Análise da crítica de Karl Deutsch à Teoria da Dependência: Elementos para a reafirmação do Princípio da Igualdade, da Fraternidade e da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento

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Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar o ponto de vista crítico de Karl Wolfgang Deutsch à teoria da dependência, que em contraponto, propôs a tese da interdependência.  Inicialmente, identifica-se a origem e o desenvolvimento das idéias do dependentismo no quadro da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, verificando a seguir o entendimento de Karl Deutsch descrito em sua obra intitulada Análise das Relações Internacionais. Finalmente, são apresentadas as conclusões onde se defende nas relações internacionais o respeito e observação prática do princípio da igualdade que por sua vez depende da fraternidade e da cooperação internacional para o desenvolvimento.


Palavras-chave: Relações internacionais. Teoria da dependência. Estados centrais e periféricos.


Abstract: The objective of the paper is to analyse the critical point of view presented by Karl Wolfgang Deutsch regarding the dependency theory, which in opposition proposed the interdependency theory. In this way, one identifies the origem and development of the ideas of dependency in Economic Comision for Latin American and Caribe (ECLAC), which are then confronted with Karl Deutsch’s understanding of dependency in this work entitled “International Relations” where he questions: “interdependency, dependency and encreasing equalization: to where the world is moving?”.


Keywords: International relations. Dependence Theory. Central and periferic state.


INTRODUÇÃO


No mundo ocidental, o pensamento tradicionalmente construído impõe uma relativa inércia científica que se caracteriza na aceitação “por adesão” da criação teórica oriunda dos seios de poucos países. A justificativa poderia estar nas condições que países convencionados como “desenvolvidos” oferecem à pesquisa, ciência e tecnologia. Mas deve-se ter consciência de que uma forma de cultura foi criada a partir do ‘des-cobrimento’ do Novo Mundo, gerando nos “povos colonizados” as idéias da menos valia, da entrega, do simples consumo, e em conseqüência, causando uma espécie de conformismo inconsciente implícito na condição de “subdesenvolvimento”, ou melhor ‘em desenvolvimento’[1].


Várias teorias surgiram para explicar os comportamentos ou tendências mundiais, sobretudo quando orientados no desenvolvimento vinculado ao capitalismo como indiscutível força mundial. Mas de todo modo, ainda que a indústria e o comércio estejam voltados a níveis de excelência, percebeu-se que as contradições sociais aumentavam a cada dia, em matéria de distribuição da riqueza e pobreza.


Anotou-se que tal força mundial acarretou condições multidisciplinares favoráveis e desfavoráveis em determinados pontos do planeta, e que provocaram transformações indesejáveis nos países ou em regiões internas dos países ditos “subdesenvolvidos” formando cinturões de miséria.


Por outro lado, a meados do século passado, uma vez que em todo continente central e sulamericano implantavam-se ditaduras militares, estudiosos da América Latina como Raúl Prebisch, André Gunder Frank, Fernando Henrique Cardoso, Theotônio dos Santos, Oswaldo Sunked e Enzo Faletto,  reunidos no Chile por força do exílio e em virtude de estudos para a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), analisaram os contextos regional e internacional partir da realidade de seus países e deram origem à teoria da dependência no intuito de explicar a  fonte da “eternização” da condição de pobreza e desigualdade.


Estes autores, concluíram tratar-se do resultado das forças externas advindas dos ditos “países centrais” na condução das políticas internacionais aliadas às condições históricas de colonização dos ditos “países periféricos”. Em outras palavras, fruto de uma época “imperialista” de invasão e controle direto em territórios do planeta por parte de determinados “países centrais”.


Uma vez lançada a base dessas idéias, a reação da comunidade acadêmica dos países desenvolvidos, até então exclusivos geradores das teorias econômico-político-sociológicas, não poderia ser outra senão a da negação, não aceitação de uma explanação teórica independente e contrária às tradicionais ideologias do ‘centro’.


 1. O LIMIAR DA TEORIA DA DEPENDÊNCIA


Em termos históricos, o século XIX foi marcado pelo pensamento do Estado liberal com a defesa de um sistema político na órbita de atuação do governo e o sistema econômico da competência livre da empresa privada.


Quanto ao alvorecer do século XX, observou-se no pós guerra a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), que tinha e tem como um de seus propósitos a busca da paz e segurança internacionais, o desencadeamento da independência das colônias ainda existentes no século XX. Contudo, diante de toda uma série de dificuldades que permearam e que ainda hoje persistem, muitos autores põem em cheque tal independência, dizendo-a puramente formal e que por detrás desta aparente independência[2] e soberania[3], figuraria uma completa dominação política com exploração econômica, resultando cada vez mais em degradação social dos países recém independentes.


Com a criação da CEPAL[4] e no quadro do sistema onusiano, alguns estudiosos da América Latina, desenvolveram estudos sobre ‘o problema da desigualdade causada pelo poder de exploração dos atores dominantes em face dos dominados, com um quadro de extrema injustiça, pobreza e desigualdade em alguns Estados e riqueza de outros’[5].


É nesse contexto que a partir de um enfoque inicialmente econômico, surgiu a ‘teoria da dependência’ seguida de uma série de trabalhos ao longo das décadas de 60 e 70 do século passado, que por sua vez originou correntes internas de pensamento entre as quis cabe mencionar: a) a estruturalista; b) a neomarxista e; c) a acumulação do capital em escala mundial.


Em grandes linhas, a teoria da dependência propõe conceitos fundamentais como centro e periferia[6], configurando uma estrutura de relação de dependência tanto entre os Estados quanto dentro destes.


Nesse diapasão, surgiram igualmente adeptos de outras regiões “subdesenvolvidas” do mundo, como Anouar Abdel Malek e Samir Amin. Entretanto, recorde-se que a comunidade acadêmica tradicional da época demonstrou repulsa à teoria de berço latino-americana[7], fato que geraria uma indiferença da comunidade internacional, conseqüência logicamente, da própria origem colonial do qual o processo civilizatório teria inabilitado tais povos à autodeterminação, capacidade de desenvolvimento histórico significativo ainda que transformados em nações[8]. Assim sendo, como então poderiam eles próprios criarem uma teoria para explicar a economia e a relação de poder que a envolve?


Como regra geral, o que os defensores desta teoria autóctone surgida nos países da ‘periferia’ denominaram de ‘dependência’ foi explicado pelos estudiosos de países do ‘centro’ como mera fase do inevitável e recíproco processo de ‘interdependência’.


Observa Guimarães que “o sistema e a dinâmica internacional têm sido descritos e interpretados como resultado de um processo benéfico de crescente globalização, interdependência e progresso econômico, de que participam e se beneficiam, material e espiritualmente, cada vez mais e de forma mais democrática, todos os indivíduos e em todos os países” [9].


