Jeniffer Emmanuele Wenceslau Cocovic – Advogada atuante na área cível, com foco em Família e Sucessões,graduada em Direito pelo Centro Universitário Newton Paiva em 2013, pós graduanda em Direito Processual Penal. E-mail:cocovichadv@yahoo.com.br
Resumo: O Estudo da Execução Penal vem crescendo de forma ampla e a preocupação com os meios punitivos vem tomando espaço na sociedade. O presente estudo visa aprofundar-se na referida discussão ao passo que analisa a efetividade da lei de Execução Penal brasileira
Palavras-chave: Lei de Execução Penal; valoração do preso; Execução Penal; métodos punitivos.
Abstract: The Study of Penal Execution has been growing broadly and the concern with punitive means is taking place in society. The present study aims to deepen this discussion while analyzing the effectiveness of the Brazilian Penal Execution law.
Keywords: Penal Execution Law; valuation of the prisoner; Penal execution; punitive methods.
Sumário: Introdução. 1 LEP e a Perpetuação da Pena. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
O Brasil de 1984 passava por grandes movimentos que alavancavam o País em busca de uma democracia plena (JUNIOR- 2011).
Movimentos sociais já surgiam com o intuito de livrar aquele Brasil da tão cinzenta e horrenda ditadura, dentre eles o movimento “Diretas Já” deixou sua marca.
No meio de tantas mudanças, sociais, politicas, econômicas, o direito também se transformava e no centro de tantos atos revolucionários uma Lei tão corajosa e ousada quanto os movimentos sociais vividos surgia, com argumentos humanos e solidários, voltando os olhos para uma parcela da população que tanto sofria nas mãos do governo Militar e que não deveria ser desmerecida.
Neste cenário nascia a Lei 7210/84, Lei de Execução Penal, ou simplesmente LEP.
Nasceu moderna, vanguardista, nos moldes da criminologia da década de 70, voltada a preservar a população carcerárea, protegendo-a de alguma maneira das mazelas estatais que, com mãos de ferro impunha sobre o sujeito objetificado no sistema carcerário toda a brutalidade e rigidez do ambiente militar, reflexo da sociedade em questão .
Como representantes desta tal Criminologia, que foi o berço da LEP, destacam-se, sobretudo os pensamentos Marxistas que influenciaram fortemente os estudiosos da época.
Abordando de maneira muito sintética, Marx pregava que o crime não deveria ser analisado pelo fato gerador do dano, mas sim pela sociedade ao redor,as condições sociais e politicas que influenciaram o delito. Para esta Teoria seria impossível anular o problema criminal em uma sociedade capitalista (LOPES- 2002).
Apesar de anterior à Constituição tão almejada que veio surgir em 1988, a LEP trouxe a mesma humanização, e estava em concordância com preceitos que seriam posteriormente constitucionalizados. Enfim, nasceu repleta de esperança para a sociedade que também tinha esperança.
Todavia, hoje, 36 anos depois de sua promulgação difícil acreditar na realidade que presenciamos em presídios por todo o País.
Após tantos anos de sua promulgação, a Lei ainda têm metas que não passam de ideais inatingíveis, artigos de leis inaplicados, promessas não cumpridas. A sociedade de outrora, hoje presencia o descaso com as mudanças tão desejadas.
O Brasil não vive a ressocialização e a Inclusão esperada, e a desídia de nossos governantes não só com a LEP, mas também com a constituição, reflete o cenário que transparece hoje: uma sociedade insegura, com índices de criminalidade altos, sensação de alta impunidade em contraponto com numeros que refletem a grande carcerização efetivada pelo Estado dia a dia.
Cidadãos que clamam por leis mais severas e perversas, e a perpetuação de um sistema punitivo inoperante e cruel com excesso de leis e precariedade de medidas efetivas na área penal. (JUNIOR- 2011)
É muito clara a crise vivida pelo sistema penal brasileiro, que já não consegue dar à sociedade o que esta almeja.
