Relação familiar entre os homossexuais e a questão os direitos humanos

Resumo: Por mais que os homossexuais tenham sido alvos de muitos preconceitos a luta dos direitos humanos vem sendo vitoriosa e os tribunais vêm reconhecendo alguns direitos a partir da convivência em comum, direitos esses ainda insertos no contexto legislativo. A convivência de pessoas do mesmo sexo fez nascerem polêmicos Projetos de Lei cujo propósito é dar as parcerias homossexuais status de união estável e reconhecer os direitos de todo o ser humano além de deveres e obrigações, protegendo assim disposições de caráter patrimonial protegendo a propriedade construída pelos parceiros e o direito à adoção, garantindo ainda o direito de sucessão nos bens pelo companheiro homossexual, marcando assim a saída da clandestinidade destas relações e a regulamentação como entidade familiar que são baseados nos direitos fundamentais do ser humano.


Palavras Chaves: Homossexualidade. União homoafetiva. Direitos humanos.


Sumário: Introdução. 1)Conceito de Direitos Humanos. 2)Conceito de homossexualidade e sua origem. 3)Homossexuais e Direitos Humanos. 4)Origem da família e sua evolução histórica. 4.1) A família homossexual. 5) Direito à união estável por homossexuais. 6) Direito à adoção por homossexuais. 7) Direito à sucessão por homossexuais.  8) Conclusão. 9) Bibliografia. 

“O problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos (humanos), qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.”[1] 


Introdução:


A sociedade sofre mudanças constantes e estas devem ser, quando necessário, regulamentadas pelo Direito, é o caso da homossexualidade que é uma questão que não pode mais ser deixada de lado, é gritante a urgência em se regulamentar situações que ferem diariamente os direitos fundamentais do homem.


Os homossexuais não são uma espécie diferente, são todos seres humanos, estão incluídos dentro de todos os direitos inerentes a esta espécie e merecem uma atenção especial, por parte da legislação e do judiciário para que possam ver garantidas situações comum quando se trata de casais heterossexuais.


È necessário prestar mais atenção a este grupo social que sofre diariamente o preconceito de ter feito uma escolha, uma opção sexual, que lhe é permitido de acordo com o seu direito a liberdade e a vida privada, mas estes sofrem por não terem assegurados devido a sua condição sexual, direitos básicos, como por exemplo: o reconhecimento da união estável, a sucessão, a adoção, entre outros.


Com a evolução da sociedade estes direitos estão começando a desabrochar com inovadoras, mas ainda tímidas, jurisprudências, mas como a maioria do que é regulamentado no Direito começa a ser decidindo e regulamentado pela jurisprudência, analogia e princípios gerais do Direito este está sendo o mais importante e principal passo na garantia dos direitos deste grupo social.


  Sendo assim é a partir deste contexto que estão surgindo às primeiras garantias com relação aos direitos dos homossexuais e é isto que pretendemos mostrar neste trabalho, a importância do estudo dos direitos humanos em face da família homoafetiva e a evolução destes direitos.


1) Conceito de Direitos Humanos:


A idéia de Direitos Humanos surge juntamente com a dignidade da pessoa humana, pois, são direitos do homem que garantem a este uma vida com um mínimo de garantias. O autor João Baptista Herkenhoff entende por Direitos Humanos:


“Por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir.” [2]


Desta forma, entende-se como direitos humanos aquela parcela de direitos fundamentais que a pessoa humana carrega pelo fato de ser humano e de necessitar de direitos básicos que cubram as suas garantias mínimas.


Os direitos humanos nada mais são que direitos que visam resguardar os mais preciosos valores da vida humana, que visam resguardar a integridade física e psicológica perante a sociedade e perante ao Estado, limitando o poder deste e garantindo dignidade a todo ser humano.


Sem dúvida conceituar o que são Direitos Humanos não é algo fácil, pois trata-se de uma tema amplo, mas o que verdadeiramente importa não é o seu conceito ou  as suas características e sim a sua não violação, nas palavras de Noberto Bobbio em seu livro  A Era dos Direitos, afirma:


“O problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos (humanos), qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.”[3] 


Assim, os Direitos Humanos são mais que simples direitos, são garantias a serem rigorosamente cumpridas para que a vida do ser humano tenha sempre segurança e dignidade.


2) Conceito de Homossexualidade e sua origem:


Existe uma pergunta que muitas pessoas fazem quando param para refletir sobre a condição de homossexual, a questão centra-se sobre o fato de ser a homossexualidade apenas característica que caracteriza o ser humano? Com certeza não, esta é uma característica inerente a todos os animais.


Assim a homossexualidade esta presente não somente entre os homens, mas entre as inúmeras espécies de animais, sendo este um acontecimento que se dá desde os tempos mais remotos da história da humanidade.


O autor Enéas Castilho Chiarini Júnior[4], se pronuncia sobre a existência da homossexualidade:


“O certo é de que “desde que o mundo é mundo”, a homossexualidade existe, e não será proibindo-se que se acabará com ela. Quem defende que a homossexualidade é algo errado, contra a natureza, deve ter em mente que durante séculos e séculos esta atitude foi, e ainda é, combatida pela igreja, mas ela continua resistindo e existindo. Não será varrendo a homossexualidade para debaixo do tapete que se acabará com esta prática. Mesmo porque, se até os animais têm relações homossexuais, como pode alguém dizer que esta prática contra a natureza? Ou será que foram os homens quem ensinaram os animais à ter relações homossexuais? Claro que não, isto faz parte do instinto animal, e o ser humano, sendo igualmente animal, deve, igualmente, possuir instintos semelhantes aos da maioria dos animais.”     


