Resumo: O novo CPC trouxe consigo a necessidade de se rever alguns aspectos da jurisdição e o papel que desempenha no Estado. A arbitragem como um meio de pacificação social também se apresenta nesse palco para a análise de seu objetivo perante a sociedade.
Palavras- chave: Novo CPC. Arbitragem. Jurisdição.
Abstract: The new CPC brought with it the need to review some aspects of the jurisdiction and yours works in the State. Arbitration as a means of social pacification also presents on this stage for the analysis of yours objective at the society.
Keyswords: New CPC; Arbitration; Jurisdiction.
Sumário: Introdução; 1 Meios de pacificação social Breve aspecto histórico; 2 Jurisdição e sua função no Estado de Direito; 2.1 Arbitragem jurisdição e o acesso à justiça; 2.2 Jurisdição estatal e jurisdição arbitral no novo CPC; Conclusão.
Introdução
O presente estudo busca analisar a jurisdição diante do Novo CPC e seus aspectos legais que influenciam, pragmaticamente, no seio da pacificação social. É no contexto assertivo da sua semântica que a expressão tem concebida uma retificação doutrinária que já se apresenta como necessária para a compreensão da nova ordem processual civil e o alento legislativo de se preocupar com a duração razoável do processo, ou melhor, da justa solução dos conflitos seja pelo Estado ou por mecanismos equiparados que buscam enaltecer essa solução.
1 Meios de pacificação social – Breve aspecto histórico
Ubi societas ibi ius[1], essa expressão esclarece a coexistência das normas jurídicas e a sociedade. O Direito, no aspecto social, representa um conjunto de instrumentos que a sociedade dispõe para imposição dos modelos culturais, ideais coletivos e valores que persegue visando a pacificação social.
O presente trabalho não tem por escopo o estudo do que representa o Direito para a sociedade, uma vez que, há necessidade de uma abordagem própria analisando em seus vários aspectos. O direito representa no seio da sociedade, um complexo de normas que regulam a vida dos cidadãos em uma determinada época, baseado em uma perspectiva de fato, valor e norma.
Assim, percebe-se que o direito de um cidadão não representa um elemento intangível, pelo contrário, a busca pela sua concretização e resultado é o que marcam nossos recentes estudos jurídicos, principalmente em matéria processual, tais como a efetividade do processo, instrumentalidade do processo e também não se pode olvidar a respeito da CF/88 ao dispor no art. 5º inc. LXXVIII a concretização dos princípios da economia e celeridade processual.
Ultrapassadas tais considerações sobre o Direito e seu aspecto sociológico que desenvolve em determinada comunidade, é preciso verificar a evolução desencadeada ao longo dos anos para tutela desses direitos. Certamente que, seria imprudente afirmar que na Roma Antiga existiam os direitos fundamentais ou direitos humanos, pois é cediço que nesses tempos o devedor de determinadas obrigações respondia com a própria vida, existindo a imposição da vontade de uma das partes sobre a outra, outrossim, é o que marca a fase da autotutela.
O instituto da autotutela embora seja proibido em regra (art. 349 e 350 do Código Penal), nos remotos tempos era a via eficaz para que o lesionado obtivesse o resguardo de seus direitos, não havia tamanha comoção como atualmente a possibilidade de matar alguém em razão de alguma dívida ou mesmo transformá-lo em escravo para quitação das obrigações contraídas[2].
A autotutela aponta duas características que claramente a definem: ausência de um terceiro alheio ao litígio para dirimi-lo; e imposição da vontade de uma das partes sobre a outra.
Essa prática foi sendo abolida diante das vicissitudes sociais, surgindo a possibilidade de intervenção de um terceiro alheio ao conflito para solucioná-lo, mas mesmo assim, a presença deste terceiro não era obrigatório, surgindo a chamada arbitragem facultativa. Esclarece-se desde já, que essa “arbitragem” não se confunde com a Lei da Arbitragem (Lei nº 9.307/96), sua utilização apenas representa a anuência que as partes concediam a um terceiro para resolver seus impasses. Esse terceiro, eram os sacerdotes cujas ligações com as divindades garantiam as soluções mais acertadas de acordo com a vontade dos deuses ou ainda, era este terceiro poderia ser os anciãos que conheciam pela experiência da vida os costumes locais que integravam uma comunidade.
Na medida em que o Estado foi se firmando como ente soberano, impõe-se aos particulares situações que invadem sua esfera de liberdades, nasceu daí gradativamente a tendência de absorver o poder pelo Estado e com isso ele chama para si o jus puniendi.