Apesar da culpa recair na maioria das vezes numa legislação que se julga falha, o presente trabalho vem tentar mostrar que a sociedade e os operadores do direito é que são, quase sempre, os verdadeiros culpados e mudar a legislação talvez seja menos eficaz do que realmente cumpri-la e adequá-la quando se fizer necessário, o que não acarreta necessariamente uma mudança de todo o sistema penal.
“Talvez a maior lição que a LEP nos tenha deixado nesse um quarto de vida é a de que não bastam boas leis para mudar uma realidade vergonhosa que teima em persistir desde o Brasil Colônia; mais do que isso,é preciso que a sociedade se conscientize da sua importância, para a sua própria sobrevivência”. (JUNIOR- 2011).
A Lep e a Perpetuação da Pena
Nosso sistema penal, assim como todo o ordenamento jurídico retira da Constituição Federal a validade de suas normas e com a Lei de Execução Penal não poderia ser diferente.
As garantias fundamentais estão descritas no artigo 5° da CF/88, reunidas ali com o propósito único de delimitar a atuação Estatal no exercício de seu Poder punitivo quando este for direcionado aos cidadãos.
Assim, o referido artigo ao abrir o capítulo denominado “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” irradia pelo ordenamento a luz da Constituição Federal, delineia limites e traz aos subordinados daquelas normas impositivas a certeza do respeito a direitos tidos como básicos e conquistados historicamente.
Todo o sistema penal, e não só a Lei de execução penal, deveria andar em consonância com o que apregoa a Constituição Federal, todavia o que se vê nem sempre é o que deveria ser.
Segundo Renata Tavares:
“A lei de Execuções Penais- LEP- sobre as bases teóricas da Nova Defesa Social, assenta sobre o paradigma disciplinar de tratamento que versa sobre dois postulados primários: a avaliação da personalidade do preso e a análise de seu comportamento.” (TAVARES- 2012)
A LEP não pode interferir na personalidade do preso devendo restringir-se apenas à reinserção deste preso à sociedade e o cumprimento da pena estipulada em julgamento.
Enfocando na inserção social, a LEP traz em seu artigo 112 a possibilidade de progressão de regime, o que junto com demais dispositivos da própria lei, dá ao preso a real aplicabilidade da ressocialização.
“art. 112 A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
I – 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
II – 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
III – 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
IV – 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
V – 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI – 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
VII – 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII – 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.
§ 1º Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
§ 2º A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes.
§ 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente:
I – não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa
II – não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente;
III – ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;
IV – ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;
V – não ter integrado organização criminosa.
§ 4º O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo.
§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006
§ 6º O cometimento de falta grave durante a execução da pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do requisito objetivo terá como base a pena remanescente”.
Com a progressão de regime o preso começa a ter contato, mesmo que gradual, com a sociedade fora do estabelecimento prisional. Começa aos poucos a adaptar-se com o mundo por trás dos muros e volta a exercer gradativamente sua cidadania.
A grafia do artigo 112 da LEP nos trouxe uma indagação que não poderia deixar de ser feita ante o conteúdo legislativo. Afinal, o que seria boa conduta carcerária?
Nas palavras de Saulo de Carvalho “O bom comportamento carcerário é indicado fundamentalmente pela ausência de registro no prontuário do preso, de falta grave” (CARVALHO-2001).
As faltas graves estão disciplinadas nos artigos 50 e 51 da Lei de Execução Penal que assim explicam:
“Art. 50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:
I – incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina;
II – fugir;
III – possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem;
IV- provocar acidente de trabalho;
V- descumprir, no regime aberto, as condições impostas;
VI- inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.
VII– tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao preso provisório.
Art. 51. Comete falta grave o condenado à pena restritiva de direitos que:
I – descumprir, injustificadamente, a restrição imposta;
II- retardar, injustificadamente, o cumprimento da obrigação imposta;
III- inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.”
