Os direitos dos trabalhadores migrantes em situação irregular

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Resumo: O presente artigo analisa a situação jurídica dos trabalhadores migrantes que se encontram de forma irregular no Estado de destino e quais são as possibilidades de evitar a sua discriminação e garantir seus direitos enquanto trabalhador.


Palavras-chave: direitos humanos – migrantes em situação irregular – trabalho.


Abstract: This article examines the legal situation of migrant workers who are illegally in the State of destination and what are their chances of avoiding discrimination and ensuring their rights as workers.


Keywords: human rights – undocumented migrants – work.


Sumário: 1. Introdução.  2. O trabalhador migrante em situação irregular.  3.Referências


1. Introdução


A globalização econômica aproximou os Estados diminuindo as distâncias entre as pessoas que, por muitas das vezes, não mais circunscrevem as suas relações às fronteiras de um único Estado. 


Seja por um ato voluntário, pelas alterações climáticas que impossibilitam a vida em determinada região do planeta ou pela falta de condições de trabalho em seu Estado de origem para garantir a própria subsistência e de sua família, é certo que o fenômeno migratório é cada vez mais usual e acarreta a reflexão sobre vários temas que, até boa parte do século XX, tratava-se de assunto de jurisdição interna dos Estados.


Nesse artigo será analisada a situação jurídica dos trabalhadores migrantes que se encontram de forma irregular e quais são as possibilidades de evitar a sua discriminação e garantir seus direitos enquanto trabalhador.


2. O trabalhador migrante em situação iregular


De acordo com a Convenção Internacional sobre a proteção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias, entende-se por trabalhador migrante “a pessoa que vai exercer, exerce ou exerceu uma atividade uma atividade remunerada num Estado de que não é nacional” (ART.2º CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE TODOS OS TRABALHADORES MIGRANTES E DOS MEMBROS DE SUAS FAMÍLIAS).  Estes geralmente são tratados como mão de obra complementar e lhes são atribuídas tarefas que menos interessam aos nacionais. As discriminações mais usuais a estes trabalhadores são quanto ao tipo de emprego que podem ocupar e quanto ao acesso à formação profissional.


A discriminação se agrava quando o estrangeiro encontra-se de forma irregular no Estado em que exerce suas atividades laborais. O migrante irregular é um alvo para a exploração, vendo-se obrigado, por muitas das vezes, a aceitar todo o tipo de atividade laboral e em locais precários, sem as devidas condições de saúde e higiene, jornadas de trabalho extensas e remuneração bem aquém da devida. Sua condição de trabalho, em alguns casos, assemelha-se à escravatura ou ao trabalho forçado.


No Brasil, a situação jurídica do estrangeiro é regulamentada pela Lei 6.815/80, também conhecida como Estatuto do Estrangeiro. O estatuto foi elaborado antes da transição democrática; assim, vários de seus dispositivos atentam contra a dignidade humana, princípio basilar do Estado Democrático brasileiro, e desrespeitam os direitos humanos. Como bem explana Maritza Natália F. C. Farena (2009):


“Há um nítido contraste substancial e ideológico entre os textos do Estatuto do Estrangeiro e da Constituição, naquele colocando-se em primeiro plano a Segurança Nacional, encarado o imigrante como uma ameaça à coletividade, e nesta consagrando-se a dignidade da pessoa humana e seus direitos fundamentais, assegurando desde o seu Preâmbulo ‘o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos’. Contudo, o Estatuto do Estrangeiro segue incólume, sendo rigorosamente aplicado”.


No que tange aos direitos trabalhistas, o Estatuto do Estrangeiro estabelece uma série de restrições aos migrantes e determina que primeiramente deve-se defender o trabalhador nacional.


Àqueles que aqui estão ao amparo de visto de turista, de trânsito, ou temporário na condição de estudante, bem como aos dependentes de titulares de quaisquer vistos temporários é vedado o exercício de atividade remunerada. Caso descumpram tal determinação serão deportados, ou seja, serão retirados compulsoriamente do território nacional.


O Estatuto do Estrangeiro trata do migrante em situação irregular somente para aplicar-lhe a deportação e proibir a legalização de sua estada (arts. 38 e 57).


Assim, com medo do descobrimento de sua situação irregular, o que ensejará sua deportação, o migrante não procura a defesa de seus direitos e se sujeita às condições precárias de trabalho e renumeração, observando seus direitos humanos e liberdades fundamentais serem infringidos pelo empregador.


 Casos semelhantes acontecem em outros países, uma vez que os Estados restringem cada vez mais a possibilidade de ingresso de forma regular em seus territórios.


