Introdução
“Todos temos o direito de nos rebelar
contra qualquer espécie de coerção e abuso de poder, em qualquer instância em
que se manifestem: nossa arma chama-se Constituição. Ela é a resposta à
exigência também de Montesquieu, há mais de dois séculos: ‘Para que não se
possa abusar do poder, é preciso que, pela disposição das coisas, o poder freie
o poder’”. (Paulo Bonavides)1.
No momento em que se deflagrava o
processo de elaboração da nova Carta Magna, que viria a ser denominada
carinhosamente pelo povo brasileiro de Constituição Cidadã, o Presidente
da Assembléia Nacional Constituinte, ULYSSES GUIMARÃES, no discurso que
inaugurou a Sessão de Abertura dos trabalhos daquela Assembléia, assim se
pronunciava: “(…) Não podemos submeter o nosso destino aos que buscam
contê-lo, impedindo-nos de fabricar instrumentos modernos e de promover, com a
nossa própria inteligência, o seu desenvolvimento. Concluíam os gregos, naquele
esplêndido Século V antes de Cristo, dando origem à concepção ocidental da Lei,
que ‘o homem é a medida de todas as coisas’. Retorno assim à minha preocupação
original. É para o homem, na fugacidade de sua vida, mas na grandeza de sua
singularidade no universo, que devem voltar-se as instituições da sociedade”. 2
Com efeito, a Constituição é o
instrumento de garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana, sagrando em
seu texto a liberdade, a igualdade, a dignidade, além de uma vasta gama de
preceitos fundamentais, consolidados em regras e princípios, que apontam
o homem como “a medida de todas as coisas”.
E para garantir esse Estado Democrático
de Direito, onde o respeito à pessoa humana seja uma tônica vibrante, faz-se
necessário dotar a nação de mecanismos de controle, capazes de rechaçar abusos,
coibir arbitrariedades e assegurar os direitos fundamentais do homem, fazendo
valer a vontade da Constituição, realizadora do bem comum, mesmo que em
detrimento de eventuais interesses egoísticos de uns poucos. 3
JOSÉ ALFREDO DE OLIVEIRA BARACHO, ao
tratar dos direitos fundamentais e sua consolidação no sistema constitucional, leciona:
“Mostra Pietro Virga
que o Estado de direito, em contraposição a outros tipos de Estado, como o
absoluto, tem a necessidade de reconhecer aos cidadãos os direitos de liberdade
ou direitos fundamentais, que constituem salvaguarda contra o abuso do poder
estatal; esses direitos consubstanciam o primeiro núcleo do direito público
subjetivo, a cuja elaboração teórica segue a doutrina publicística.
Tendo em vista o grande movimento político contrário ao sistema absolutista, os
direitos fundamentais, na sua primeira elaboração, prendem-se à concepção
individualista da liberdade no Estado, característica da contraposição
Estado-indivíduo. Posteriormente, os direitos fundamentais passam a ter um
conteúdo social, através da introdução, ao lado dos tradicionais direitos
fundamentais individualistas, dos denominados direitos sociais, referentes ao
trabalho, assistência e atividade econômica. Surge um nova
interpretação do velho direito fundamental, que passa a atender às novas
exigências sociais.” 4
O Professor J.J.GOMES CANOTILHO,
discorrendo sobre a fiscalização da Constituição, pontifica que “a instituição
da fiscalização judicial da constitucionalidade das leis e demais actos normativos do Estado constitui, nos modernos Estados
constitucionais democráticos, um dos mais relevantes instrumentos de controlo
do cumprimento e observância das normas constitucionais.” 5
O sistema positivo de controle da
constitucionalidade no Brasil acolheu o método de controle pelo Judiciário. Ao contrário do que se verifica no ordenamento jurídico alemão,
onde o recurso constitucional é destinado exclusivamente à proteção dos
direitos e garantias fundamentais, no Brasil, o controle da constitucionalidade
dá-se incidenter tantum
nas instâncias inferiores e em grau de recurso extraordinário, pelo Supremo
Tribunal Federal, quando a decisão recorrida submetida a sua apreciação
contrariar dispositivo da Constituição, declarar a inconstitucionalidade de
tratado ou lei federal, ou julgar válida lei ou ato do governo local contestado
em face da Constituição (C.F.: art. 102, III).
Guardião da Constituição, o Supremo
Tribunal Federal mereceu do Professor MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO as
seguintes considerações: “É ele o supremo aplicador da lei e, portanto, o mais
alto servidor da justiça. Cabe-lhe assegurar rigorosamente a supremacia da
Constituição, como fundamento da ordem jurídica”. 6
Para dar cumprimento a esse mister de
zelar pela Constituição, foram previstos diversos mecanismos de controle,
destinados a conferir maior efetividade às previsões constitucionais, como a
Ação Direta de Inconstitucionalidade, a Ação Declaratória de
Constitucionalidade, o Habeas Corpus, o
Habeas Data, o Mandado de Segurança coletivo e o
individual, a Ação Popular e o Mandado de Injunção.
Conforme observa MARIA HELENA DINIZ, em
seu sempre esclarecedor magistério, “A supremacia da Constituição se
justificaria para manter a estabilidade social, bem como a imutabilidade
relativa de seus preceitos, daí haver uma entidade encarregada da ‘guarda da
Constituição’, para preservar sua essência e os princípios jurídicos. O órgão
jurisdicional tem por função primacial controlar a constitucionalidade das leis
verificando a correspondência do ato normativo diante do texto constitucional.