Ainda, o artigo 52 ressalva que:
“Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasionar subversão da ordem ou disciplina internas, sujeitará o preso provisório, ou condenadonado, nacional ou estrangeiro, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características:
I – duração máxima de até 2 (dois) anos, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie;
II – recolhimento em cela individual;
III – visitas quinzenais, de 2 (duas) pessoas por vez, a serem realizadas em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, por pessoa da família ou, no caso de terceiro, autorizado judicialmente, com duração de 2 (duas) horas;
IV – direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para banho de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, desde que não haja contato com presos do mesmo grupo criminoso;
V – entrevistas sempre monitoradas, exceto aquelas com seu defensor, em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, salvo expressa autorização judicial em contrário;
VI – fiscalização do conteúdo da correspondência;
VII – participação em audiências judiciais preferencialmente por videoconferência, garantindo-se a participação do defensor no mesmo ambiente do preso.
§ 1o O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.
§ 1º O regime disciplinar diferenciado também será aplicado aos presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros:
I – que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade;
II – sob os quais recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, independentemente da prática de falta grave.
§ 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.
§ 3º Existindo indícios de que o preso exerce liderança em organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou que tenha atuação criminosa em 2 (dois) ou mais Estados da Federação, o regime disciplinar diferenciado será obrigatoriamente cumprido em estabelecimento prisional federal.
§ 4º Na hipótese dos parágrafos anteriores, o regime disciplinar diferenciado poderá ser prorrogado sucessivamente, por períodos de 1 (um) ano, existindo indícios de que o preso:
I – continua apresentando alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal de origem ou da sociedade;
II – mantém os vínculos com organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, considerados também o perfil criminal e a função desempenhada por ele no grupo criminoso, a operação duradoura do grupo, a superveniência de novos processos criminais e os resultados do tratamento penitenciário.
§ 5º Na hipótese prevista no § 3º deste artigo, o regime disciplinar diferenciado deverá contar com alta segurança interna e externa, principalmente no que diz respeito à necessidade de se evitar contato do preso com membros de sua organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou de grupos rivais.
§ 6º A visita de que trata o inciso III do caput deste artigo será gravada em sistema de áudio ou de áudio e vídeo e, com autorização judicial, fiscalizada por agente penitenciário.
§ 7º Após os primeiros 6 (seis) meses de regime disciplinar diferenciado, o preso que não receber a visita de que trata o inciso III do caput deste artigo poderá, após prévio agendamento, ter contato telefônico, que será gravado, com uma pessoa da família, 2 (duas) vezes por mês e por 10 (dez) minutos”
De acordo com o entendimento de bom comportamento, ensinado brilhantemente pelo Ilustre Professor Saulo de Carvalho, um preso que possui uma única falta grave em todo seu prontuário não poderia nunca ter acesso ao referido benefício o que geraria a perpetuação da condenação uma vez que não há qualquer tipo de lapso temporal que determine o tempo máximo para que tais apontamentos continuem a surtir efeitos no sistema jurídico.
A título de exemplo, um preso que desrespeita pessoa que deveria ter bom convívio, brigando com um colega de cela, por exemplo, perderia o beneficio da progressão de regime.
Conforme se verifica em decisão abaixo, a interpretação dada acima é aplicada em nossos tribunais:
Processo: 1209888-38.2012.8.13
Relator(a): Des.(a) Júlio Cezar Guttierrez
Data de Julgamento: 03/04/2013
Data da publicação da súmula: 18/04/2013
Ementa:
EMENTA: AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – FALTA GRAVE – CARACTERIZAÇÃO – SUFICIÊNCIA DE PROVAS DA AUTORIA – REGRESSÃO DE REGIME – INTERRUPÇÃO DO PRAZO PARA NOVA PROGRESSÃO – NECESSIDADE – PERDA PARCIAL DE EVENTUAIS DIAS REMIDOS – ART. 127 DA LEP – OPÇÃO PELA FRAÇÃO MÁXIMA – MOTIVAÇÃO – RAZOABILIDADE – OFENSA AO DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS – INEXISTÊNCIA.