Nesta ordem de idéias, Guimarães encerra o raciocínio justamente criticando a argumentação de que “as sociedades e os indivíduos que porventura não se beneficiam do progresso são, eles mesmos, de acordo com essa imagem, devido a seu arcaísmo, autoritarismo, incompetência e ignorância, os únicos e infelizes culpados por sua sorte infeliz, neste mundo deslumbrante e pleno de maravilhas”[10].


De todas as formas, o verdadeiro desenvolvimento dos indivíduos dentro de seus países e dos Estados nacionais enquanto unidades coletivas no quadro planetário passa necessariamente pela possibilidade de real autodeterminação.


Assim sendo, também historicamente e em caráter reflexivo, é importante assinalar o pensamento de Jaguaribe no sentido de que a “estratificação internacional resultante do novo sistema inter-imperial se caracteriza pela diferenciação de quatro níveis de decrescente capacidade de autodeterminação. O nível mais alto corresponde à primazia geral. O nível imediatamente seguinte corresponde à primazia regional. Segue-se o nível da autonomia. O nível mais baixo é o da dependência”[11].


Em vista das anotações anteriores, é inegável que o surgimento da teoria da dependência representou e ainda hoje representa uma referência inovadora de pensamento intelectual que acima de tudo de justifica no princípio de audeterminação dos povos.


2. REAÇÃO À TEORIA DA DEPENDÊNCIA


Karl Wolfgang Deutsch[12], como outros estudiosos da época[13], imediatamente manifestaram-se à desfavor da teoria da dependência, principalmente desacretidando-a como teoria.


Deutsch, internacionalista e pesquisador da ciência política, chamado em seu tempo de “liberal-cosmopolita, voltado para a idéia de um mundo único, a partir da preservação da liberdade”[14], caracterizava-se pela “visão sistêmica da sociedade humana, com noções extraídas da cibernética”[15].


Após a análise das relações internacionais, a partir de uma lógica e visão tradicionalista, principalmente ao definir estratégias políticas[16] que apontavam para uma crescente integração, Deutsch conclui pela inevitável interdependência global[17], sendo oportuno anotar sua clássica indagação quanto a “interdependência, dependência e crescente igualdade: Para onde está indo o mundo?”[18].


Como forma de justificativa de tal indagação, cita Bernard Baruch, que em 1947 “classificou a opção entre a soberania nacional e controle total no campo da energia atômica por um único organismo mundial, de escolha ‘entre os vivos e os mortos”[19]. Nesta ótica parece não haver escolha, senão seguir o fluxo (normal)!, independentemente  de eventuais percepções existentes desde o mundo em desenvolvimento.


Contudo, é bastante claro que Deutsch teve suas idéias influenciadas pelos efeitos da ‘guerra fria’, com extremo pavor de uma guerra nuclear iminente, conseqüentemente idealizando uma integração (governo) mundial que buscasse a paz internacional.


Entretanto, é patente que noções de igualdade entre os Estados pareciam e ainda parecem estar debilitadas em termos práticos neste alvorecer de século XIX. Salvo, é justo anotar, a crescente importância do grupo de países em desenvolvimento denominados BRICS, composto por países em desenvolvimento onde se incluem Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul que reivindicam na atualidade uma maior democratização das relações internacionais. Por outro lado, a noção de Deutsch acerca da ‘interdependência e suas dimensões’ foram explicadas através da seguinte fórmula:


“Dois países são interdependentes quando uma mudança ocorrida no país A – digamos, uma elevação do nível geral de preços – provocar uma alteração previsível no país B, ou seja, talvez também um aumento dos preços. Se uma modificação no país B produzir um efeito tão grande no país A quanto o que aquela alteração ocorrida no país A produziu no país B, então será possível considerar sua interdependência simétrica[20].


A seguir, adverte para a ‘interdependência positiva’ e a ‘negativa’ observando que esta tende a conflitos[21]. Enfatiza aqui Deutsch, nada mais que reações mútuas similares, o que pressupõe atores iguais. Mas, e as diversidades e as desigualdades práticas entre os Estados nacionais existentes naqueles tempos e ainda hoje prevalentes?


Com efeito, é notório observar-se na obra uma preferência de abordagem à interdependência simétrica onde por razões de fato não há como negar as evidentes e crescentes assimetrias entre os então denominados países desenvolvidos e “subdesenvolvidos”, o que impõe uma tarefa difícil – pesquisa destituída de opções valorativas ou ideológicas – por resultar um estudo que ampara as diversas correntes de pensamento, convergentes ou divergentes, teóricas ou empíricas.


A estes efeitos, orientações ideológicas podem ser altamente difundidas e incorporadas pelo meio social podendo, ademais, transformarem-se em condição impositiva. Basta lembrar o surgimento da ‘teoria das vantagens comparativas’, hoje percebida como relativamente inócua a um mundo pluralista que se pretenda desenvolvido, democrático e/ou integrado.


Por outro lado, Deutsch analisa a situação originada pela especialização da produção, lembrando que “no início de 1974, a época do embargo árabe de petróleo, um semanário satírico francês, Charlie Hebdo, publicou uma estranha charge com a seguinte legenda: ‘Os holandeses revidam – não enviarão mais tulipas para os árabes!”[22]. E após esta passagem, faz o seguinte comentário:


“Da mesma forma como os árabes poderiam viver muito mais facilmente sem tulipas do que os holandeses sem petróleo, assim os Estados Unidos e a Europa Ocidental poderiam viver muito mais facilmente sem bananas do que os países da América Central e da África Ocidental sem muitos dos produtos industriais e de peças de reposição que importam dos países altamente industrializados. Estas assimetrias podem ser uma das fontes de dependência na política internacional”[23].


Este é um dos poucos momentos em que o autor admite as assimetrias como fonte provável da dependência, mas infelizmente não aprofundou seu estudo sob esta ótica. A razão certamente está no fato de que a tese da interdependência sugere uma interação inevitável nos auspícios do progresso e ideário de paz mundial, mas sob a orientação de “força(s) hegemônica(s)”.


De forma complementar, ao explanar a forma sistêmica das relações internacionais, Deutsch afirma que “visivelmente, a área, o domínio e os recursos da interdependência cresceram. Quanto à área, praticamente não há qualquer território em nosso planeta cujos habitantes não estejam envolvidos em quaisquer transações e, na maioria das vezes, não tenham algum vínculo estrutural com pessoas ou organizações de outros territórios”[24].


Para além do que, classifica os recursos da interdependência em “transporte aéreo, marítimo, terrestre; comércio e finanças; correios, telégrafos, telefones, jornais, filmes, televisão, rádios; negócios, recreação, viagens e movimentação transnacional de estudantes, professores e cientistas; a moda em termos de roupas, música e estilos de vida”[25] e que tais fluxos são mantidos por vínculos estruturais, tais quais “empresas, hotéis, estradas, meios de comunicação, bancos, mercado de ações, empresas multinacionais, organismos internacionais governamentais e não-governamentais…”[26].


