A exigência do exercício de atividade rural no momento do requerimento administrativo, como requisito necessário para concessão da aposentadoria por idade nos termos do §3º do artigo 48 da Lei 8.213/91

Resumo: É cada vez mais crescente o número de idosos trabalhadores urbanos que desenvolveram atividade rurícola em algum momento da sua vida e que tem seu benefício de aposentadoria por idade negado devido a exigência do INSS de qualidade de trabalhador Rural no momento do requerimento, como condição para concessão do Benefício de aposentadoria por idade regulamentada pelo §3º do art. 48 da lei 8.213/91, conhecida no meio previdenciário por aposentadoria hibrida. Diante disso, nos propomos, sem a pretensão de esgotar o tema, analisar, num primeiro momento, a migração para o meio urbano do trabalhador Rural enquadrado como segurado especial que passa a desenvolver, já com idade avançada, atividade laboral tipicamente urbana; os efeitos jurídicos quando do requerimento administrativo, junto ao INSS, da aposentadoria por idade objetivando a cumulação do tempo de exercício das duas atividades e, finalmente, fazendo um paralelo entre o entendimento do INSS, legislação infraconstitucional e a Carta Magna de 1988, a fim de demonstrarmos a inconsistência jurídica da imposição do INSS de exercício da atividade Rural no momento do requerimento administrativo. Para tanto, faz necessário também analisarmos as modalidades de aposentadorias por idade tipicamente Rural, aposentadoria Urbana e a novidade trazida pela lei 11.718/08, conhecida como aposentadoria híbrida, ou seja, uma mescla entre as duas modalidades anteriores.

Palavras-chave: Previdenciário, tempo de contribuição, Segurado Especial, Aposentadoria por Idade Rural e Urbana, Aposentadoria Hibrida.

Sumário: A migração do trabalhador rural. Da aposentadoria rural art. 48 2 da lei 8.213/91. Da aposentadoria por idade urbana. Da aposentadoria híbrida. Princípio da equivalência e uniformidade entre benefícios e serviços à população urbana e rural. Conclusão. Referências.

A MIGRAÇÃO DO TRABALHADOR RURAL

É praxe, principalmente nas nações em desenvolvimento, a migração em massa da população rural para as cidades em busca de melhor qualidade de vida, empregabilidade, estudos para os filhos, enfim, condições de vida que não são oportunizadas no campo aos camponeses mais pobres.

Tal movimento, conhecido por Êxodo Rural, é determinado por uma série de fatores que influenciam na vida dos camponeses, dentre eles as alterações climáticas, como a seca, por exemplo, políticas públicas mal geridas e também pela mecanização do processo de agricultura e com adoção do novo modelo padrão tecnológico baseado em insumos agrícolas (VANDERLINDE, 2005).

É certo que tal movimento teve seu ápice à décadas atrás, mas é comum presenciar famílias inteiras migrando para as cidades fugindo da miséria e em busca de uma vida melhor.

Podemos numerar consequências variadas que surgem desta migração e quase sempre são negativas, que influenciam inclusive no momento do requerimento de sua aposentadoria caso o pretenso candidato à aposentadoria por idade não comprove o cumprimento da carência exigida para trabalhador Rural ou trabalhador urbano, dependendo do computo dos períodos de ambas as atividades.

DA APOSENTADORIA RURAL (ART. 48 §2º DA LEI 8.213/91)

A aposentadoria rural nos termos do 48 §2º DA LEI 8.213/91 é devida ao trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido que consiste em 180 contribuições (art. 25, II, da lei 8.213/91.

Tal modalidade é exclusiva ao trabalhador rural qualificado como segurado especial, que desenvolva sua atividade individualmente ou em regime de economia familiar, em área não superior a 04 módulos fiscais, pescador artesanal profissional; bem como o cônjuge e filho menor de 16 anos ou equiparado que trabalhem no grupo familiar (Art. 11, VII, alínea “a” e “b”).

Nesta modalidade a idade do segurado no momento do requerimento deverá ser no mínimo 60 anos para homem e 55 para mulher (art. 48, §2º da lei 8.213/91).

Vejamos que o pequeno produtor e equiparados enquadrados como segurado especial, e que migraram para a cidade, não terão concedido seu benefício nesta modalidade, ainda que cumpram o requisito idade, pois deixaram de ser segurado especial.

DA APOSENTADORIA POR IDADE URBANA

Para ter concedido seu benefício por idade, o Requerente deverá comprovar perante o INSS possuir idade mínima de 65 anos se homem, e 60 anos se mulher; além de contar com 180 contribuições.

