Direito Constitucional

A Legalização do Uso do Canabidiol e Tetrahidrocanabidiol no Brasil à Luz do Direito Humano à Saúde

Lívia Marceli da Silva¹

 

Resumo: Os primeiros relatos do uso maconha para fins medicinais e terapêuticos são datados, por volta, dos anos de 1500 a.C, e atualmente pesquisas científicas afirmam os benefícios das substâncias CBO e THC no tratamento doenças crônicas embora  desde a antiguidade seja usada de forma medicinal em várias finalidades. O pleito pelo uso das substâncias está embasado no Direito Constitucional à saúde, à vida, precursor dos demais direitos fundamentais. No decorrer do trabalho foram abordadas temáticas que abrangem aspectos históricos, legais e doutrinários que buscam esclarecer pensamentos preconceituosos sobre o uso da substância em questão, a partir do conhecimento sobre seus componentes e a sua utilização exclusivamente no tratamento de doenças crônicas. Para tanto foi realizada uma pesquisa qualitativa, do tipo bibliográfico dos estudos já realizados por vários pesquisadores especializados na manipulação dos componentes da maconha e com apoio principalmente na atual Lei de Drogas Nº 11343/2006, esta, por sua vez, proibe o uso da planta considerada ilícita pela ANVISA, porém, no decurso do tempo, a demanda pelas substâncias resultou no surgimento de resoluções permissivas para o uso com fins medicinais. O presente trabalho contextualiza desde a história associada com a proibição, até as mudanças de autorização para uso mediante controle.

Palavras chaves: Direito fundamental à saúde. Doenças crônicas. Canabidiol. Thetrahidrocanabidiol. Legislação.

 

Abstract: The earliest reports of medical and therapeutic marijuana use date back to the 1500s, and currently scientific research has affirmed the benefits of CBO and THC in treating chronic diseases, although since ancient times it has been used medicinally in many countries. purposes. The claim for substance use is based on the constitutional right to health, life, a percussor of the other fundamental rights. In the course of this work, themes that cover historical, legal and doctrinal aspects that seek to clarify prejudiced thoughts about the use of the substance in question, from the knowledge about its components and its use exclusively in the treatment of chronic diseases, were approached. For this purpose, a qualitative bibliographic research was carried out in studies already carried out by several researchers specialized in the handling of marijuana components and supported mainly by the current Drug Law No. 11343/2006, which in turn prohibited the use of the plant. considered unlawful by ANVISA, but over time, the demand for substances has resulted in the emergence of permissive resolutions for use for medicinal purposes. The present work contextualizes from the history associated with the prohibition, to the changes of authorization for use by control.

Keywords: Fundamental right to health. Chronic diseases. Canabidiol. Legalization

 

Sumário: Introdução. 1. Apanhados históricos do uso da maconha pela humanidade. 2. A  disciplina jurídica do uso, produção e comercio de drogas no Brasil. 3. Direito fundamental à saúde e a legalização do uso da substância canabidiol para o tratamento de doenças crônicas. 3.1 Origem do termo direito fundamental. 3.1.1 Direitos fundamentais, 3.2. Direito fundamental à saúde. 3.3  Legalização do uso da substancia canabidiol para o tratamento de doenças crônicas. Conclusão. Referências.

 

Introdução

Os primeiros relatos do uso maconha para fins medicinais e terapêuticos são datados, por volta, dos anos de 1500 a.C, pelos povos que habitavam a região da Ásia Central. E partindo da essência do seu uso pelos antigos, surgem estudos sobre as substância da planta Cannabis, bem como, a comprovação, eficaz, no tratamento de doenças crônicas até então não tratáveis com medicamentos comuns disponíveis no mercado, por essa razão, foi necessário pesquisar e introduzir no presente artigo, um panorama, detalhado, sobre a historicidade da maconha. Posteriormente, temos uma explanação teórica de tudo relacionado à Lei de Drogas, na qual, criminaliza a conduta do uso maconha para fins lucrativos, fruto da política proibitiva, bem como, o benefício da nova lei para o usuário de maconha, embora seja uma conduta passível de condução à autoridade policial punida com pena alternativa e sobre as consequências gravosas com as alterações da nova lei para os que praticam a conduta de tráfico. Não obstante, os diferentes posicionamentos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal-STF, na definição, quando comparado às alterações da antiga lei de Nº 6.368 com a nova lei de drogas Nº 13.343/2006. Ressalta-se a ausência de critério normativo na legislação para diferenciar o usuário do traficante de drogas.

Depois, veremos que dentre os Poderes da República, tem-se o Poder Judiciário, doutrinariamente, derivado da soberania, com capacidade de interferir no caso concreto, impondo o direito (no presente caso seria o direito fundamental à vida e o direito social à saúde) e as condições, resolvendo as controvérsias entre os jurisdicionados. Por essa razão, vislumbrou os sujeitos de direito e garantia constitucional, alcançar, por meio de liminar, o pleito pelo uso do canabidiol para fins de tratamento médico, por não haver resolução autorizativa do Conselho Federal de Medicina-CRF à época. Adiante, o surgimento das primeiras normas e a evolução destas em prol do uso e importação de medicamentos produzidos à base de CBO e THC.

Portanto, o objetivo do artigo visa contextualizar a origem do impasse que deu causa à legislação atual e estimular a flexibilização, visando à inserção de políticas públicas que assegure o direito humano à saúde, possibilitando plantar canabis legalmente e processá-la em laboratório, mediante controle e fiscalização do governo como já ocorre em diversos outros países, como Holanda, Itália, Alemanha e Finlândia, a fim de extrair a substância, permitindo a produção sem necessidade de importação e consequentemente diminuir o custo benefício tanto de quem precisa como do Estado.

 

  1. Apanhados históricos do uso da maconha pela humanidade:

A história da humanidade apresenta os primeiros registros do uso da canabis, sendo, pois considerada uma planta bem remota. Os primeiros relatos de seu uso para fins medicinais e terapêuticos, são datados, por volta, dos anos de 1500 a.C, pelos povos que habitavam a região da Ásia Central, especialmente, ao norte aos pés do Himalaia. A planta tem uma capacidade extraordinária de adaptação aos diversos climas e solos, e dependendo da espécie, quais sejam, Índica, Sativa ou Ruderalis, tem padrões de crescimento, qualidade e efeitos diferentes uma da outra. O cultivo dessa planta não tem finalidade alimentícia, sendo considerada uma planta enteógena (àquela que manifesta o interior divino), por causa de sua capacidade psicoativa, utilizada desde os primórdios nas diversas religiões (hinduísmo, budismo, rastafári e muçulmana), em rituais, pela desenvoltura de despertar deuses ou semideuses, ou seja, colocar o homem em contato com o “sagrado”, entretanto tal aspecto é considerado subjetivo.

Nas várias regiões em que foram utilizadas, as propriedades da planta foram aproveitadas para fins medicinais e terapêuticos, no tratamento de doenças nervosas, tumores, insônia, prisão de ventre, cólicas menstruais, e até como estimulante sexual, dentre outras inúmeras finalidades, conforme demonstram documentários e pesquisas sobre seu uso.

