Das áreas máximas para o Regime de Autorização e Concessão para as substâncias incluídas na Lei 6.567/1978 pela Lei 13.975/2020

Felipe Martins Silvares Costa[1] [2]

Resumo: O presente artigo tem por objeto a análise da Lei 6.567/1978 após as alterações da Lei 13.975/2020 e o seu aparente conflito com o Código de Mineração e a Portaria do Diretor-Geral do DNPM nº 155/2016. A polêmica é de que teria havido a limitação de 50 hectares também para o Regime de Autorização e Concessão para as substâncias incluídas na Lei 6.567/1978, trazendo grande impacto para os setores de rochas ornamentais e de revestimentos cerâmicos. Contudo, a Lei 13.975/2020 não conflita com as normas anteriores, não alterando os limites de área para as substâncias no Regime de Autorização e Concessão. Por outro lado, ainda que se entendesse que a Lei 6.567/1978 também regeria o Regime de Autorização e Concessão, o parágrafo único que estabelece a área máxima de 50 hectares teria sido revogado pela Lei 9.314/1996 que deu nova redação ao art. 25 do Código de Mineração. Assim, esse trabalho buscará evidenciar a desnecessidade da alteração da lei, sendo recomendados apenas ajustes de redação da Portaria 155/2016, considerando nessa análise a utilização da hermenêutica jurídica, bem como do estudo do processo legislativo buscando aferir a mens legis para se estabelecer a correta interpretação das normas citadas.

Palavras-chave: Lei 13.975/2020; Lei 6.567/1978; Código de Mineração; Regime de Licenciamento; Regime de Autorização e Concessão; Hermenêutica; Direito Minerário; Processo Legislativo.

 

Abstract: The present article aims to analyze Law 6.567/1978 after the amendments brought by Law 13.975/2020 and its apparent conflict with the Mining Code and the Ordinance 155/2016 from the General-Director of DNPM. The controversy is that there would be the limitation of 50 hectares for the Authorization and Concession Regime for the substances added to Law 6.567/1978, bringing great impact to the sectors of ornamental rocks and ceramic tiles. However, Law 13.975/2020 does not conflict with previous rules, and has not changed the area limits in the Authorization and Concession Regime. On the other hand, even if Law 6.567/1978 was understood to also rule the Authorization and Concession Regime, the sole paragraph that stablishes the maximum area of 50 hectares would have been revoked by Law 9.314/1996 which gave new wording to art. 25 of the Mining Code. In this way, the present article will seek to highlight the unnecessary alteration of the law, requiring only occasional wording adjustments in the Ordinance 155/2016 from the General-Director of DNPM, considering in this analysis the use of legal hermeneutics, as well as the study of the legislative process seeking to assess the mens legis to establish the correct interpretation of the aforementioned rules.

Keywords: Law 13,975 / 2020; Law 6,567 / 1978; Mining Code; Licensing Regime; Authorization and Concession Regime; Hermeneutics; Mining Law; Legislative Process.

 

Sumário: Introdução e apresentação do problema. 1. Dos Regimes de aproveitamento das substâncias minerais. 2. Do Regime de Licenciamento – histórico da legislação e processo legislativo. 2.1 Da limitação quanto às substâncias; 2.2 Da limitação quanto à área máxima de 50 hectares. 3. A inclusão pela Lei 13.975/2020 de substâncias no art. 1º da Lei 6.567/1978 atrairia a aplicação do § único do mesmo artigo para as citadas substâncias no Regime de Autorização e Concessão? Da regulamentação das áreas máximas para a autorização de pesquisa – A Portaria 155/2016 e os seus limites considerando a Lei 13.975/2020 – hermenêutica, métodos de interpretação e antinomia.  Conclusão. Bibliografia.

 

Introdução e apresentação do problema

O presente artigo tratará da polêmica dos “efeitos colaterais” trazidos pela Lei 13.975/2020, publicada em 07/01/2020, que visando trazer uma maior celeridade para o aproveitamento de determinadas substâncias minerais acabou por gerar a paralisação no trâmite de centenas de processos minerários, trazendo enorme insegurança jurídica aos agentes do setor.

A Lei 13.975/2020 trouxe pequena, porém importante, alteração na Lei 6.567/1978 que trata do Regime de Licenciamento (uma das formas de aproveitamento mineral, adiante explicada), acrescentando substâncias que podem ser aproveitadas sob esse regime mais simplificado e célere. Até por sua singeleza, vale trazer o inteiro teor da Lei 13.975/2020:

 

Art. 1º. O art. 1º da Lei nº 6.567, de 24 de setembro de 1978, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º ……………………………………………………………………………………….

……………………………………………………………………………………………………….

III – argilas para indústrias diversas;

……………………………………………………………………………………………………….

V – rochas ornamentais e de revestimento;

VI – carbonatos de cálcio e de magnésio empregados em indústrias diversas.

 

Assim, a nova lei se limitou a adicionar algumas substâncias ao rol do art. 1º da Lei 6.567/1978 que podem ser aproveitadas sob o Regime de Licenciamento.

Ocorre que, por disposição já existente na própria Lei 6.567/1978, especialmente o parágrafo único do mesmo art. 1º, foi instaurada a polêmica diante da interpretação literal de tal dispositivo, segundo o qual as áreas máximas para essas substâncias adicionadas estariam limitadas a 50 hectares, não somente no Regime de Licenciamento, mas também no Regime de Autorização e de Concessão. É a redação do parágrafo único do art. 1º:

Parágrafo único. O aproveitamento das substâncias minerais referidas neste artigo fica adstrito à área máxima de cinqüenta hectares.