Em outras palavras, a dinâmica das atividades sistêmicas tende a padronização na forma de estrutura e organização implementada pelos países desenvolvidos, sendo difundida através de seus recursos e vínculos estruturais. Além disso, existem organismos internacionais de ajuda financeira aos países “subdesenvolvidos” sob imposição de condutas, ou seja, uma variada gama de exigências sobre suas políticas governamentais. O poder de influência e/ou condução dos rumos da Humanidade pode estar nas mãos do(s) que detém “hegemonia”[27] no meio internacional, e hoje, não há dúvida que inobstante exista uma diversidade de Estados desenvolvidos, apenas uma super potência detém todas as características supostamente hegemônicas[28].


Não é fortuito que ao ilustrar a variação da interdependência, observa-se a possibilidade de manipulação a resultados desejados ao afirmar que:


“Em relação a qualquer país – digamos, o país A – pode-se dizer que a variação de sua dependência de outra nação, B, é indicada pela diferença entre o maior ganho e a pior perda – ou melhor, o mais alto ganho, ou auxílio, versus o pior prejuízo que A pode sofrer em virtude de uma crise, de um bloqueio ou de uma guerra – ocorridos em função de suas transações com B. (…) Da mesma maneira, a variação entre lucros e as perdas que as mudanças em B causam em A representa a dependência de B em relação a A. O conjunto destas duas variações constitui, então, a variação de interdependência entre A e B”[29].


A estes efeitos, Vidal, demonstrando a dificuldade que um país “dependente” enfrenta no sentido de criar estruturas tecnológicas adverte para algumas situações estratégicas de manutenção do sistema. Em suas palavras:


“Quando, nos países dependentes, se cogita criar estruturas tecnológicas, manifestam-se obstáculos de toda ordem, tais como: Impossibilidade de constituir-se, em curto prazo, acervos de conhecimentos técnicos equivalentes aos existentes nos países centrais; Inadequação de suas estruturas institucionais que dificultam, quando não incapacitam, adrede (SIC), o desenvolvimento das tecnológicas produtivas; Presença de subsidiárias de corporações transnacionais, cuja concorrência as empresas nacionais têm de enfrentar em condições, em extremo, desvantajosas” [30].


Para Deutsch, o alcance da dependência de um país se transforma em alcance da interdependência, já que defende a existência de efeitos recíprocos:


“O alcance da dependência de um país, A, em relação a outro, B, consiste nos tipos de atividades e instituições que em A podem significativamente afetadas por mudanças que ocorrem em B. Em contrapartida, o conjunto de tipos de processos e estruturas que em B tendem a alterar-se de forma significativa em resposta a mudanças ocorridas em A representa o alcance da dependência de B em relação a A. O conjunto dessas duas espécies de alcance dá origem, então, ao que chamamos de alcance da interdependência entre A e B”[31].


Embora passa parecer razoável, as mudanças que um e outro país causam entre si reciprocamente, realmente não são o principal fator, senão quando vantajosas ou prejudicais, pois um país desenvolvido poderia eventualmente obter vantagens em detrimento dos “subdesenvolvidos” que com ele tenham negócios, principalmente quando renunciam parcelas de soberania em prol de integrações simplesmente comerciais[32] em que não detenham igualdade de condições[33].


Por outro lado, quanto maior a probabilidade de uma pluralidade de Estados com características “hegemônicas”, maior a chance de multipolaridade no sistema mundial e um certo equilíbrio nas relações internacionais, gerando opções variadas aos “dependentes”.


Deutsch adverte que a interdependência tende a transformar-se em integração (econômica, política, cultural…) desde que expressiva, positiva e valorizada pelos que dela participam. Mas, como já se afirmou, a tese da interdependência das nações “é bem uma elaboração sistêmica de como se desenvolve a problemática mundial”[34], em que os atores se cercam de estratégias e possibilidades de escolha racional, o que não significa, necessariamente, ganhos mútuos. Assim sendo, muito elucidam as palavras de Keohane e Nye:


“Interdependência, definida em poucas palavras, significa mútua dependência. Na política mundial, interdependência  diz respeito a situações caracterizadas pelos efeitos recíprocos entre as nações ou entre os atores em diferentes nações. Estes efeitos com freqüência resultam transações internacionais: fluxos de dinheiro, mercadorias, pessoas e mensagens através das fronteiras. Estas transações intensificaram-se dramaticamente desde a Segunda Guerra Mundial. (…) As relações de interdependência  sempre envolvem custos, já que a interdependência restringe a autonomia; mas é impossível especificar de antemão se os benefícios de uma relação irão exceder os custos. Isto dependerá da categoria dos atores, tanto quanto da natureza das relações. Nada garante que a relação que designamos de ‘interdependência’ será caracterizada como mútuo benefício[35].


Assim sendo, é exatamente esta possibilidade que se questiona na visão de Deutsch, ficando claro que a teoria da interdependência como benefício inevitável das relações internacionais trata-se mais de um ideal imaginário do que exatamente uma teoria com visão do mundo real ou uma pretensão ideológica de abertura à contemporaneidade, visto que sem igualdade prática, soma positiva para todos os atores e resistência dos que dela não se beneficiam.


Em seu ponto débil, a interdependência propugnada por Deutsch pode ser vista como uma visão romântica ou estratégica de não centrar o estudo ao questionamento das desigualdades, assimetrias, diferenças, desvantagens e/ou prejuízos? E fundamentalmente nas oportunas alternativas de equacionamento desses desequilíbrio ?


Para Caubet, a “interdependência muito mais oculta fenômenos de desigualdade estrutural – e estruturada – do que explica as relações entre os que, via de regra, tomam e impõem as decisões e os que, por outro lado, as acatam ou implementam. O conceito de interdependência, na verdade, naturaliza as relações de desigualdade e a substância das realidades”[36].


Uma vez esclarecido este ponto, em subtítulo do capítulo XIX, Deutsch explana “QUANDO A INTERDEPENDÊNCIA É ALTAMENTE DESIGUAL: IMPERIALISMO E DEPENDÊNCIA”, iniciando uma análise da teoria da dependência no aporte teórico marxista, já que diz tratar-se da continuidade de tais idéias, porém sob o enfoque econômico.


É preciso, mais uma vez, chamar a atenção para o fato de que, apesar do que sugere o título, o autor não realizou um estudo sobre a interdependência em processos de desigualdade, mas apenas um enfoque às teorias marxistas do “imperialismo” para ligá-las às idéias repassadas pelos teóricos dependentistas e a partir de então, formular sua crítica.