De modo repentino a planta se expandiu por todo o continente da Ásia Central, ao leste, no oriente médio alcançando Egito, Argélia, Marrocos, África e Europa.  Porém, na Europa, a vida econômica girou em torno da planta, aproveitava-se a planta para praticamente tudo, o cânhamo (caule) passou a ser utilizada para a produção de vários componentes das caravelas, como cordas e velas, além de servir de tecidos de roupas, tintas para pintura de quadros na época da renascença, inclusive as telas. Os romanos produziram palitos e o óleo da planta chegou a ser extraído das sementes e utilizado como a segunda opção de combustível para a produção de iluminação pública (a primeira era o óleo de baleia). Os chineses foram os primeiros a produzir papel com o cânhamo, porém o primeiro livro impresso foi produzido na Alemanha, na fábrica de livros de Johannes Guterberg, considerado o criador do processo de impressão com tipos móveis e tipografia. Dessa forma, observa-se o quanto a planta foi utilizada por diversas nações, etnias, e com ampla variedade de uso, para fins terapêuticos e medicinais, ao consumo fumado nas religiões, reuniões sociais, utilidades e benfeitorias.

Maconha é nome originado de outro termo africano (makanã), denominado pelos quibundos, pessoas que exerciam práticas religiosas de origem africana, tais como afro-brasileira e afro-indígena, consideradas no geral, de feitiçarias, magia-negra e curandeirismo.

No Brasil, na época da expansão da produção e cultivo da planta pelo mundo, tanto os escravos africanos como os colonizadores foram os responsáveis pela implantação dela na América do Sul, com a intenção de suprir a crescente demanda dos derivados da maconha para produção. A pessoa de Pedro Álvares Cabral apontou para este continente e implantou aqui a primeira fazenda de produção, no Rio Grande do Sul, a REAL BENFEITORIA DE LINHO-CÂNHAMO (1783) e a partir de então a matéria-prima (a planta canabis) se propagou pelos estados do Pará, Amazonas, Maranhão, Bahia e Rio de Janeiro, lugares em que melhor se adaptou. Com o primeiro empreendimento, financiado oficialmente pela a Coroa Portuguesa e de iniciativa das elites rurais em larga escala, passou a ser o principal agronegócio da economia europeia, representando à época o que o petróleo é atualmente para o Brasil.

Toda via, Napoleão Bonaparte objetivando prejudicar a exportação da fibra de cânhamo para a Inglaterra, afirmou que o uso da planta deixava as pessoas violentas, descontroladas, aptas a cometer crimes, pois os africanos, enquanto escravos mantiveram o seu costume de fumar a erva. Essa foi à primeira tentativa da história para privar a produção da matéria-prima gerando uma crise industrial. Alguns historiadores afirmam que, com a introdução da fábrica no Brasil, escravos, vindo de Angola para trabalhar no empreendimento, trouxeram sementes escondidas em suas vestes e por esta razão, são considerados igualmente responsáveis pelo o ingresso da maconha no país. Os negros e escravos usavam maconha de forma recreativa, fumavam maconha em forma de cigarro e por esta razão recebeu o termo pejorativo de “fumo de Angola”. Em razão de sua heterogeneidade étnica, a planta recebe inúmeras denominações como liamba, diamba, pango, rongo, pito do pango, maconha, dentre outros. Os senhores de engenhos e colonizadores, bem como os escravos fumavam maconha e assim houve uma dilatação urbana e contumaz de seu hábito considerado recreativo, porém, a maconha, assim como a criminalidade e a feitiçaria, de já foram associada às classes sociais mais baixas, pois inicialmente o uso nessa forma proveio daqueles. Diante da abordagem relativa à introdução, a proibição da maconha e associação desta com a criminalidade, vale destacar alguns textos sobre as primeiras proibições e suas fases. Vejamos um dos primeiros contextos criados proibindo o uso da maconha: é proibida a venda e o uso do pito do pango, bem como a conservação dele em casas públicas”. “Os contraventores serão multados, a saber: o vendedor em $20.000,00 e os escravos e mais pessoas, que dele usarem, em três dias de cadeia” (MOTT, 1986, p. 117).

Após a primeira tentativa de proibição do cultivo, plantação, produção e venda da maconha, dois cientistas chamados de Rodrigues Dória e Francisco Iglesias, em 1910, escreveram artigos científicos sobre o comportamento “natural” dos africanos, fazendo um paralelo aos efeitos farmacológicos da canabis e apresentando em congressos internacionais os seus relatos, destacando que o uso da maconha causava compulsão, psicose, loucura, degeneração mental, vício, o que levava a pessoa a cometer crimes. Tais efeitos foram atribuídos especialmente ao comportamento dos negros, pois consideravam que, quando faziam uso da planta, esta influenciava na resistência física, ignorância, intemperança, criminalidade e fetichismo. O discurso racista de Rodrigues Dória alastrou-se facilmente no ambiente acadêmico da época, quando muitos dos conceitos ligados a teses eugênicas (visavam melhorar o patrimônio genético) vigoravam influenciando os meios científicos do país. “A raça preta, selvagem e ignorante, resistente, mas intemperante, se em determinadas circunstâncias prestou grandes serviços aos brancos, seus irmãos mais adiantados em civilização, dando-lhes, pelo seu trabalho corporal, fortuna e comodidades, estragando o robusto organismo no vício de fumar a erva maravilhosa, que, nos êxtases fantásticos, lhe faria rever talvez as areais ardentes e os desertos sem fim de sua adorada e saudosa pátria, inoculou também o mal nos que o afastaram da terra querida, lhe roubaram a liberdade preciosa, e lhe sugaram a seiva reconstrutiva. (DÓRIA, 1986, p. 37)”.

Posteriormente a imprensa passou a divulgar tais informações sobre o suposto comportamento daqueles que fumavam maconha. O conteúdo negativo supracitado passou a ganhar força a partir da década de 1940, com o sensacionalismo da imprensa, atribuindo a expressão “maconheiro” para os que faziam uso da erva, e nos relatos de crimes violento,  atribuía-se  a culpa às “gangues dos maconheiros”. A matéria foi aceita com bastante sucesso no meio acadêmico, na sociedade em geral, em nível nacional e internacional, caracterizando assim o racismo e o preconceito, enquanto que a maconha era utilizada na antiguidade por todas as classes, urbanas e rurais, e até mesmo por famosos como Willian Shakespeare.

O Brasil tinha como principal aliado comercial e político os Estados Unidos da América, então a América do Sul alinhada às recomendações da América do Norte, firmou acordo na reunião da Liga das Nações Unidas e  promulgaram a Lei Federal N° 4.294, na época do Brasil Império, e logo após, o decreto lei nº 15.683, normatizando suas intenções proibitivas, e passou a prever prisão para usuários e tratamento compulsória para estes, pois quem utilizava era considerado doente.

Em 1924, as autoridades de mais de 100 países, reuniram-se para discutir novamente sobre o uso da coca e do ópio, ocasião esta que um representante do Egito afirmou sua inquietação em razão do haxixe, então, o conselho formou uma sub convenção para que fosse discutido tal reinvindicação, e nesta ocasião o Brasil representado por Dr. Pedro Pernambuco, discípulo de Dória, exigiu o mesmo controle para a papoula e a canabis,  ambas consideradas perigosas e suscetíveis de causar muitos danos assim como o ópio na Europa e dessa forma passaram a ingressar a lista de plantas proscritas. A maconha foi proibida em 1930 e tornou-se ilegal (MILLS, 2003).