 

Com efeito, embora a Lei 13.975/2020 tenha sido criada tão somente para trazer uma opção de uso de um novo regime e simplificar o aproveitamento de mais algumas substâncias minerais, no entender de alguns essa Lei teria derrogado a Portaria 155/2016 do Diretor-Geral do DNPM na parte que trazia as áreas máximas de outorga para cada substância em cada regime, passando a valer o limite de 50 hectares em qualquer regime para a substâncias listadas na nova lei.

 

Vale dizer que a regulação pela Portaria 155/2016 decorre de disposição do Código de Mineração que, após alterações da Lei 9.314/1996, dispõe em seu art. 25:

Art. 25. as autorizações de pesquisa ficam adstritas às áreas máximas que forem fixadas em portaria do Diretor-Geral do DNPM.

Assim, criou-se a dúvida se a Lei 13.975/2020, mais recente, teria derrogado a Portaria 155/2016 na estipulação de área máximas acima do limite de 50 hectares, passando a prevalecer a Lei em relação à Portaria, que é norma hierarquicamente inferior.

Diante desse aparente conflito de normas, que causa enorme insegurança jurídica no setor, e já gera prejuízos com a suspensão do ato de outorga de concessões de lavra em áreas com mais de 50 hectares, tecemos o presente estudo com o objetivo de contribuir com as discussões, trazendo a nossa visão e nossas conclusões sobre o assunto.

Como adiante fundamentaremos, entendemos que Lei 6.567/1978, com as alterações da Lei 13.975/2020, limita-se a regular o Regime de Licenciamento, não tendo qualquer impacto no Regime de Autorização e Concessão, especialmente no que se refere às áreas máximas, que continuam podendo ser estipuladas mediante Portaria do Diretor-Geral do DNPM (atualmente por Resolução da ANM), consoante o permissivo legal do art. 25 do Código de Mineração atualmente em vigor.

Outrossim, ainda que se entendesse que a Lei 6.567/1978 também regeria o Regime de Autorização e Concessão, o parágrafo único que estabelece a área máxima de 50 hectares teria sido revogado pela Lei 9.314/1996 que deu nova redação ao art. 25 do Código de Mineração.

 

1.    Dos Regimes de aproveitamento das substâncias minerais

Por força constitucional, “as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra os bens minerais que são de propriedade da União, sendo garantido ao concessionário o seu aproveitamento”. Trata-se do art. 176 da Constituição Federal, que ainda traz em seu §1º:

  • 1º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas.

Desta forma, para o aproveitamento de recursos minerais no Brasil é necessária a outorga da autorização ou concessão da União, de acordo com a legislação especial, que estabelece os regimes de aproveitamento dos recursos minerais a depender, essencialmente, da substância envolvida, seu uso e o sujeito de direito que requer o aproveitamento.

Para os fins do presente trabalho nos interessam os regimes de autorização e concessão (que, na verdade e em regra, constituem-se de uma sequência lógica de um mesmo processo de direitos minerários) e de licenciamento, regulado por Lei específica (Lei 6.567/1978) objeto da polêmica em questão.

Contudo, para melhor situar o tema na legislação minerária, cabe-nos tecer breves linhas sobre os regimes de aproveitamento existentes.

Estabelece o Código de Mineração (Decreto-Lei 227/1967), em seu art. 2º, os regimes de aproveitamento de substâncias minerais, a saber:

I – regime de concessão, quando depender de portaria de concessão do Ministro de Estado de Minas e Energia;

II – regime de autorização, quando depender de expedição de alvará de autorização do Diretor-Geral do Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM;

II – regime de licenciamento, quando depender de licença expedida em obediência a regulamentos administrativos locais e de registro da licença no Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM;

IV – regime de permissão de lavra garimpeira, quando depender de portaria de permissão do Diretor-Geral do Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM;

V – regime de monopolização, quando, em virtude de lei especial, depender de execução direta ou indireta do Governo Federal.

Os critérios para a escolha ou determinação do regime adequado são, em resumo, o sujeito de direito (pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado), a substância mineral objetivada, a sua forma de ocorrência e a sua forma de aproveitamento.

Em breves linhas, o Regime de Monopolização destina-se ao aproveitamento de substâncias regidas por legislação especial, tais como as radioativas.

Já o Regime de Permissão de Lavra Garimpeira, nos termos do § único do art. 1º da Lei 7.805/1989, é utilizado para “o aproveitamento imediato de jazimento mineral que, por sua natureza, dimensão, localização e utilização econômica, possa ser lavrado, independentemente de prévios trabalhos de pesquisa”. Os minérios garimpáveis são estabelecidos a critério da ANM, tais como ouro, diamante, cassiterita, columbita, tantalita, volframita, nas formas aluvionar, eluvional e coluvial, dentre outros.

Há, ainda, o Regime de Extração, previsto no parágrafo único do mesmo artigo citado acima, reservado a órgãos da administração direta ou autárquica da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, restrito a substâncias de emprego imediato na construção civil e para uso exclusivo em obras por eles executadas diretamente.

Tratando do tema deste estudo, o Regime de Autorização e Concessão é o mais amplo, podendo ser utilizado para o aproveitamento de quase todas as substâncias (excetuando aquelas do Regime de Monopolização), e por quase todo sujeito de direito (excetuando aqueles do Regime de Extração).

