Código do Consumidor: Imunidade bancária

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O juiz Carlos Alberto Etcheverry, de Porto Alegre, publica escrito no site “Consultor Jurídico”, comentando a pretensão do sistema bancário de fugir à aplicação do Código do Consumidor. Tem a crônica jurídica  dependência da argüição de inconstitucionalidade do artigo 3.º, par. 2.º, da legislação referida, aparecendo como autora a Confederação Nacional do Sistema Financeiro. O magistrado Etcheverry transcreve trecho atribuído à Confederação. Esta critica decisões judiciais limitativas da taxa de juros bancários: “Nenhum investidor estrangeiro ou brasileiro manterá recursos nos bancos brasileiros e, à falta deles, não haverá recursos para financiamentos, para desenvolvimento das empresas, para qualquer operação, a não ser que o Governo emita para cobrir os recursos retirados por falta de política monetária”.

A argüição de inconstitucionalidade tem, como representante “ad processum” da autora, cultíssimo advogado que, além de qualidades outras, traz comportamento ético exemplar. Não se lhe critique, pois, a aceitação da causa. O Supremo Tribunal Federal dirá se há ou não razão no petitório. Já aconteceu, há alguns anos atrás, de advogado diferenciado aceitar a propositura de uma ADIN, em nome da Associação dos Magistrados Brasileiros, visando a inconstitucionalidade de dispositivo previsto no Estatuto da Advocacia. Nem por isso o distinto colega foi escarmentado. O Supremo lhe deu razão. E quando o Supremo diz que as coisas são, elas são. É quanto basta! Mas, evidentemente, o povo tem o direito a  inconformismo, porque, de um lado, o sangramento é hemorrágico e tem origem nas algibeiras do cidadão. De outra parte, as instituições bancárias, destacando-se uma ou outra a liderar o grupo faraônico, alardeiam lucros extravagantes. Gera-se  tremenda contradição: o chefe de família vê aquilo e se revolta com a miséria própria e com o  enriquecimento dos senhores da caravana financeira. O brasileiro não quer saber das explicações do bilíngüe  presidente do Banco Central do Brasil. Aliás, nem entende a sutileza das observações. Sabe, entretanto, que se o agiota da esquina fizer o mesmo vai para o cárcere, se não tiver proteção hábil. E lembra das histórias de Ivanhoé, aquelas do tempo em que a gente era menino e ainda acreditava em romance: Ivanhoé precisava de dinheiro para comprar armadura, cavalo, contratar escudeiro e dar brilho à  lança e espada, pois devia  defender a honra da rainha. Pediu ao agiota. O usurário não deu, porque o cavaleiro não tinha garantias e havia saído recentemente de umas feridas sérias provocadas por outro embate. O remédio, já que Ivanhoé tinha jeitão de galã da “Casa dos Artistas”, foi seduzir Rebecca, filha do financista. Esta lhe emprestou as jóias da mãe. E Ivanhoé pôde manter a dignidade da mulher de Arthur. Depois, é claro, precisou contentar Rebecca de alguma forma, mas isso já não é problema nosso.

Insista-se, o cidadão brasileiro só conhece, de finanças, alguns contos de fadas. Não passa pela cabeça de algum deles que os bancos venham a obter imunidade judicial, submetendo-se apenas ao Conselho Monetário Nacional. Independentemente de razões jurídicas (das quais, confesso, ando meio enfastiado), buscar-se no Supremo Tribunal Federal a declaração de que o sistema bancário deve ser excluído da fiscalização jurisdicional é o mesmo que pedir ao pai que exclua do poder paterno o filho impúbere, sob a alegação de disponibilidade. Em outros termos, o pai poderia desvestir-se do pátrio poder. Ora (e vem aqui um raciocínio socrático), se o pai pode dizer que não pode, é porque pode, porque quem não pode sequer pode negar sua ausência de poder. Observe-se: pede-se ao Supremo Tribunal Federal que exclua o sistema financeiro do Código do Consumidor. A jurisdição especializada  não o alcançaria. Não se trataria, aqui, de falta de competência, mas da incapacidade plena, na alternativa, de enfrentamento do mérito…

Obviamente, não se há de tentar transformar as reflexões aqui postas em ponto de doutrina. Seria ridicularizar a dogmática. Eis a citação: “Se o pai pode dizer que não pode, é porque pode, porque quem não pode sequer pode negar sua ausência de poder”. Não ficaria bem. Além de tudo, falta um pouco de latim. Raciocine-se, entretanto, já agora voltando à crítica feita pelo eminente magistrado: Não se pode excluir da apreciação do Poder Judiciário nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direito previstas em lei.  O resto é conversa mole. O usurário de Ivanhoé teve sorte. Negou dinheiro ao cavaleiro empobrecido e não ao nobre da Corte. Iria, na segunda hipótese, às masmorras saxônicas. Trazendo a ficção aos nossos tempos, a solução é mandar à cadeia o banqueiro luxurioso que suga, hoje, a economia do escorchado cidadão. Evidentemente, o banqueiro tem muito medo do juiz da Vara Distrital, respeitada a competência em razão do local, da matéria e eventualmente do “quantum”,  o mesmo juiz que tem os bolsos esvaziados  por  sangrias realizadas pelos juros postos nos cheques especiais. Desse, sim, as instituições bancárias têm pavor, procurando então, em desespero, encontrar justificativa na possível evasão de aplicações dos capitais estrangeiros. Vem bem o Código do Consumidor. Deve assustar o merceeiro, o padeiro, o açougueiro e o banqueiro. Como se vê, tudo termina em “eiro”. Mas seria trágico se fosse esta a única e solitária coincidência entre o dono da cornucópia e o infeliz  agiota apaixonado pelo bezerro de ouro. Todos os infratores à cadeia bexiguenta. É isonômico

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Paulo Sérgio Leite Fernandes

 

Advogado criminalista em São Paulo e presidente, no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, da Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas do Advogado.

 


 

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