No período do Estado Novo, em 1938, o Poder Executivo publicou um Decreto-lei, Nº 891, que definia e regulamentava as atribuições do CNFE (Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes), a lei anterior já previa penalidade de encarceramento para àquele que usava, plantava, portava e neste novo decreto incluiu pena para quem comercializava, pois o uso era bastante difundido em todo território nacional.

O surgimento do CNFE (Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes, CNFE, 1951) ensejou a criação de outros órgãos, instituições, delegacias, departamentos de polícias, centros de tratamentos, em razão dos usuários serem considerados doentes. Enquanto isso, no decorrer do tempo, continuava-se a fazer pesquisas, expedições, relatórios, e quando conclusos, tudo era encaminhados para o CNFE, firmou-se convênios interestaduais, houve o lançamento da Campanha Nacional de Repreensão ao Uso e Comércio da Maconha, que estabeleceu normas para todo o território Brasileiro. (CARVALHO, 2013).

O Brasil chegou a participar da Convenção Única de Entorpecentes que aconteceu em Nova York, em 1961, a tese crítica e negativa adotada seria considerada influenciando na proibição internacional, ainda que equivocada as afirmações acerca dos males da planta, não foi alterada o ponto de vista do Brasil, que pactuava desde o início dos discursos de Dória, Parreiras e Iglesias. (PARREIRAS, p. 1959). Nos anos 90, o consumo de drogas alastrou-se mesmo depois de tantos movimentos nacionais e internacionais vislumbrando o comércio ilegal de drogas. No Brasil, atualmente, mesmo com anos dedicados à erradicação do uso da planta e alterações nas leis, a maconha continua a ser considerada ilícita e faz parte da lista de entorpecentes. O julgamento proibitivo acerca do uso da maconha, cocaína, ópio, dentre outras, embasou o pretexto para elaboração da nova lei de Drogas, Nº 11.343/2006. Nesse sentido, o governo brasileiro tem o auxilio da ANVISA (autarquia) e do Ministério da Saúde.

No que tange às penas estabelecidas para o usuário, foram substituídas as penas de encarceramento e tratamento compulsório, por penas mais brandas, ou seja, a substituição da pena privativa de liberdade (PPP) por penas alternativas, quais seja, advertência, medidas socioeducativas e prestação de serviços a comunidades, claro que, levando em conta elementos que qualificam e distinguem o mero usuário do traficante. Apesar da intensa política de repressão às drogas e ao tráfico ilícito de entorpecentes ao longo dos anos, muitos países têm mudado de estratégia e investido na política de prevenção e educação ao invés de repressão. A visão da associação das drogas com a criminalidade decaiu em diversos países dos Estados Unidos da América, considerados grandes consumidores de drogas. Em alguns estados do EUA, hoje é permitido fumar maconha desde que, se respeite algumas limitações, pois em tais países chegou-se ao entendimento de que o combate ao uso não é a melhor estratégia. Outros países da mesma forma adotaram esse entendimento, entre eles, Portugal, Espanha e Republica Tcheca[1]. Inclusive, há dados que estipulam ser a taxa de consumo menor em países que autorizam o uso recreativo da maconha, comparado a países como a França e Reino Unido, onde é proibido, porém o contexto fatídico dos lugares deve ser analisado.

 

  1. A disciplina jurídica do uso, produção e comércio de drogas no Brasil.

À época do período do Brasil Império, o ordenamento jurídico brasileiro já previa regras de política sanitária com o objetivo de regulamentar a venda de substâncias medicinais e de medicamentos.  O Código Penal de 1890, dispunha que era considerado crime “expor à venda ou ministrar substâncias venenosas sem legítima autorização e sem as formalidades previstas nos regulamentos sanitários.” No entanto, tais normas tratavam apenas de substâncias venenosas e não se referiam diretamente às drogas. Posteriormente, surgiram, movimentos internacionais para tratar o combate ao uso e comércio ilegal de drogas e em decorrência disso, o Brasil em 1911, se comprometeu em Haia a desenvolver ações voltadas para a fiscalização sobre o consumo de cocaína e ópio, e nos anos 90, o consumo de drogas ilícitas se espalhou de forma significativa em todo o país tornando a legislação existente ineficaz no combate.

Vigorava a época o Decreto nº 4.294/1921, posteriormente modificado pelo Decreto nº 15.683, o qual previa penalidades para os contraventores na venda de cocaína, opio, morfina e seus derivados, além de criar um estabelecimento especial para internação dos intoxicados pelo álcool ou substancias venenosas. Em 1930, a maconha tornou-se uma substância de uso proibido no Brasil e aconteceram as primeiras prisões em decorrência de seu uso. A partir de então, novas normas penais voltadas ao combate do uso e comercialização das drogas foram editadas. Em seguida, veio o Decreto-lei nº 891, de 25 de novembro de 1938, prevendo a pena de prisão pelo comercio ilegal de entorpecentes.

No contexto mais recente, a Lei nº 6.368/76, dispôs sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes e que causam dependência física ou psíquica, estabelecendo ainda outras providências. Ao longo do tempo essa lei sofreu algumas alterações, até ser revogado completamente pela atual Lei de Drogas nº 11.343/2006, a qual passou a regular os meios de combate às drogas, além de instituir o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD, prescrever medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas, estabelecer normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas, definir crimes, entre outras providências e alterações significativas em relação ao tratamento destinado ao usuário e ao traficante de drogas.

Apesar de regulamentar os aspectos criminais sobre o uso e comércio ilícito de drogas, a Lei nº 11.343/ 2006, esta não especifica as substâncias consideradas drogas para efeitos de sua incidência, essa definição fica a cargo da ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária, na qual, através da portaria nº 344/1998, estabelece quais são as substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial do poder público, servindo de parâmetro para complementar a norma penal em branco contida na lei de drogas atual. Por ser uma norma penal em branco, exige complemento em seu preceito primário.

Preliminarmente, as disposições da Lei de Drogas conforme previsão do art. 1º, é prescrever medidas para prevenção do uso indevido, institui princípios com foco na atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas da repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas, além de definir crimes. No parágrafo único do mesmo artigo, conceitua-se droga substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União (BRASIL, 2006).

Entre as inovações trazidas pela nova Lei, vale destacar o novo tratamento penal destinado ao usuário de substancia entorpecente, na qual a lei deixou de prever a possibilidade de aplicar a prisão em flagrante e a pena privativa de liberdade, devendo o usuário ser conduzido perante a autoridade policial e submetido às penas de caráter alternativo, pois o crime de uso de drogas passou a ser considerada uma infração de menor potencial ofensivo sujeitando-se ao procedimento da lei dos juizados especiais criminais. Nesse sentido, dispõe o artigo 28 da lei nº 11.343/2006.

O usuário ou dependente de drogas, segundo os doutrinadores, foram beneficiados com a nova lei porque tornou mais branda a pena, prevendo para eles a aplicação de medidas educativas, tratamento e reinserção ao convívio social. Já em relação ao traficante, agravou-se a pena destes por serem os responsáveis pela ampliação do uso de drogas e suas consequências. Na atual lei, não é possível diferenciar o consumidor do traficante por ausência de critério normativo, no caso concreto, a diferenciação ocorre quando observado alguns aspectos objetivos do caso e subjetivo do infrator, sendo este submetido a um procedimento diferenciado e dependendo do que se trata se consumo ou trafico, quando traficante punido rigorosamente.

