Brasil sem homofobia?

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Palestra
proferida no

Conferência Internacional de Direitos Humanos  GLBT, por ocasião do 1º
World Outgames – Montréal 2006, dia 26 de julho de 2006, em Montréal-CANADÁ.

No Brasil realiza-se a
maior parada gay do mundo, e isso há
3 anos consecutivos. São Paulo reuniu, no último dia 17 de junho, mais de 2
milhões e meio de pessoas em uma festa linda, marcada pelas cores do arco-íris:
símbolo universal da diversidade. Depois do Carnaval,  é nossa maior festa
em número de participantes.

Em todos os mais de 5.000
Municípios, há alguma entidade em defesa dos direitos humanos atenta ao tema da
livre orientação sexual. Entre os movimentos sociais existentes são estes os de
maior número. A ABGLBT – Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Transexuais e Travestis – congrega mais
de 200 entidades.

Mas há mais. O programa
nacional intitulado “Brasil sem Homofobia” visa a combater a violência e a
discriminação contra os homossexuais e a promover a cidadania, atentando à
diversidade de gênero. Este é o maior plano de ações governamentais já
implantado e envolve todos os setores do governo em todos os níveis: federal,
estadual e municipal. O próprio governo federal, inclusive, criou um
observatório – do qual tenho o privilégio de fazer parte – que se destina a
cobrar a implementação dessas medidas.

Em nível federal, há o
Conselho Nacional de Combate à Discriminação, ligado à Secretaria Especial de
Diretos Humanos, e, na maioria dos 26 Estados, existem conselhos visando à
implantação de políticas públicas em prol dos direitos à identidade
homossexual. O Programa Nacional DST/AIDS destaca-se como exemplo no panorama
internacional com o seu programa de combate à AIDS.

Tudo isso leva a crer que
o Brasil é o melhor dos mundos: não existe discriminação, reina o primado dos
direitos humanos, e é absoluto o respeito às diferenças. No entanto,
infelizmente esta não é a realidade do nosso País. Talvez o dado mais chocante
seja o fato de não existir nenhuma lei que reconheça direito aos parceiros do
mesmo sexo. A omissão é total, mesmo sendo o Código Civil bastante recente, do
ano de 2003.

Nada é reconhecido, nem a
união civil e muito menos a possibilidade do casamento.

Projeto de lei buscando o
reconhecimento da parceria civil, do ano de 1995, nunca chegou a ser votado. As
reações são violentas. Apesar de o Brasil ser considerado um país católico, a
maioria do Congresso Nacional é formada por integrantes de igrejas evangélicas,
segmento religioso que tem crescido muito, dispõe de grande poder econômico e
vem dominando até os meios de comunicação. Assim, somam-se as forças
conservadoras que impedem a aprovação de qualquer lei que busque reconhecer
algum benefício à parcela da população alvo de tanta discriminação e
preconceito.

Este obstáculo, que vem
sendo visto quase como instransponível, tem levado à aprovação de algumas leis,
de alcance estadual e municipal, com medidas de repressão a atitudes
homofóbicas. Porém, os avanços mais significativos vêm sendo alcançados no
âmbito do Poder Judiciário. É por intermédio das decisões judiciais que alguns
direitos são reconhecidos. No entanto, o número dessas decisões ainda é
escasso.

No ano de 2000, iniciei
uma verdadeira cruzada, denunciando o injustificável preconceito contra as
uniões que chamei de “homoafetivas” – expressão que mais diz sobre a natureza
deste vínculo – na obra que, de forma pioneira, enfrentou os aspectos jurídicos
das uniões de pessoas do mesmo sexo. A partir daí é que a Justiça começou a
emprestar visibilidade e reconhecer alguns direitos a gays e lésbicas. Por
isso, foi principalmente no sul do Brasil – região onde sou magistrada – que
surgiram as decisões mais arrojadas e de vanguarda.

Mas a grande dificuldade
ainda é abandonar o velho preconceito de ver tais uniões como uma sociedade de
fato e as identificar como entidade familiar. Esta mudança se faz necessária,
pois alguns direitos só podem ser reconhecidos no âmbito do Direito de Família,
tal como direito a alimentos, direito de habitação, direitos previdenciários e,
principalmente, direito à herança. Ora, enquanto visualizada como simples
sociedade de fato, não se pode falar em família e, via de conseqüência, em
direito sucessório.

O primeiro passo foi
afirmar a competência das Varas de Família para julgar as ações envolvendo
casais homossexuais. Depois, com o reconhecimento das uniões como uma entidade
familiar, foi possível atribuir ao parceiro sobrevivente a condição de herdeiro
e conceder-lhe direitos sucessórios.

Recente decisão,
também do Tribunal gaúcho, concedeu a adoção dos dois filhos à companheira da
mãe adotante. Eles haviam sido adotados por uma das companheiras quando do
nascimento, e, após 3 anos, sua companheira obteve na Justiça a adoção de
ambos. Esta foi a primeira decisão que no Brasil acabou por reconhecer a
possibilidade de adoção por um casal homossexual. Assim, as crianças passaram a
ter duas mães, constando o nome de ambas no registro de nascimento.

Algumas ações propostas
pelo Ministério Público no âmbito da Justiça Federal dispõem de efeito
vinculante, ou seja, asseguram direito a todos. Assim, benefício previdenciário
em decorrência da morte do parceiro e auxílio-reclusão, quando o parceiro
estiver preso, passaram a ser pagos ao parceiro homossexual em sede
administrativa, sem haver a necessidade de se buscar a via judicial. Igualmente
a indenização decorrente do seguro obrigatório por morte em acidente de
trânsito é deferida sem a necessidade de propor ação judicial.

Decisões sem efeito erga
omnes
, ainda que beneficiem somente as partes, acabam consolidando a
jurisprudência, que indica novos rumos e abre caminhos, ainda que de modo
vagaroso.

Mas os caminhos trilhados
estão abertos – são conquistas que sinalizam novos tempos – e servem de
paradigma para que a sociedade saiba o que significa o dogma maior da nossa
Constituição Federal, que impõe o respeito à dignidade da pessoa humana.

E não há respeito sem
igualdade, sem liberdade. O indispensável é garantir o direito à felicidade, o
que todos buscamos e é o que desejo a todos vocês.

Obrigada.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Maria Berenice Dias

 

Advogada, Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM

 


 

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