Pratica falta grave aquele que infringe deveres do condenado e ainda incita a subversão da ordem e da disciplina.
Deve-se invocar, na seara de apuração de falta grave, a mesma valoração probatória adotada em tema de aferição da autoria delitiva, onde a palavra de testemunhas deve ser privilegiada em detrimento da negativa isolada do reeducando.
A prática de falta grave é causa de regressão do regime prisional, interrompendo o prazo para nova progressão, ou seja, impondo ao condenado o cumprimento de um sexto da pena para progredir novamente. A observância desse período é importante para que o Julgador possa avaliar o mérito do condenado que o torna compatível com o regime menos rigoroso.
A teor do art. 127 da LEP, o cometimento de falta grave tem como consequência a perda de parte dos dias remidos, inexistindo ofensa ao dever de fundamentação das decisões judiciais se a eleição da fração mais gravosa prevista no art. 127 da Lei de Execuções Penais logrou motivação idônea em face das circunstâncias do caso.
(Fonte:Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Disponivel em:< http://www5.tjmg.jus.br/jurisprudencia/pesquisaPalavrasEspelhoAcordao.do
?&numeroRegistro=3&totalLinhas=10&paginaNumero=3&linhasPorPagina=
1&palavras=AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE.
SUBVERSÃO À ORDEM E À DISCIPLINA.&pesquisarPor=ementa&pesquisaTesauro=true&orderByData=1&referencia
Legislativa=Clique na lupa para pesquisar as referências
cadastradas…&pesquisaPalavras=Pesquisar&> acesso em 01/07/2020)
O artigo 5º da CF/88 prevê expressamente em seu inciso XLVII que não haverá penas de caráter perpétuo.
A falta de limitação temporal para a permanência de tais apontamentos nos prontuários dos detentos e ainda, a ausência de tempo máximo em que uma decisão de concessão ou não do beneficio poderia fundamentar-se nos dados ali contidos, traz uma perpetuação da pena, mesmo que administrativa, privando o apenado de um beneficio que lhe é de direito.
Nos dizeres de Renata Tavares:
“No caso especifico, a perpetuidade da condenação disciplinar é manifestada no tempo de cumprimento da pena, isto é, no tempo em que ela pode surtir efeitos no tempo. Afinal, não há imposição disciplinar à pessoa que não está presa” (TAVARES- 2012).
A referida ausência de regulamentação fere ainda gravemente os próprios objetivos da LEP que conforme seu artigo 1º busca a integração social do preso:
“Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”
Ao preso é dado o beneficio da progressão de regime por uma razão de ser. O Instituto da penalização, visualizado principalmente na pena restritiva de liberdade, há muito já deixou de ser um fim em si mesmo, tendo como função social a reinserção do preso.
Esta dita reinserção é de suma importância, não só para o preso, mas para a sociedade como um todo. Deixando de lado por breve momento o subjetivismo da frase acima há de se ressaltar que a questão esta ainda consolidada no próprio artigo 5º da CF/88 que traz dentre os direitos e garantias fundamentais, a vedação a penas cruéis e a proteção à dignidade da pessoa humana.
A carcerização comprovadamente não traz benefícios, nem ao preso nem à sociedade, assim expõe Alessandro Baratta: “Exames clínicos realizados com os clássicos testes de personalidade mostram os efeitos negativos do encarceramento sobre a psique dos condenados e a correlação destes efeitos com a duração daquele”. (BARATTA-2002)
Logo se vê a importância ressaltada do instituto da progressão de regime, que dá a pena sua função social e ainda, ao preso a garantia de proteção a direitos fundamentais.