Então como se percebe a homossexualidade é algo que está intimamente ligado com os seres humanos e com todos os animais, não sendo possível ser escondida ou como autor mencionou não sendo possível ser varrida para debaixo do tapete algo tão comum em nossos dias e que precisa ser regulamentada urgentemente.


A religião é uma das organizações entre outras, como os movimentos anti-homossexuais, que combate radicalmente os homossexuais, é claro que na Bíblia não existe a palavra homossexual, mas podemos encontrar uma passagem que demonstra exatamente o que estamos colocando, em Levítico 18:22, lê-se: “Com o homem não te deitarás, como se fosse mulher: É abominação.” Desta forma podemos entender porque a igreja entende que a homossexualidade é contrária a lei divina.


Mas, quando falamos em textos bíblicos não podemos nos esquecer que a mesma bíblia que condena a homossexualidade, condena também o julgamento feito por qualquer pessoa, não nos esqueçamos da passagem de João 8:7: “… aquele dentre vós que está sem pecado que lhe atire uma pedra.”.


Sendo assim, somente Deus pode julgar os seres humanos, e mais, Direito e Religião não podem ser levadas para o mesmo caminho, pois são teorias muito diferentes, exemplo disto podemos encontrar o divórcio, a independência da mulher, estas são questões contrárias a Bíblia e a religião, mas que não acompanham a evolução da sociedade, coisa que o direito tem o dever de normatizar.


Sobre o assunto o autor Enéas Castilho Chiarini Júnior, comenta exatamente a questão:


“Assim sendo, o Direito não está, de forma alguma, ligado à Religião, contrariando-a às vezes, e, portanto, já que o Direito não obedece aos mandamentos bíblicos que ordenam a mulher a submeter -se ao seu marido, e que impedem o divórcio, porque os juristas se preocupam com o fato de ser a homossexualidade contra a vontade de Deus? Se o ordenamento jurídico já contrariou a Bíblia em nome da igualdade entre os sexos, porque não pode, mais uma vez, contrariá-la, afirmando a igualdade entre hetero e homossexuais?”[5]


O Direito não pode mais se deter com relação a esta questão que esta cada vez mais latente por regulamentação, nesse sentido o Desembargador José Carlos Teixeira Giorgis, na Apelação Civil Nº.: 70001388982, menciona:


“Não se permite mais o farisaísmo de desconhecer a existência de uniões entre pessoas do mesmo sexo e a produção de efeitos jurídicos derivados dessas relações homoafetivas. Embora permeadas de preconceitos, são realidades que o Judiciário não pode ignorar, mesmo em sua natural atividade retardatária. Nelas remanescem conseqüências semelhantes às que vigoram nas relações de afeto, buscando-se sempre a aplicação da analogia e dos princípios gerais do direito, relevando sempre os princípios constitucionais da dignidade humana e da igualdade.”[6]


Assim, o poder judiciário, através da jurisprudência, vem concedendo mais agilidade a fatos como as relações jurídicas advindas das uniões homoafetivas[7] que não podem deixar de serem regulamentadas por razões de preconceito. Em nosso Estado a jurisprudência deu seus primeiros passos no assunto com a inovadora decisão:


“HOMOSSEXUAIS. UNIAO ESTAVEL. POSSIBILIDADE JURIDICA DO PEDIDO. É possível o processamento e o reconhecimento de união estável entre homossexuais, ante princípios fundamentais insculpidos na constituição federal que vedam qualquer discriminação, inclusive quanto ao sexo, sendo descabida discriminação quanto à união homossexual. E justamente agora, quando uma onda renovadora se estende pelo mundo, com reflexos acentuados em nosso país, destruindo preceitos arcaicos, modificando conceitos e impondo a serenidade cientifica da modernidade no trato das relações humanas, que as posições devem ser marcadas e amadurecidas, para que os avanços não sofram retrocesso e para que as individualidades e coletividades, possam andar seguras na tão almejada busca da felicidade, direito fundamental de todos. Sentença desconstituída para que seja instruído o feito. Apelação provida.”[8] (grifos nossos).


É com este tipo de decisão que está à prova de que realmente a grande movimentadora e geradora de direitos é a jurisprudência garantindo que os direitos humanos inerentes a todos os seres humanos e que estão elencados na nossa Constituição Federal sejam respeitados.


3) Homossexuais e Direitos Humanos:


Podemos ousar afirmar que os Direitos Humanos estão sempre ligados com as mais diversas situações que envolvam os seres humanos, desta forma não seria diferente com os homossexuais, sendo os mesmos direitos reservados a eles, pois estes, como já foi comentado, não se tratam de uma espécie diferente do ser humano, somos todos iguais e temos direito as mesmas garantias independente da opção sexual.


Com base neste pensamento é que o direito máximo do ser humano que é o direito a liberdade deve ser sempre garantido onde o ser humano é livre para escolher a melhor forma de viver a sua vida não devendo este ser marginalizado e discriminado por qualquer de suas escolhas. Neste sentido o sábio autor João Baptista Herkenhoff escreveu:


“O direito à liberdade é complementar do direito à vida. Significa a supressão de todas as servidões e opressões. A liberdade é a faculdade de escolher o próprio caminho, de tomar as próprias decisões, de ser de um jeito ou de outro, de optar por valores e idéias, de afirmar a individualidade, a personalidade. A liberdade é um valor inerente à dignidade do ser, uma vez que decorrem da inteligência e da volição, duas características da pessoa humana. Para que a liberdade seja efetiva, não basta um hipotético direito de escolha. É preciso que haja a possibilidade concreta de realização das escolhas.” [9]


Aqui mais uma vez nos deparamos com algo bastante comum dentro das sociedades, direitos que existem, mas que são feitos para beneficiar determinados grupos de pessoas, ou seja, os direitos são conquistados mas nem sempre são devidamente garantidos para todos como seria devido.