Alguns juristas manifestam-se dizendo que houve a descriminalização do uso de drogas, levando em conta a pena imposta pela norma incriminadora, por não ser tal conduta punida com pena privativa de liberdade, seja reclusão ou detenção relacionada a pratica de crime. Esse entendimento tem por base o art. 1º, parte geral do Código Penal, que define e diferencia crime de contravenção, utilizando como critério o tipo de pena aplicada na infração penal, se reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa, enquanto a contravenção,  infração penal a que a lei comina, isoladamente, penas de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. (BRASIL, 1941).

Dessa forma, Gomes afirma que a descriminalização do uso de drogas seria hipótese de abolitio criminis. Vejamos seu entendimento: “Não há dúvida que a posse de droga para consumo pessoal (com base na nova lei) deixou de ser ‘crime’ porque as sanções impostas para essa conduta (advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programas educativos) não conduzem a nenhum tipo de prisão e tampouco essa conduta passou a ser contravenção penal” (GOMES, 2006, p.118-119). A contravenção penal é punida com prisão simples ou multa.

Em outras palavras, conforme o art. 28, a conduta da posse de droga para consumo pessoal deixa de ser crime. “Retirou-lhe a etiqueta de infração penal porque de modo algum permite a pena de prisão e sem pena de prisão não se pode admitir a existência de infração penal no nosso País, que a posse de droga para uso pessoal é conduta sui generi” (GOMES, 2006, p. 118-119).

Há quem discorde de Gomes, por considerar seu argumento frágil. Para (GUIMARÃES, 2006) não houve a descriminalização das condutas relacionadas com o uso, pois a conduta é tipificada, mas sim, a inclusão de um tertium genus de pena, pois uns afirmam não é crime e nem contravenção, porém a pena para posse de droga para uso pessoal é alternativa.

Já o STF entende que houve a despenalização da conduta, ou seja, diminuiu a pena do delito sem descriminalizar e sem tirar do fato o caráter do ilícito penal, enquanto para a maioria doutrinária, houve a descarcerização. Assim Rangel (2007, p.109) diz que não houve descriminalização e nem despenalização, tomando por base os princípios constitucionais da reserva legal e da individualização da pena.

Descriminalização, para Cervini (2002, p.81-85) é sinônimo de retirar formalmente ou de fato, do Código Penal, certas condutas, não graves, que deixam de ser delitivas, sendo pertinente conforme os demais entendimentos o conceito de crime concordando com o professor jurista, Gomes (2006).

No âmbito do Poder Judiciário, processos nos quais, pessoas estão submetidas a julgamento pelo porte de drogas para consumo próprio os juízes têm sentenciando pela absolvição dos réus, quando sua convicção esta pautada no bem jurídico tutelado pela lei de drogas, qual seja, a saúde pública e incolumidade pública, pois a conduta daquele que faz uso “recreativamente” da droga não afeta “diretamente” o terceiro.

Para alguns estudiosos, deve-se definir uma quantidade de drogas que permita o usuário a ter a posse sem risco de ser submetido a qualquer tipo de constrangimento. Nesse sentido destaca-se o pensamento do Ministro Gilmar Mendes: “a pequena quantidade de drogas e a ausência de outras diligências apontam que a instauração da ação penal com a condenação é medidas descabidas”, acrescentando ainda que a nova Lei das Drogas, que veio para abrandar a aplicação penal para o usuário e tratar com mais rigor o crime organizado, está contribuindo demasiadamente para o aumento da população carcerária.

Os ministros decidiram, ainda, oficiar ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que realize uma avaliação de procedimentos para aplicação da Lei nº 11.343/2006, em razão da quantidade de casos semelhantes que chegam ao STF. Em sequência, o ministro Luís Roberto Barroso proferiu seu voto a favor da descriminalização, apenas da maconha, observemos: “As reflexões que eu farei aqui se referem à maconha”, disse, inaugurando sua fala. Ressaltando que a política de combate às drogas fracassou e há milhares de jovens presos por porte de droga, inchando o já capenga sistema carcerário brasileiro, e que era preciso criar novos caminhos, sem usar necessariamente como modelo políticas de desenvolvidas por outros países (STF – RE 635659. Relator Min. Gilmar Mendes. 20/08/2015).

Inclusive, propôs ao Congresso que tomasse para si e estabelecesse a quantidade que o usuário de maconha poderia portar, temporariamente, até a resolução da questão, evitando mais enquadramento de usuários como traficantes. Nesse sentido, Rosa (2016), destaca o pensamento do Ministro Barroso: “25 gramas e até seis plantas fêmeas de maconha por pessoa”, propôs Barroso. “Se a pessoa pode consumir, é preciso ter ao menos uma fonte legítima do acesso [à droga]”. Para o ministro, “a vida privada é o espaço que vai da religião aos hábitos pessoais e em linhas de princípio ninguém tem nada com isso”.  (ROSSI, 2015).

A ressalva do ministro faz referência ao fracasso da política antidrogas e em contrapartida ao aumento do uso destas pelos jovens, que ocasiona um abarrotamento da população carcerária. Além do sistema está defasado, não tornou eficaz o caráter da sua finalidade. Assim, focar na política de prevenção e não legalização, sugerindo ser este um novo caminho, o que não implicaria adotar a mesma medida de países que legalizaram para uso recreativo.

No que tange ao dolo de comercializar drogas, a lei traz exaustivas condutas que tipifica o crime, abrangendo ao todo, 33 (trinta e três) ações nucleares diferentes, considerado, portanto, crime plurinuclear, além disso, equiparado a crime hediondo, ainda que na forma tentada, conforme a Lei nº 8.072/90 (lei dos crimes hediondos).

Amplamente, a nova lei, buscou reprimir a conduta, inclusive, o fato de oferecer drogas à pessoa de seu relacionamento, ainda que eventualmente, igualmente é considerado crime, não podendo o indivíduo, vislumbrando se livrar da punição do Estado alegar o mero desconhecimento da lei. Igualmente, uma modificação relevante na lei foi o aumento da pena mínima para cinco anos (art.33 da lei 8.072/90). Ao que pratica o crime de tráfico lhe são vedados alguns benefícios, tais como, o instituto da fiança, que serve para evitar que o indivíduo vá para a prisão ou se nela estiver venha a ser posto em liberdade, a anistia (própria ou imprópria, antes ou depois da condenação, não exclui o crime), a Graça (não poderá conceder o Presidente da República) e Indulto (quando houver cumulação das penas, concedida pelo Presidente).

Vale destacar que a pena base não está limitada ao quantum previsto, ficando a critério do juiz estipular, o aumento graduado da pena, com vistas à subjetividade do agente infrator conforme estabelece o artigo 59, do Código Penal, que versa sobre a fixação da pena.

O Ministério Público mediante denúncia, e em razão do princípio da obrigatoriedade, indisponibilidade e indivisibilidade deverá propor ação penal pública incondicionada e apurar a infração, sendo, portanto, titular desta ação. Além disso, os prazos para quem responde a processo por esta acusação, quando réu preso, são diferenciados dos crimes comuns, por exemplo, no caso de prisão temporária passa a ser de 30 (trinta) dias, podendo ser igualmente prorrogado.