O controle da constitucionalidade significa impedir a subsistência da eficácia
da norma contrária à Constituição, pressupondo, necessariamente, a idéia de
supremacia constitucional, pois na existência de um escalonamento normativo,
onde é a Constituição a norma-origem, encontra o legislador seu limite, devendo
obedecer à forma prevista e ao conteúdo anteposto. Por isso, ato normativo
contrário ao texto constitucional será considerado presumidamente
constitucional até que por meio de mecanismos previstos constitucionalmente se
declare sua inconstitucionalidade e, conseqüentemente, a retirada de sua
eficácia, ou executoriedade.” 7
Por outro lado, percebe-se que o
controle da constitucionalidade se opera através de um sistema pluralista, que
prevê diversos tipos de mecanismos constitucionais, diferenciados pela espécie
de ação direcionada a cada situação de ofensa aos postulados fundamentais ou ao
texto constitucional.
Os sistemas de controle da
constitucionalidade são apresentados por LUIZ HENRIQUE CAVALCANTI MÉLEGA com
caráter orgânico dúplice, a saber: sistema concreto (ou difuso) e sistema abstrato (ou concentrado), assim definidos: “Por sistema
concreto compreende-se aquele em que o poder de controle é outorgado a todos os
órgãos judiciários de um ordenamento jurídico, enquanto que, por sistema
abstrato entende-se aquele no qual o referido poder se concentra em um único
órgão judiciário. No direito brasileiro coexistem ambos os sistemas, sendo que
ao Supremo Tribunal Federal compete, precipuamente, a guarda da Constituição”. 8
OSMIR ANTONIO GLOBEKNER presta valiosa
contribuição ao entendimento dessa diferenciação, quando elucida: “O controle
incidental possui escopo bastante diverso do visado pelo controle concentrado. Aquele objetiva a defesa de direitos subjetivos; este,
precipuamente a defesa do ordenamento jurídico objetivo. O controle incidental,
de inspiração norte-americana é, ali, exclusivo, combinando os dois escopos, em
virtude e decorrência do stare decisis. Não é esse o nosso caso. Daí, a necessidade da
inserção do controle direto, configurando o nosso sistema misto de controle.” 9
Esse sistema de controle, por sua vez,
tem como marca a não existência do denominado “efeito vinculante”,
como resultado das decisões do Supremo Tribunal Federal, no âmbito recursal, a
exemplo dos recursos ordinário e extraordinário, cuja competência é atribuída
àquela Corte.
Sobre essa realidade, que conduz a um
abarrotamento do Supremo pelo número elevado de processos que lhe são
dirigidos, gerando uma indesejável transferência de casos não solucionados,
para os anos seguintes, elevando o volume de trabalho residual de nosso
Tribunal Maior, trazemos a lume a observação crítica de CARLOS ROBERTO SIQUEIRA
CASTRO, quando aduz: “Releva assinalar, nesse específico
campo de questões, a imprevidência do legislador constituinte de 1988, que não
albergou o efeito vinculante recomendável e
atribuível, desde logo, aos acórdãos do Tribunal de cúpula da Justiça
brasileira, quando proclamatório da
inconstitucionalidade ou da constitucionalidade das leis em sede de recurso
ordinário ou extraordinário, ou seja, no exercício da jurisdição constitucional
difusa. Tivéssemos adotado o regime de stare
decisis para os arestos de tal natureza
prolatados pela Suprema Corte, não se teria de aguardar a sempre demorada e
incerta suspensão, pelo Senado Federal, da executoriedade
das normas declaradas incondizentes com a
Constituição no exercício de sua competência recursal…” 10
Com efeito, o Ministro MARCO AURÉLIO
MELO adverte, com extremada preocupação, que o Judiciário, ante a sucessiva e
desenfreada interposição de recursos infundados, com escopo protelatório, está
à beira de um colapso, se é que já não o podemos proclamar. Segundo o notável
jurista, “é inimaginável que se chegue em um só ano
judiciário, como ocorrerá no em curso (2000), à distribuição de mais de 80.000
processos no Supremo Tribunal Federal.” 11
Como mais recente figura auxiliar do
controle de constitucionalidade, que ora principia a tomar corpo e substrato em
nosso ordenamento jurídico, está a argüição de
descumprimento de preceito fundamental, prevista no artigo 102, § 1o,
da Constituição Federal, constituindo nova atribuição do Supremo Tribunal
Federal, que poderá, em razão do efeito vinculante
atribuído pela lei supletiva, contribuir para o esvaziamento dos processos sob
sua responsabilidade, caso não venha a mostrar-se como apenas uma nova
incumbência, avolumando ainda mais o já excessivo número de processos postos a
julgamento.
No presente trabalho
pretendemos avaliar a significação do termo “preceito fundamental” no
corpo do § 1o do artigo 102 da Constituição, como elemento
justificador do cabimento da argüição de descumprimento de preceito
fundamental, ali versada.
Localização constitucional da argüição
de descumprimento
A Constituição Federal de 1988 trazia
expressa, no parágrafo único do artigo 102, a seguinte previsão: “A argüição de
descumprimento de preceito fundamental decorrente desta Constituição será
apreciada pelo Supremo Tribunal, na forma da lei”.
Sem que houvesse o legislador
infraconstitucional, até então, atendido ao comando constitucional que exigia
regulação por lei, revelando seu caráter de norma constitucional de eficácia
limitada, surgiu, em 1993, a
Emenda Constitucional n.º 03, que acrescentou novo
parágrafo àquele artigo, inseriu vírgulas no parágrafo único e
transformou-o em § 1.º, ficando o artigo com a seguinte redação:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal
Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (…)
§1o. A argüição de
descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será
apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.