No caso dos homossexuais estes direitos não são de certa forma, garantidos falta amparo para que sejam plenamente garantidos os direitos de liberdade de escolha da opção sexual e  até mesmo da união homoafetiva, para que do direito a estas opções possam decorrer também a garantia  de outros direitos, como o da sucessão hereditária, da adoção, entre outros.


Este direito dá as pessoas a plenitude de fazer o que escolheram desde que não prejudique ninguém, mas ai surge uma indagação, a quem pode incomodar uma união homoafetiva,  quem ela prejudica? Como não se acha resposta a estas indagações, também não se tem fundamentos para negar estes diretos aos homossexuais. 


Diante da escolha da homossexualidade, garantida pelo direito à liberdade, desencadeia-se também a garantia de outro importante direito, qual seja, o direito à intimidade.


Então, todos somos livres para fazer a nossa opção sexual e como conseqüência também temos direito a ter privacidade e viver a sexualidade da forma que lhe convier, este direito a intimidade e a vida privada é considerado como um dos direitos fundamentais do Homem, como costa na nossa Constituição Federal de 1988, quanto ao assunto esclarece o autor José Adérico Leite Sampaio:


“No centro de toda a vida privada se encontra a autodeterminação sexual, vale dizer, a liberdade de cada um viver a sua própria sexualidade, afirmando-a  como signo distintivo próprio, a sua identidade sexual, que engloba a temática do homossexualismo, do intersexualismo, e do transexualismo, bem assim da livre escolha de seus parceiros e da oportunidade de manter com eles consentidamente, relações sexuais.”[10]


Desta forma o individuo tem o direito de ser homossexual, pois esta escolha somente lhe diz respeito, não afetando os direitos de ninguém, mas como este mesmo indivíduo poderá assumir a sua opção sexual em uma sociedade altamente discriminativa, não podendo fazer desta escolha algo reconhecido juridicamente, com todos os direitos inerentes a um casal heterossexual.


Em conformidade com este raciocínio vem a questão do princípio da igualdade, ou seja, o direito de todos serem tratados igualmente, sendo estes hetero ou homossexuais, pois se aos casais de sexos diferentes é dado o direito de ter uma família reconhecida, aos homossexuais também tem que ser dado o mesmo direito, o direito a ter sua união homoafetiva reconhecida sendo que estes dispõem das mesmas características de qualquer família.


Sobre o assunto o autor Enéas Castilho Chiarini Júnior, comenta:


“Aqui está a razão maior para a analogia entre a união estável heterossexual e a união estável homossexual. Se ambos podem cumprir os requisitos para a constituição e reconhecimento de uma união estável: convivência, mútua assistência, notoriedade da relação, relação duradoura e estável, não há razões jurídicas plausíveis para excluir-se dos homossexuais a possibilidade de reconhecimento de suas uniões, sob pena de quebra do princípio da isonomia através da hipótese de exclusão de benefício.”[11]


Sobre as características necessárias para o reconhecimento de união estável e também em recorrência deste o direito a adoção é necessário mencionar jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:


“APELAÇÃO CÍVEL. ADOÇÃO. CASAL FORMADO POR DUAS PESSOAS DE MESMO SEXO. POSSIBILIDADE. Reconhecida como entidade familiar, merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus componentes possam adotar. Os estudos especializados não apontam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus cuidadores. É hora de abandonar de vez preconceitos e atitudes hipócritas desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das crianças e dos adolescentes (art. 227 da Constituição Federal). Caso em que o laudo especializado comprova o saudável vínculo existente entre as crianças e as adotantes. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME.”[12](grifos nossos).


 Partindo destes pressupostos, é importante para entendermos melhor a questão das relações familiares entre os homossexuais, fazermos um estudo mais avançado partindo da origem da família, passando pelos novos conceitos de família até chegarmos então ao estudo da família homossexual e conseqüentemente os direitos a ela inerentes.  


4) Origem da família e sua evolução histórica:


Engels[13] nos ensina que num período de passagem da fase animal para a fase humana, cada mulher pertencia igualmente a todos os homens, e que cada homem às mulheres, denominado o chamado matrimônio em grupos.


Com o surgimento de conceitos como ciúme e incesto dentro dos grupos que foram trazidos por religiões e novas culturas a formação da família começou a mudar. Atualmente a família é considerada como aquela que decorre do casamento civil, derivada da união estável entre o homem e a mulher ou até mesmo por uma comunidade formada por um pai e um filho, denominando assim a família monoparental. (artigo 226, §§ 1º a 4º da Constituição Federal e artigo 25 do Estatuto da Criança e do Adolescente).


Deocleciano Torrieri Guimarães define família como sendo a “sociedade matrimonial formada pelo marido, mulher e filhos, ou o conjunto de pessoas ligadas por consangüinidade ou mero parentesco”.[14]


Mas o conceito de família evolui constantemente e provavelmente irá mais uma vez, em breve, sofrer mais alterações no que diz respeito à família homossexual. Podemos perceber que a partir dos anos 90, as unidades familiares apresentam as mais variadas formas possíveis, sendo muito comuns são as famílias mono parentais, formadas por um dos pais e seus filhos, adotivos ou biológicos. Proliferam de igual sorte, as famílias formadas por homossexuais, homens ou mulheres.