As áreas máximas que o empreendedor pode obter os títulos de autorização e concessão variam de acordo com cada substância, partindo de 50 hectares até 2.000 hectares[3].

No caso das rochas ornamentais e argilas de uso industrial, focos do presente estudo, as áreas máximas são de 1.000 hectares conforme art. 42, III, da Portaria 155/2016.

Consiste também no regime mais complexo, com várias etapas que se iniciam com a outorga de um título para a realização de pesquisa, seguido da elaboração de relatório que é analisado pela ANM, apresentação de plano de aproveitamento econômico, que só após a sua aprovação dá origem à concessão de lavra. Os procedimentos podem ser resumidos no quadro abaixo:

Procedimento padrão (em vermelho o momento do início dos trabalhos de lavra):

Como se vê, o trâmite processual sob o Regime de Autorização e Concessão é complexo, e por isso leva vários anos até a outorga final do título autorizativo de lavra, muitas vezes mais de uma década, o que na maioria das vezes é incompatível com as necessidades do minerador e do mercado.

O setor de rochas ornamentais é especialmente sensível a essa demora em razão das peculiaridades do mercado, que é severamente impactado por oscilações de moda, uma vez que o seu maior critério de diferenciação e qualidade é o seu aspecto estético. Com isso, a rapidez na inserção no mercado e a previsibilidade da continuidade no fornecimento podem ser definitivamente decisivos na viabilidade do material. A demora ou a interrupção no fornecimento podem gerar a substituição por outros materiais, muitas vezes de forma irreversível.

Por esses fatores, visando trazer a celeridade necessitada pelo setor de rochas (posteriormente também incluídas outras substâncias), foi proposto Projeto de Lei nº 5.751/2016, que teve origem a partir do Projeto de Lei do Senado 733/2015 de autoria do Senador Ricardo Ferraço, que culminou na sanção da Lei 13.975/2020, com um único artigo, acrescentando outras substâncias ao rol daquelas aproveitáveis sob o simples e célere Regime de Licenciamento, dando uma opção mais simples aos mineradores para o aproveitamento das substâncias.

Tratando do Regime de Licenciamento, este foi estabelecido e regulado inteiramente pela Lei 6.567/1978, que ao longo do tempo sofreu alterações por duas principais leis: a 8.892/1995 e, recentemente, pela 13.975/2020, objeto deste texto.

Cabe ressaltar, de pronto, que não se confunde o Regime de Licenciamento Minerário com o Licenciamento Ambiental, pois este diz respeito às medidas de controle, mitigação e impactos ambientais da atividade e é imprescindível em qualquer regime minerário, ao passo que aquele se trata de uma modalidade de aproveitamento minerário.

O Regime de Licenciamento (que poderia ser chamado também, para melhor didática, de Licenciamento Minerário) foi criado inicialmente visando o aproveitamento de substâncias de aplicação imediata na construção civil, e possui um rito muito mais simples do que os outros regimes, notadamente o de Autorização e Concessão. O quadro abaixo resume o trâmite desde o início do processo até a outorga do título que “licencia” a lavra:

Como se percebe, o Regime de Licenciamento tem rito simples para que o empreendedor inicie as atividades, prescindindo de qualquer trabalho de pesquisa ou relatórios para o início da efetiva extração.

Contudo, para possibilitar essa simplicidade, esse Regime possui duas principais limitações: só pode ser utilizado para um número limitado de substâncias; a área máxima objeto do título é de 50 hectares.

A problemática que é objeto do presente artigo decorre exatamente dessas limitações, que passaremos a abordar detalhadamente a seguir, começando pela histórico da Lei que regula esse Regime e suas alterações ao longo dos anos, que se faz essencial para plena compreensão do espírito da lei e de seus efeitos práticos.

 

2.    Do Regime de Licenciamento – histórico da legislação e processo legislativo

Como dito algumas linhas acima, ao mesmo tempo em que tem trâmite simples e célere, o Regime de Licenciamento possui limitações importantes, quais sejam:

  1. Só pode ser utilizado para um número limitado de substâncias;
  2. A área máxima objeto do título é de 50 hectares.

 

2.1 Da limitação quanto às substâncias.

Quanto à primeira limitação, na criação da Lei 6.567/1978 e até a edição da Lei 13.975/2020 as substâncias aproveitáveis no Regime de Licenciamento eram todas aquelas então classificadas pelo Código de Mineração de “Classe II”, com aproveitamento imediato na construção civil, sem a submissão a processo industrial de beneficiamento.

Posteriormente, o art. 1º da Lei 6.567/1978 sofreu modificações pelas Leis 7.312/1985, 8.982/1995 e, finalmente, pela Lei 13.975/2020.

Em breve pausa da narrativa, vale antecipar que, mesmo diante de alterações trazidas por 4 (quatro) leis[4], ao longo de vigência de mais de 40 (quarenta) anos, o objeto da Lei nunca foi mudado, tendo o legislador trazido nessas alterações regras exclusivamente para o Regime de Licenciamento, exatamente como descrito no preâmbulo da Lei, que atesta:

Lei nº 6.567, de 24 de setembro de 1978.

Dispõe sobre regime especial para exploração e o aproveitamento das substâncias minerais que especifica e dá outras providências.

