Por Rubens Souza e Emily Costa, tributaristas do WFaria Advogados
Desde março de 2017, muito se discute sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, que definiu que o ICMS deve ser excluído da base de cálculo do PIS/COFINS (RE nº 574.706). Naquele julgado, entendeu a Suprema Corte que o ICMS destacado nas notas fiscais de saída não integra a receita ou o faturamento, eis que apenas transita pelas contas do vendedor, razão pela qual não está sujeito à incidência das contribuições. Boa parte das discussões após aquele emblemático julgado está relacionada às “teses derivadas” daquele entendimento, ou seja, às teses que se reforçaram com o precedente similar relevante, ou que simplesmente nasceram a partir daquele julgado. Entre elas, tem-se as discussões sobre a exclusão do ISS da base de cálculo do PIS/COFINS, a exclusão do ICMS e do ISS da base da CPRB, a exclusão da CPRB da base PIS/COFINS (e vice-versa), a exclusão do ICMS da base presumida do IRPJ e da CSLL e a exclusão do PIS/COFINS da própria base (cálculo por dentro).
Tais “teses derivadas” são mais frequentemente abordadas nas mídias especializadas, e atualmente contam com precedentes favoráveis aos contribuintes.
Mas há outra “tese derivada”, que não tem ganhado tanto destaque. Refere-se à incidência do ISS na sua própria base de cálculo e sobre os tributos federais. Em raciocínio simplório, tem-se que a base de cálculo do ISS é o preço do serviço, que nada mais é que o faturamento havido em contraprestação ao serviço executado. Sendo faturamento, o ISS não deve compor a sua própria base de cálculo, assim como os tributos federais (PIS/COFINS) incidentes sobre aquela fatura, na linha do entendimento firmado pelo STF.
Ocorre que a grande maioria dos municípios determina que o ISS deve incidir sobre ele mesmo e sobre os tributos federais, mesmo que tal incidência não tenha respaldo na Constituição Federal, ou na Lei Complementar nº 116/2003 – que dispõe sobre as regras gerais do tributo municipal. De fato, tais normativos limitam-se a consignar que a base de cálculo do imposto é constituída pelo preço do serviço.
A título ilustrativo do cálculo pernicioso, em uma nota de serviços do valor total de R$ 100.000,00 tem-se destaque de R$ 5.000,00 a título de ISS (5%) e de R$ 9.250,00 de PIS/COFINS (9,25% regime não cumulativo), sendo o preço do serviço, portanto, R$ 85.750,00. Afastado o método de cálculo por dentro e sobre os tributos federais, o ISS de 5% deveria incidir não sobre o valor total da nota (R$ 100.000,00), mas exclusivamente sobre o preço do serviço (R$ 85.750,00), de modo que o valor correto a cobrar seria de R$ 4.287,50. Por essa lógica, calculando-se o ISS “por fora” e sem a incidência sobre os tributos federais, nota-se uma redução de 14,25% da carga tributária do ISS, equivalente a uma economia de 0,71% de toda a receita de serviços do contribuinte.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já se pronunciou pela impossibilidade da incidência do ISS em sua própria base de cálculo, por crer que essa sistemática deixaria de considerar apenas o preço do serviço e passaria a incluir elemento estranho à prestação (Apelação nº 9112187-90.2003.8.26.0000). Naquele julgado, estava em xeque a Lei Municipal de Campinas nº 11.110/2001, que previa a incidência do ISS sobre ele mesmo. Parafraseando o Desembargador Relator, “o legislador municipal extrapolou o aspecto material desse imposto ao alargar indevidamente sua base de cálculo”.
Nesse cenário, é possível se sustentar que não há respaldo à forma de “cálculo por dentro” do ISS e à incidência desse imposto sobre os tributos federais. No entanto, eventual discussão judicial sobre a tese em questão encontra alguns percalços relevantes, que devem ser levados em consideração pelo contribuinte. O primeiro deles remonta à dificuldade de aproveitamento de eventuais créditos oriundos do recolhimento a maior do ISS, especialmente em virtude da inexistência de norma que preveja a compensação de tributos na esfera municipal.
Ainda que se opte pela via da restituição de valor recolhido indevidamente, o contribuinte encontraria ainda outro obstáculo importante, haja vista que a transferência do encargo financeiro do tributo é uma característica inerente ao ISS, que vincularia eventual restituição à autorização expressa de terceiros, conforme previsão do artigo 166 do Código Tributário Nacional. Dessa forma, eventual discussão judicial para se reduzir a base de cálculo do ISS seria viável apenas para prestações vincendas do tributo, o que, por si só, já é suficiente para gerar redução considerável da carga tributária dos prestadores de serviços.
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