Pensar que para haver de fato uma família tenha que ter em sua formação diferença de sexo e capacidade de procriar, já não esta mais nos conceitos atuais, sendo que na família monoparental, por exemplo, estas características não se encaixam e nem por isso esta modalidade de família deixa de ser amparada como deve pelo Direito.


Se a capacidade reprodutiva não é essencial para que duas pessoas mereçam amparo legal, não tem como se justificar o desabrigo do conceito de família para a convivência entre as pessoas de mesmo sexo.


Hoje em dia o objetivo central de uma família é o affectio maritalis [15], ou seja, a mútua assistência de afeto entre as duas pessoas, o que é perfeitamente possível encontrar entre as duplas homossexuais, que estão de forma errada  excluídas do amparo Constitucional.  


O afeto está perfeitamente incluído no exercício do direito a intimidade elencado no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal, sendo que é deste afeto que se formam as relações homossexuais, dessa forma evidenciamos que não pode ser negado o direito de pessoas que possuam afeto e  todas as características inerentes a uma família se serem reconhecidas passando a serem de fato jurídicas, assim como não é negado as relações dos casais heterossexuais.


5) O direito a União Estável pelos casais homossexuais:


Para o Código Civil de 1916, o único vínculo legítimo e legal para que se pudesse constituir uma família era somente pelo casamento, livre de impedimentos e que todas as formalidades legais estivessem sido cumpridas.


Mas, como tudo que o Direito regula é dado pelos costumes e pela exigência de nossa sociedade, com o advento da nossa Constituição Federal surgiu uma nova visão de família. O bem sucedido artigo 226, da nossa Carta Magna trouxe para nossa sociedade o reconhecimento da família sem a união pelo casamento, sendo que passou a ser aceita a união estável como entidade familiar.


Antes concubinato, agora união estável, que anteriormente à Constituição de 1988, produzia efeitos somente como direito das obrigações, mas que com a mudança passaram a ter caráter de entidade familiar e passaram a ter o privilégio da conversão de sua relação em casamento.


Ao passo que houve uma grande mudança no âmbito do direito de família, por um lado positivo, não podemos deixar de mencionar, sendo este o objeto de nosso trabalho, que o artigo 226, § 3º da nossa Constituição se torna incompleto e discriminatório no momento que prescreve que “para efeito da proteção do estado é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento,” este artigo deixa bem claro que para que esteja a família protegida pelo Estado e garantida a sua entidade é necessário e obrigatório haver a diferenciação de sexos do casal, sendo ignorado mais uma vez pela Lei a existência de muitas entidades familiares formadas por pessoas do mesmo sexo, privando estas de uma série de direitos.


Em contrário a esse entendimento colaciono aqui preciosa lição de Maria Celina Bodin de Moraes, onde a jurista assim se manifesta:


“Se a família, através de adequada interpretação dos dispositivos constitucionais, passa a ser entendida principalmente como ‘instrumento’, não há como se recusar tutela a outras formas de vínculos afetivos que, embora não previstos expressamente pelo legislador constituinte, se encontram identificados com a mesma ratio, como os mesmo fundamentos e com a mesma função. Mais do que isto: a admissibilidade de outras formas de entidades ‘familiares’ torna-se obrigatória quando se considera seja a proibição de qualquer outra forma de discriminação entre as pessoas, especialmente aquela decorrente de sua orientação sexual – a qual se configura como direito personalíssimo –, seja a razão maior de que o legislador constituinte se mostrou profundamente compromissado com a dignidade da pessoa humana (art. 1º, II, CF), tutelando-a onde quer que sua personalidade melhor se desenvolva (…) A partir do reconhecimento da existência de pessoas definitivamente homossexuais, ou homossexuais inatas, e do fato de que tal orientação ou tendência não configura doença de qualquer espécie – a ser, portanto, curada e destinada a desaparecer –, mas uma manifestação particular do ser humano, e considerado, ainda, o valor jurídico do princípio fundamental da dignidade da pessoa, ao qual está definitivamente vinculado todo o ordenamento jurídico, e da conseqüente vedação à discriminação em virtude da orientação sexual, parece que as relações entre pessoas do mesmo sexo devem merecer status semelhante às demais comunidade de afeto, podendo gerar vínculo de natureza familiar. Para tanto, dá-se como certo o fato de que a concepção sócio-jurídica de família mudou. E mudou seja do ponto de vista dos seus objetivos, não mais exclusivamente de procriação, como outrora, seja do ponto de vista da proteção que lhe é atribuída. Atualmente, como se procurou demonstrar, a tutela jurídica não é mais concedida à instituição em si mesma, como portadora de um interesse superior ou supra-individual, mas à família como um grupo social, como o ambiente no qual seus membros possam, individualmente, melhor se desenvolver (CF, art. 226, §8º)”[16].


A mesma Carta Magna trás em seu artigo 5º, o princípio da igualdade, art. 226, § 3º, que busca vedar a discriminação de pessoas por razão de sua opção sexual, o que não ocorre no artigo elencado acima que simplesmente ignora esta modalidade de entidade familiar, como ignorou por anos a união estável. 


Não podemos dizer que existe uma justificativa para a imposição de diferença de sexos para que ocorra a união estável, pois passando duas pessoas a ter um vínculo afetivo duradouro, que seja público e contínuo formam uma célula familiar, independente da escolha sexual que tenham feito.