O quadro abaixo expõe as alterações trazidas no art. 1º da Lei 6.567/1978 e compara as redações em cada momento:

Nota-se que tanto a redação original quanto aquela trazida pela Lei 7.312/1985[5] traziam menção às substâncias da “Classe II”, então previstas no art. 5º do Código de Mineração, que conceituava como Classe II as “jazidas de substâncias minerais de emprego imediato na construção civil”. Em outras palavras: a Lei de Licenciamento (6.567/1978) remetia ao Código de Mineração a lista das substâncias que regulava. Já a Lei 8.982/1995 (contemporânea, porém anterior à Lei 9.314/1996) veio trazer para a própria Lei 6.567/1978 a lista das substâncias, não mais fazendo menção do Código de Mineração.

Com isso, a Lei 6.567/1978 passou a regular inteira e exclusivamente o regime de licenciamento, não dependendo mais de qualquer complementação do Código de Mineração.

Ademais, a Lei 8.982/1992 trouxe outra importante inovação: deixou de estabelecer que as substâncias listadas seriam aproveitáveis exclusivamente sob o Regime de Licenciamento, passando a facultar ao interessado o aproveitamento também sob o Regime de Autorização e Concessão.

Logo após a edição da Lei 8.982/1995, o art. 5º do Código de Mineração, que trazia a lista das “Classes” das substâncias aproveitáveis no Regime de Licenciamento, foi revogado pela Lei 9.314/1996[6]. Digno de nota que a revogação do art. 5º do Código de Mineração pela Lei 9.314/1996 veio no mesmo sentido de desburocratização da Lei 13.975/2020, conforme exposição de motivos do então Ministro de Minas Energia ao Congresso Nacional, ainda na discussão do projeto de lei[7], como se pode ver:

Por fim, a Lei 13.975/2020 trouxe apenas mais algumas substâncias passíveis de aproveitamento também no Regime de Licenciamento, incluindo alguns incisos ao caput do art. 1º da Lei 6.567/1978, visando trazer maior simplificação e celeridade ao processo de obtenção dos títulos minerários, além de maior segurança jurídica para os negócios do setor.

Ademais, o autor da PLS 773/2015, senador Ricardo Ferraço, a partir do relatório da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, no Ofício nº 925/2016 , justificou sua iniciativa afirmando que o setor de rochas ornamentais contribui com parte importante nas exportações brasileiras, gerando mais de 100 mil empregos diretos e indiretos, e funcionando como importante elemento para a interiorização do desenvolvimento econômico. Vejamos:

Portanto, além de trazer a simplificação e celeridade ao processo, a Lei 13.975/2020, consequentemente, também traria a expansão de um ramo de negócios essencial para o Brasil, e que muito pode contribuir para a recuperação econômica do país.

Quanto à limitação de área de 50 hectares, vejamos.

 

2.2        Da limitação quanto à área máxima de 50 hectares

No que se refere à área máxima para o Regime de Licenciamento, chegamos à origem de toda a polêmica objeto deste artigo: quando alterou a Lei 6.567/1978 a Lei 8.982/1995 também acrescentou o parágrafo único ao art. 1º da Lei 6.567/1978. É a redação, in verbis:

Parágrafo único. O aproveitamento das substâncias minerais referidas neste artigo fica adstrito à área máxima de cinqüenta hectares.

Ocorre que, como se viu alhures, essa limitação de 50 hectares não se constituiu em novidade da Lei 8.982/1995, já existindo desde o Código de Mineração de 1967 que trazia em seu art. 5º a lista de “Classes” de substâncias. De fato, a sua inclusão na Lei 6.567/78 resultou apenas na concentração nessa as disposições relativas ao Regime de Licenciamento, que antes estavam distribuídas no Código de Mineração e seu antigo Regulamento, como explicamos a seguir.

Ademais, posteriormente à Lei 8.982/1995 sobreveio da Lei 9.314/1996, que incluiu o art. 25 ao Código de Mineração, até hoje em vigor, estabelecendo que para o regime de autorização as áreas máximas serão estipuladas em portaria do DNPM, atualmente ANM.

Com efeito, com a alteração da Lei 8.982/1995 a Lei 6.567/1978 passou a concentrar todas as disposições relativas ao Regime de Licenciamento, retirando do Código de Mineração a regulação dessa matéria. No mesmo sentido, o Código de Mineração passou a regular o Regime de Autorização e Concessão inteiramente, delegando atribuições ao então DNPM para a editar normas relacionadas a esse regime.

A relevância dessa constatação é a verificação de que estão pacificadas na legislação há mais de 40 anos a áreas máximas do Regime de Licenciamento e do Regime de Autorização e Concessão[8]; que as Leis modificadoras meramente organizaram e concentraram o texto e acrescentaram substâncias; e que a limitação contida no parágrafo único do art. 1º diz respeito tão somente ao Regime de Licenciamento.

A inclusão pela Lei 13.975/2020 de substâncias no art. 1º da Lei 6.567/1978 atrairia a aplicação do § único do mesmo artigo para as citadas substâncias no Regime de Autorização e Concessão?

É o que buscaremos responder a seguir.

 

  1. Da regulamentação das áreas máximas para a autorização de pesquisa – A Portaria 155/2016 e os seus limites considerando a Lei 13.975/2020 – hermenêutica, métodos de interpretação e antinomia.

Como já mencionado acima, a Lei 9.314/1996 alterou o art. 25 do Código de Mineração para retirar do Presidente da República e atribuir ao DNPM a competência de delimitar as áreas máximas para as autorizações de pesquisa, passando a valer a seguinte redação:

 

Art. 25. As autorizações de pesquisa ficam adstritas às áreas máximas que forem fixadas em portaria do Diretor-Geral do DNPM.