Infelizmente, o autor se omitiu à análise dos efeitos da interdependência entre desiguais. Entretanto, recorde-se que Deutsch admite a possibilidade das assimetrias serem uma das fontes da dependência na política internacional. Ora, admitindo-se a interdependência quando desigual e prejudicial não há porque desejá-la, senão quando busque efetivamente equacionar as assimetrias fundada no reconhecimento das diferenças e na aplicação prática do princípio da igualdade, do bem comum e da solidariedade fraterna entre os povos.


Posto isto, vê-se que Deutsch para interligar à criação da teoria da dependência, traz o conceito de imperialismo ao evidenciar que “durante quase meio século, praticamente de 1875 a 1925, floresceram os impérios coloniais, cada um sob o controle direto, administrativo e militar, de uma potência relativamente mais industrializada (…). O empenho de adquirir, preservar e expandir esse tipo de império para determinada nação foi chamado de imperialismo[37]. Dentre as teorias marxistas do imperialismo, recorde-se que explanaram brevemente Rudolf Hilferding[38], Karl Kautsky[39], Rosa de Luxemburgo[40] e Lenine[41].


Com efeito, após a Segunda Guerra Mundial, as áreas coloniais do mundo se transformaram pouco a pouco em Estados-nação[42], com o que Deutsch exclama que “a era do imperialismo parecia terminada. Mas, estará realmente terminado?”[43].


Bem, realmente nesta questão é que se deve fazer outra grande indagação: O que faz pensar que os povos colonizados repentinamente teriam condições próprias[44] para alterar sua condição de dominados e explorados em termos ideológicos, econômicos, políticos, culturais, científicos e militares, para uma situação de autodeterminação e que não fosse eventualmente conduzida por uma elite dominante “apátrida”?


Mas deve-se advertir que para tratar das relações de poder no sistema internacional contemporâneo não se utiliza mais a expressão “imperialismo”[45], pois o denominado pós-marxismo tornou-se a postura intelectual da moda com o triunfo do suposto “neoliberalismo”[46] de um mundo globalizado, notadamente em suas relações econômicas.


No caso brasileiro, Goularte questiona o próprio significado de independência, aduzindo que a independência brasileira foi apenas formal, uma vez que “o Brasil se livrou da dominação portuguesa, mas aos poucos se tornava mais dependente da Inglaterra”[47]. Lembra ainda, que “o reconhecimento da Independência por parte de Portugal só aconteceu três anos depois (…). Foi, então, feito um acerto: Portugal reconheceria a independência do Brasil mediante uma indenização pelo Brasil de 2.000.000 de libras. A Inglaterra emprestaria o dinheiro ao Brasil, que pagaria a indenização e Portugal saldaria a dívida com os ingleses. O dinheiro não saiu da Inglaterra, mas o Brasil iniciou aí seu endividamento externo”[48]. Aliás, afirma Vidal que “a rigor, a dependência vem de data anterior a nossa separação de Portugal, pois, em 1703 – em conseqüência do Tratado de Methuen – tornamo-nos, indiretamente, mas de fato, uma colônia econômica da Inglaterra”[49].


Entretanto, percebe-se que o ser humano é capaz de implementar grandes transformações quando lhe convém e aqueles que exercem poder sobre o meio quando beneficiados pelo status quo, tendem a buscar a perpetuação da situação, ou caso contrário, seguem na criação de novas e mais eficientes formas de influência política, econômica, social e cultural, entre outras, sempre que percebem ameaças. Ao demonstrar as idéias de Lenine, comenta Deutsch:


“A despeito de sua insistência de que o capitalismo precisava exercer um governo direto sobre suas colônias, a fim de nelas salvaguardar os investimentos feitos pela pátria-mãe, Lenine também admitia a existência de ‘países semicolonizados’, como a China, o Irã e as repúblicas latino-americanas. Esses países eram legalmente independentes, mas, de fato -–raciocinava ele – cada um deles era comandado por um ou por vários países imperialistas com base na sua dependência em relação ao comércio exterior, mercado financeiro e seguros, transporte internacional, tecnologia estrangeira e equipamento militar, além de especialistas e consultores. (…)[50].


Mas Deutsch implacavelmente critica no sentido de que “as teorias modernas da “dependência” continuaram da década de 50 em diante a utilizar alguns temas e parte do vocabulário expresso no pensamento de Lenine, introduzindo porém, modificações importantes”[51].


Todavia, parece claro que a teoria da dependência aborda situações distintas, visto que a dependência está muito mais vinculada a fatores culturais de subserviência atrelada a uma estrutura hegemônica, do que realmente resultante de ocupação territorial anterior. De todo modo, nada impede que uma teoria do passado possa ser revisitada, aprimorada ou discutida.


Então, Deutsch questiona “DEPENDÊNCIA: IMPERIALISMO POR OUTROS MEIOS?”, comentando que na teoria da dependência alguns economistas latino-americanos e árabes, aperfeiçoada por teóricos como André Gunder Frank, Osvaldo Sunkel, Anouar Abdel Malek, Samir Amin e por Johan Galtung, explicaram a pobreza dos “países subdesenvolvidos” como:


“o resultado do atual sistema econômico internacional, que, por suas operações automáticas, “subdesenvolveu” as nações mais pobres do mundo, mantendo-as em situação de pobreza, como se ainda fossem colônias. Esse sistema, dizem os teóricos, é por sua própria estrutura, o equivalente do antigo sistema de impérios coloniais. Em seus resultados, ele é imperialismo, insistem os teóricos, embora opere através de outros meios”[52].


A seguir demonstra a visão dependentista também de relação centro x periferia internamente nos Estados:


Contraste semelhante, ainda segundo essa teoria, é encontrado na estrutura interna de cada um dos dois tipos de países. Em cada país, há, mais uma vez, uma região central, em geral a capital do país e as regiões onde se localizam as indústrias mais adiantadas, e uma periferia, quase sempre rural, onde se desenvolvem as atividades menos aperfeiçoadas tecnicamente e as populações mais pobres e menos especializadas. Mas, uma vez que os países “centro” são ricos e tornam-se cada vez mais ricos, dizem os teóricos da dependência, as regiões “centro” dos países “centro” podem dar-se ao luxo de fazer concessões às suas próprias regiões e populações periféricas, dividindo um pouco de sua riqueza com elas, comprando sua passividade ou seu apoio político.


Em cada país periférico, sob este aspecto, prevalecem condições opostas. No caso, a população da região-centro se recusará a dividir qualquer porção da escassa riqueza do país com a periferia nacional; ao contrário, a tendência é transformar-se em pequenos enclaves daquela riqueza de nível ocidental e de padrões, em termos de estilo de vida e consumismo, próprios do ocidente (…)”[53].