Por todo exposto há visivelmente uma necessidade patente de se estabelecer um lapso temporal para os efeitos das faltas disciplinares dos presos.
Os decretos de Indulto e comutação proclamados pelo presidente da Republica com base no artigo 84,XII, da CF/88 tem tradição de estabelecer prazo de 12 meses sem falta grave para que o apenado tenha direito ao benefício.
Os magistrados das Varas de Execução Penal residualmente aplicam tal entendimento, ou seja, o apenado que comete falta grave deve esperar 12 meses para ter direito ao beneficio da progressão de regime.
Ocorre que tal entendimento ainda não é o mais acertado.
A Lei 10.792/2003 deu nova redação ao artigo 112 da LEP que passa a prever expressamente que o bom comportamento carcerário será comprovado pelo diretor do estabelecimento, logo a interpretação que visa delegar ao órgão da administração penitenciária o referido juízo deverá ser rechaçada. A interpretação, portanto do magistrado da Vara de Execução Penal que aplica subsidiariamente o prazo conferido aos beneficiários de Indultos e Comutação fere o que apregoa a nova redação do artigo 112. (TAVARES- 2012).
Ressalta-se a importância do caráter subjetivo do laudo do Diretor do Estabelecimento Carcerário, que tende a basear-se não só em prontuários, mas no convívio efetivo que teve com o preso bem como a relação do referido com os demais colegas da penitenciária e os agentes que lidam diariamente com a rotina dos presos.
Tal raciocínio não se aplica aos laudos criminológicos como veremos a seguir. A introdução de requisitos subjetivos para que o preso tenha acesso a seu beneficio de progressão de regime, materializando-se na obrigatoriedade dos laudos criminológicos, retira do preso a possibilidade de exercer livremente seu contraditório uma vez que contraditório não é apenas refutar tudo o que a parte contrária traz aos autos, mas também poder influir na decisão final.
O motivo se deve ao fato de que ao exigir laudos criminológicos para o beneficio da progressão de regime o juiz delega aos peritos (médicos, psiquiatras, assistentes sociais, psicólogos…) o seu poder de decisão e retira do preso a possibilidade de refutar o conteúdo dos referidos laudos. O juiz se torna assim mero “homologador” de laudos no curso do processo penal. (TAVARES-2012)
Apesar da do advento da Lei 10.792/03 que excluem a necessidade de utilização do laudo criminológico para a progressão de regime, os juízes ainda insistem em requisitá-lo tendo inclusive sumula do STJ a respeito do assunto, dando ao magistrado de a faculdade de utilizar-se do exame criminológico pelas peculiaridades do caso e em decisão motivada. Também o STF manifesta-se a favor do laudo criminológico para progressão de regime em crimes hediondos conforme sumula vinculante 26. Os tribunais legislando sobre a matéria aceitam a possibilidade do exame criminológico desde que fundamentado, todavia a gravidade do delito e a quantidade da pena geralmente não são considerados.
A LEP em seu artigo 112 é clara ao prever como único requisito de caráter subjetivo o laudo do Diretor do Estabelecimento Carcerário que, ao contrário tem peculiaridades que por óbvio não podem ser analisadas pelo Juiz da Vara de Execuções e assim foi criado por um motivo de ser, como já anteriormente exposto.
Isto posto, claramente demonstrado que o posicionamento adotado pelos magistrados não é o mais coerente com a legislação.
Ainda, a LEP em seu artigo 49 delega à legislação local as especificações das faltas leves e médias bem como as sanções aplicáveis.
No estado do Rio de Janeiro tal regulação é matéria do Decreto 8.897/86. Dentre as sanções cabíveis, o decreto em seu artigo 63 prevê o rebaixamento de classificação como pena secundária a ser aplicada pela autoridade administrativa.
Buscando a maior efetividade do principio da individualização da pena, contido na CF/88 e também na LEP de maneira expressa em seus artigos 5º a 9º, existem laudos psicológicos que são utilizados com o intuito de classificação, tendo como base os antecedentes e personalidade do condenado.