A esta fase é chamada de arbitragem obrigatória, na qual a presença de um terceiro que antes era facultativa passou a ser obrigatória representada pelo Estado como ente soberano.
O Estado passou a centro de solução de conflitos, sua provocação depende das partes interessadas e como atividade do Estado, o juiz como agente desse, será o responsável pela concretização e resguardo dos direitos.
Embora o Estado tenha assumido essa prerrogativa social, é inevitável deixar de perceber que essa função atualmente tem causado grandes entraves na tutela de direitos pelos cidadãos, hoje se pode visualizar a demora para a solução de um simples conflito, onde o tempo utilizado para dirimir a insatisfação no seio da sociedade, pode causar os chamados danos marginais[3] às partes, isto é, quando a demora na prestação jurisdicional gera danos às partes, v.g., o próprio objeto discutido nos autos pode perecer o que causa um infortúnio não só às partes como ao próprio ente político em termos de responsabilidade estatal.
Pode-se afirmar que a busca de outros meios alternativos de pacificação social é consequência da impossibilidade de o Estado dirimir os conflitos em menor tempo e evitar na maioria das vezes o perecimento do direito. A autocomposição ganha relevo possibilitando aos interessados buscarem através da transação a tutela de seus direitos.
Cabe apontar que o instituto da autocomposição representa claramente a dicotomia da norma jurídica em sua divisão entre norma de direito material e de direito processual. A essa dicotomia impõe lembrar a Teoria Dualista de Giuseppe Chiovenda em que claramente denotamos a diferença entre as normas jurídicas de direito material e de direito processual, onde a primeira sempre preexiste ao processo, que de per si pode exaurir as obrigações sem a necessidade do processo. Assim, um acordo entre as partes que vivencia qualquer forma de extinção das obrigações (pagamento, dação em pagamento, novação, etc.) é suficiente para dirimir o conflito sem a atuação do processo.
Perceba-se ainda que, diante de sua importância jurídica, a autocomposição é colocada como pilar de existência de uma lei, v.g. a Lei nº 9.099/95 que trouxe os chamados Juizados Especiais na qual em seu art. 2º pondera que os processos nesses juizados serão orientados pela conciliação e transação.
Muito embora seja louvável o instituto da autocomposição, certamente que, se não alcançada a transação almejada pelas partes, tudo retornaria ao statu quo, ou seja, as partes ainda estariam em contraposição de interesses o que restaria levar o litígio à jurisdição estatal.
De outro lado, não seria conveniente que o cidadão lesado ou na ameaça de sê-lo, pudesse aguardar por longo tempo a tutela de seu direito, o problema da morosidade da justiça representa uma grande preocupação à população, fato que levou a criação da EC nº 45/2004 denominada de Reforma do Poder Judiciário que embora os alentos sejam louváveis por parte do Governo, infelizmente criaram-se outros entraves como, v.g., o problema da definição de competência sobre matéria indenizatórias oriundas do ambiente de trabalho, as Súmulas Vinculantes, etc.
Desta forma, a Lei nº 9.307/96 tomou assento relevante em nosso pátrio direito. A procura por meios mais céleres e com a mesma garantia impositiva do Poder Judiciário para solucionar os conflitos, a Lei da Arbitragem, foi crescendo neste aspecto. Na atual sociedade da informação, os meios de pacificação social, não atrelados com a atividade estatal, representam um avanço em economia de tempo e ônus pecuniário; não obstante, contribuindo principalmente para a facilitação de resolver conflitos entre sucursais de multinacionais que aqui exploram a economia ao inserirem a cláusula compromissória em seus contratos.
A arbitragem, diante do relevante objetivo social que representa atualmente, faz repensar os aspectos jurídicos da jurisdição e seus efeitos, contribuindo com um panorama rico de questões que merecem estudos pela academia jurídica brasileira, não apenas no aspecto processual como também para a teoria geral do direito no que tange a sua própria definição.
Seria conveniente conceber ao árbitro o exercício da jurisdição?
Tal indagação indica a reflexão de como ficaria a atividade do Estado – Juiz.
Neste diapasão passa-se a analisar a jurisdição e seus aspectos na função jurisdicional no Estado de Direito.
2 Jurisdição e sua função no Estado de Direito
Pode-se verificar a respeito da jurisdição, que não há contornos precisos, no mínimo pode referir-se como o poder que uma autoridade possui.