Assim, criticou os teóricos da dependência[54], alegando terem utilizado o mesmo vocabulário marxista, porém sob ângulo distinto es enfatizando a contrariedade de pensamento entre os teóricos da dependência e Lenine, apesar daqueles utilizarem a teoria deste.


“O contraste com a teoria de Lenine é visível, embora ambos os grupos de teóricos invoquem seu nome. Segundo Lenine e seus adeptos, a industrialização e o crescimento econômico, por si sós, são forças enormes e potencialmente liberalizantes. Sua tendência é aumentar o número, a disciplina, a capacidade e a consciência social dos trabalhadores e, através dos crescentes contactos com os trabalhadores – pensava ele – também a capacidade e a consciência política da parcela mais pobre dos camponeses, que podem tornar-se seus aliados. Além do mais, o imperialismo, da forma como Lenine o via, trará capital e indústrias -–inclusive indústria pesada – para os países colonizados e semicolonizados; ele precisa empenhar-se em favor de sua conquista militar e de seu controle direto. Por sua vez, imaginava ele, isso fará com que o imperialismo se envolva em periódicos conflitos com as classes médias locais dos países em desenvolvimento, de modo que, no final, os trabalhadores, os camponeses pobres e, de tempos em tempos, essas classes médias locais, todos estarão unidos em uma ampla coalizão para resistir e, finalmente, destruir o sistema imperialista”[55].


Em novo subtítulo ao enfoque de “TEORIAS CONFLITANTES EM BUSCA DE INDÍCIOS”, entende que “ambas as perspectivas correspondem a alguns elementos da realidade, mas nenhuma lhe corresponde como um todo. Em alguns países anteriormente não industrializados(…), cresceu o índice de industrialização ao longo deste século”[56].


Recentemente, conforme já explanado, em obra que explica a correlação da colonização histórica como conseqüência da riqueza e da pobreza das nações, também se fez críticas duras ao aduzir que:


“(…) as teses dependentistas vicejaram e gozaram de prestígio na América Latina. Também tiveram bom trânsito e ressonância, após a Segunda Guerra Mundial, na precária situação econômica e na consciência política das colônias recém-libertadas. Os cínicos poderiam até dizer que as doutrinas de dependência foram a mais bem-sucedida exportação da América Latina. No entanto, são más para o esforço e o moral. Ao instigarem uma mórbida propensão para atribuir as culpas a todo o mundo menos àqueles que as denunciam, essas doutrinas promovem a impotência econômica. Mesmo que fossem verdadeiras, seria preferível arquivá-las[57].


Como contraponto, há que se asseverar que a busca de solução passa, inevitalvelmente, pelo entendimento do problema, pois a consciência de um estado negativo de coisas, não quer significar passividade, mas em primeiro lugar, possibilidade de conhecimento para despertar o interesse à mudanças.


Deustch igualmente alegou a falta de comprovação empírica como um dos pontos fracos da teoria da dependência, afirmando que em países da África, Ásia e América Latina, instalaram-se regimes militares locais, “de caráter repressivo, para defender padrões locais de extrema desigualdade econômica e privilégio social, enquanto se mantém mais ou menos subservientes a credores estrangeiros e multinacionais – de certa forma, como os teóricos da dependência haviam previsto”[58]. Assim, questiona até que ponto a teoria da dependência é sustentada por dados comprováveis?


Interessante, e que na atualidade só vem a corroborar a tese dependentista, é a alegação de Deutsch, naquele tempo, de que “a Argentina, apesar de, em geral ser considerada um país de ‘Terceiro Mundo’, não se enquadra muito bem neste quadro estatístico: na média, é um país bastante rico, de alto índice de consumo de energia, de alfabetização, muito bem suprido de jornais e estações de rádio, muito bem alimentado e igualmente muito pouco dependente do comércio exterior em geral ou de qualquer país parceiro em particular – mesmo assim, sua taxa de mortalidade infantil atinge níveis assombrosos”[59].  Note-se que o ocorre hoje na Argentina é uma imensa fragilidade da economia e nítida dependência externa, ainda que Deutsch a indicasse como diferencial na América Latina.


Mas continuou seu argumento, afirmando que demais detalhes na teoria não se enquadram , pois Índia e China “são tão grandes e possuem setores tão diminutos de comércio exterior, comparados ao seu PNB, que é difícil saber de que modo estes poderiam fazer com que tais países se tornassem verdadeiramente dependentes de qualquer sistema imperialista mundial”[60].


Por fim, enfatiza que “não obstante, os esforços dos ditadores locais e dos que lhes dão sustentação do estrangeiro, a situação política e social em muitos desses países parece mais precária, menos estável e menos inclinada à auto-eternização do que o imaginado pela teoria da dependência”[61].


No entanto, ao contrário do que sugere Deutsch, de forma cíclica, há sempre um país em desenvolvimento que ao seguir os padrões impostos, ingressa em crise econômica e que em grau extremo, pode-lhe resultar a própria extinção do Estado.


Em contraponto, deve-se depreender que a interdependência está relacionada à visão sistêmica da sociedade e que, principalmente como comenta Ianni, “diz respeito a um cenário em que a maior parte dos problemas aparece nas razões, estratégias, táticas e atividades de atores principais e secundários, todos jogando com as possibilidades de escolha racional” [62]. Mas adverte que “em algumas formulações, a tese de que o mundo pode ser visto como um sistema implica certa dose de idealização. Há algo de utópico na maneira pela qual algumas formulações sobre a interdependência sistêmica supõem a integração, o equilíbrio ou a harmonia entre os Estados nacionais, corporações, estruturas mundiais de dominação e apropriação, elites, classes, grupos e outros ‘atores’ presentes no cenário local, nacional, regional e mundial. Uma utopia idealizando a formação social presente e fundamentando diretrizes destinadas a aprimorá-la”[63].


Negando veementemente a existência de uma perfeita e integrada ordem mundial, justificando tratar-se mais de um equívoco[64], Wolkmer comenta que vivemos numa “realidade internacional instrumentalizada por profundas contradições, produzida e articulada pelos interesses dos blocos de poder dominantes (hegemonia do “Centro”, do “Norte”) sobre a inoperância, esvaziamento, fragmentação e dependência das periferias dominadas (espoliação do Sul)”[65].


Jamais qualquer teoria deve afastar-se da realidade política, econômica ou social ou deixar de ponderar a existência de forças ideológicas tendentes à indução[66]. Independente de um, dois ou mais Estados que detenham hegemonia, há que analisar o grau de superioridade e a possibilidade de que esteja(m) conduzindo os destinos nas nações.


CONCLUSÃO


Desde os primórdios, o ser humano sente a necessidade de dominar e cada vez mais aprimora sua capacidade de poder com os instrumentos que lhe possibilitam melhores resultados.