Dessa forma não há como se negar o caráter de instituição familiar aos relacionamentos homossexuais, pois independentemente de sua escolha sexual, estas pessoas são primeiramente cidadãos amparados pela Constituição Federal e que não podem ser discriminados no que tange os princípios da isonomia, e o direito à intimidade e à liberdade, sendo usado para suprir a lacuna da lei a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito.


Atualmente é a jurisprudência que funciona como garantidora destes direitos, sobre o reconhecimento da união homoafetiva, nos brinda a Desembargadora Maria Berenice Dias:


“APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO HOMOAFETIVA. RECONHECIMENTO. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA IGUALDADE. É de ser reconhecida judicialmente a união homoafetiva mantida entre dois homens de forma pública e ininterrupta pelo período de nove anos. A homossexualidade é um fato social que se perpetuou através dos séculos, não podendo o judiciário se olvidar de prestar a tutela jurisdicional a uniões que, enlaçadas pelo afeto, assumem feição de família. A união pelo amor é que caracteriza a entidade familiar e não apenas a diversidade de gêneros. E, antes disso, é o afeto a mais pura exteriorização do ser e do viver, de forma que a marginalização das relações mantidas entre pessoas do mesmo sexo constitui forma de privação do direito à vida, bem como viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade. AUSÊNCIA DE REGRAMENTO ESPECÍFICO. UTILIZAÇÃO DE ANALOGIA E DOS PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO. A ausência de lei específica sobre o tema não implica ausência de direito, pois existem mecanismos para suprir as lacunas legais, aplicando-se aos casos concretos a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito, em consonância com os preceitos constitucionais (art. 4º da LICC). Negado provimento ao apelo, vencido o Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves. [17]” (grifos nossos).


Como podemos perceber aquela opinião retrógrada de que somente homem e mulher podiam formar uma família é centrada em princípios morais e religiosos, mas que com a evolução da sociedade têm feito com que vários juristas repensem a situação, em 2000 o nosso Tribunal de Justiça deu um importante passo em direção a evolução das relações homoafetivas, reconhecendo a existência a união estável no relacionamento de homossexuais na Apelação Civil de nº.: 598362655, julgada pela Oitava Câmara Cível, tendo como relator: o Desembargador José Ataídes Siqueira Trindade, como citamos no inicio do trabalho.


É claro que estas decisões ainda são uma exceção, ao passo que são muito fortes as correntes que sustentam o contrário, ou seja, pelo não reconhecimento da união estável, como exemplo, podemos citar a decisão julgada pela Quarta turma do Superior Tribunal de Justiça onde foi negada a união estável aos homossexuais:


“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE DE FATO. HOMOSSEXUAIS. HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO. COMPETÊNCIA. VARA CÍVEL. EXISTÊNCIA DE FILHO DE UMA DAS PARTES. GUARDA E RESPONSABILIDADE. IRRELEVÂNCIA. A primeira condição que se impõe à existência da união estável é a dualidade de sexos. A união entre homossexuais juridicamente não existe nem pelo casamento, nem pela união estável, mas pode configurar sociedade de fato, cuja dissolução assume contornos econômicos, resultantes da divisão do patrimônio comum, com incidência do Direito das Obrigações.”[18](grifos nossos)


Com relação a dualidade de sexos, que está mais que ultrapassada fazendo com que seres humanos sejam discriminados todos os dias, achamos pertinente citar  o pensamento da Desembargadora Maria Berenice Dias:


“A Lei Maior, rastreando os fatos da vida, viu a necessidade de reconhecer a existência de relações afetivas fora do casamento, mas se restringiu a emprestar juridicidade à relação entre um homem e uma mulher. Melhor que não tivesse previsto essa limitação, pois o afeto, por mais que não se queira ver, não tem como pressuposto a diversidade de sexos”.[19]


Como é gritante em nossa sociedade a situação dos homossexuais, é necessário que o ordenamento jurídico retire a venda que lhe impede de ver a realidade social vigente, pois de nada irá adiantar continuar negando a legitimação destas entidades familiares às pessoas do mesmo sexo se são inúmeras as famílias nesta situação, certas estão as inovadoras decisões que vêm garantindo os direitos humanos básicos a este grupo social.


6) Direito à adoção por casais homossexuais:


A questão da adoção pelos homossexuais tem desprendido muita polêmica. As premissas giram entorno principalmente das conseqüências para a personalidade da criança, qual será a posição a ser tomada pela criança com relação ao masculino e ao feminino.


Mas, o fato é que não existe ainda um estudo concreto que diga ser negativa a estruturação da personalidade da criança dentro desta modalidade de família. Importante é mencionar que uma criança deve ser criada em um ambiente estruturado, com amor e carinho, muitas vezes o que um lar de heterossexuais não tem a oferecer.


Ao contrário do que muitos pensam, estudos estão sendo realizados com o objetivo de ver o progresso das famílias homossexuais e das crianças por estas adotadas, sobre o assunto na Universidade de Valência (ESP), o estudo de Navarro, Llobell e Bort[20] aponta na mesma direção:


“Los resultados ofrecen de forma unánime datos que son coherentes com el postulado de la parentalidad como un proceso bidireccional padres-hijos que no está relacionado com la orientación sexual de los padres. Educar y criar a los hijos de forma saludable lo realizan de forma semejante los padres homosexuales y los padres heterosexuales.”


A adoção pelo Estatuto da Criança e do Adolescente não tem mais a finalidade de dar filhos a quem não pode tê-los, mas sim de dar uma família à criança, sendo visto a melhor estrutura para receber a criança e não faz menção à opção sexual do adotante.