De seu ponto de vista etimológico representa o poder de dizer o direito aplicado a uma situação ou conduta que quebra a paz jurídica. Em outros termos, é a determinação de um critério jurídico de decisão para um problema que não pode ser resolvido espontaneamente[4].
Perceba-se que o poder é significativo na jurisdição, este poder caracteriza a imposição do direito, o brandir da espada da justiça. Muito embora a palavra “poder” seja polissêmica, interessa notar que a noção de poder diz respeito à capacidade de impor a própria vontade numa relação social[5].
Certamente que a espécie aqui abordado é o Poder Jurídico que necessariamente estará atrelado à necessidade de uma norma jurídica para exercício desse Poder. De tal forma que a própria norma jurídica também foi confeccionada através de uma certa norma de competência que atribuiu o Poder para Legislar para alguém.
Observando tal assertiva sobre o poder como elemento da jurisdição, deve ficar claro que esse mesmo poder não precisa ser necessariamente praticado pelo magistrado.
Essa idéia em estar relacionado com a atividade do magistrado remonta do Direito Romano, onde define a jurisdição como a manifestação do poder de imperium do magistrado daí nossa concepção atual de que a jurisdição seria a atividade praticada pelo magistrado para pacificação social.
Embora o berço romano venha a refletir no atual conceito de jurisdição não parece razoável aceitar que somente o juiz de direito que possui as garantias constitucionais do art. 95 da C.F./1988 teria a possibilidade de exercer a jurisdição.
Daí a necessidade de não confundir a jurisdição com a autoridade que se utiliza desse poder, a primeira teria o escopo de encontrar a verdade (formal ou material) através da atuação do direito material, o segundo representa a competência investida para utilizar o poder, v.g., poder de criar leis.
Certamente que, quando atrelamos o problema de competência, é cabível frisar que a qualificação de um sujeito individual ou coletivo como autoridade é a existência de uma norma jurídica de competência preexistente que o autoriza a criar normas jurídicas, em outras palavras, a Lei da Arbitragem também trouxe os aspectos legais da competência do árbitro, portanto, é uma autoridade criada por uma determinada norma de competência[6] para resolução de conflitos.
Portanto, diante da análise do contexto da jurisdição, não é conveniente apregoar que apenas o juiz de direito teria condições de exercer a atividade jurisdicional.
A jurisdição nesta aproximação conceitual é o poder de julgar de acordo com os critérios jurídicos e as formas de seu exercício são variáveis. Neste aspecto, no Estado Liberal de Direito, o poder jurisdicional concentraria a atividade de administrar a justiça de acordo com a lei dentro de uma concepção impregnada de política, ética e história, contudo não apenas um monopólio do Estado.
Justamente no alento de se obter uma tutela jurídica mais concreta, ágil e econômica que a sociedade postula por outros meios de pacificação social e que certamente não poderiam estar excluídas da jurisdição o que passamos a analisar este aspecto com a arbitragem.
2.1 Arbitragem, jurisdição e o acesso à justiça
Embora o princípio consagrado na Constituição Federal de 1988 no art. 5º inc. XXXV venha a refletir o acesso à justiça, não é difícil visualizar o problema que o acesso à justiça representa no contexto contemporâneo, a evolução social algumas vezes não é abraçada por nossas leis, pois é cediço que aquela é muito mais intensa do que esta.
Para se entender o quão extenso é a aplicação do princípio do acesso à justiça, temos que repassar o que realmente significa justiça diante dessas mudanças sociais.
A concepção de justiça padronizada significava em sua essência a mera aplicação de regras correlatas ao direito aos fatos verdadeiros do caso.
O novo entendimento sobre justiça veio com a terceira onda de Mauro Cappelletti e Bryant Garth em sua clássica obra Acesso à Justiça, onde fizeram uma análise além do que mera aplicação correlata do direito ao fato concreto, o direito representa um pilar para a busca da justiça social através de procedimentos que possam garantir a pacificação e adequados com a realidade atual de nossos Tribunais[7].
A terceira onda introduzida pelos autores citados nas arcadas jurídicas, reconhecem o acesso à justiça como além de uma justa representação, levando-a para uma concepção mais ampla, postulando um novo enfoque, abrigando desta forma, tanto as situações judiciais como extrajudiciais[8].