O paradigma do realismo político bem demonstrou essa busca desenfreada pelo poder, de sorte que após duas grandes guerras percebeu-se que em vista da sofisticação bélica, não haveria opção futura no sentido de que a utilização de armamento nuclear poderia ser a última ação do ser humano na terra.


O mercantilismo dominou vários séculos e a dominação deixou de ser territorial e passou a ser de mercado. O mundo tornou-se uma aldeia global, praticamente sem fronteiras, surgindo formas inovadoras e diferenciadas de quebra das barreiras, sejam territoriais, culturais, políticas ou econômicas, para a conquista de novos mercados e possibilitar a prepondenrância do mais forte.


Os povos “dominados” não conseguem facilmente determinar seu destino e em prol da riqueza de poucos, muitos foram levados à miséria e os detentores do “domínio” ao pretenderem o absoluto, procuram manipular os povos, principalmente com estratégicas ideologias.


De todas formas, chega-se à consciência de que o mundo está dividido não mais em atores na busca da hegemonia, não há mais bipolaridade ou multipolaridade, mas a unimultipolaridade em que apenas um ator detém todas as formas de dominação conhecidas.


Nas palavras de Almeida, “como os povos africanos e asiáticos, também os da América Latina começam a perceber o anacronismo do critério cultural nas relações internacionais, e procuram dar-lhes sentido político e econômico”[67].


Várias foram as teses, doutrinas e teorias ofertadas pelas principais potências para justificar porque o mundo tomou tal rumo ou  para orientar e induzir à aceitação de determinadas condutas globais. Formou-se um mundo destituído das condições mínimas de vida e consciência da realidade social , com grandes bolsões de miséria.


Em determinado momento da história, alguns intelectuais resolveram, a partir da visão dos dominados, analisar a problemática criando a ‘teoria da dependência’ que explica o viés do subdesenvolvimento como conseqüência direta e proporcional da manutenção do desenvolvido, com base nas relações de influência norte e sul, centro e periferia, riqueza e pobreza.


Em seu tempo, a dependência foi negada pelos intelectuais dos países centrais e argüida como uma justificativa do incompetente.


Por outro lado, surge a ‘interdependência’ para demonstrar as ligações intrínsecas das relações internacionais, como uma rede, um sistema inevitável, mas sem minuciosa análise das assimetrias e sua prejudicialidade aos Estados em desigualdade nas relações mundiais, principalmente quando econômicas.


Por volta de trinta anos, tiveram sucesso as intervenções do ‘centro’ à teoria da dependência pois realmente seus estudos estagnaram. Contudo, ocorre que como uma súbita conscientização histórica, incentivados pelos acontecimentos atuais, estudiosos revisitam o dependentismo na tentativa de melhor estudá-lo, bem assim reanalisar o status das relações internacionais no mundo.


Diante das desigualdades reinantes nas relações internacionais, urge reconhecer que a teoria da dependência representou e representa uma importante contribuição científica para o entendimento e busca permanente de soluções compartilhadas para as graves assimetrias existentes tanto no âmbito interno quanto externo dos Estados.


Ancorado no direito internacional e em sólidos fundamentos multidisciplinares, é de se asseverar que o equacionamento das assimetrias reveladas pela teoria da dependência somente podem vir a ser alcançado com base no respeito e observação prática do princípio da igualdade que por sua vez depende da fraternidade e da cooperação internacional para o desenvolvimento.


Igualdade não apenas formal, mas também prática e democratizante. Fraternidade e cooperação internacional para o desenvolvimento co-responsável, pois tanto a essência humana quanto o destino da Humanidade e da própria Vida no planeta dependem da conscientização da interdependência existente que somente pode ser sustentável e resultar em paz duradoura ao equacionar os desequilíbrios que ameaçam a todos.


 


Referências

ALMEIDA, Cândido Antônio Mendes de. Perspectiva Atual da América Latina. 2 ed. Rio de Janeiro: ISEB, 1960.

AMIN, Samir. Imperialismo e Desenvolvimento Desigual. Trad. Eneida Araújo. São Paulo:Vértice – RT, 1987.

ARON et al, Raymond. Curso de Introdução às Relações Internacionais. Relações Internacionais de Poder. 2 ed. Unidade IV. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1983.

BALÁN, Jorge (Org.). Centro e Periferia no Desenvolvimento Brasileiro. São Paulo: DIFEL, 1974.

CARDOSO, Fernando Henrique. FALETTO, Enzo. Dependência e Desenvolvimento na América Latina: ensaio de interpretação sociológica. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1970.

CAUBET, Christian Guy. O Brasil e a dependência externa. São Paulo: Acadêmica, 1979.

DEUTSCH, Karl Wolfgang. Análise das Relações Internacionais. Trad. Maria Rosinda Ramos da Silva. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982.

_________. Política e Governo. 2 ed. Trad. Maria José Matoso Miranda Mendes. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1983.

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GOULARTE, Nivaldo A. Brasil: 500 anos: Desconstruindo o mito. Criciúma: UNESC, 2000.

GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Quinhentos anos de Periferia: uma contribuição ao estudo da política internacional. Porto Alegre: Ed. da Universidade/UFRGS/Contraponto, 1999.

HARNECKER, Marta. URIBE, Gabriela. Imperialismo e Dependência. São Paulo: Global Editora, 1980.

IANNI, Octávio. Teorias da Globalização. 5 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999.

LACOSTE, Yves. Os países subdesenvolvidos. 20. ed. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 1990.

LANDES, David S. A riqueza e a pobreza das nações: por que algumas são tão ricas e outras são tão pobres. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Campus, 1998.

OLIVEIRA, Odete Maria de (Org.). Relações Internacionais e Globalização: grandes desafios. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 1997.

PETRAS, James. Neoliberalismo: América Latina, Estados Unidos e Europa. Trad. Ana Maria Ruediger Naumann et al. Blumenau: Editora da FURB, 1999.

SEITENFUS, Ricardo. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.

VIDAL, José Walter. Bautista. De Estado Servil à Nação Soberana. Civilização Solidária dos Trópicos. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora Universidade de Brasília, Petrópolis:  Vozes, 1988.


Notas

[1] O termo ‘subdesenvolvimento’ a juízo dos autores é discriminatório, representando uma violação dos direitos humanos da pessoa humana em escala individual (especificamente do princípio da igualdade) e por conseqüência, em escala coletiva, do direito dos Estados nacionais ao desenvolvimento. Entretanto, cumpre assinalar que tal termo surgiu como estudo econômico e social sob a ótica unilateral dos intitulados “desenvolvidos”, de graves contradições internas, uma vez que instigaria o crescimento populacional, mas por outro lado, prejudicaria o crescimento econômico a prover as necessidades da massa humana localizada nos países ditos “periféricos”. Portanto, Lacoste adverte que “o subdesenvolvimento resulta fundamentalmente da intrusão do sistema capitalista no seio de sociedades ancilosadas em estruturas sociais menos evoluídas, em proveito de uma minoria (estrangeira ou autóctone) política e economicamente privilegiada. Suas exações restringem de tal modo o mercado interno, que as atividades econômicas modernas são essencialmente limitadas à necessidades do país estrangeiro” (LACOSTE, Y. Os países subdesenvolvidos, p. 76).