A adoção visa amenizar a paternidade irresponsável e o abandono do menor, a adoção somente pode ser autorizada quando o menor não puder depender dos pais biológicos ou por ausência ou destituição do pátrio poder, ou ainda se os pais biológicos concordarem com o pedido de adoção de forma expressa.


Ainda com relação à adoção as partes que irão adotar devem estar plenamente preparadas para a inserção da criança na família, pois, geralmente esta vem de um lar com problemas sociais, econômicos, desta forma é notável que seja tomado alguns cuidados na formalidade da adoção para que não ocorra uma nova rejeição com relação a criança. 


A lei não faz qualquer distinção em razão de sexo com relação a adoção, tendo em vista a vedação constitucional da discriminação em razão do sexo, ou seja, discriminação por opção sexual, sendo que nada dispõe com relação aos homossexuais e a sua formação familiar.


 A Desembargadora Maria Berenice Dias defende o direito à adoção pelos casais homossexuais, salientando que este direito encontra guarida na esfera constitucional, uma vez que “o artigo 227 da Constituição Federal, atribui ao Estado o dever de assegurar à criança, além de outros, o direito à dignidade, ao respeito e à liberdade, o que certamente não encontra na rua, e sim em uma convivência familiar, independentemente da orientação sexual de seus membros.” [21]


Ainda em defesa da adoção por homossexuais o autor Marcos Rolim afirma: [22]


“Temos, no Brasil, cerca de 200 mil crianças institucionalizadas em abrigos e orfanatos. A esmagadora maioria delas permanecerá nesses espaços de mortificação e desamor até completarem 18 anos porque estão fora da faixa de adoção provável. Tudo o que essas crianças esperam e sonham é o direito de terem uma família no interior das quais sejam amadas e respeitadas. Graças ao preconceito e a tudo aquilo que ele oferece de violência e intolerância, entretanto, essas crianças não poderão, em regra, ser adotadas por casais homossexuais. Alguém poderia me dizer por quê? Será possível que a estupidez histórica construída escrupulosamente por séculos de moral lusitana seja forte o suficiente para dizer: – “Sim, é preferível que essas crianças não tenham qualquer família a serem adotadas por casais homossexuais” ? Ora, tenham a santa paciência. O que todas as crianças precisam é cuidado, carinho e amor. Aquelas que foram abandonadas foram espancadas, negligenciadas e/ou abusadas sexualmente por suas famílias biológicas. Por óbvio, aqueles que as maltrataram por surras e suplícios que ultrapassam a imaginação dos torturadores; que as deixaram sem terem o que comer ou o que beber, amarradas tantas vezes ao pé da cama; que as obrigaram a manter relações sexuais ou atos libidinosos eram heterossexuais, não é mesmo? Dois neurônios seriam, então, suficientes para concluir que a orientação sexual dos pais não informa nada de relevante quando o assunto é cuidado e amor para com as crianças.”


Como podemos notar não há nada de proveitoso para a sociedade em se negar o direito de adoção aos casais homossexuais e também o direito das crianças abandonadas terem ao seu lado pessoas que ofereçam tudo o que elas necessitam e que não tem qualquer relação com a opção sexual dos adotantes.


Existem aqueles autores que se posicionam de forma contrária a adoção por casais homossexuais, entre eles citamos o autor Arnaldo Marmitt, que determinou em seu livro Adoção, um capítulo especificado Adoção por pessoas contra-indicadas, onde diz que “se de um lado não há impedimento contra o impotente, não vale o mesmo quanto aos travestis, aos homossexuais, às lésbicas, às sádicas, etc., sem condições morais suficientes. A inconveniência e a proibição condiz mais com o aspecto moral, natural e educativo”.[23]


Observa-se que entre o vasto campo de posições, existem aquelas pessoas que apóiam a adoção dentro desta nova célula familiar, existem também aqueles que condenam esta entidade familiar e que utilizam argumentos refutáveis e sem comprovação científica confirmada, como a ocorrência de falta de moral, ou a ocorrência de seqüelas psíquicas para a criança ou também a estranha posição dos nomes dos pais na certidão do adotado.


As teses contrárias não devem e nem merecem prosperar, sendo que no primeiro argumento, citado no parágrafo anterior, não existe nada comprovado que demonstre que esta modalidade de família traria problemas para a criança quanto a este tipo de adoção, já no segundo caso o próprio instituto da adoção consagra-se pelo caráter de fictio juris, assim se é possível pela ficção legal criar como filho alguém desconhecido é possível admitir-se por completa ficção jurídica a possibilidade de adoção por casais homossexuais a assim garantir plenamente o direito à adoção.


7) Direito a sucessão entre os casais homossexuais:


O vocábulo sucessão significa substituição, descendência, qualidade transmitida aos descendentes.  No sentido jurídico sucessão é a transmissão de direitos e obrigações operada mortis causa.


A autora Thaysa Halima Sauáia Ribeiro define sucessão como: “A sucessão é a transmissão de bens e direitos do morto a seus herdeiros que é aberta no momento da morte do autor da herança, transmitindo-se a propriedade e a posse dos bens que ele deixou para os herdeiros[24]”.


Mas não é o que ocorre no caso dos homossexuais quando morre um dos parceiros, vê-se o sobrevivente obrigado a recorrer a justiça para ver reconhecidos os seus direitos. Entretanto, já existem decisões a favor do parceiro sobrevivente, mas algumas Cortes de justiça negam o seu convívio com o parceiro e negam também o direito a um patrimônio que o sobrevivente ajudou igualmente a adquirir.