(…)
Foi mantida pela Emenda, como se vê, a natureza do dispositivo, conservando-se como norma de
eficácia limitada e pendente de regulamentação por lei ordinária. 12
Tanto era assim, que o Supremo Tribunal
Federal rejeitava processar argüições de descumprimento de preceito
fundamental, em razão da inexistência de lei regulamentadora,
exigida pelo texto constitucional, conforme se pode inferir da ementa abaixo
transcrita:
101157 – JCF.102.1
ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL: ART. 102, § 1º, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 – DECRETO ESTADUAL DE INTERVENÇÃO EM MUNICÍPIO –
ARTS. 4º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CC E ART. 126 DO CPC – 1. O § 1º do art. 102
da Constituição Federal de 1988 é bastante claro, ao dispor: “a argüição
de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será
apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei”. 2. Vale dizer,
enquanto não houver lei, estabelecendo a forma pela qual será apreciada a
argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente da Constituição,
o STF não pode apreciá-la. 3. Até porque sua função precípua é de guarda da
Constituição (art. 102, caput). E é esta que exige Lei para que sua missão seja
exercida em casos como esse. Em outras palavras: trata-se de competência cujo
exercício ainda depende de Lei. 4. Também não compete ao STF elaborar Lei a
respeito, pois essa é missão do Poder Legislativo (arts.
48 e seguintes da CF). 5. E nem se trata aqui de Mandado de Injunção, mediante
o qual se pretenda compelir o Congresso Nacional a elaborar a Lei de que trata
o § 1º do art. 102, se é que se pode sustentar o cabimento dessa espécie de
ação, com base no art. 5º, inciso LXXI, visando a tal resultado, não estando,
porém, sub judice, no
feito, essa questão. 6. Não incide, no caso, o disposto no art. 4º da Lei de
Introdução ao Código Civil, segundo o qual “quando a lei for omissa, o
Juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios
gerais de direito, para resolver lide “inter
partes”. Tal norma não se sobrepõe à constitucional, que, para a argüição
de descumprimento de preceito fundamental dela decorrente, perante o STF, exige
Lei formal, não autorizando, à sua falta, a aplicação da analogia, dos costumes
e dos princípios gerais de direito”. 8. De resto, para se insurgir contra
o Decreto estadual de intervenção no Município, tem
este os meios próprios de impugnação, que, naturalmente, não podem ser
sugeridos pelo STF. (STF – AgRg
em Petição 1.140-7 – TO – Plenário – Rel. Min. Sydney Sanches – DJU 31.05.1996’- in Juris
Síntese Millennium – CD-ROM)
A resposta legislativa só veio a lume
em dezembro de 1999, através da Lei 9.882, que dispôs sobre o processo e
julgamento da ADPF.
Por seu turno, a Lei 9.882/99 foi
objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIn n.º 2.231-8, ajuizada pelo Conselho Federal da
Ordem dos Advogados do Brasil, perante o Supremo Tribunal Federal.
Referida ação ainda pendia de
julgamento pelo STF, quando da conclusão deste artigo, em 02/05/2001. 13
O preceito fundamental como objeto de
tutela da argüição de descumprimento
Não se afigura nada fácil a delimitação da esfera de abrangência do termo “preceito
fundamental”. O que se constata na doutrina, aliás, é uma total ausência de
uniformidade quanto ao entendimento do que seja preceito fundamental e,
especialmente, quanto à delimitação de quais preceitos seriam de tal relevância
que pudessem justificar a interposição da argüição.
MARIA GARCIA oferece uma interpretação sui generis, que
julgamos deva ser primeiramente destacada, quando evidencia a acepção
semântica da norma constitucional em sua redação literal, que assim restou
lançada no aludido § 1o do artigo 102: “descumprimento de preceito
fundamental, decorrente desta Constituição…”.
Para a autora, “o termo decorrente (decursivo, derivado, conseqüente, segundo o Dicionário
Aurélio) faz concluir, primeiramente, pela possibilidade de localização do
preceito externamente à Constituição. Porquanto, se é decorrente da Constituição
não deverá estar, necessariamente, contido na Constituição. Não
expressamente. E, neste particular, obrigatória se torna a lembrança do
disposto no § 2o do art. 5o, o qual admite a existência
de ‘outros direitos e garantias’, além daqueles expressos na
Constituição, ‘decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados’
(ou dos tratados internacionais firmados)”. 14
Esta interpretação conta parcialmente
com o aval de SÉRGIO RESENDE DE BARROS, quando pondera que “o que se tem em
mente proteger – e isto está claro no texto constitucional – é preceito
fundamental decorrente desta Constituição, o que é bem mais amplo –
e, portanto, diferente – do que preceito fundamental ou preceito
constitucional, mesmo se tomando esses dois últimos termos como sinônimos.
Isso porque um preceito que decorre da Constituição não precisa,
necessariamente, nela ser visto ou estar previsto, mas pode ser ou estar
simplesmente implícito.” 15
E arremata o autor, usando do alerta
tantas vezes repetido pela Professora REGINA MARIA MACEDO NERY FERRARI, nas
versáteis aulas que nos foram ministradas no curso de mestrado: “não há
palavras inúteis na Constituição!”.
A maioria dos autores, no entanto, não
enfoca a questão sob esse prisma. Preceitos fundamentais, decorrentes da
Constituição, segundo eles, não estariam situados no exterior da Carta, mas em
seu bojo.
Desta forma, são apresentados como
preceitos fundamentais os direitos fundamentais enunciados no artigo 5o,
bem como as denominadas “cláusulas pétreas”, estabelecidas no § 4o
do artigo 60, todos da Constituição. 16
Outros preceitos orientadores, na
condição de princípios constitucionais e regras constitucionais, são igualmente
assinalados como justificadores da argüição em tela.
Nem aqui, porém, há uniformidade.
Quando se propõem a identificar quais preceitos fundamentais estariam sendo
apontados pela diretriz constitucional como passíveis de constituir objeto da
argüição de que trata o § 1o do artigo 102, não demonstram
convergência de opiniões, senão vejamos.
LUIZ HENRIQUE CAVANCANTI MÉLEGA, após
discorrer sobre as diferenças substanciais entre princípios e regras
constitucionais, assevera ser possível compreender por preceito fundamental,
“tanto os princípios fundamentais, como as regras de direito fundamentais
inseridas na Carta Magna. Os conceitos daqueles e dessas, que a seguir vão
lançados são da pena do Prof. J. J. GOMES CANOTILHO: ‘Consideram-se princípios
jurídicos fundamentais os princípios historicamente objectivados
e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma
recepção expressa ou implícita no texto constitucional’ (Obr.