[2] Ver HARNECKER, Marta. URIBE, Gabriela. Imperialismo e Dependência, p. 45.

[3] Nas palavras de CARDOSO: “O Estado latino-americano nasce em contradições históricas que o tornam expressão de uma relação duplamente contraditória. De um lado, trata-se de um Estado que se afirma politicamente soberano, pois não se pode pensar na noção de Estado sem a noção de soberania. De fato, não se pode pensar teoricamente a idéia de Estado sem pensar-se na idéia de igualdade no plano internacional entre os vários soberanos. Entretanto, essa soberania se afirma num solo embasado numa economia que é dependende. E essa soberania se afirmou sem que do ponto de vista das relações econômicas tivesse havido um corte diferente do deslocamento dos liames de dependência, que anteriormente ligavam as colônias às metrópoles e que passou a ligá-las depois da Independência, basicamente à Inglaterra e, mais tarde, aos EUA. Portanto, o Estado nacional funda-se num contexto em que a aspiração de soberania está condicionada pela existência de uma estrutura objetiva de relações econômicas internacionais, que limita a existência efetiva dessa soberania na medida em que repõe a existência de relações de dependência”. CARDOSO et al, Fernando Henrique. O Estado na América Latina, p. 80-81.

[4] Criada pela resolução 106 (VI) do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, com sede em Santiago, no Chile, em 25 de fevereiro de 1948, com vistas a coordenar as políticas de desenvolvimento econômico da América Latina e do Caribe.

[5] OLIVEIRA, Odete Maria de. Relações Internacionais: breves apontamentos e contextualização. In: Relações Internacionais & Globalização: grandes desafios, p. 51.

[6] Quanto a estes termos, CARDOSO opina que: “O esquema de ‘economias centrais’ e ‘economias periféricas’ pode parecer mais rico de significação social  que o esquema de economias desenvolvidas e economias subdesenvolvidas. Nele pode-se incorporar de imediato a noção de desigualdade de posições e funções dentro de uma mesma estrutura de produção global…. As noções de ‘centro’ e ‘periferia’ por seu lado, destacam as funções que cabem às economias subdesenvolvidas no mercado mundial sem levar em conta os fatores político-sociais implicados na situação de dependência”. CARDOSO, Fernando Henrique. FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na América Latina, p. 26-27.

[7] Ora, para os intelectuais dos países “desenvolvidos”, tal teoria seria resultante de cultura “subdesenvolvida” e por conseqüência, com visão deturpada da realidade!

[8] Por tal fator, deve-se advertir conforme ALMEIDA, que “a partir da sua descoberta, o acontecer histórico-social, neste continente, é menos resultado de um processo autodeterminado do que induzido por pressões externas”. ALMEIDA, Cândido Antônio Mendes de. In: Perspectiva atual da América Latina, p. 11.

[9] GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Quinhentos anos de periferia, p. 15.

[10] Idem, ibidem.

[11] JAGUARIDE, Hélio. Leitura: Autonomia e Hegemonia. In: ARON et al, Raymond. Curso de Introdução às Relações Internacionais, p. 142.

[12] Nasceu na tchecoslováquia em 1912, com ascendência alemã. Americano naturalizado, estudou em Harvard – 1939 a 1941. Iniciou carreira docente em Yale, e no Massachussetts Institute of Technology, professor de Cátedra de Governo e Paz Internacionais. Na Universidade de Harvard publicou, dentre outros trabalhos: Os nervos do Governo, em 1963; O Nacionalismo e a Comunicação Social, em 1966; Análise das Relações Internacionais, em 1968, 2ª ed. 1978; Política e Governo, em 1970.

[13] Aliás, na atualidade ainda surgem críticas como a de LANDES, David S. ao fazer referência ao surgimento da Teoria da Dependência, que em dado momento tece o seguinte comentário no sentido de que “o fracasso do desenvolvimento latino-americano, tanto pior quando posto em contraste com a América do Norte, foi atribuído por estudiosos locais e simpatizantes estrangeiros a malefícios de nações mais fortes e mais ricas. Essa vulnerabilidade foi rotulada de ‘dependência’, subentendendo um estado de inferioridade em que um país não controla o seu destino e somente faz o que lhe é ditado por outros. Seria desnecessário dizer que esses outros usam sua superioridade para transferir produto das economias dependentes, tal como procediam os antigos governos coloniais. A bomba do império converte-se na bomba do imperialismo capitalista”. In: A riqueza e a pobreza das nações, p. 369.

[14] In: Deutsch na UnB, p.73.

[15] Idem, ibidem.

[16] O que, de certo modo, lembra as estratégias do realismo político. Mas, Deutsch idealizava uma integração na ‘busca à paz’, assim como Raymond Aron e Immanuel Kant.

[17] Que, de todo modo, refere-se a uma dinâmica sistêmica crescente e tendente ao desenvolvimento e difusão do modo de produção, econômico e político capitalista.

[18] Título do Capítulo XIX, p. 283.

[19] In: Relações Internacionais, p. 284.

[20] Idem, ibidem.

[21] Ibidem.

[22] Idem, p. 292.

[23] Idem, ibidem.

[24] Idem, p. 284-285.

[25] Idem, p. 285.

[26] Idem, ibidem.

[27] A hegemonia requer total controle de recursos: matéria-prima, capital, vantagens competitivas no meio de produção e mercado, aliados ao poderio militar em sua defesa.

[28] “Os Estados Unidos estiveram em condições de hegemonia, reunindo condições historicamente sem precedentes para tentar mais uma vez reorganizar o sistema político, econômico e militar internacional. Nesta tarefa, se engajaram através do projeto de segurança coletiva das Nações Unidas”. In: GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Quinhentos anos de periferia, p. 26.

[29] Idem, p. 287.

[30] In: VIDAL, José Walter Bautista. De Estado Servil à Nação Soberana, p. 66.

[31] Idem, p. 288.

[32] Destituídos de um ideal de melhoria social, mesmo que para isto necessite relevar ou dividir injustamente a riqueza.

[33] Àquele país que, hodiernamente, necessite renegociar dívidas externas, certamente não terá muito poder de barganha ou arbítrio, e hoje há uma grande pluralidade de países em desenvolvimento devedores.

[34] IANNI, Octávio. Teorias da Globalização, p. 80.

[35] KEOHANE, Robert. O., NYE, Joseph S. Power and Interdependence, p. 8-10. In: IANNI, Octávio. Idem, p. 80-81.