Merece ser destacada a motivação dessa alteração legal[9]:

 

O supramencionado art. 25 encontra-se dentro do Capítulo II do Código de Mineração, que trata da “Pesquisa Mineral”, concernente ao regime de Autorização.

Essa atribuição de competência, frisa-se, posterior à Lei 8.982/1995 que incluíra o § único motivo da hodierna polêmica, veio na mesma linha da desburocratização intencionada na edição da Lei 9.314/1996, conforme se vê na mesma mensagem de encaminhamento do projeto ao Congresso pelo Ministro de Minas e Energia:

Para melhor visualização e entendimento dessas alterações, vejamos o quadro abaixo:

Desta forma, verifica-se que as alterações legais sempre repetiram os mesmos limites de áreas existentes desde (pelo menos) 1967, com a entrada em vigor do Código de Mineração. Sendo assim, o que foi alterado, de fato, foi a concentração na Lei 6.567/1978 das disposições acerca do Regime de Licenciamento, deixando para o Código de Mineração a regulação do regime de autorização e concessão. Ao longo dos anos, o então DNPM, exercendo o poder que lhe foi atribuído pelo citado dispositivo legal, editou diversas Portarias estipulando os limites máximos das áreas, estando atualmente em vigor a Portaria 155/2016, que em seu art. 42 estabelece:

 

Art. 42. Nos regimes de autorização e concessão o título ficará adstrito às seguintes áreas máximas:

 

I – 2.000 (dois mil) hectares:

 

  1. a) substâncias minerais metálicas;
  2. b) substâncias minerais fertilizantes;
  3. c) carvão;
  4. d) diamante;
  5. e) rochas betuminosas e pirobetuminosas;
  6. f) turfa; e
  7. g) sal-gema;

 

II – 50 (cinquenta) hectares:

 

  1. a) as substâncias minerais relacionadas no art. 1º da Lei nº 6.567, de 1978;
  2. b) águas minerais e águas potáveis de mesa;
  3. c) areia, quando adequada ao uso na indústria de transformação;
  4. d) feldspato;
  5. e) gemas (exceto diamante) e pedras decorativas, de coleção e para confecção de artesanato mineral; e
  6. f) mica.

 

III – 1.000 (mil) hectares:

 

  1. a) rochas para revestimento; e
  2. b) demais substâncias minerais.

 

  • 1º Nas áreas localizadas na Amazônia Legal definida no art. 2º da Lei nº 5.173, de 27 de outubro de 1966, o limite máximo estabelecido para as substâncias minerais de que trata o inciso I e para a substância mineral caulim, será de 10.000 (dez mil) hectares.

 

  • 2º Consideram-se rochas para revestimento, para os fins do disposto no inciso III, as rochas adequadas ao uso ornamental e para revestimento que revelem características tecnológicas específicas, adequadas para fins de desdobramento em teares, talhas-bloco, monofios ou processos de corte, dimensionamento e beneficiamento de face.

 

Como se viu mais acima, a edição da Portaria 155/2016 é legitimada pelo art. 25 do Código de Mineração, que concede ao DNPM (atualmente ANM) a prerrogativa de regular as áreas máximas para o Regime de Autorização e Concessão. Trata-se de norma infralegal em perfeita harmonia com o sistema legal vigente.

Contudo, a partir da Lei 13.975/2020, questiona-se: por ser norma hierarquicamente superior à Portaria 155/2016, a limitação da Lei 6.567/1978 do § único do art. 1º prevaleceria para as substâncias incluídas pela Lei 13.675/2020 também para o regime de autorização e concessão?

Entendemos que não. Os limites máximos continuam sendo os previstos na Portaria 155/2016, pelas seguintes razões: a) a Lei 6.567/1978 regula exclusivamente o Regime de Licenciamento, não se aplicando ao Regime de Autorização de Concessão; b) Na hipótese de entendimento em sentido contrário, de que a Lei 6.567/1978 seria aplicável às substâncias que lista em qualquer regime, incluindo o de Autorização e Concessão, o §único do art. 1º dessa Lei teria sido derrogado pelo art. 25 na redação da Lei 9.314/1996, por ser essa lei mais recente.

Quanto ao primeiro motivo, relacionado ao objeto e a interpretação da Lei 6.567/1978, vale tecer breves linhas sobre hermenêutica jurídica e interpretação das normas, para melhor entendimento da questão.

Para não nos delongarmos em discussões que fogem do foco deste texto, optamos por elegermos um conceito mínimo e prático do que seria Direito: um sistema de normas válidas em um determinado tempo e espaço, cuja linguagem prescritiva se submete à lógica do dever-ser, para disciplinar o comportamento humano em suas relevantes relações intersubjetivas.

Diferenciando direito positivo e ciência do direito, elucida Alf Ross:

O direito é considerado um sistema de normas positivas, isto é, efetivamente vigorantes. A” ciência do direito” busca apenas estabelecer a existência dessas normas no direito efetivo independentemente de valores éticos e considerações políticas. Tampouco formula a escola analítica qualquer questão relativa às circunstâncias sociais penetradas pelo direito – os fatores sociais que determinam a criação do direito e seu desenvolvimento, e os efeitos sociais que se produzem ou se pretende produzir mediante normas jurídicas.[10]

Além disso, o direito é linguagem e, por essa razão, sofre plena influência dos meios de sua comunicação, seja, verbi gratia, textualmente nos livros ou verbalmente em audiência, criando, assim, um universo semiológico.