Ocorrendo a violação da lei, a punição desta não necessariamente garante o cessar da conduta, pois o aumento na reincidência da prática criminosa demonstra o insucesso na proibição, pressupondo-se  que outros fatores corroboram para a repetição da conduta ilícita. Ou talvez  a falha esteja no não cumprimento de toda a finalidade da pena que visa punir, prevenir e ressocializar. “O certo é que em virtude do bem jurídico tutelado, se mostra inadmissível a punição da posse de drogas para uso pessoal, seja pela inafetação do bem jurídico protegido (a saúde pública), seja por sua contrariedade com um ordenamento jurídico garantidor da não intervenção do Direito em condutas que não afetem a terceiros”, como explica Maria Lúcia Karam, em sua excelente obra “De Crimes, Penas e Fantasias, Rio de Janeiro”: (LUAM, 1991), a mesma autora complementa afirmando com absoluta propriedade que a “aquisição ou posse de drogas para uso pessoal, da mesma forma que a autolesão ou a tentativa de suicídio, situa-se na esfera de privacidade de cada um, não podendo o Direito nela intervir.” (MOREIRA, 2016) b.

Sucedendo toda essa discursão doutrinária sobre o conceito da pena do tráfico de drogas com a alteração da 11.343/2006 e o benefício da atual lei de drogas quanto à pessoa do usuário, ainda assim, falta a definição precisa sobre o que é considerado droga para uso pessoal, pois quando a pessoa é flagrada portando determinada quantidade de maconha, automaticamente é presumido como traficante, uma avaliação imediata e voluntária no ato flagroso, o que é inaceitável, pois o tráfico deve conter a finalidade lucrativa, requerendo, portanto, por partes dos agentes ou autoridades policiais uma avaliação imparcial e sem preconceitos ou distinções de raça e cor, pois certamente um negro ou desempregado tem essas peculiaridades em seu desfavor. Posteriormente, a aplicação da pena em razão do uso pessoal de drogas embora seja diferente da pena do crime de tráfico, aos juízes cabem sentenciar, contribuindo para o abarrotamento nos cárceres.

 

  1. Direito fundamental à saúde e a legalização do uso das substancias canabidiol e tetrahidrocanabidiol para o tratamento de doenças crônicas.

3.1. Origem do termo direito fundamental

Primeiramente, convém fazer uma breve explanação, histórica, sobre o surgimento do termo Direito Humano e a fruição de direitos fundamentais do homem. Antes do século VXIII, não se utilizava a expressão Direitos Humanos com frequência e quando mencionado, não continha o significado atual. O termo era utilizado para distinguir o homem do divino e dos animais, por outro lado, tratava de direitos políticos tais como liberdade de expressão ou participação política. Em 1734, o relato mais antigo que se tem sobre o uso do termo Direitos da Humanidade é em francês, foi usado pelo padre católico Nicolas Lenglet-Dufresnoy ao fazer menção aos monges, em seu acerbo crítico, no qual afirmava que estes renunciavam a todos os seus direitos para pastar com os animais e andar nu. Posteriormente, em 1756, por Voltaire, ao tratar sobre a Pérsia, ironizando a monarquia à época dizendo que esta havia recurso para todo e qualquer tédio (LYNN, 2009).

Em 1760, os franceses criam a expressão Direito do Homem “droits de I´homme”. Em 1762, a denominação Direito do Homem começou a circular em francês com o surgimento de O contrato social, de Jean-Jacques Rousseau, embora sem ter atribuído nenhuma definição. Em 1763, surge o Direito Humano, pela primeira vez, em francês, com significado de “Direito Natural”.  Posteriormente, no corrente ano o termo Direito do Homem, tornou-se comum e relacionado ao “Direito do Nosso Ser”, por meio de uma peça chamada “Manco”, que versava sobre o respeito dos incas no Peru, ainda conexo com a influência da obra de Rousseau. Ademais, em 1776, na data correspondente à declaração de Direitos da Virgínia, porém não se apresentou uma lista de quais seriam esses direitos. Ainda, em 1786, o Marquês de Condocet, defensor do iluminismo francês ligou explicitamente o Direito do Homem à revolução americana. Em 1787, Jean-Paul, um pastor calvinista, reclama sobre um edito de tolerância para os protestantes, dessa forma, nota a ambiguidade dos direitos humanos, pois não aceita que uma lei invalide os direitos da humanidade. Em 1789, Direitos do Homem tinha poucas incursões no Inglês, porém passou a ser usado com frequência.

Vale lembrar, que o termo Direito Natural era utilizado antes de 1789 e tinha poucas incursões no inglês e após esse ano, passou o termo a ser denominado de Direitos do Homem por força de O contrato de Rousseau. De todo modo, antes do século XVIII, em francês ou inglês, Direitos Humanos, de gênero ou da humanidade eram termos gerais protagonizando o emprego político direto. Em 1806, Jefferson ao se referir aos males do tráfico de escravos, emprega o termo Direitos Humanos como algo mais passivo e menos político, ainda que sem deduzir nada sobre o fato. Nos anos 70 e 80, na França, D`Holbach e Mirabeau (LYNN, 2009) denominaram os Direitos do Homem como auto evidentes, ou seja, que não precisa ser definido e nem justificado, pois são óbvios.

 

3.1.1 Direitos fundamentais

A existência e a definição de quais são Direitos Humanos tornou-se determinada e numerosa, atrelada, dependente da razão e da emoção. Com o passar do tempo, houve a ampliação dos direitos fundamentais assegurados ao homem em razão da sua condição humana. A evolução desses direitos ocorre por etapas, denominadas gerações, quais sejam: direitos fundamentais de 1ª geração que tem como marco a passagem de um Estado autoritário para um Estado de direito, respeitando as liberdades individuais; os de 2ª geração que correspondem ao direito de igualdade, uma perspectiva em relação aos direitos sociais, culturais e econômicos, bem como os direitos coletivos; na 3ª geração, encontram-se os direitos a solidariedade e fraternidade, caracterizados como direitos transindividuais, pois ultrapassam o indivíduo, abrangendo o gênero humano (MORAES, 2009, p. 27). Podendo ser resumida pelo Lema francês, liberdade, igualdade e fraternidade.

Atualmente, entre os doutrinadores, não há um consenso com relação à definição da origem dos direitos de 4º dimensão que está relacionado do ponto de vista de Noberto Bobbie (2000) à globalização, enquanto outros atribuem à engenharia genética e os demais defendem que sua existência esta associada aos direitos da democracia, informação e pluripartidarismo (diversidade de opinião na política ou religião). Nesse debate não se exclui a existência dos direitos de 4º dimensão, e sim a origem e definição.  Direitos de 5º dimensão tratam do direito à paz, apesar de estar associado com os direitos de 3º dimensão, aqui recebe posição de destaque, atribuindo à humanidade a necessidade do convívio harmônico e com qualidade para o bem estar do homem.

Os marcos históricos que contribuíram para a evolução dos direitos fundamentais foram a Revolução Industrial na segunda metade do século XVIII e a Primeira Grande Guerra, que ocasionaram péssimas condições de trabalho e assim insurge a necessária  intervenção estatal com o crescente desenvolvimento tecnológico e científico, assim novas preocupações, tais como a proteção ao meio ambiente e ao consumidor, nesse contexto histórico, o ser humano passou a ser inserido em uma coletividade, adquirindo direitos a solidariedade e fraternidade, o que desencadeou a preocupação com a proteção dos novos direitos que estavam surgindo. (LENZA, 2011, p. 27-28).