[36] CAUBET, Christian Guy (org.). O Brasil e a dependência externa, p. 08.

[37] In: Relações Internacionais, p. 294.

[38] “(…) o funcionamento automático da competição capitalista produziria empresas cada vez menores e empresas cada vez maiores, cada vez mais envolvidas em operações financeiras do que na simples produção, e cada vez mais tendentes a usar o poderio do Estado-nação para fortalecer e expandir suas áreas de império econômico e de privilégio monopolístico. (…), faria surgir uma ideologia apropriada às suas estruturas cada vez mais burocráticas: uma ideologia pseudobiológica de racismo e favorável à guerra. (…). Mas em sua visão do futuro, Hilferding também deixou em aberto uma possibilidade mais otimista: em última instância, um ‘cartel geral’ poderia unir todas as empresas privadas, transformando-as numa só, para assim explorar em paz a economia mundial”. In: Idem, p. 296.

[39] Deutsch comenta que Kautsky tem visão semelhante a de Hilferding quando acredita que “talvez os impérios mundiais e os monopólios empresariais venham a, ocasionalmente, aliar-se de modo pacífico, em uma era de ultra-imperialismo”. In: Idem, ibidem.

[40] “Consideradas em conjunto, todas as empresas capitalistas, argumentava ela, poderiam ser lucrativas se vendessem sua produção de bens e serviço por mais dinheiro do que o que haviam gasto com o pagamento de salários, aluguéis e outros custos ao produzí-los. Daí, deduzia, o capitalismo tem que, inevitavelmente, encontrar um maior poder aquisitivo no mercado do que aquele que ele próprio é capaz de criar, e uma economia puramente capitalista cai, necessariamente na estagnação ou se destrói no caso de crises econômicas periódicas. A única salvação para o capitalismo, pensava ela, seria uma infindável penetração – e conquista – em territórios e populações não capitalistas. (…) O imperialismo e as guerras dele resultantes, concluía, eram uma necessidade para o capitalismo e desapareceriam com o capitalismo, mas não tão cedo”. In: Idem, p. 297.

[41] “(…) insistia em que o capitalismo não poderia sobreviver sem a administração política direta e a ocupação militar das áreas coloniais, e que sob o capitalismo as guerras eram uma certeza, tornando-se impossível uma paz duradoura. Mas o título que deu a seu livro foi Imperialismo: A Última etapa do Capitalismo. Pois os capitalistas, pensava Lenine, desviariam cada vez mais e mais investimentos para as colônias, especialmente para aplicação em indústria pesada, a fim de, assim, torná-las potencialmente mais poderosas do que as antigas áreas metropolitanas – embora pagando bem menos à ‘aristocracia de trabalhadores’ nessas pátria-mãe, de modo a obter seu apoio para suas polítcas imperialistas. A longo prazo, porém, os próprios países metropolitanos, segundo Lenine, iriam entrar ‘em decadência’ (…)”. In: Idem, ibidem, p. 297.

[42] Contudo, afirmar, conseqüentemente, independência e soberania, já seria efeito não necessariamente interligado.

[43] Idem, p. 299.

[44] Talvez, com fator psicológico de intrínseca dependência.

[45] Lenine, estudou uma nova etapa do capitalismo, a qual denominou  de imperialismo, que nada mais é do que a dominação e exploração direta pela mãe-pátria nos territórios dominados (colonizados). HARNECKER e URIBE, ao estudarem o tema, distinguem traços marcados por Lenine quanto as seguintes fases: “a) aparecimento de monopólios; b) aparecimento do capital financeiro; c) exportação de capitais; d) formação de monopólios internacionais; e) luta constante pela partilha do mundo entre as grandes potências.” In: Imperialismo e Dependência, p. 21.

[46] Ver PETRAS, James. Neoliberalismo: América Latina, Estados Unidos e Europa, p. 17.

[47] GOULARTE, Nivaldo A. Independência ou Morte? A emancipação política e a origem da dívida externa. In: Brasil 500 anos: desconstruindo o mito, p. 32-33.

[48] Idem, ibidem.

[49] VIDAL, José Walter Bautista. De Estado servil à nação soberana, p. 34.

[50] Idem, p. 299.

[51] Idem, ibidem.

[52] Idem, p. 301.

[53] Idem, ibidem.

[54] Que nomina de “new left”.

[55] Idem, p. 303.

[56] Idem, ibidem.

[57] LANDES, David S. A riqueza e a pobreza das nações, p. 370.

[58] Idem, p. 304.

[59] Idem, ibidem.

[60] Idem, p. 304/306.

[61] Idem, p. 306.

[62] IANNI, Octávio. Teorias da Globalização, p. 81-82.

[63] Idem, ibidem.

[64] Pois as relações internacionais são marcadas pela força e jogo conflitante do poder.

[65] WOLKMER, Antônio Carlos. Para uma nova ordem jurídica internacional. In: CAUBET, Christian Guy. O Brasil e a dependência externa, p. 130

[66] Jaguaribe já nos caracterizou que “a assimetria estrutural do sistema intra-imperial, fundada na absoluta superioridade econômico-tecnológica e político-militar dos Estados Unidos, como país, e de suas elites dirigentes, como titulares de múltiplos papéis internacionais, assegura, de várias formas, o privilegiamento dos interesses americanos, públicos e privados, nos seus inter-relacionamentos internacionais” (Leitura: Autonomia e Hegemonia. In: ARON et al, Raymond. Curso de Introdução às Relações Internacionais, p. 145).  E Petras anuncia que “o novo imperialismo tenta reforçar sua posição global em declínio, através de uma exploração mais intensa das economias latinas. No processo, estabeleceu dois novos veículos para conter distúrbios: uma ideologia e uma rede organizacional. A ideologia da “globalização” e a promoção das ONGs não-lucrativas. A primeira serve para mistificar os intelectuais, levando-os à submissão diante da Inevitável Onda do Futuro; a segunda fornece aos intelectuais os meios para desmantelar os sistemas nacionais do bem-estar social’ (In: PETRAS, James. Neoliberalismo: América Latina, Estados Unidos e Europa, p. 172).

[67] ALMEIDA, Cândido Antônio Mendes de. Perspectiva atual da América Latina, p. 10-11.


Informações Sobre os Autores

Tânia Mota

Mestre em Direito e Relações Internacionais (UFSC); Professora nos Cursos de Direito e Administração/Comércio Exterior da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC); Coordenadora de Relações Internacionais da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC).

Fernando Kinoshita

Doutor em Direito Internacional e Comunitário pela Universidad Pontificia Comillas, Espanha; Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina; Pesquisador do CNPq e CAPES; Consultor em Direito Público Interno e Internacional, Cooperação e Negócios Internacionais.


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