Cit., pág. 1090).
‘Designam-se por normas de direitos fundamentais todos os preceitos
constitucionais destinados ao reconhecimento, garantia ou conformação
constitutiva de direitos fundamentais (cfr. CRP, art.
24o e ss.).’(Obr. Cit.,
pág. 1096)“. 17
Com tal identificação, o autor passa a
sustentar, com base na doutrina, a defesa de um sistema de valores, propondo
uma concepção axiológica da Constituição, em face do que, aparentemente, nem
toda norma constitucional seria passível de ser denominada preceito
fundamental.
Para DANIEL SARMENTO, “embora saiba-se que, do ponto de vista jurídico-formal, inexiste
hierarquia entre as normas da Constituição, é certo que algumas são mais
relevantes do que outras, desfrutando de primazia, na ordem de valores em que
se esteia o direito positivo. Assim, conforme averberam
Celso Bastos e Aléxis Galiás de Souza Vargas a
propósito da ADPF, ‘…não se trata de fiscalizar a lesão a qualquer
dispositivo da que é, sem dúvida, a maior Constituição do mundo, mas
tão-somente aos grandes princípios e regras basilares deste diploma’.” 18
Ao procurar delinear os preceitos
fundamentais, ANDRÉ RAMOS TAVARES manifesta-se no mesmo diapasão, quando
afirma: “Ademais, já que se trata de proteger, pela argüição, os preceitos
constitucionais fundamentais, e não meros preceitos constitucionais,
importa averiguar e controlar de perto o maior número de atos que os infrinjam,
realizando, dessa sorte, uma fiscalização mais eficiente em seu raio de ação.
Daí poder-se realizar, pela argüição, o controle dos atos normativos editados
anteriormente à atual Constituição, dos atos normativos municipais e de todos
os demais atos estatais, como se verá.” 19 (grifos nossos).
E continua, ao tratar diretamente da
questão do significado de fundamentalidade dos
preceitos, dizendo que “É preciso afastar, de imediato, a possibilidade de que
‘preceito fundamental’ seja toda e qualquer norma contida na Lei Fundamental.
Se teoricamente essa construção é admissível, o mesmo não ocorre quanto ao
vigente sistema constitucional, por motivos que atendem à lógica.” 20
No mesmo sentido era a posição de
THOMAS DA ROSA DE BUSTAMANTE, que sustentava que a argüição de descumprimento
de preceito fundamental não poderia ter por finalidade o controle de qualquer
norma insculpida na Constituição, mas apenas as
normas de hierarquia axiológica superior, tais como os princípios estruturantes do Estado Democrático de Direito. Em momento
posterior, o autor revê sua posição, dizendo:
Analisando melhor o tema, volto atrás
em algumas das minhas afirmações, para admitir a fiscalização de qualquer norma
constitucional, seja expressa ou implícita, através da argüição de
descumprimento de preceito fundamental, tal como prevê em linhas gerais a Lei n.º 9.882/99. Com efeito, a norma constitucional
regulamentada permite tal interpretação, pois, no jogo de palavras que veicula,
de certo modo define como “preceito fundamental” aquele
“decorrente da Constituição”. Veja-se que a redação do dispositivo
constitucional se refere a “preceito fundamental,
decorrente desta Constituição”, de modo que abre a possibilidade de
interpretação no sentido defendido pelos autores da Lei 9.882/99. É
perfeitamente sustentável, portanto, a utilização da argüição de descumprimento
de preceito fundamental para curar a violação de qualquer norma jurídica expressa
ou implicitamente consagrada no texto da Constituição da República, ainda mais
porque a ação destina-se à correção de atos inconstitucionais, justificando
assim uma interpretação ampliativa quanto aos pressupostos. 21
Reconhecendo a ambigüidade e
indeterminação do dispositivo-matriz da argüição,
ELIVAL DA SILVA RAMOS assevera que “não se trata de prevenir ou reparar a
ofensa a todo e qualquer dispositivo constitucional e sim a ‘preceito
fundamental’”, parecendo concordar com a corrente doutrinária que diferencia o
caráter da fundamentalidade da acepção de sinônimo de
constitucionalidade, mas complementa dizendo: “a despeito de sua eficácia
limitada, não há que se admitir que cabe à legislação
ordinária precisar o sentido da expressão preceito fundamental. Em face
da larga faixa de incerteza e indeterminação que integra seu significado de
base, qualquer que fosse a orientação adotada em nível infraconstitucional,
sempre seria passível de contestação pelos operadores do sistema, mormente pelo
Supremo Tribunal Federal, a quem compete o julgamento da argüição”. 22
Por todos os posicionamentos trazidos à
análise, forçoso concluir que o tema não apresenta contornos de uniformidade,
nem dá mostras de estar-se encaminhando a um consenso doutrinário.
Oportuna, assim, a lição de INGO
WOLFGANG SARLET, quando aduz: “Especialmente no que diz respeito à argüição de
descumprimento de preceito fundamental, verifica-se, de plano, que a recente
regulamentação pelo legislador ordinário pouco contribuiu para a clarificação
dos contornos do instituto, inclusive quanto a seu objeto e finalidade, a
respeito dos quais nunca houve consenso e, a depender do que se vislumbra em
termos de produção doutrinária, dificilmente se logrará obter certa
uniformidade, ao menos não antes de que se venha a
sedimentar alguma orientação por parte do Supremo Tribunal Federal.” 23
Para esse autor, devem prevalecer as
posições que tenham como elemento comum “o fato de levarem a sério o termo fundamental,
salvaguardando, neste ponto, o espírito e a essência da Constituição, de tal
sorte que preceitos fundamentais poderão ser considerados todas as normas
constitucionais (ainda que não expressamente positivadas) enunciando princípios
e direitos fundamentais, evidentemente não restritos aos Títulos I e II da nossa
Carta Magna”.