A discriminação aos migrantes em situação irregular foi questionada na Corte Interamericana de Direitos Humanos, na Opinião Consultiva nº.18 de 17 de setembro de 2003.


 Com base no princípio da igualdade jurídica, o Estado do México solicitou o parecer da Corte Interamericana de Direitos Humanos quanto à atuação de alguns Estados que, ao interpretar e expedir suas leis, são contrários às determinações do Pacto de São José da Costa Rica e demais declarações de direitos humanos que compõem o sistema interamericano.


Além de questionar a possibilidade de alguns Estados Americanos elaborarem suas leis trabalhistas discriminatórias em relação aos migrantes, o México ainda indagou qual o valor da interpretação feita por esses Estados quando condicionam a proteção e respeito aos direitos humanos àqueles que preencherem os requisitos de sua política migratória.


A Corte Interamericana de Direitos Humanos entendeu que os Estados não podem deixar de garantir direitos trabalhistas e os direitos humanos aos imigrantes ilegais. O imigrante, ao assumir uma relação de trabalho, adquire direitos por ser trabalhador, que devem ser reconhecidos e garantidos independentemente de sua situação regular ou irregular.


O Estado e o particular, como empregadores, podem abster-se de estabelecer uma relação de trabalho com os migrantes em situação irregular. Se os migrantes são contratados, imediatamente se convertem em titulares de direitos trabalhistas, sem que haja possibilidade de discriminação por sua situação irregular.


No entender da Corte, o Estado não pode condicionar o respeito ao princípio da igualdade perante a lei e a não discriminação à concretização dos objetivos de suas políticas públicas e migratórias.


O parecer da Corte veio a consolidar o posicionamento internacional (2009) no qual o migrante em situação irregular deve ser analisado em três dimensões: enquanto infrator das leis de migração, trabalhador e ser humano. Cada uma destas dimensões deve ter suas próprias consequências jurídicas, que não devem confundir em detrimento dos direitos individuais dos trabalhadores.


Este parecer não possui obrigatoriedade jurídica aos Estados, mas os leva à reflexão e à mudança de postura, pois as novas relações jurídicas advindas do aumento do fluxo migratório entre as nações passam a exigir o reconhecimento dos direitos individuais e universais, independente do Estado em que se localiza a pessoa.


Brasil e Bolívia avançaram nesta questão ao afirmarem em La Paz, em 15 de agosto de 2005, um acordo sobre a regularização migratória (Acordo publicado no DOU nº. 179, de 16/09/2005, Seção 1 p. 67). Os nacionais de uma das partes que ingressaram no território da outra parte até 15 de agosto de 2005 e nele permanecem em situação imigratória irregular poderão requerer registro e autorização de permanência.


Os migrantes regularizados pelo acordo gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos às mesmas obrigações de natureza laboral em vigor para os trabalhadores nacionais do Estado receptor e da mesma proteção no que se refere à aplicação das leis relativas à higiene e à segurança do trabalho.


A possibilidade de, por meio da cooperação internacional, os Estados flexibilizarem suas políticas migratórias, permitindo a regularização dos migrantes que estão em seu território de forma ilegal, é um dos primeiros passos para se resolver uma questão que não pode mais ser analisada como um assunto de jurisdição interna dos Estados.


 


Referências bibliográficas:

CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Opinião Consultiva 18/03 Disponível em: <http:/ /www. corteidh.or.cr /docs /opiniones /seriea_ 18_ esp.pdf>  Acesso em 18 de abril de 2009.

CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE A PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE TODOS OS TRABALHADORES MIGRANTES E DOS MEMBROS DAS SUAS FAMÍLIAS. Adotada pela Resolução 45/158, de 18 de dezembro de 1990, da Assembléia Geral da ONU. Entrada em vigor em 01 de julho de 2003. Disponível em: <http://www.december18.net>. Acesso: 18 de abril de 2009.

FARENA, Maritza Natalia Ferretti Cisneros. Algumas notas sobre direitos humanos e migrantes. Revista de Filosofia de Direito Internacional e da política global. Disponível em: <http://www.juragentium.unifi.it/pt/surveys/migrant/ferretti.htm#*>. Acesso em: 24 de abril de 2009

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Os direitos dos trabalhadores migrantes. Disponível em: <http://www.december18.net/UNconventionPortugese.pdf> . Acesso em 18 de abril de 2009


Informações Sobre o Autor

Fernanda Santinelli

Doutora em Direito pela PUC-SP. Professora do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Alfenas – campus Varginha.


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