Com efeito e para que haja compreensão do direito, desenvolveu-se a hermenêutica, que é a teoria da interpretação – a qual, por sua vez é a prática da hermenêutica – e que é a ciência do conjunto de regras e métodos para devida compreensão da norma jurídica.

De acordo com Celso Ribeiro Bastos e Vicente Ráo:

A Hermenêutica (jurídica) seria o ramo da ciência dedicado ao estudo e determinação das regras que devem presidir o processo interpretativo de busca do significado da lei, e não a sua aplicação, a busca efetiva deste significado em cada caso. Distingui-se-ia, pois, da interpretação, na medida em que a Hermenêutica seria mais ampla, situando-se num momento lógico anterior. [11]

[…]

Nós interpretamos o mundo, a realidade e as coisas, de acordo com nossos horizontes. Para interpretar, precisamos obrigatoriamente compreender, temos de ter uma pré-compreensão de algo que devemos interpretar, portanto o processo de interpretação é baseado em uma soma de conhecimentos previamente adquiridos. [12]

A primevo, narrou-se que a linguagem do ordenamento jurídica é prescritiva. Logo, não se busca, por meio da hermenêutica, uma interpretação verdadeira, mas uma válida, conforme Vitor Hugo Nicastro Honesko[13]:

A linguagem prescritiva de condutas é a linguagem própria para a expedição de ordens ou de comandos. Projeta-se sobre a região material da conduta humana, canalizando-se no sentido de implantar os valores do emissor do discurso. É a linguagem das normas, onde há o destaque para as normas jurídicas. Não guarda relação com os valores de verdade. Isto é, as propriedades “ser falso” ou “ser verdadeiro” não podem ser atribuídas à linguagem prescritiva, “así como la calidad de mamífero no puede predicarse de la belleza ni la de ser un número racional puede afirmarse del cerro Aconcagua. ”[14]

Seus valores são a validade e a invalidade. Outra característica desta linguagem é que somente os fatos e as condutas possíveis são atingidos por seu campo semântico.

Assim, com a hermenêutica entra-se em contato com o sentido dos textos positivados e com os referenciais culturais que os informam.

Dessa forma, a hermenêutica deve ser efetivada por todos aqueles entes que compõem a sociedade, que são sujeitos de direito, em busca da adequada compreensão de normas jurídicas válidas em determinado ordenamento jurídico no tempo e espaço, na medida que o direito, por ser um fenômeno sociocultural com aptidão de afetar a todos o tempo todo, deve ser compreendido, sob pena de se cometer antijuridicidades. Independentemente do tipo de técnica empregado, o resultado da interpretação pode ter três efeitos: 1) restritivo, na hipótese de se obter norma jurídica cuja interpretação se restrinja à sua literalidade; 2) declarativa, quando se obtém a norma jurídica na exata medida de sua literalidade; 3) extensiva, quando há a extensão da literalidade da norma jurídica.

Além disso, dentre os métodos de interpretação, destaca-se, para o presente caso, a necessidade de utilização do método histórico, o qual analisa a origem da norma, partindo da premissa dos seus antecedentes históricos, isto é, verificando-se as circunstâncias fáticas e jurídicas que lhe antecederam, como por exemplo seus antecedentes legislativos; método lógico, pelo qual se busca analisar o sentido e o alcance propriamente dito da norma; método sistemático que busca interpretar a norma não isoladamente, mas no contexto em que está inserida; e, por fim, o método jurisprudencial que é produzida pelo conjunto de sentenças, acórdãos, súmulas e enunciados proferidos litígio em que incidam a regra da qual se busca exaurir o processo hermenêutico.

Assevera-se, nas palavras de Reis Friede, que:

É importante dizer que o ideal é que o intérprete proceda em primeiro lugar a interpretação literal para, em seguida, observar as interpretações lógica, sistemática, histórica e teleológica, concluindo ao final pela integralização de todos esses meios, chegando assim no conhecimento do verdadeiro conteúdo e significado da norma jurídica.[15]

Em verdade, a finalidade da interpretação normativa é revelar o sentido da norma e fixar o seu alcance, e, só é possível alcançar de forma efetiva essa finalidade com a utilização recorrente dos métodos de interpretação supra apresentados, dado o fato de que, nem sempre é possível encontrar uma norma aplicável ao caso concreto, devendo o juiz, por essa razão, se valer das fontes do Direito[16] para, nos casos de lacunas da lei, realizar a integração normativa

No caso ora em exame, como se vê no histórico de alterações da Lei 6.567/1978, nunca se olvidou que o objeto da norma era regular o Regime de Licenciamento. Ao contrário, se nos ativermos a mens legis e ao deslinde de todo o processo legislativo, como já destrinchado neste artigo, teremos que a iniciativa visou tão somente a simplificação e celeridade do procedimento de obtenção de títulos minerários, além de buscar efetivar maior segurança jurídica para o setor.

Ademais, ainda que se entendesse que a Lei 6.567/1978 regularia, sim, outros regimes para as substâncias que lista em seu primeiro artigo, ainda assim se verifica que as área máximas para o Regime de Autorização e Concessão continuam podendo ser e são reguladas pela Portaria 155/2016, consoante art. 25 do Código de Mineração.

Ora, como narrado alhures, o art. 25 em sua redação atual, que outorga ao DNPM a prerrogativa de estipular as áreas máximas para o regime de autorização e concessão, decorre de Lei posterior à Lei que institui o § único do art. 1º da Lei 6.567/1978.

Com efeito, a Lei 9.314/1996 que alterou o art. 25 é posterior à Lei 8.892/1995 que criou o § único do art. 1º da Lei 6.567/1978, prevalecendo em caso de conflito.