Tais laudos são usados e formulados por uma Comissão Técnica de Classificação existente em cada estabelecimento prisional com o intuito de classificar o preso e servir de base para elaborar um programa individualizador da pena privativa de liberdade a ele adequada.
Segundo Tarine Sartori da Silva:
“o exame de classificação baseia-se em aspectos da personalidade, antecedentes, vida familiar e social e inclusão no mercado de trabalho. Por sua vez, o exame criminológico abrange fatores psíquicos e psiquiátricos, objetivando avaliar atitudes, reações e equilíbrio do condenado em situações distintas. Já o parecer expressa a opinião dos técnicos que compõem a comissão técnica, a partir do acompanhamento do condenado em regime carcerário”. (SILVA-2011)
Assim o posicionamento adotado pela legislação do Rio de Janeiro ao prever como sanção disciplinar o rebaixamento do índice de classificação dá o caminho a ser seguido pela LEP, ressaltando-se que até o citado rebaixamento tem um prazo máximo.
O que diferencia os referidos laudos utilizados para a classificação do preso, possibilitando a aplicação da sanção de rebaixamento de índice de classificação é a objetividade.
O preso sujeito a tal classificação sabe exatamente o que será levado em conta no momento de sua avaliação justamente porque tal índice está totalmente regulamentado no decreto, dando a ele a possibilidade d exercer seu direito constitucional de ampla defesa e tirando do juiz o papel de mero “homologador” de laudos imprecisos.
Logo quando a autoridade penitenciária fixar um índice de comportamento na transcrição de ficha disciplinar, ela estará levando em conta não só as faltas disciplinares, como as regalias, conduta social etc. Sabendo com maior autoridade quem é o preso estando mais apta a fornecer o índice de comportamento necessário a concessão do beneficio da progressão de regime. (TAVARES- 2012)
O preso por outro lado fica mais seguro quanto à aferição, uma vez que o índice está completamente regulamentado em decreto.
Isto posto, conclui-se que o que deve prevalecer como bom comportamento carcerário é o índice comportamental previsto na transcrição de ficha disciplinar (TAVARES- 2012).
Em Minas Gerais as disposições regulamentares estão dispostas Na Resolução 742/2004 que prevê benefícios ao preso de bom comportamento e sanções aos de mal comportamento, mas não há nesta resolução nenhum tipo de sanção disciplinar que se assemelhe à contida no Decreto 8.897/86.
Considerações Finais
A progressão de regime é direito do preso não devendo ser suprimido por norma alguma. É essencial para sua ressocialização o que retira da pena seu caráter meramente punitivo.
Com a ausência de norma reguladora, os apontamentos contidos no prontuário do preso além de gerar grande insegurança jurídica podem vir a causar injustiça, uma vez que o preso poderá ser submetido a uma pena administrativa de caráter perpetuo o que é vedado em nosso ordenamento.
O magistrado com cada vez mais frequência vem se tornando “homologador” de laudos, delegando seu poder a técnicos de diversas áreas ao fundamentar sua decisão de concessão ou não de progressão de regime em laudos criminológicos com ausência de regulamentação jurídica, o que impossibilita, dentre outras consequências, que o preso exercite seu contraditório.
A solução seria a mais simples, já trazida pelo Decreto 8.897/86, qual seja a fixação de um índice de comportamento na transcrição de ficha disciplinar, onde seria possível que autoridade administrativa levasse em conta não somente os apontamentos dos prontuários, mas também o todo em volta do preso que é muito maior que as faltas cometidas. A vida social do preso e as regalias, por exemplo, poderiam ser consideradas.
Ainda, o preso teria a segurança de ter todo o procedimento legislado, a aferição de seu comportamento seria mais precisa e coesa, podendo inclusive ser prevista por ele próprio.
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