Justiça Restaurativa: um novo foco sobre a Justiça!

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 “Justiça Restaurativa: Um Novo Foco Sobre a Justiça”. Este é o título da conferência que será proferida pelo Professor Howard Zehr, a partir das 9h30 da terça-feira, dia 08 de abril de 2008, no auditório do STJ, como parte de um Ciclo de Conferências que também acontecerão em São Paulo, Florianópolis e Porto Alegre. Dos não iniciados no tema pode-se esperar a pergunta: o que é Justiça Restaurativa? O que há de novo nessa proposta? É possível atribuir adjetivos à justiça, um valor universal e atemporal? Que visão se pode ter dos conflitos e da justiça a partir dessa perspectiva? Qual o significado mais profundo da proposta?

Para a dogmática jurídica, crime é o fato típico e antijurídico, vale dizer, o fato humano que se enquadra numa tipologia legal e que constitui, na sua substância, violação de um bem juridicamente tutelado. Para a consideração da Justiça Restaurativa, crime é, também, a violação das relações humanas que provoca danos. O fato é o mesmo, mas visto de um ponto de vista diferente. Enquanto para a justiça retributiva a atenção está voltada para a integridade da ordem jurídica, para a justiça restaurativa a atenção está voltada para a relação entre as pessoas.

O cenário da realização da justiça preserva os papéis simbólicos dos agentes do Estado na afirmação da ordem jurídica e a participação dos envolvidos é voltada para a revelação da verdade, uma verdade que se quer aproximar da realidade. O fato revelado é considerado em face da ordem jurídica, e não se achando conforme com ela o seu autor é punido com pena proporcional à ofensa e à conduta. Com isso se previnem novos fatos do mesmo autor, que terá aprendido com a punição ou terá sido compulsoriamente recluso, e de outros autores, que temerão incorrer no mesmo castigo.

Um direito penal assim racionalizado se fez resposta pronta numa quadra histórica revolucionária em que as penas de suplício, então aplicadas, se destinavam a purgar a alma dos pecadores, tidos que eram crime e pecado como um só fato visto de pontos de vista diversos. A questão que se levanta hoje é saber se subsistem os pressupostos de eficácia desse modelo num estádio em que se conquistou o direito à igualdade e à diferença, em que o exercício da liberdade exige responsabilidade como correspondente numa linha de contínuo, e em que a fraternidade ganha significado na solidariedade. De outro lado, é saber de que maneira os novos saberes das ciências humanas podem colaborar para apaziguar a crescente violência que aflige os povos, por diversos que sejam econômica, social e culturalmente.

A justiça restaurativa tem nas suas raízes algo de comum com as principais religiões e com a cultura de povos isoladas – caso dos Maoris neozelandeses e aborígenes australianos. Tal fato parece indicar que esta é uma perspectiva pela qual se pode ver o crime e a justiça como fenômenos essencialmente humanos, próprio mesmo da interação social, para cuja resposta se deve considerar a condição humana. Daí o paradigma do encontro – denominado ciclo restaurativo, ou encontro restaurativo –, em que as condutas não são cotejadas apenas com o valor da lei abstrata, mas também com os seus efeitos concretos na vida dos envolvidos primários e secundários.

O encontro restaurativo recapitula tecnologias sociais postas em prática no último século e traz para a resolução de conflitos intersubjetivos o poder mágico da palavra, já confirmado nos conflitos subjetivos em outros saberes, como é caso das terapias diversas. Realizado sem os ritos cerimoniais das cortes, na ausência das autoridades representativas do sistema de justiça estatal e sob a coordenação de pessoa capacitada e em ambiente seguro, preservada a confidência, o encontro restaurativo ou ciclo restaurativo têm o poder de desmistificar pessoas e motivações e de estimular a resolução dos efeitos danosos do crime, para vítimas e autores.

As ciências criminais em geral e a criminologia em especial têm identificado fatores criminógenos diversos para explicar o crime e a violência como fenômenos complexos que são. A justiça restaurativa não despreza a verdade de que, dentre os perfis criminógenos, alguns agentes não mobilizam nenhuma empatia ao conhecer o mal resultante da conduta desviante. A esses perfis, de criminalidade racional, para cuja realização o agente realiza cálculo meramente econômico, aferindo a probabilidade de ser responsabilizado, o quanto perderá se o for e o quanto ganhará se não o for, deve ser reservada uma resposta eficaz e dura, que aumente a probabilidade de responsabilização e diminua a taxa de ganhos. Para aquele outro espectro dos que se vêem emaranhados em conflitos de que não conseguem sair pelas próprias forças, por mais graves tenham sido os efeitos danosos da conduta, a justiça restaurativa parece ser a mais apropriada modalidade de realização de justiça. O acordo restaurativo, ou plano de reparação, quando cuidadosa e adequadamente construído, parece despertar algum sentimento de pertença que leva ao seu cumprimento, e esse plano, freqüentemente, reúne maior potencialmente de responsabilização e de reparação do que o castigo imposto.

A instituição de semelhante sistema, no Brasil, implica a ampliação do espaço de consenso do direito penal, hoje restrito aos casos sujeitos à jurisdição dos juizados especiais criminais, a alguns casos em que cabe a suspensão condicional do processo e aos crimes sujeitos à jurisdição da infância e juventude. Mais difundido nos países que adotam o modelo do common low, onde se registram as mais bem sucedidas experiências de Justiça Restaurativa, a ampliação do espaço de consenso não traduz nem mais nem menos justiça, mas sim, mais cidadania e mais cidadania ativa, na medida em que devolve aos titulares do conflito parte do poder de resolução que historicamente tiveram.

O movimento restaurativo que ganha o mundo não prescinde de alteração legislativa, já se podendo verificar alguns países que instituíram leis regulamentando o procedimento como direito das partes. É o caso de Portugal, com a Lei nº 27/2007, de 12/06/2007, da Colômbia, com a sua inserção no art. 250, da Constituição e no art. 518 e seguintes, do novo Código de Processo Penal, e da Nova Zelândia, que desde 1989 tem lei regulamentando a prática. A ONU, pela edição da Resolução 2002/12, do seu Conselho Econômico e Social (Ecosoc), estimula os países membros a adotarem programa de justiça restaurativa. No Brasil, o PL 7006 de 2005, de autoria do Instituto de Direito Internacional e Comparado de Brasília – IDCB, que está em tramitação no Congresso Nacional e passou pela Comissão de Legislação Participativa, propõe algumas mudanças pontuais na legislação penal para permitir a prática.

Não se apresenta a justiça restaurativa como a panacéia para os dramas da condição humana. E se melhor não fizer pela crise de violência e segurança do que tem feito o movimento de lei e ordem, pior não haverá de fazer pelos efeitos da violência e da criminalidade do que o modelo retributivo simples, cujas promessas, embora não cumpridas, são recorrentes no endurecimento das penas, sempre que um novo episódio ganha as manchetes de jornais e desperta a sanha da vingança pública, sugerindo que a melhor pedagogia é sempre o castigo mais severo.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Asiel Henrique de Sousa

 

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

 


 

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