24
Como situar, então, o conceito e a
abrangência do preceito fundamental, para fins de identificação do objeto da
argüição de descumprimento prevista na Constituição Federal, em seu artigo 102,
§ 1o?
Obviamente isso não se afigura tarefa
de fácil solução.
Os próprios integrantes da comissão de
juristas que deu gênese à Lei regulamentadora não são
unânimes quanto aos contornos e extensão do instituto.
Não bastasse isso, há que se considerar tais divergências de opinião como fruto de uma
realidade legislativa que afasta a norma de seu idealizador, tão logo
positivada no mundo jurídico. A lei, uma vez publicada, rompe os vínculos com
seu criador e assume vida própria. Valerá, portanto, o que diz a norma, se
válida e eficaz apresentar-se, independentemente do sentido que se lhe quis dar
quando da sua elaboração. Opera-se, portanto, uma ruptura entre o pensamento
manifestado pelo legislador e a descrição literal da norma, no momento em que
esta se faz operante, o que KARL LARENZ denomina de “teoria objectivista
da interpretação”. 25
Não nos propomos dar ao instituto da
argüição, muito menos ao termo “preceito fundamental”, qualquer definição
exaustiva. Isso seria insensato. Mais coerente será revelar o pensamento
doutrinário, suas vertentes e dissensões, e a opção que nos parece mais
acertada, para que o leitor formule, em meio a esta complexa gama de opiniões,
o entendimento que melhor se amolde ao seu próprio pensar jurídico.
Preceito, derivado do latim praeceptum, traduz a idéia de regra, linha de
conduta, diretriz, mandamento.
FRANCISCO DA SILVEIRA BUENO, citado por
LUIZ HENRIQUE CAVALCANTI MÉLEGA, conceitua: “Preceito – s.m.
Regra, conselho, mandamento, ordem, recomendação, máxima, provérbio, instrução,
ensinamento. Lat. Praeceptum”. 26
Segundo MARIA GARCIA, para quem a
legítima titularidade para o exercício dessa medida constitucional democrática
jamais poderia ser retirada do cidadão, “Preceito que significa
mandamento, ordenação, regra, norma de conduta, e que é também fundamento,
ou seja, ‘base ou razão em que se firmam as coisas ou em que se justificam as
ações’, na acepção mais comum, algo coordenado ao sistema constitucional,
embora não expresso na constituição” 27
Já o Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA,
quando analisa o dispositivo constitucional sob comento, conclui: “O §1º do
art. 102 contém uma disposição não muito bem redigida, tal como dizer ‘preceito
fundamental decorrente da Constituição’, quando deveria apenas falar em
‘preceito fundamental da Constituição’, mas isso não infirma nem mesmo
prejudica a relevância da norma, assim enunciada: a argüição de
descumprimento de preceito fundamental decorrente da Constituição será
apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. ‘Preceitos
fundamentais’ não é expressão sinônima de ‘princípios fundamentais’. É mais
ampla, abrange a estes e todas as prescrições que dão sentido básico ao regime
constitucional, como são, por exemplo, as que apontam para a autonomia dos
Estados, do Distrito Federal e especialmente as designativas de direitos e
garantias fundamentais (tít. II). 28
Não obstante a idéia de preceito
aproximar-se mais da natureza de regra do que de princípio,
preferimos abstermo-nos de ingressar nos meandros
dessa discussão, pois restou bastante claro dos excertos anteriormente
transcritos, que tanto um quanto outro estariam abrangidos
pelo vocábulo preceito fundamental.
Resta ao Supremo Tribunal Federal, na
apreciação das ações a serem intentadas, delinear o perfil e a extensão do que
possa ser entendido por preceito fundamental, já que tanto o constituinte
quanto o legislador ordinário trataram genericamente da matéria.
Muito convenientes, para tanto, a
indagação e a assertiva de WALTER CLÁUDIUS ROTHENBURG, assim formuladas: – “Fez
bem o constituinte em não estabelecer desde logo quais os preceitos que, por
serem fundamentais, poderiam ser tutelados pela argüição de descumprimento de
preceito fundamental? E o legislador, deveria tê-lo seguido? Sim, agiram ambos
com acerto: somente a situação concreta, no momento dado, permitiria uma
adequada configuração do descumprimento a preceito fundamental da Constituição.
Qualquer tentativa de prefiguração seria sempre parcial ou excessiva; e a
restrição seria agravada pela interpretação restritiva que um rol taxativo
recomenda.” 29
Esta última ponderação fala por si, ao
tempo que revela a complexidade do assunto. De nossa parte, preferimos a
concepção mais ampla, que conceda ao instituto da argüição de descumprimento de
preceito fundamental um espectro de aplicabilidade abrangente, capaz de
assegurar um controle efetivo da constitucionalidade, mesmo onde outras
medidas, a despeito de previstas, não lograram tal êxito, podendo ser cabível
tanto em situações de ameaça ou violação de qualquer preceito fundamental,
assim entendidos tanto aqueles de maior conteúdo axiológico, quanto todos os
demais previstos no bojo da Constituição e dela decorrentes, aqui incluindo-se os demais direitos e garantias decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais, agasalhados
pelo artigo 5o, § 2o.
Outras considerações relevantes sobre a
argüição de descumprimento de preceito fundamental
A indefinição conceitual que cerca a
argüição de descumprimento de preceito fundamental não se limita meramente ao
alcance do termo preceito fundamental. Vai muito além
disso.
Exemplo disso é a discussão que se
avoluma na doutrina e se desmembra em conseqüências relevantes, com respeito à
previsão do § 1º do artigo 4o, da Lei 9.882/99, quando estabelece
que “não será admitida argüição de descumprimento de preceito fundamental
quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.”