Cada Estado soberano constitui sua legislação, enumerando, dentro do universo dos direitos humanos, aqueles que pretendem destacar, dando ênfase e atribuindo o caráter de direitos fundamental. Nesse sentido, a Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu artigo 5º, menciona os seus direitos considerados como fundamentais, tais como: a vida, a igualdade, a liberdade, a segurança e a propriedade. Vale frisar, que esse rol de direito é meramente exemplificativo e a própria Constituição admite a existência de outros, decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais no qual a República Federativa do Brasil seja parte.

No universo dos direitos humanos fundamentais, o direito à vida é considerado o mais fundamental e abrangente de todos os direitos, pois constitui um pré-requisito à existência e fruição dos demais, sem ele não há como assegurar a plenitude da boa condição humana. Assim sendo, cabe ao Estado assegurar à vida nos seus aspectos físicos, psíquicos (materiais) e espirituais (imateriais).

Os direitos fundamentais têm como fundamento o princípio da dignidade da pessoa humana, compreendendo o direito a existência digna. Tais direitos são dotados de características considerados indispensáveis à existência humana, quais sejam:

1)Historicidade – nasceu com o Cristianismo.

2) Imprescritibilidade- que não prescreve, não acaba em razão do decurso do tempo.

3) Inalienabilidade- não se transfere-se  à outra pessoa.

4) Irrenunciabilidade- que não pode ser objeto de renúncia.

5) Universalidade – abrange a todos os indivíduos, independente de ração, cor, sexo, crença ou convicção (LENZA, 2011).

É importante destacar que, os direitos fundamentais não devem ser interpretados isoladamente, igualmente, não são absolutos. No caso concreto pode haver conflito de direitos, porém, cabe ao intérprete ou magistrado decidir qual prevalecerá no caso, levando em consideração a máxima observância dos direitos envolvidos. Esse fenômeno é conhecido por conflito horizontal de direitos.

O artigo 5º, parágrafo 1º, da CF DE 88, dispõe sobre a aplicabilidade imediata dos direitos e garantias fundamentais, quais sejam, vida, igualdade, liberdade, segurança e propriedade. Ou seja, a estes confere a maior eficácia possível, portanto cabe ao poder público garantir a máxima de sua efetivação. São normas classificadas de eficácia plena, pois não necessita de autorização legislativa nem tão pouca complementação para produzir todos os efeitos jurídicos.

 

3.2.  Direito fundamental à saúde

Contemplado na 2º geração, no estabelecimento dos direitos sociais, o direito à saúde é direito e garantia fundamental do indivíduo. Embora não esteja explícito no artigo 5º da norma magna na qual expõe os direitos fundamentais, trata-se de direito precursor dos demais, no qual, sem gozo deste, outros direitos não despertam interesse e nem podem ser exercidos, por ser uma necessidade vital básica permissiva de fruição dos demais direitos pertinente à pessoa humana.

O direito a saúde é inerente ao princípio basilar da dignidade da pessoa humana, tem valor supremo e fundamento axiológico, assim sendo, o Estado deve garantir sua efetivação. A saúde enquanto direito humano social, contido na Constituição Federal, está disciplinada tanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos- DUDH, como em legislação extravagante.

Insta salientar, que existem alguns princípios que norteiam os direitos fundamentais contidos na suprema Constituição, que abrangem o direito à saúde, pois irradiam os efeitos e servem de paradigma para a interpretação, fundamentação e concretização de todo o ordenamento (SEGATTO, 1997). Dentre outros, ressalta-se o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, pois este tem a capacidade de tornar eficaz a aplicação das normas constitucionais, bem como, embasa o Estado democrático de direito, portanto, fundamento basilar dos demais princípios. É uma referência a unificadora de todos os direitos fundamentais (FACHIN, 2009).

Quanto à possibilidade da norma produzir, efetiva ou potencialmente os efeitos previstos, o direito à saúde é considerado norma de eficácia limitada, pois precisa de uma lei integrativa infraconstitucional que possa complementá-la, ou seja, uma legislação posterior para conferir-lhe eficácia devida. As normas constitucionais, quanto a sua eficácia e aplicabilidade, são classificadas em normas de eficácia plena, normas de eficácia contida e normas de eficácia limitada. As normas de eficácia plena, são as de eficácia imediata, pois não necessitam de autorização legislativa nem tampouco de complementação para produzir todos os seus efeitos jurídicos. As normas de eficácia contida, apesar de necessitarem de legislação futura para restringir o seu conteúdo, não dependem dela para completar lhes a eficácia, eis que são aplicadas imediatamente, mesmo sem a atividade do legislador ordinário. É por isso que apesar das semelhanças com as normas de eficácia limitada, delas se afastam, pois não dependem da legislação posterior para conferir-lhes eficácia. As normas de eficácia limitada necessitam de outra norma complementar a fim de concretizar o direito.

Dessa forma, conforme pontua Villas-Bôas (2014, p. 144), a natureza de norma de eficácia limitada de princípio programático atribuído aos direitos à saúde, decorre da forma como foi redigido o artigo 196 da Constituição de 1988, o qual prevê a saúde como um direito que deve ser “garantido mediante políticas sociais e econômicas”, que visem ao acesso universal, igualitário e integral. Por essa razão, a norma que assegura tal direito não é bastante em si not-self-acting e necessita de norma integradora ou por meio da implementação de políticas públicas e sociais.

As políticas públicas são atividades de política administrativa, que tratam dos recursos disponíveis e da demanda, posteriormente, o poder público escolhe, descreve a necessidade pública, sendo esta inserida no ordenamento jurídico, enquanto, o serviço público, é o instrumento do Estado para tornar real a obrigação, garantindo o mínimo necessário para a manutenção da saúde, a exemplo de políticas públicas são o fornecimento de medicamentos e tratamento-médico-hospitalares.

Deveras, a natureza de norma de eficácia limitada impede que o administrador forneça determinada terapêutica sem que ela esteja prevista nas portarias e demais espécies definidoras das políticas públicas estatais de saúde, como aconteceu com os tratamentos de doenças crônicas que necessitaram de medicamentos a base de canabidiol e pela ausência de regulação suscitaram sua demanda perante o poder Judiciário. O Poder Judiciário é independente e atua na defesa social do direito, no intento de assegurar os princípios e garantias Constitucionais.

Diante da necessidade e malgrado a incompletude ou inadequação da complementação normativa, inviabilizando a aplicação imediata do direito fundamental à saúde, a demanda resultou em ações judiciais específicas para atender essa finalidade, não podendo o poder publico se eximir do dever, simplesmente alegando ausência de norma infraconstitucional.