Assim, é de se entender a extensão que abrange o princípio do acesso à justiça, muito embora o art. 5º inciso XXXV da CF/88 coloque no plano que cabe somente ao Poder Judiciário a apreciação de qualquer ameaça ou lesão ao direito, não podemos dizer que, se uma lei retira tal apreciação, seja declarada inconstitucional[9], pois limitaríamos muito seu entendimento e não representaria os anseios da terceira onda do acesso à justiça proclamada por Mauro Cappelletti.
E ainda, não menos importante, o próprio art. 5º,inc. XXXV, da CF/88 ao relatar que não excluirá da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça ao direito e mesmo analisando os critérios adotados para entender o acesso à justiça (maior participação de causas e pessoas no processo; devido processo legal; participação das partes para formação do convencimento do juiz e efetiva participação em diálogo)[10] no escopo da busca pela pacificação social, permite que se passe ao longo da análise da amplitude do acesso à justiça sob o foco da jurisdição.
É o meio que complementa os dizeres da terceira onda do acesso à justiça atribuir sobre ela o contexto da jurisdição, pois como afirmado, o princípio do acesso à justiça deve possuir uma extensão em sua concepção, não se limitando ao Poder Judiciário, mas como forma de buscar outros meios que traduzam no aspecto social a real concepção do acesso à justiça através da busca de outros procedimentos para dirimir conflitos.
Certamente que, quando se referir em dirimir conflitos pensa-se na própria jurisdição, na evolução que parte da autotutela aos anseios estatais em chamar para si o ius puniendi[11].
Portanto, antes de refletir sobre o acesso à justiça e a jurisdição, passamos a definição de jurisdição.
Não seria razoável apenas definir a jurisdição como o poder de dizer o direito pelo Estado-Juiz para solução de conflitos, eis que, apenas denota a preocupação jurídica esquecendo-se das garantias sociais que devem refletir no contexto do acesso à justiça e da pacificação de litígios[12]. Essa concepção claramente denota apenas a jurisdição como monopólio do Estado o que é intolerável em razão das circunstâncias das vicissitudes sociais.
Podemos desta forma, conceituar jurisdição como a função atribuída por terceiro imparcial de realizar o Direito de modo imperativo e criativo, reconhecendo, efetivando, protegendo situações jurídicas concretamente deduzidas, em decisão insuscetível de controle externo e com aptidão para tornar-se indiscutível[13].
Referido conceito esgota todas as possibilidades que poderíamos suscitar sobre a jurisdição e sua extensão quanto a órgãos não – estatais.
A pretensão da terceira onda conclamada pelo acesso à justiça pelo italiano Mauro Cappelletti soma ao tema da busca de outros procedimentos capazes de garantir a ordem social.
As mudanças sociais nos levam a isso. O grande número de processos em nossos Tribunais, a capacidade econômica do litigante muitas vezes incompatível com as custas e despesas processuais que suporta, representam alguns dos inúmeros motivos pela busca de meios mais céleres e efetivos para concretização e satisfação de direitos.
Todavia, certamente que o problema do acesso à justiça não deva ser analisado de forma isolada, uma das maiores evoluções em nosso direito foi o alcance da jurisdição.
Razoável é sua análise com o acesso à justiça, dentro de um novo conceito que acompanhe as vicissitudes sociais[14].
A jurisdição reflete em muitas legislações infraconstitucionais[15] e o critério a analisar é saber se há verdadeira jurisdição nessas leis ou apenas são reflexos de uma deontologia que aspiram a concepção antiga mantendo o rigorismo Estatal.
Muitas dessas legislações infraconstitucionais não têm o crivo da verdadeira jurisdição, pois embora seus parâmetros algumas vezes mencionem a expressão: “jurisdição em todo território nacional” a verdadeira conotação é a de que seus efeitos serão exercidos em todo o território nacional[16].
Interessante analisar que algumas leis apresentam de forma híbrida no contexto da jurisdição, p.e. a Lei n. 2.180/1954 que trata do Tribunal Marítimo e que traz em seu bojo no art. 16 a possibilidade de instituição de arbitragem entre as partes, assim, caso essa prerrogativa seja utilizada, estaríamos diante de uma verdadeira jurisdição, o que será comentado adiante sobre o tema arbitragem e jurisdição.
Assim, ultrapassadas as premissas sobre a extensão do acesso à justiça e a jurisdição propriamente dita, passamos a analisar o sistema arbitral e a extensividade concreta da jurisdição neste caso.
A jurisdição em seu novo enfoque representa a imagem publicista de como o Estado age para dirimir os conflitos, note-se que o poder de dizer o direito pelo Estado-juiz, apenas espelha um de seus inúmeros objetivos.