Pergunta-se, então, se este dispositivo
consagra o princípio da subsidiaridade, ou seja, a
argüição de descumprimento de preceito fundamental só será admitida em casos de
inaplicabilidade de qualquer outra medida constitucionalmente prevista? Se
afirmativa a resposta, isso não condenaria o processo de argüição à inutilidade
e inviabilidade prática, posto que sempre haverá um
mecanismo aplicável, de controle da constitucionalidade?
As opiniões aqui novamente se dividem.
LUIZ HENRIQUE CAVALCANTI MÉLEGA30,
ALEXANDRE DE MORAES (ob. cit., p. 27), DANIEL SARMENTO (ob.
cit., p.103), dentre outros, entendem que a medida é
de aplicação subsidiária, mas amenizam a previsão legal, a exemplo de GILMAR
FERREIRA MENDES, afirmando que ante a ausência de processos ordinários e
recursos extraordinários que não se mostrem aptos a solver a controvérsia
constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata, há que se entender
possível a utilização da argüição de descumprimento de preceito fundamental.
Já ANDRÉ RAMOS TAVARES vê na argüição
uma medida de cunho principal, que não possuiria caráter residual, mas que
poderia ser, inclusive, de relevância superior à ação direta de
inconstitucionalidade (ob. cit., p. 45). Segue-o nesse entendimento CELSO SEIXAS
RIBEIRO BASTOS, para quem o dispositivo, se aplicado em sua literalidade,
tornaria a medida de argüição totalmente inócua, praticamente sem possibilidade
de utilização. 31
Depreende-se de tais assertivas, que a
vingar a interpretação do § 1o, do artigo 4o, a argüição
de descumprimento de preceito fundamental destinar-se-ia apenas ao controle da
constitucionalidade em tese da lei municipal e do regulamento, hipóteses não
alcançadas pelas demais ações constitucionais, especialmente a ADIn e a ADC, já que, para todas
as demais situações hipotéticas de ofensa ao texto constitucional, caberá ação
ou recurso próprio.
Nesse caso, o instituto da argüição
seria desnecessário, bastando que o Supremo estendesse ao regulamento a
possibilidade de controle direto da constitucionalidade e a lei municipal
ficaria tal como se encontra, sujeita a revisão apenas em sede de recurso, sem
o controle abstrato.
Outro ponto relevante, que resulta da
redação dada à lei regulamentadora, é o efeito vinculante decorrente das decisões proferidas pelo Supremo
Tribunal Federal em sede de argüição (§ 3o do artigo 10, da Lei
9.882/99), ao qual nos referimos nas notas introdutórias deste trabalho.
GILMAR FERREIRA MENDES exemplificando o
alcance desse efeito, argumenta que, “se entendermos, como parece recomendável,
que o efeito vinculante abrange também os fundamentos
determinantes da decisão, poderemos dizer, com tranqüilidade, que não apenas a
lei objeto da declaração de inconstitucionalidade no município “A”, mas toda e
qualquer lei municipal de idêntico teor não mais poderão ser aplicadas”. 32
De acordo com REGINA MARIA MACEDO NERY
FERRARI, a norma municipal que contraria a Constituição Federal, não poderia
ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade nem perante o Supremo
Tribunal Federal, nem junto aos Tribunais de Justiça dos Estados, mas apenas em
sede de defesa. 33
Com efeito, não pode o Tribunal de
Justiça declarar a inconstitucionalidade de lei municipal em tese, frente à
Constituição da República, mesmo que a Constituição Estadual repita o
dispositivo da C.F. Cabe ao Tribunal de Justiça analisar tão-somente a
inconstitucionalidade da lei municipal frente à Constituição do Estado, já que,
se a lei for levada ao Supremo Tribunal Federal, em sede de recurso
extraordinário, este é que lhe apreciará a inconstitucionalidade em face da
Constituição Federal. Por ser esse julgamento definitivo, não poderia competir
ao Tribunal de Justiça.
Neste particular, importante repetir
que a argüição de descumprimento de preceito fundamental veio preencher uma
lacuna existente no ordenamento jurídico, que não permitia o controle abstrato
de constitucionalidade de lei municipal.
Não menos digna de nota é a previsão do
parágrafo único do artigo 7o, da Lei 9.882/99, que atrelou ao crivo
do Ministério Público as argüições que não tenha formulado, outorgando ao
Procurador-Geral da República um controle prévio da constitucionalidade.
Essa tendência fica bastante evidente
nas razões de veto, objeto da Mensagem n.º 1.807, de
03/12/1999 ((DOU 06.12.1999), encaminhada à mesa do Senado Federal. Em
relação ao artigo 2o, inciso II, que permitia a “qualquer
pessoa lesada ou ameaçada por ato do Poder Público” ingressar com o
processo de argüição, entendeu o Presidente da República que a admissão de um
acesso individual e irrestrito seria incompatível com o controle concentrado de
legitimidade dos atos estatais.
E quando vetou o § 2o, do
artigo 2o, que permitia representação ao STF contra o indeferimento
do pedido de argüição, asseverou:
A exigência de um juízo favorável do
Procurador-Geral da República acerca da relevância e da consistência da
fundamentação da representação (prevista no § 1º do artigo 2º) constitui um
mecanismo adequado para assegurar a legitimidade da argüição de descumprimento
de preceito fundamental. A legitimidade da exigência reside não só na
necessidade de resguardar a viabilidade funcional do Supremo Tribunal Federal –
por meio da indagação substancial acerca da relevância e da consistência das
questões a serem apreciadas – bem como em razão da inexistência de um direito
subjetivo a essa prestação jurisdicional.
Quer nos parecer que, com tal
disposição, fica reforçada a idéia de que o Procurador-Geral da República tenha
concentrado em suas mãos um poder demasiadamente excessivo, de selecionar, em
juízo preliminar de constitucionalidade, o que deve e o que não deve ser levado
à apreciação do Supremo Tribunal Federal.