Nesse sentido, tem-se que a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro[17] estabelece em seu art. 2º, § 1o, que “a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

Trata-se, neste caso, do princípio cronológico lex posterior derogat legi priori, que se refere ao início da vigência das leis e que, em síntese, para normas gerais, de mesmo nível hierárquico estabelecidas em diferentes ocasiões, estabelece que tem validade a norma editada posteriormente, significando que se duas normas são antinômicas e do mesmo nível, a mais recente deverá prevalecer sobre a mais antiga.

Sob égide desse pensamento, o legislador pode revogar lei anterior criando uma nova lei com ela incompatível, que ocupará seu lugar. Mas, deve-se ressaltar que a lei posterior somente será aplicada se o legislador teve o propósito de revogar a lei anterior, o que, conforme o explicitado alguns parágrafos acima, não foi a mens legis da Lei 13.975/2020.

De acordo com Alf Ross,

O princípio lex posterior significa que de duas leis do mesmo nível, a posterior prevalece sobre a anterior. É indubitável que se trata de um princípio jurídico fundamental, embora não seja expresso como norma positiva, que o legislador pode derrogar uma lei anterior e que pode fazê-lo criando uma regra nova incompatível com a anterior, que ocupe seu lugar. Todavia não é correto guindar este princípio à categoria de axioma absoluto. A experiência mostra que não há adesão condicional a ele, sendo permissível colocá-lo de lado quando em conflito com outras considerações. O princípio lex posterior, portanto, só pode ser caracterizado como um importante princípio de interpretação entre outros. Além disso, a força do princípio variará segundo os diferentes casos de inconsistência. Nos casos de inconsistência entre regras particulares anteriores e regras gerais posteriores, a lex specialis pode, segundo as circunstâncias, prevalecer sobre a lex posterior.[18]

No caso em questão, caso se interprete que a Lei 6.567/1978 seria aplicável também ao Regime de Autorização e Concessão, o seu §único do art. 1º teria sido revogado pela Lei 9.314/1996 que trouxe nova redação ao art. 25 do Código de Mineração.

Por consequência, também sob essa ótica de conflito de normas, a regulamentação trazida pela Portaria 155/2016 quedaria válida, também sob esse prisma.

Por fim, há que se reconhecer que a Portaria 155/2016 acabou ficando “desatualizada” em razão da redação do inciso II do art. 42, que acaba por estipular em seu item “a” a área de 50 hectares para “as substâncias minerais relacionadas no art. 1º da Lei nº 6.567, de 1978”, que acabou tendo esse rol de substâncias ampliado pela Lei 13.975/2020. Assim, acabaria por haver pequena contradição com o inciso III, que traz para as rochas ornamentais “e demais substâncias” expressa disposição do limite de 1.000 hectares, e não apenas 50 hectares.

De qualquer forma, o inciso III traz a regulação exclusiva prevista e delegada pelo art. 25 do Código de Mineração, exaurindo e regulando por completo o tema, e por trazer disposição mais específica que a do inciso II acaba por excepcionar a substâncias listadas. Portanto, verifica-se que não há prejudicialidade na interpretação, pois o inciso III acaba por trazer disposição mais específica, podendo ser entendida até mesmo como exceção, ao rol geral do inciso II, item a do mesmo artigo.

Reforça-se esse entendimento com a leitura do §2º do mesmo art. 42, que traz o conceito de rochas ornamentais (ali chamadas rochas para revestimento) para fins de aplicação desse artigo, reforçando o intuito de se aplicar o inciso III para essas substâncias.

De qualquer forma, no intuito de dar maior segurança jurídica, é recomendável a atualização da Portaria 155/2016, suprimindo-se o item a do inciso II, por ser desnecessário em razão da completa regulação pela Lei 6.567/1978.

 

Conclusão

Vimos que o cenário abordado causa grande insegurança jurídica para o setor, que além de ter os processos parados por conta das diferentes interpretações, percebem o risco de terem áreas drasticamente reduzidas e na maior parte das vezes não abrangendo todo o empreendimento projetado, causando total desestímulo aos investimentos no setor.

Importante destacar, neste sentido, a antiga e malfadada Portaria nº 16/1997 do Diretor-Geral do DNPM, posteriormente revogada pela Portaria nº 40/2000, que reduzira as áreas máximas de várias substancias de 1.000 (hum mil) hectares para 50 (cinquenta) hectares, cujas consequências são até hoje sentidas por vários mineradores que tiveram título de lavra outorgados para apenas algumas das áreas de 50 (cinquenta) hectares, além de ter que conduzir diversos processos de licenciamento em razão da multiplicidade de processos.

Dessa forma, o Código de Mineração trata do Regime de Autorização, sendo considerado especial em relação a outras leis para esse regime em específico. Lado outro, a Lei nº 6567/1978 trata do regime de Licenciamento, também sendo, deste modo, especial em relação a outras, exclusivamente, para esse regime.

Nesse sentido, não há conflito de normas, ante ao fato de que, conforme exposto, a finalidade da interpretação normativa é revelar o sentido da norma e fixar o seu alcance, e, só é possível alcançar de forma efetiva essa finalidade com a utilização recorrente dos métodos de interpretação.

É necessário, para solucionar o presente imbróglio, utilizar-se e estarmos atentos ao conjunto de leis, sentenças, acórdãos, súmulas e enunciados proferidos em litígio em que incidam a regra da qual se busca exaurir o processo hermenêutico, tendo em vista que nem sempre é possível encontrar uma norma aplicável ao caso concreto, devendo-se realizar a interpretação integrativa.