Com relação ao direito de suceder do companheiro homossexual a Desembargadora Maria Berenice Dias comente: 


“Tais soluções, cabe repetir, geram um descabido beneficiamento dos familiares distantes, que, normalmente, rejeitavam, rechaçavam e ridicularizavam a orientação sexual do de cujus. De um outro lado, na ausência de parentes, a solução leva a um resultado ainda mais injusto. A herança é recolhida ao Estado pela declaração de vacância, em detrimento de quem deveria ser reconhecido titular dos direitos hereditários.”[25]


A justiça gaúcha deu as primeiras decisões que integraram o parceiro na ordem hereditária de seu companheiro e junto com a jurisprudência continuam a evoluir nas decisões, como exemplo citamos a seguinte jurisprudência:


“UNIÃO HOMOAFETIVA. POSSIBILIDADE JURÍDICA. Observância dos princípios da igualdade e dignidade da pessoa humana. Pela dissolução da união havida, caberá a cada convivente a meação dos bens onerosamente amealhados durante a convivência. Falecendo a companheira sem deixar ascendentes ou descendentes caberá à sobrevivente a totalidade da herança. Aplicação analógica das leis nº 8.871/94 e 9.278/96. POR MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO, VENCIDO O REVISOR.”[26].(grifos nossos)


Como podemos analisar cabe ao companheiro homossexual os mesmos direitos de um companheiro sobrevivente de uma relação heterossexual, cabendo aquele a sua parte na herança do companheiro falecido.


Assim, evidencia-se que a ausência de previsão legal não está prejudicando o julgamento com sabedoria das matérias relacionadas com a partilha de bens e o direito a sucessão pelo companheiro homossexual, hoje é sabiamente decidido conforme o caso em questão e os julgadores já conseguem dar passos avançados com relação à justiça no caso concreto não ocorrendo hoje tantas discriminações como a tempos atrás.


É necessário que se reconheça o direito sucessório do parceiro que contribuiu para a formação do patrimônio,pois, ao contrário ocorreria o enriquecimento ilícito de pessoas alheias aquela relação familiar, cabendo ao judiciário integrar o Direito a realidade social, através das mais inovadoras jurisprudências, sempre fundamentando suas decisões nos princípios gerais do direito, nos costumes e na analogia garantindo o amparo deste direito.


Interessante aqui citar o pensamento de Rui Portanova, ao julgar em grau de apelação a questão do reconhecimento da união homossexual e consequentemente os direitos a ela inerente, entre eles o patrimonial:


“A decisão de tutelar o direito do homossexual e as relações que daí advém cabe ao aplicador da lei com base no ordenamento jurídico que está a sua disposição. Só existem, assim, dois caminhos: ou se reconhece o direito às relações homoafetivas e lhes imprime proteção e às relações jurídicas decorrentes, ou se segrega, se marginaliza. Não existe meio termo ou outorgue proteção parcial. A primeira hipótese coaduna-se com a tolerância que deve permear as relações sociais. A segunda, traz o preconceito, o sectarismo, o apartheid pela opção sexual. Implica em reconhecer como menor uma relação entre duas pessoas de mesmo sexo, sob o paradigma das relações heterossexuais. Ainda que corrente seja a heterossexualidade, o paradigma é outro: é o do gênero humano. Pouco importa se hetero ou homoafetiva é a relação. Importa que seja a troca ou o compartilhamento de afeto, de sentimento, de carinho e de ternura entre duas pessoas humanas. Importa que siga os elementos da união estável, mas que seus sujeitos sejam não somente o homem e a mulher, como também o homem e o homem e a mulher e a mulher. Negar-lhes esse direito é desprezar sua natureza humana e limitar a pessoa que são.  Portanto, no caso, aplica-se o instituto da união estável e seus efeitos, notadamente os patrimoniais.”[27]


Ao reconhecer o direito à herança ao companheiro vivo, a justiça esta sendo realizada dando a este o que é seu por direito não deixando que aconteça a marginalização do ser humano pela sua opção sexual, o que é necessário entender é que a união de casais homossexuais segue exatamente os moldes de qualquer união familiar descabendo a discussão de um ou outro direito.


Conclusão:


Qualquer pessoa inserida dentro do Estado Democrático de Direito tem que ter seu direito a liberdade respeitado, não podendo ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. Neste sentido podemos concluir que não há razão para não se tratar com dignidade os homossexuais e reconhecer a sua entidade familiar e seus direitos inerentes.


O principio da igualdade, muitas vezes, simplesmente não tem valor com relação a este assunto, pois não se reconhece os direitos das relações homoafetivas pelo fato da família destes ser diferente da conduta social convencional. Como podemos evidenciar as relações homoafetivas são continuas, duradouras e públicas não tendo assim argumento plausível para não ser dado os direitos inerentes a qualquer casal, como por exemplo, o direito à adoção e a sucessão.


Embora com medo, principalmente de grupos preconceituosos e conservadores, o legislador mais cedo ou mais tarde não poderá mais se esquivar do seu dever de regular os relacionamentos homoafetivos e os direitos que sucedem dele, pois os julgados através da jurisprudência vem a passos largos regulando e proporcionando os direitos fundamentais do ser humano aos casais homossexuais.


Dessa forma, tímida e sem previsão legal, é a jurisprudência que tem garantido através da analogia, costumes e princípios gerais do direito, a garantia dos direitos deste grupo social, para que seja suprida esta lacuna em nossa legislação e se acabe com as discriminações e a marginalização em razão de uma simples opção sexual. 


 


Bibliografia:

 HERKENHOFF, João Baptista. Gênese dos direitos humanos. 1ª ed., São Paulo: Editora Acadêmica, 1994.

Apelação Cível Nº 70006542377, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 11/09/2003.