A argüição de descumprimento de
preceito fundamental, conforme se depreende das considerações ora
tecidas, revela-se uma incógnita a ser desvendada na concretude
dos casos que forem submetidos ao Supremo Tribunal Federal, que na qualidade de
guardião da Constituição da República, dará os necessários delineamentos à
abrangência do termo “preceito fundamental”, definindo suas hipóteses de
aplicabilidade e seu caráter, principal ou subsidiário, no contexto dos
mecanismos de controle judicial da constitucionalidade.
Conclusão
Tanto a Constituição Federal, quanto a
Lei 9.882/99, que regulamentou seu artigo 102, § 1o, deixaram em
aberto a delimitação do que seja preceito fundamental, decorrente desta
Constituição.
Não há consenso na doutrina, quanto ao
significado dessa expressão. As controvérsias operam-se desde a localização
geográfica dos preceitos fundamentais decorrentes da Constituição, havendo quem
os entenda situados fora dela; outros em seu bojo; outros em ambos.
Da restrita concepção de preceito
fundamental como regra ou princípio de maior hierarquia, à ampla equiparação de
preceito fundamental a toda e qualquer norma constitucional ou decorrente da
Constituição, é certo que não se pode precisar com segurança qual a extensão
desse termo, enquanto o Supremo Tribunal Federal não se manifestar, no processo
de construção jurisprudencial, delineando a matéria.
Concluímos nossa análise com a
assertiva de DANIEL SARMENTO, para quem “o legislador agiu bem ao não arrolar
taxativamente quais, dentre os dispositivos constitucionais, devem ser
considerados como preceitos fundamentais. Ao valer-se de um conceito jurídico
indeterminado, a lei conferiu uma maleabilidade maior à jurisprudência, que
poderá acomodar com mais facilidade mudanças no mundo dos fatos, bem como a
interpretação evolutiva da Constituição. Caberá, ao Supremo Tribunal Federal,
definir tal conceito, sempre baseando-se na
consideração do dado axiológico subjacente ao ordenamento constitucional.” (Cf.
op. cit., p. 91).
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Notas
1 BONAVIDES, Paulo, ANDRADE, Paes de. História
constitucional do Brasil. 3. ed. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991, p.
483.
2 Cf. Paulo Bonavides, in op. cit., p.
834.
3 Não é sem
razão que KONRAD HESSE invoca o magistério de Burckhardt,
para tratar da força normativa da constituição e da preservação da vontade
constitucional, dizendo: “Como anotado por Walter Burckhardt,
aquilo que é identificado como vontade da Constituição ‘deve ser honestamente
preservado, mesmo que, para isso, tenhamos de renunciar a alguns benefícios, ou
até a algumas vantagens justas. Quem se mostra disposto a sacrificar um
interesse em favor da preservação de um princípio constitucional, fortalece o
respeito à Constituição e garante um bem da vida indispensável à essência do
Estado, mormente ao Estado democrático’. Aquele, que, ao contrário, não se
dispõe a esse sacrifício, ‘malbarata, pouco a pouco,
um capital que significa muito mais do que todas as vantagens angariadas,
e que, desperdiçado, não mais será recuperado’.” (HESSE, Konrad. A força
normativa da constituição. (Trad. de Gilmar
Ferreira Mendes). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, p. 22.)
4 BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria
geral da cidadania: a plenitude da cidadania e as garantias constitucionais e
processuais. São Paulo: Saraiva, 1995, p.6
5 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito
constitucional e teoria da Constituição 4. ed.,
Coimbra: Almedina, p. 861.
6 FERREIRA FILHO, Manoel
Gonçalves. Curso de direito constitucional.19.
ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 230.
7 DINIZ, Maria
Helena. Norma constitucional e seus efeitos. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 13-14.
8 MÉLEGA, Luiz Henrique
Cavalcanti. Argüição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF
– Art. 102, § 1o da C.F. Repertório IOB de Jurisprudência,
1a quinzena de março de 2001, n.º 05/2001,
Caderno 1, p. 142.
9 GLOBEKNER, Osmir
Antônio. O controle de constitucionalidade, em tese, de lei ou ato normativo
municipal frente à Constituição Federal. Revista Ibero-Americana de Direito
Público, V. III, Rio de Janeiro: América Jurídica, 2001, p. 234.
10 CASTRO,
Carlos Roberto Siqueira. Da declaração de inconstitucionalidade e seus
efeitos.. Revista Ibero-Americana de Direito Público, V.I,
Rio de Janeiro: América Jurídica, 2001, p. 22.
11 MELO, Marco
Aurélio. O Judiciário e a litigância de má-fé. Revista Ibero-Americana
de Direito Público, V.III, Rio de Janeiro: América Jurídica, 2001, p. 217.
12 Segundo JOSE AFONSO
DA SILVA, “A norma constitucional dependente de legislação também entra em
vigor na data prevista na constituição. Sua eficácia integral é que fica na
dependência da lei integrativa. A distinção não é acadêmica. Tem conseqüências
práticas de relevo. Pois tais normas, desde que entram em vigor, são aplicáveis
até onde possam, devendo notar-se que muitas delas são quase de eficácia plena,
interferindo o legislador ordinário tão-só para aperfeiçoamento de sua
aplicabilidade.” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas
constitucionais. 3. ed., São Paulo: Malheiros, 1999, p. 130).
