontro de praticantes de crimes de todas as espécies, que passam o tempo geralmente na ociosidade – longe de se prestarem à reeducação dos presos, servem de laboratório e especialização para comissão de outros delitos, quiçá mais graves, que serão praticados assim que abertos os grilhões da cela.

De reconhecer porém, que aos crimes teratológicos, e agentes de alta  de periculosidade, que não apresentem sinais ou interesse de regeneração – pois há casos em que o próprio condenado não esconde que, quando solto voltará a delinqüir, e até dos que continuam articulando redes criminosas de dentro da própria prisão – se mostra assaz razoável a continuidade da vedação à progressão do regime.

Assim, a par de desejarmos que o cancro da criminalidade ocupe cada vez menor espaço no tecido social, numa primeira opinião, de lege ferenda,      é esperar que os legisladores aprofundem estudo, que viabilize a justa individualização da pena, modificando a lei para que o juiz possa, fixar também o regime de forma proporcional à infração, com possibilidade de variação na fração do tempo de cumprimento da pena, conforme o caso e as condições pessoais do agente, reservada porém, a vedação da progressão àquelas situações incontornáveis.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Ricardo Calil Fonseca

 

Advogado em Itaberaí, Goiás, atuante desde 1992, nas áreas: cível e trabalhista, inscrito na OAB/GO sob nº. 12.120. Pós-graduado em direito do trabalho, pelo convênio Universidade Católica de Goiás/PUC-SP

 


 

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