Por essa razão, na faculdade do exercício típico da função judiciária, tem-se garantido a fruição do direito à saúde liminarmente antes mesmo da previsão de uso da ANVISA à época em que iniciaram demandas suscitando o uso do canabidiol, cabendo até então à agência importar. Ressalta-se que a ANVISA não é contra o uso da substância à base do canabidiol, entretanto o direito à saúde enquanto norma limitada sofre impasses na utilização do direito quando se trata do desenvolvimento de política pública social, financiamento econômico para pesquisas e cultivo controlado da maconha para fins terapêuticos em prol da saúde.  Atualmente o uso da Canabis se dar de forma parcial e com finalidade medicinal após o surgimento de novas resoluções do CFM. [2]

 

3.3.  Legalização do uso da substancia canabidiol e tetrahidrocanabidiol para o tratamento de doenças crônicas

Após uma garota ser diagnosticada com epilepsia refratária, doença de ordem genética e rara ganhar notoriedades na mídia em 2015, tendo seu estado de saúde apresentado significativas melhoras com o uso do canabidiol (um dos componentes da maconha), iniciou-se o êxodo de outras pessoas portadoras de doenças crônicas do sistema nervoso na busca pelo conhecimento e aquisição acerca dos benefícios da proteína extraída da canabis, bem como, a reivindicação pelo direito de uso dessas substâncias, judicialmente, em prol de uma melhoria na saúde uma vez que no Brasil ainda não era permitido à época.

Para melhor compreensão sobre os impasses autorizativos no uso legal sem impeditivos é mister um panorama histórico, legislativo e  estrutural química da famosa planta de nome canabis. Primeiramente, embora a planta psicotrópica seja utilizada de forma ilícita por ser entorpecente, ainda assim, a cannabis contém substâncias que facilita o tratamento de doenças graves, como alternativa terapêutica e medicinal.  Entre seus vários componentes, destacam-se os canabinóides, o THC (delta-9-tetrahidrocanabidiol) e o CBD (canabidiol).

O THC é o responsável pelo “barato”, pelo efeito psicoativo, segundo Caline (2004), enquanto o CBD tem efeito oposto.       Entretanto, em 2013, cientistas da Universidade de Jerusalém desenvolveram um tipo de maconha medicinal a partir da neutralização da substancia do THC, dessa forma tornou-se possível plantar, cultivar, produzir e extrair a substância CBD com inibição do THC, em laboratórios específicos.

Vale destacar que, no Canadá, Reino Unido e Espanha há muito tempo vem utilizando um medicamento que combina os dois compostos, o CBD e o THC para o tratamento de esclerose múltipla.

Dessa forma, percebe-se que é possível a produção de maconha medicinal, com a inibição do THC, com a utilização isolada do CBD, ou mesmo as duas substancias nos tratamentos de doenças a depender do caso concreto. Para isso, requer-se, que cada Estado no âmbito de sua legislação interna autorize o uso de tais substâncias, exclusivamente, para fins medicinais, caso seja considerada no local o uso da planta cannabis proibido. Assim sendo, tem-se a eficácia do direito fundamental à saúde quando pessoas enfermas tem acesso ao  tratamento adequado fazendo uso do medicamento à base da substância considerada a  solução mais viável ou mesmo resolutiva.

Conforme destaca Crippa (2012), as pesquisas comprovam a eficácia do CBD no tratamento de doenças crônicas, Parknsion, esquizofrenia, distúrbios do sono, ansiedade, efeito anticonvulsivantes, e inclusive dependência de drogas, demonstrando que os canabinóides tem incrível potencial terapêutico.

Em 01/09/2008, o Ministério da Justiça declarou que o Brasil está entre um dos líderes nas pesquisas relacionadas à substância. Nesse contexto cientifico o professor, médico, Doutor Elizardo Caline mencionou que despertou seu interesse e passou a desenvolver estudos experimentais sobre a maconha (Canabis sativa L.) em 1970. Suas pesquisas renderam muitas publicações e trouxeram reputação internacional para os trabalhos brasileiros.

Entretanto, ressaltou o Dr. Caline que o seu retorno ao Brasil foi cheio de dificuldades, tanto pela a ausência de liberdade científica como pelos fatores econômicos, em razão de baixos recursos destinados às pesquisas neste sentido.

Em suas palavras afirmou a dificuldade de lidar com essa situação, porque durante os anos em que viveu nos Estados Unidos, teve mais liberdade do que no Brasil para atuar e fatores econômicos impuseram limitações severas, considerou que parte da população não tinha recursos suficientes nem para satisfazer as necessidades elementares (CALINE, 2004).

Em 2014, impelido pela repercussão, o plenário do Conselho Federal de Medicina – CFM aprovou a resolução nº 2.113/14, após avaliar fatores relacionados à segurança e a eficácia da substancia, então regulamentou o uso compassivo do canabidiol para crianças e adolescentes com epilepsia refratária. Para tanto, sendo necessário que o interessado, paciente ou responsável requeira a liberação do medicamento no portal da ANVISA, após a devida prescrição dos médicos especialistas, psiquiatras ou neurologistas, mediante a solicitação, comprovação, aprovação e acompanhamento do órgão. A etapa posterior final seria somente aguardar a importação do produto para dar início ao tratamento. Essa via é a administrativa.

Ao regulamentar apenas o uso compassivo (tratamento ainda não totalmente avaliado, destinado a doentes que não têm outras opções) do canabidiol exclusivamente para epilepsias refratárias frente aos tratamentos convencionais, a agência informou à época que só mudaria as suas regras se o CFM alterasse a resolução, pois o protocolo e área técnica que a ANVISA segue são normas do CFM e assim, a ANVISA publica a nova resolução em 17 de novembro de 2015 no Diário Oficial da União, definindo critérios e o procedimento para a importação, para uso próprio, para a pessoa física, por profissional habilitado, justificando o pedido para o tratamento de saúde.

A recomendação do CFM à ANVISA é que os médicos deverão ser previamente cadastrados em uma plataforma on-line, criada pelo CFM para este fim. O médico Ricardo Ferreira, especialista em dor, declara que almeja que haja uma produção nacional para baratear a compra e facilitar o acesso, pois ainda é difícil importar devido à burocracia no importe e também por causa da oscilação do dólar.

Como autoridade federal, a ANVISA, é quem registra produtos, substâncias e serviços que podem afetar a saúde da população, igualmente responsabilizando-se pela autorização e importações nos casos já aprovados depois de atendidos os requisitos. Vejamos o trajeto das resoluções permissivas no decurso do tempo.

Em 29/05/2014, iniciou-se a discursão sobre a permanência ou não do canabidiol na lista de produtos controlados, ou seja, proscrita, pois enquanto substância proscrita depende de prévia autorização da ANVISA. Posteriormente, no mês de setembro do corrente ano, houve significativo aumento no pedido de medicamento à base do CBD, via mecanismo criado pela a ANVISA, o que causou agilidade. A excepcionalidade no acesso do CBD ocorre sem demanda judicial, o procedimento para à aquisição encontra-se no site da ANVISA, e o medicamento embora não tenha registro no Brasil atende aos requisitos da resolução, o registro retrata dados de eficácia e segurança. A responsabilidade caso haja um contra tempo seria do profissional médico ao prescrever a medicação.

Com o surgimento das normas específicas para a importação do CBD, o paciente deve se cadastrar na ANVISA, ter prescrição e laudo médico. O cadastro requer renovação. A nova norma trás 05 (cinco) produtos à base do CBD. Já na importação, a novidade ocorre com a intermediação por parte da associação de pacientes que ajuda a reduzir custos envolvidos na aquisição e transporte do medicamento, contudo devem ser autorizados, igualmente, pelo regulamento.