13 Para aqueles que desejarem conhecer a
fundo a gênese da Lei 9.882/99, desde o nascimento da idéia primordial de
regulamentação da argüição de descumprimento de preceito fundamental, as
comissões constituídas e seus respectivos membros, bem assim o texto original
do Projeto de Lei de autoria da Deputada Sandra Starling,
do Anteprojeto de Lei da Comissão Celso Bastos e do substitutivo do Deputado Prisco Viana, aprovado pela Comissão de Constituição e
Justiça e e Redação da Câmara dos Deputados e que foi
referendado pelo Plenário da Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, tendo
sido submetido ao Presidente da República, que o sancionou em 3 de dezembro de
1999, recomendamos a leitura do artigo de lavra do Advogado-Geral
da União, Dr. GILMAR FERREIRA MENDES, intitulado Argüição de descumprimento
de preceito fundamental.(§ 1o do art. 102
da Constituição Federal), publicado no Site da revista eletrônica Jus Navigandi, na Internet: www.jus.com.br/doutrina/incinco1.htm
14 GARCIA, Maria. Argüição de
descumprimento: direito do cidadão. In Revista de Direito
Constitucional e Internacional, n.º 32, p. 99-106.
15 BARROS, Sérgio Resende de. O nó górdio do sistema misto. In Argüição de
descumprimento de preceito fundamental: análises à luz da Lei n.º 9.882/99. André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 180-197.
16 O artigo 60, § 4o,
assevera: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direito, secreto,
universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e
garantias individuais.”
17 MÉLEGA, Luiz Henrique
Cavalcanti. Argüição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF
– Art. 102, § 1o da C.F. Repertório IOB de Jurisprudência,
1a quinzena de março de 2001, n.º 05/2001,
Caderno 1, p. 140.
18 SARMENTO,
Daniel. Apontamentos sobre a argüição de descumprimento de preceito
fundamental. In Argüição de descumprimento de preceito fundamental:
análises à luz da Lei n.º 9.882/99. André Ramos
Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 91.
19 TAVARES, André Ramos. Argüição
de descumprimento de preceito constitucional fundamental: aspectos essenciais
do instituto na Constituição e na lei, In Argüição de descumprimento
de preceito fundamental: análises à luz da Lei n.º 9.882/99.
André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg, organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 42.
20 Cf. op. cit., p. 52.
21 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Notas
sobre a argüição de descumprimento de preceito fundamental. Texto publicado
na Internet, no Site: www.jus.com.br/doutrina/lei9882b.htm (capturado em
30/04/01).
22 RAMOS, Elival
da Silva. Argüição de descumprimento de preceito fundamental:delineamento
do instituto. In Argüição de descumprimento de preceito fundamental:
análises à luz da Lei n.º 9.882/99. André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001 , p. 122-123.
23 SARLET, Ingo
Wolfgang. Argüição de descumprimento de preceito fundamental:alguns
aspectos controversos. In Argüição de descumprimento de preceito
fundamental: análises à luz da Lei n.º 9.882/99. André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 150-171.
24 Cf. op. cit., p. 152, nota 6.
25 Segundo LARENZ, “a
teoria ‘objectivista’ da interpretação afirma não
apenas que a lei, uma vez promulgada pode, como qualquer palavra dita ou
escrita, ter para outros uma significação em que não pensava o seu autor – o
que seria um truísmo – , mas ainda que o juridicamente decisivo é, em lugar do
que pensou o autor da lei, uma significação ‘objectiva’,
independente dele e imanente à mesma lei. Com o que se sustenta, antes de tudo,
que há uma oposição fundamental entre a interpretação jurídica e a
histórico-filosófica. Enquanto esta procura descobrir nas palavras o sentido
que o autor lhes ligou, o fim da interpretação jurídica será patentear o
sentido racional da lei olhada como um ‘organismo espiritual’, no dizer de Kohler. As opiniões e intenções subjectivas
do legislador, dos redactores da lei ou das pessoas
singulares que intervieram na legislação, não têm relevo; a lei é ‘mais
racional’ do que o seu autor e, uma vez vigente, vale por si só.” (Cf. LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 5. ed., 1983.
(Tradução de José Lamego, revisão de Ana
Freitas). 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gilbenkian, p. 36.
26 BUENO, Francisco da
Silveira. Grande Dicionário Etimológico – Prosódico da Língua Portuguesa. São
Paulo: Brasília Limitada, 1974, v. 6o, p. 3162, apud MÉLEGA,
Luiz Henrique Cavalcanti, op. cit.,
p. 141.
27 Cf. op. cit, p. 103.
28 SILVA, José Afonso
da. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed.,
São Paulo: Malheiros, 1996, p. 530.
29 ROTHENBURG, Walter Claudius. Argüição de
descumprimento de preceito fundamental. In Argüição de
descumprimento de preceito fundamental: análises à luz da Lei n.º 9.882/99. André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 198-238.
30 Luiz Henrique Cavalcanti Mélega situa a ADPF no campo da subsidiariedade,
dizendo: “Assim, pode-se ponderar que a finalidade do novel instituto reside em
suprir as deficiências ou fraquezas do sistema abstrato, atuando
subsidiariamente devido à ausência de outro instituto que possa remover, com
eficácia, o obstáculo decorrente do descumprimento de preceito fundamental.”
(MÉLEGA, Luiz Henique Cavalcanti. Argüição
de descumprimento de preceito fundamental – ADPF – Art. 102,§
1o da C.F. In Repertório IOB de Jurisprudência, 1a
quinzena de março de 2001 – n.º 5/2001 – Caderno 1 – p. 142.)
31 BASTOS, Celso Seixas Ribeiro. Argüição
de descumprimento de preceito fundamental e legislação regulamentadora.
In Argüição de descumprimento de preceito fundamental: análises à luz da
Lei n.º 9.882/99. André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 77-84.
32 MENDES, Gilmar Ferreira. Argüição
de descumprimento de preceito fundamenta: parâmetro de controle e objeto.
In Argüição de descumprimento de preceito fundamental: análises à luz
da Lei n.º 9.882/99. André Ramos Tavares e Walter Cláudius Rothenburg,
organizadores. São Paulo: Atlas, 2001, p. 142.
33 FERRARI, Regina Maria
Macedo Ney. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 4. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 270-271.
Advogado no Paraná
Especialista em Administração Universitária pela UEM
Professor de Direito Administrativo na FECILCAM
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