Servir e proteger

O seqüestro e posterior assassinato do
prefeito Celso Daniel comoveu a todos.  Comigo não foi diferente.
Precisamos, contudo, enxergar o simbolismo do fato. Se a vítima não fosse o
prefeito de Santo André, o impacto não seria o mesmo e o caso teria sido tratado
como mera estatística. Estaríamos vivendo uma semana como qualquer outra. Celso
Daniel seria mais um, assim como foram as outras
vítimas de assassinato naquele mesmo dia por todo o Brasil. A conclusão é:
passamos do limite tolerável há muito tempo.

São Paulo é apenas um exemplo. No
quesito seqüestro este Estado registrou dezenove ocorrências em 1999. Em 2000
os números foram além e atingiram a marca de 63. E no ano de 2001 foram
registrados 307. Mas como disse, São Paulo não é a
única vítima. Porto Alegre tem verificado números cada vez mais alarmantes.
Caminhamos a passos largos para a possibilidade de guerra civil, que segundo
alguns, em caráter informal, já ocorre em algumas
capitais, como o Rio de Janeiro. A situação é tão grave que a capital paulista
possui números de assassinatos para cada 100 mil habitantes maiores do que
Bogotá, na Colômbia.

Os órgãos públicos sugerem soluções,
como em 2000, após o seqüestro do ônibus da linha 174 no Rio. Devido à
gravidade do fato, o governo anunciou o “Plano Nacional de Segurança Pública”.
Hoje, novas medidas são propostas. O problema é que não saímos de “planos” e
“propostas” para a ação. A cada nova tragédia de caráter nacional é a mesma
conversa.

As vítimas, ressalto
novamente, não são somente as que geram repercussão. Elas se acumulam, dia após
dia. Elas não são prefeitos. São pessoas comuns, trabalhadores assalariados,
empresários e outros que possuem famílias que dependem exclusivamente de seu
esforço. Os 17 mil assassinatos ocorridos em São Paulo durante
o ano de 2001 mostram que existem muitas vítimas além daquelas que geram
comoção nacional.

O crime está banalizado porque não
existe certeza de punição. Possuímos, como todos sabem,
leis processuais penais ineficientes, poucos policiais nas ruas, além de
presídios e penitenciárias superlotadas. Se o desrespeito à lei não é punido,
novos infratores aparecerão. Mas, a certeza jurídica da punição, aliada a políticas preventivas e, principalmente, ostensivas e
repressivas é o começo da imposição do respeito à lei, como mostra a
experiência bem sucedida de Nova York. Nos últimos tempos, parece ter ocorrido
uma inversão de valores. O caos no Rio Grande do Sul é um exemplo. Lá, fazendas
são invadidas, a polícia é recriminada pelo secretário de segurança e nada acontece.
Atitudes como estas incentivam aqueles que praticam delitos, pois enxergam na ausência de punição, o terreno propício para
desenvolver a criminalidade.

O Estado brasileiro tem fracassado na
mais importante de suas funções: garantir a vida. Vivemos em um Estado inchado que
opera em setores que transcendem suas reais atribuições. Como resultado desta
intervenção demasiada e equivocada, não resta dinheiro, atenção e mobilização
suficientes nos setores que são a essencial função do Estado, motivo principal
de sua existência: segurança, saúde e educação.

Além de outras iniciativas, deve ser
delineada, em caráter urgente, uma nova política para a polícia, principalmente
no sentido de valorizar seu trabalho, com aumento significativo de salários.
Além disto, deve-se aparelhar sua estrutura, coordenar ações com o Ministério
Público, Polícia Federal e organizar de modo eficiente o sistema de
inteligência. Se não há espaço no orçamento para a reestruturação da polícia,
talvez seja a hora de governo perceber que atua em frentes equivocadas e prover
a segurança é sua função primordial. Se realmente foi declarada guerra ao
crime, como frisaram as autoridades, é hora de agir. Menos retórica e mais
ação. O povo não deseja somente o “belo” discurso de respeito aos direitos humanos, sem dúvida, necessário. O povo demanda e o Estado,
primordialmente, deve prover segurança e tranqüilidade – “servir e proteger”. A
sociedade não pode mais viver sob o regime do medo.


Informações Sobre o Autor

Márcio C. Coimbra

advogado, sócio da Governale – Políticas Públicas e Relações Institucionais (www.governale.com.br). Habilitado em Direito Mercantil pela Unisinos. Professor de Direito Constitucional e Internacional do UniCEUB – Centro Universitário de Brasília. PIL pela Harvard Law School. MBA em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas. Especialista em Direito Internacional pela UFRGS. Mestrando em Relações Internacionais pela UnB.
Vice-Presidente do Conil-Conselho Nacional dos Institutos Liberais pelo Distrito Federal. Sócio do IEE – Instituto de Estudos Empresariais. É editor do site Parlata (www.parlata.com.br) articulista semanal do site www.diegocasagrande.com.br e www.direito.com.br. Tem artigos e entrevistas publicadas em diversos sites nacionais e estrangeiros (www.urgente24.tv) e jornais brasileiros como Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil, Zero Hora, Jornal de Brasília, Correio Braziliense, O Estado do Maranhão, Diário Catarinense, Gazeta do Paraná, O Tempo (MG), Hoje em Dia, Jornal do Tocantins, Correio da Paraíba e A Gazeta do Acre. É autor do livro “A Recuperação da Empresa: Regimes Jurídicos brasileiro e norte-americano”, Ed. Síntese – IOB Thomson (www.sintese.com).


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