Apelação Cível Nº 70006844153, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Catarina Rita Krieger Martins, Julgado em 18/12/2003.

Apelação Cível Nº 70001388982, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 14/03/2001.

Apelação Cível Nº 70013801592, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 05/04/2006.

Apelação Cível Nº 70001388982, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 14/03/2001.

Apelação Cível Nº 598362655, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 01/03/2000.

CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A união homoafetiva sob o enfoque dos direitos humanos . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 235, 28 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4902>. Acesso em: 01 out. 2006.

DIAS, Maria Berenice. União Homossexual: Preconceito e Justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2001.

DIAS, Maria Berenice. Efeitos Patrimoniais das Relações de Afeto. Revista Jurisplenum, CD, v. 1-36, 1998.

DIAS, Maria Berenice. União Homossexual aspectos sociais e jurídicos. In Revista de Direito de Família, nº 4, jan. 2000.

MARMITT, Arnaldo. Adoção. Rio de Janeiro: Aide, 1993.

RIBEIRO, Thaysa Halima Sauáia. Adoção e sucessão nas células familiares homossexuais. Equiparação à união estável. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3790>. Acesso em: 26 set. 2006.

ROLIM, Marcos. Casais homossexuais e adoção. Disponível em:  http://www.rolim.com.br/cronic162.htm. Acesso em: 30 set. 06.

A união entre pessoas do mesmo sexo: uma análise sob a perspectiva civil-constitucional. In  RTDC. v. 1.p. 89/112.

 

Notas:

[1] Bobbio, Norberto. A Era dos Direitos, trad. Carlos Nelson Coutinho, Rio de Janeiro. RJ: Campus, 1992.

[2] HERKENHOFF, João Baptista. Gênese dos Direitos Humanos, págs.30 e 31. 

[3] Bobbio, Norberto. A Era dos Direitos, trad. Carlos Nelson Coutinho, Rio de Janeiro. RJ: Campus, 1992.

[4] CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A união homoafetiva sob o enfoque dos direitos humanos . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 235, 28 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4902>. Acesso em: 01 out. 2006.

[5]  CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A união homoafetiva sob o enfoque dos direitos humanos . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 235, 28 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4902>. Acesso em: 01 out. 2006.

[6] Apelação Cível Nº 70001388982, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 14/03/2001

[7]Neologismo criado pela Desembargadora  Maria Berenice Dias, em seu livro União Homossexual: o preconceito e a justiça.

[8]Apelação Cível Nº 598362655, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 01/03/2000.

[9]Direitos Humanos: uma idéia,muitas vozes, pág. 108.

[10]  LEITE SAMPAIO, José Adércio. Direito à intimidade e à vida privada: uma visão da sexualidade, da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da morte. 1ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 1998;  Pág. 277.

[11] CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A união homoafetiva sob o enfoque dos direitos humanos . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 235, 28 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4902>. Acesso em: 01 out. 2006.

[12]Apelação Cível Nº 70013801592, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 05/04/2006.

[13] ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Trad. por Leandro Konder. Rio de Janeiro: SED, 1981, p. 39.

[14] GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. São Paulo: Rideel, 1995, p.320.

[15] Assistência afetiva.

[16] A união entre pessoas do mesmo sexo: uma análise sob a perspectiva civil-constitucional. In  RTDC. v. 1.p. 89/112.

[17] Apelação Cível Nº 70009550070, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 17/11/2004.

[18] RESP 502995 / RN ; RECURSO ESPECIAL 2002/0174503-5, relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em: 26/04/2005.

[19] DIAS, Maria Berenice. Efeitos Patrimoniais das Relações de Afeto. Revista Jurisplenum, CD, v. 1-36, 1998.

[20] EM TRADUÇÃO LIVRE: Os resultados oferecem de forma unânime dados que são coerentes com o postulado da parentalidade como um processo bidirecional que não está relacionado com a orientação sexual dos pais. Educar e criar os filhos de forma saudável o realizam semelhantemente os pais homossexuais e os heterossexuais.

Frias Navarro, Pascual Llobell e Monterde Bort. Hijos de padres homosexuales: qué les diferencia.  Texto cedido, em meio eletrônico, pela Dra. Elizabeth Zambrano, in acórdão da Apelação Cível Nº 70013801592, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 05/04/2006. 

[21] DIAS, Maria Berenice. Efeitos Patrimoniais das Relações de Afeto. Revista Jurisplenum, CD, v. 1-36, 1998.

[22] ROLIM, Marcos. Casais homossexuais e adoção. Disponível em:  http://www.rolim.com.br/cronic162.htm. Acesso em: 30 set. 06.

[23] MARMITT, Arnaldo. Adoção. Rio de Janeiro: Aide, 1993, p. 112/113.

[24] RIBEIRO, Thaysa Halima Sauáia. Adoção e sucessão nas células familiares homossexuais. Equiparação à união estável. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3790>. Acesso em: 06 out. 2006.

[25] DIAS, Maria Berenice. União Homossexual: Preconceito e Justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2001, p.19/20.

[26] Apelação Cível Nº 70006844153, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Catarina Rita Krieger Martins, Julgado em 18/12/2003.

[27] Apelação Cível Nº 70006542377, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 11/09/2003, pág. 19 a 20.


Informações Sobre o Autor

Carina Deolinda da Silva Lopes

Advogada em Santa Maria (RS), Mestre em Direito pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões de Santo Ângelo/RS. Pós-graduada em Direito Constitucional pela Universidade do Sul de Santa Catarina; Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Luterana do Brasil campus Santa Maria/RS.


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