Por todo o exposto, concluímos que a Lei 6.567/1978 tem por objeto exclusivamente o Regime de Licenciamento, não sendo aplicável ao Regime de Autorização e Concessão. Por essa razão, as áreas máximas para o Regime de Autorização e Concessão para as substâncias incluídas na Lei 6.567/1978 pela Lei 13.675/2020 não sofreram alteração, continuando a ser reguladas pela Portaria 155/2016.

Não obstante especificidade da Lei 6.567/1978, ainda que se entenda que a mesma pode também ser aplicável ao Regime de Autorização e Concessão, o §único do seu art. 1º foi revogado pelo art. 25 do Código de Mineração com a vigência da Lei 9.314/1996, pelo princípio cronológico lex posterior derogat legi priori.

Por fim, a Portaria 155/2016, ainda que aplicável e tendo em seu art. 42, inciso III, plena aplicação quanto às rochas ornamentais “e demais substâncias”, é recomendável que a ANM atualize a redação desse dispositivo, substituindo a menção do item “a” do inciso II à Lei 6.567/1978 e passando a listar as substâncias, dirimindo quaisquer dúvidas sobre as áreas máximas que pretende regular.

 

Bibliografia

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ANM. Portaria DNMP nº 16/97.  Disponível em: <http://www.dnpm.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/portarias-do-diretor-geral-do-dnpm/portarias-do-diretor-geral/portaria-no-016-em-13-01-1997-do-diretor-geral-do-dnpm > Acesso em: 12 jul 2020.

 

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ROSS, Alf: Direito e Justiça, tradução de Edson Bini, 1ª edição, Editora Edipro, Bauru, 2003.

 

[1] Graduado em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo, LLM em Direito Empresarial e LLM em Direito Societário, ambos pela FGV. Advogado especialista em direito minerário, e-mail felipe.martins@abreujudice.com.br.

[2] Auxiliado por Debora Frolich Ferreira, graduanda em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo. debora.frolich@abreujudice.com.br, e por Victoria Deps Cabral, Graduanda em Direito pela Faculdade de Direito de Vitória. victoria.deps@abreujudice.com.br.

[3] Salvo áreas situadas na Amazônia Legal, que tem limite de até 10.000 hectares.

[4] Sem falar da Medida Provisória 790/2017 que teve vigência encerrada.

[5] A Lei 7.312/1985 veio meramente incluir a substância basalto no rol das substâncias aproveitáveis no Regime de Licenciamento.

[6] Vale informar que o Projeto de Lei 4.151/1993 que deu origem à Lei 9.314/1996 foi proposto simultaneamente ao Projeto de Lei 4.150/1993 que originou a Lei 8.892/1995, na data de 09/09/1993.

[7] Sessão do dia 23/03/1994, para votação do Projeto de Lei 4.151/1993 que deu origem à Lei 9.314/1996.

[8] Por apego à precisão das informações, as áreas máximas sofreram modificações em Portarias do DNPM, especialmente pela Portaria 16/1997, posteriormente revogada pela Portaria 040/2000 retornando à tradicional área máxima de 1.000 hectares para rochas ornamentais. Aliás, essas alterações apenas confirmam a prerrogativa legal de o DNPM regular as áreas máximas para o regime de autorização e concessão, trazidas pelo art. 25 do Código de Mineração após modificações da Lei 9.314/1996.

[9] Constante na exposição de Motivos do então Ministro de Minas Energia ao Congresso Nacional, ainda na discussão do projeto de lei 4.151/1993 que deu origem à Lei 9.314/1996.

[10] ROSS, Alf. Direito e Justiça, 1ª Edição. 2000. EDIPRO. São Paulo. p. 25.

[11] BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. 3ª Ed. São Paulo. 2002. p. 31 e 32.

[12] RÁO, Vicente. O direito e a vida dos Direitos. 5. ed. Anotada e atualizada por Sandoval, Ovídio Rocha Barros. São Paulo. RT, 1999

[13] http://web.unifil.br/docs/juridica/01/Revista%20Juridica_01-13.pdf. Acesso em 15/07/2020.

[14] GUIBOURG, Ricardo; GHIGLIANI, Alejandro M.; GUARINONI, Ricardo. Introducción al conocimiento científico. Buenos Aires: EUDEBA, 1985. p.69.

[15] FRIEDE, Reis. Ciência do direito, Norma, Interpretação e Hermenêutica Jurídica. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária Biblioteca Jurídica, 2006. p. 165.

[16] O termo provém do latim fons, fontis, que implica o conceito de nascente de água. Entende-se por fonte tudo o que dá origem, o início de tudo. Fonte do Direito nada mais é do que a origem do Direito, suas raízes históricas, de onde se cria (fonte material) e como se aplica (fonte formal), ou seja, o processo de produção das normas. São fontes do direito: as leis, costumes, jurisprudência, doutrina, analogia, princípio geral do direito e equidade. Cunha, Alexandre Sanches. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Saraiva, 2012.

[17] a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro é a lei que disciplina, de forma geral, a aplicação das leis. Sua função é reger as normas, indicando como interpretá-las ou aplicá-las, além de determinar sua vigência e eficácia

[18] ROSS, Alf: Direito e Justiça, tradução de Edson Bini, p. 160 e 161, 1ª edição, Editora Edipro, Bauru, 2003, p. 432.

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