Sua atenção volta-se aos reflexos sociais, buscando ao máximo a satisfação social e não apenas a aplicação do direito isoladamente, por isso justifica a efetividade de suas decisões como um dos critérios corolários do acesso à justiça[17]e que pela via conseqüente representa o seio da possibilidade das decisões jurisdicionais se tornarem imutáveis garantindo essa efetividade a quem teve a lesão ou possui ameaça ao direito.
Dentre os meios apregoados pela sociedade se destaca a arbitragem que inevitavelmente contribui com a efetividade dos direitos tanto no aspecto substancial quanto processual.
Assim, a arbitragem é vista como um dos objetivos que o Estado possui em pacificar litígios exercendo a jurisdição plena, senão vejamos[18].
O fato inegável é que a arbitragem, embora tenha origem contratual, desenvolve-se com a garantia do devido processo legal e termina com um ato[19] que possui a mesma função de uma sentença judicial.
Para o presente estudo, observa-se que existem quatro formas de definir a natureza da arbitragem, mas como exposto anteriormente, afilio-me a corrente que considera o Juízo arbitral uma verdadeira jurisdição[20].
Temos a primeira posição que adota natureza puramente contratual; a segunda posição que considera o juízo arbitral uma verdadeira jurisdição; a terceira que considera um misto entre as duas anteriores, sendo contratual no seu fundamento inicial e jurisdicional ante a natureza pública da sentença arbitral; e a quarta corrente que afirma ser a arbitragem um equivalente jurisdicional, pois a jurisdição embora pertença ao Estado, a arbitragem equivale a ela apresentando todas as suas funções[21].
No primeiro e terceiro posicionamentos não há como negar que a arbitragem tenha um cunho do direito material e de direito processual, sendo um instituto envolto pelo heterotipismo das normas jurídicas, portanto, inconcebível apenas tratar como instituto de direito material. Não obstante, mesmo no início de sua criação é possível verificar conotações jurisdicionais, v.g., o compromisso arbitral firmado em um processo já em trâmite e ainda, a sua conseqüência certamente seria de cunho jurisdicional, o que reforça sua natureza neste aspecto.
E o quarto posicionamento certamente, como foi exposto em pontos anteriores, a jurisdição não é um monopólio do Estado, restando assim, a natureza jurisdicional da arbitragem.
A maior preocupação sobre sustentar a jurisdição na arbitragem é o poder de imperium sobre suas decisões e assim corroborar com a efetividade.
Ora, afirmar que a inexistência deste poder ao árbitro subtrai a jurisdição do seio da arbitragem é equivocada, eis que, essa subtração subsiste no próprio âmago do Poder Judiciário e nem por isso deixa a jurisdição de existir, p.e. os julgados dos Tribunais Superiores em que há delegação de sua executoriedade aos Tribunais Inferiores de primeira instância.
Observa-se que a questão seria mais de incompetência e não de falta de jurisdição: a lei ao permitir a arbitragem, investe-lhe em competência apenas para certificar direitos, não para efetivá-los[22].
Não obstante, as partes ao escolherem a arbitragem não renunciam a jurisdição, apenas o seu exercício pelo Estado, não há monopólio de seu exercício, até mesmo pelo fato da própria CF/88 no art. 114 § 1º delegar esse exercício em matéria trabalhista.
Um argumento contra a jurisdição na arbitragem é que as decisões podem ser controladas pelo Poder Judiciário[23], mas tal reflexão melhor sorte não assiste, pois só seria válido se partíssemos da premissa de que o árbitro não é juiz, e que a decisão do juiz estatal pertence a outra estrutura.
Daí tem que, se o árbitro não é juiz, porque então estaria submetido aos impedimentos e suspeição previstos no CPC? Assim, se partimos da premissa que o árbitro exerce jurisdição, a possibilidade de controle da validade de suas decisões pelo juiz estatal seria apenas uma questão de distribuição de competência funcional[24], como já acontece dentro da esfera das ações rescisórias, por exemplo, onde a competência para julgar e processar é atribuída a órgãos distintos daquele que proferiu a decisão que se busca desconstituir.
Assim, perfeitamente cabível a jurisdição em órgão não estatal como a arbitragem em que se depreende a autorização legal diante da necessidade do amplo acesso à justiça e consequente efetividade das decisões como garantia social. Esse aspecto representa a tendência contemporânea[25] sobre a questão e que refletiu no novo código de processo civil.