No caso dos segurados especiais que deixaram de enquadrar nesta categoria ao passarem exercer atividade urbana, quando completarem a idade exigida, deverão contar com 180 contribuições vertidas para o sistema na qualidade de trabalhador urbano não podendo, para isso, segundo o INSS, computar seu tempo de segurado especial e assim completar a carência exigida.

DA APOSENTADORIA HIBIRDA

Prevista pelo §3º do art. 48 da lei 8.213/91, o qual foi incluído pela lei 11.718/08, esta modalidade de aposentadoria, conhecida também como mista, nasceu da mescla dos requisitos exigidos para aposentadoria rural e urbana. Vejamos:

“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.    (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)

§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)

§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)

§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social.”

Para ter concedido seu benefício de aposentadoria por idade sob o prisma do parágrafo 3º do art. 48 da lei 8.213/91, o segurado que completar a idade de 65 anos se homem, e 60 anos se mulher, farão jus à concessão do benefício, podendo utilizar-se de períodos de contribuição sob outras categorias de segurado para fins de carência.

Entretanto, pela sistemática atual do INSS terá direito ao benefício somente o trabalhador Rural, ou seja, pelo INSS aquele trabalhador rural que migrou do campo rumo à cidade e ali passou a desenvolver atividade urbana até completar sua idade para aposentadoria não terá direito à aplicação do §3º do art. 48 da lei 8.213/91, afrontando cabalmente o princípio constitucional da equivalência e uniformidade entre benefícios e serviços à população urbana e rural.

PRINCÍPIO DA EQUIVALÊNCIA E UNIFORMIDADE ENTRE BENEFÍCIOS E SERVIÇOS À POPULAÇÃO URBANA E RURAL

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988, conhecida como “Constituição Cidadã” por trazer em seu bojo uma complexidade de garantias individuais, dentre as quais podemos citar a inviolabilidade de direitos e liberdades básicas como instituiu uma vastidão de preceitos progressistas, como a igualdade de gêneros, a criminalização do racismo, a proibição total da tortura e direitos sociais como educação, trabalho e saúde para todos. (https://www.infoescola.com/direito/constituicao-de-1988/).

Também podemos citar dentre tais garantias o “Princípio da Equivalência e Uniformidade entre Benefícios à População Urbana e Rural, estampado no artigo 194, II, da Carta Magna. Vejamos:

“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. (…)

II- uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; (…)”

Fabio Zambitte Ibrahim, lecionando com maestria a respeito deste princípio, enfatiza que “As prestações securitárias devem ser idênticas para trabalhadores rurais ou urbanos, não sendo lícita a criação de benefícios diferenciados (IBRAHIM, 2012, p. 67)”.

Neste mesmo sentido, Eduardo Rocha Dias, a respeito do princípio em comento, enfatiza: “… significa que as prestações da seguridade social serão idênticas para toda a população, independentemente do local onde residam ou trabalhem as pessoas”. (DIAS; MACEDO; 2008, página 118).

 Infere-se de tais posicionamentos que não se pode discriminar a classe trabalhadora, independente do trabalho realizado e do local de prestação dos serviços ou de sua residência, já que todos, sem distinção contribuem com o desenvolvimento da nação através de seu tralho lícito, seja ele qual for.

CONCLUSÃO

 A atual sistemática adotada pelo INSS para concessão do Benefício de aposentadoria por idade na modalidade elencada pelo §3º do artigo 48 da lei 8.213/91, consistente na exigência de que somente poderá ser beneficiário desta modalidade aquele segurado que teve como sua última atividade a Rural, fere de morte o Princípio da Equivalência e Uniformidade entre Benefícios e Serviços à População Urbana e Rural, já que concede o benefício somente àquele segurado que comprovar exercício de atividade rural.

Entretanto, o INSS tem enfrentado constantes derrotas no judiciário em ações que debatem o tema, o que já era de se esperar, pois este ato não coaduna com a base principiológica da Constituição Federal.

 

Referências:
VANDERLINDE, t. Capa: o jeito luterano de atuar com os pequenos agricultores no sul do brasil. Curitiba, n. 10, p. 49-60, 2005.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 17º ed. Niterói: Impetus, 2008
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acessado em 24/01/2018.
Lei 8.213/91. Planalto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8213cons.htm.
MARTINS, Sérgio Pinto. Fundamentos de Direito da Seguridade Social. São Paulo: Atlas, 2002.
DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de Direito Previdenciário – São Paulo : Método, 2008.
referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.


Informações Sobre o Autor

Wanderson Teixeira Leal

Advogado. Pós-graduando em direito previdenciário pelo Legale


Equipe Âmbito Jurídico

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