Em 22/11/2016, a diretoria colegiada da ANVISA, aprovou por unanimidade a inclusão de medicamentos à base de derivados de canabis sativa na lista A3 da portaria SUS/MS Nº344/98 (lista das plantas e substâncias sob controle especial e uso proibido). Essa atualização possibilitou o registro do medicamento no Brasil. Logo, em 05/12/2016, uma nova regra consente o uso do medicamento de nome MEAUATY, produzido não somente à base de CBD, mas também do THC. Foi necessária a atualização para que o medicamento chegasse ao Brasil, dessa forma, pacientes diagnosticados com espasticidade moderada à grave podem ter acesso ao remédio.

Em 05/12/2016, igualmente houve a ampliação do número de produtos composto por CBD, ocasião em a ANVISA possibilitará a autorização para a importação de forma mais simples. Tais produtos não tem registro no Brasil e nem passaram por teste clínico aprovado pela a ANVISA. Esse é o trâmite resolutivo que tem desburocratizado o acesso ao composto feito à base do CBD.

Insta salientar, que os efeitos benéficos do canabidiol no tratamento de doenças, não podem ser usados como justificativa para a legalização da maconha para fins recreativos. De acordo com Crippa (2012), decorridos 50 anos de estudo, a proposta é, criar uma agência pública que regulamente a plantação, fabricação, e comercialização da maconha e viabilize o uso medicinal da droga, seja ele como fumo, cápsula ou spray, com controle e rigor.

A sugestão do cientista é a mais do que adequada, é benéfica tanto para a coletividade como para a nação, abrange economia financeira e celeridade na aquisição. Não se prolongaria o sofrimento do paciente em razão da demora, não se favoreceria tráfico ilícito, dentre outras situações constrangedoras que já ocorreram em tempos de outrora, a exemplo da prisão do paciente diagnosticado com câncer e que no seu quintal plantou maconha para consumir em forma de chá com a finalidade de favorecer o seu apetite. Igualmente, facilitaria o manuseio nos estudos e a condução dos experimentos, pois o que a cúpula dos cientistas e pesquisadores defende nada mais é do que o manuseio de uma das 400 substâncias que a planta canabis possui, pois beneficia a saúde da sociedade, causando uma melhoria na qualidade de vida dessas pessoas portadoras de doenças crônicas, que, até então, tem dificuldade para ser tratadas com os meios farmacológicos disponíveis no mercado. Os riscos do uso do canabidiol são equiparados ao de uma medicação comum e os benefícios prevalecem sobre os riscos, não há razão para obstar ou burocratizar o tratamento com o CBD uma vez já devidamente comprovado.

Atualmente, o poder Judiciário que no princípio atua em favor da importação do medicamento, agora, dispõe do Núcleo de Apoio técnico ao Judiciário denominado NAT-JUS, antes chamado NATEM (núcleo de apoio técnico ao magistrado) e ainda se discuti a instalação de comitês Estaduais e Federais para tratar de demandas judiciais no âmbito da saúde. Por sua vez, o NAT-JUS, tem a finalidade de presta assistência aos magistrados por meio de médicos que compõe o órgão pertencente ao TJ-PI quando do recebimento de demandas judiciais relacionadas à área da saúde que requeiram do juiz (a) o embasamento de conhecimentos técnicos e específicos. Nesse caso, o pleito social segue por esse critério de análise. A Resolução n°131/2019, do TJ-PI, tem por base a Resolução n° 238/2016 de 19 de março de 2019, que dispõe sobre a criação e instalação de comitês nos tribunais. (CARVALHO, 2019).

Até o presente momento, embora continue a evolução normativa no sentido de viabilizar o acesso ao medicamento à base do CBD, via administrativa, pela ANVISA com o surgimento de resoluções, ao mesmo tempo ocorrem sucintas provocações frente ao poder judiciário, visando à autorização do uso do CBD que agora requer à análise do Nat-Jus, que pode tornar ou não moroso ou dificultoso o concebível direito à saúde. E assim, perpetua-se a prioridade da eficácia do direito à saúde assegurada Constitucionalmente ao cidadão, retratando o descompasso na visão legislativa morosa que deve ser unicamente destinada a assegurar o exercício do direito social à saúde por se tratar de norma suprema.

 

Considerações Finais

A princípio buscou-se compreender o contexto histórico da planta cannabis, sua utilidade para os povos antigos e as razões de sua proibição nos dias atuais, adiante o estudo da disciplina jurídica do uso, produção e comércio das drogas no Brasil, visto que, a planta popularmente conhecida por maconha é entorpecente, destacando a importância do uso do canabidiol derivada dela que é eficaz no tratamento de doenças crônicas, bem como, o aumento na demanda pelo uso do CBD no tratamento de doenças, o que impulsionou o CFM (Conselho Federal de Medicina) a criar uma nova resolução regulamentando a permissão de uso, o que antes não existia. Depois, o ponto de vista dos cientistas para que se estimule pesquisas e o desenvolvimento de políticas públicas em prol da melhoria da saúde, pois se trata de direito fundamental além de ressaltar os embaraços para atuar no Brasil com essa finalidade. Sobre a criação dos Direitos Humanos notadamente é o resultado de um processo que nasce com a constituição dos Estados liberais, àqueles Estados que receberam uma forte influência da Revolução Americana e Revolução Francesa.

Os apanhados históricos relatam a associação da planta canabis com a criminalidade,  com o racismo, e a partir da proibição legal causa o que na prática chama-se conflito horizontal entre as normas de segurança pública, o bem jurídico tutelado pela lei 13.343/2006 e o Direito social à saúde. O direito social à saúde, embora garantidos constitucionalmente é norma de aspecto pragmático, dependente de leis infraconstitucionais para regulamentar a forma de tornar concreto o direito. No que tange ao uso do CBO, pesquisas e produção de medicamentos com a extração dessas substâncias, aqui no Brasil ainda não é possível visto que o cultivo é proibido pela a lei de drogas, necessitando, portanto de alteração principal.  Em termos de saúde pública, as substâncias extraídas da planta convertida em medicamento causam benefícios que em nada prejudica o bem jurídico protegido da lei 11.343/06.

Felizmente no ano de 2015, paulatinamente, o uso do Canabidiol (CBO), tem sido regulamentado pela ANVISA, por ser uma opção viável, inquestionável para o tratamento de doenças não tratáveis com a farmacologia comum no Brasil, e agora, inserida na lista de substancias proscritas.  A repercussão na decisão da Justiça Federal do Distrito Federal que inicialmente estipulou prazo para a regulamentação, embasa o pleito, pois como sabido, o Poder Judiciário pode e deve intervir quando a política pública for comprovadamente inadequada para tutelar a saúde, nessa hipótese, sempre respeitando a justa medida da razoabilidade e proporcionalidade, mediante prévia provocação do interessado.

Nessa perspectiva, atualmente, tem se avançado em passos um tanto restrito no sentido de garantir o direito à saúde através do uso do CBD e THC, têm–se debatido no Congresso Nacional sobre tudo relacionado à Cannabis como medicamento, e aguarda-se que as deliberações alcancem os resultados almejados pelos pesquisadores e população. Enquanto isso, o Brasil, embora tenha sido pioneiro nas pesquisas com as substancias em tempo de outrora, sofre os com impasses financeiros e legislativos, logo, deixa de adquirir bônus para o País, bem como reaver positivos, eficazes, científicos, e econômicos em favor da nação e coletividade. Os impasses no Brasil limitam o direito à saúde da população.

 

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[1] Documentário quebrando o tabu. Disponível em: < http://www.quebrandootabu.com.br/>

Âmbito Jurídico

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