2.2 Jurisdição estatal e jurisdição arbitral no novo CPC
Tal como se verifica nas linhas anteriores, a jurisdição costuma ser conceituada como a tríplice qualificação como poder, função e atividade, porém essas considerações devem ser retificadas[26], pois a jurisdição não é um poder, mas uma expressão do poder estatal.
Ela se situa juntamente com a legislação, entre as atividades jurídicas do Estado. É uma atividade ligada essencialmente à atuação jurídica, enquanto que a legislação se destina à produção jurídica.
O Estado persegue os objetivos do processo com fundamento em sua própria capacidade de decidir imperativamente e impor decisões e sem a anuência das partes no processo. A situação destes perante o Estado é de sujeição.
Na atual ciência processual a respeito da jurisdição, também deve-se passar pela inclusão, nesse conceito, da jurisdição exercida pelo juiz estatal como também pela arbitragem, pois é do passado a crença de que o monopólio estatal da jurisdição seria apenas do magistrado togado.
A jurisdição arbitral também é exercida com fundamento em um poder, mas diferentemente da jurisdição estatal, não se dá por meio do ato de imperium, mas pela bilateralidade das partes que houverem optado pela arbitragem. O seu caráter substitutivo apenas não se incluem os atos de constrição sobre pessoas ou bens, salvo quando a própria lei da arbitragem assim consentir (vide atuais reformas da Lei n. 9.307/1996 pela Lei n. 13.129/2015).
Na atual realidade é significativo observar que a própria sigla por meio da qual ficaram conhecidos os meios de solução dos conflitos “ADR” passou a ser lida não mais como o sentido original “Alternative Dispute Resolution”, mas como “Adequate Dispute Resolution”, ou seja como formas adequadas de se solucionar os litígios.
Por isso que, o Conselho Nacional de Justiça 125/2011 passou a designar meios adequados de se solucionar os conflitos. O Novo CPC também faz referência no art. 3º, § 3º, que os meios de solução de conflitos devem ser sempre incentivados.
Daí porque, o palco pela a efetividade de alguns mecanismos de pacificação social, encontra-se preparado para que o cenário da atuação da arbitragem seja convincente aos olhos dos jurisdicionados que procuram resolver seus conflitos. Em outras palavras, traz uma face nova daquilo que se procura demonstrar como essencial para a atividade jurisdicional.
Conclusão
A jurisdição, embora repouse o seu exercício na concepção uníssona do Estado em grande maioria da doutrina, sua análise semântica demonstra justamente o contrário, como poder exercido não somente pelo Estado-juiz como por entes não-estatais.
Justamente na tentativa de explicar esse fenômeno social sobre a utilização de outros meios de pacificação é que ganham relevância a análise dos tribunais administrativos, arbitragem, etc. O que parecia um estudo sem alento acadêmico retoma a necessidade de revisitar o tema da jurisdição em seus vários aspectos.
Sua análise de compreensão não reside unicamente no seio do direito processual, como também na teoria geral do direito que explica a etimologia da palavra jurisdição trazendo consigo um prospecto mais amplo e que possa alinhar com as vicissitudes sociais para resolução dos conflitos.
Não se perca de vista que o berço do Direito Romano foi fundamental para que a concepção uníssona do exercício da jurisdição fosse semeada em nossa vasta doutrina, mas a análise filológica da palavra demonstra que não foi este o real interesse da jurisdição, limitar apenas seu exercício ao Estado.
Seu exercício não pode ser segregado como objeto de conhecimento entre os juristas, pelo contrário há de propor que a jurisdição seja exercida e dita por qualquer ente que detenha competência para tanto, sendo mais racional, prático e simples de ser entendido. Somente assim sua acepção seria facilmente entendida diante das mudanças sociais e problemas que enfrentamos no Poder Judiciário.
Advogado Professor de Direito na Universidade Anhanguera de Taboão da Serra-SP. Professor no Centro Integrado de Educação no Trânsito em cursos de trânsito e de Pós-Graduação em Trânsito. Major da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Graduado em Direito pela Universidade Bandeirante de São Paulo e graduado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco. Pós-Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho Direito Penal e Processual Penal e Didática do Ensino Superior.
Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP; Advogado da Rosenthal Guarita Facca Advogados Especialista em Direito Tributário e Direito Processual Civil pela PUC/SP Professor de Graduação e Pós-Graduação no curso de Direito e MBA em Finanças da Unifieo e Anhanguera Educacional
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