Filosofia

Justiça: uma análise da obra de Michael J Sandel para refletir acerca do que é justiça na contemporaneidade

Autor: Giovanna Petrola Rocha Viana Ferreira – Acadêmica de Direito na Universidade Regional do Cariri (URCA)

Orientador: Profa. Dra. Francisca Edineusa Pamplona Damacena – Doutora em Direito Econômico e Socioambiental pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Suficiência investigadora na área de Direito Administrativo no programa de doutorado “O Direito Público e as Institucións Públicas ante a Unión Europea e o Mercosur” da Universidade de Santiago de Compostela (USCEs). Mestre em Direito Público pela Universidade Federal Ceará (UFC). Graduada em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Professora Adjunta da Universidade Regional do Cariri (URCA).

 

Resumo: o presente artigo conduz uma reflexão, com base na obra de Michael J. Sandel “Justiça: o que é fazer a coisa certa?”, no que diz respeito ao que seria justiça na contemporaneidade. Sandel explicita que o objetivo do seu livro é submeter o leitor a conceber sua própria visão sobre justiça trazendo alguns casos concretos para se pensar sobre ela, e não apresentar um conceito fechado. Seus destinatários são tanto os iniciantes como os estudantes avançados, uma vez que a obra intenta ampliar o conhecimento e reflexão da justiça. Visando contribuir, de alguma maneira, com estudantes e pesquisadores a despertar interesse na filosofia, este trabalho descreve um livro associado aqueles objetivos, recomendando a adoção de teorias da justiça observadas em processos acadêmicos e profissionais. O tema é tratado por tópicos, agrupando uma entrevista do autor em epígrafes em iniciando os capítulos. Sandel traz uma proposta inovadora, inédita no Brasil. Foi escolhido esse autor estrangeiro por apresentar teorias filosóficas clássicas e modernas inseridas na realidade norte-americana com exemplos de casos atuais que são universais. Por isso, o denominado filósofo de Harvard tem feito sucesso mundialmente. Pretende-se expor o pensamento do autor e sua teoria de justiça a fim de se obter um consenso a respeito do que é justo na sociedade contemporânea, englobando questões sobre como a lei deveria ser e como a comunidade deveria se organizar.

Palavras-chave: Justiça. Contemporaneidade. Moral. Filosofia política.

 

Abstract: the current article conducts a reflection based on Michael J. Sandel’s work “Justice: what’s the right thing to do?” as regards what justice is nowadays. Sandel explains that the main objective of his book is to bring the reader to conceive their own vision of justice, exhibiting concrete cases to think about it and not just throw a tight concept of it. Your recipients are both beginners how the advanced students, once written intends to expand the knowledge and reflection of Justice. To contribute, in some way, with students and researchers encouraging interest in philosophy, this work describes a book associated those objectives, recommending the Justice Theories adoption observed in academic and professional process. The subject is treated on topics and treaty on, grouping an author interview in epigraphs, in the beginning of chapters. Sandel brings an unprecedented proposal in Brazil, making use of a modern vision of classic philosophical theories in the current context. His proposal is innovative and pioneer in exposing the philosophical theories with examples of American daily life, which is universal. The Harvard philosopher has been successful worldwide. It is intended to expose the thoughts of the author and his theory in order to obtain an agreement about what’s just in contemporary society, engulfing questions of how law is supposed to be and how the community should organize itself.

Keywords: Justice. Contemporaneity. Moral. Political philosophy.

 

Sumário: Introdução. 1. Fazendo a coisa certa. 2. Corrente utilitarista. 3.Justiça como respeito à liberdade. 4. Justiça como virtude e equidade. 5. Considerações finais. Referências bibliográficas.

 

Introdução

Michael J. Sandel, professor de filosofia em Harvard, levanta em sua obra “Justiça: o que é fazer a coisa certa”, através de uma série de exemplos que exploram dilemas do cotidiano, várias questões acerca de uma teoria de justiça. Tais questões, que são explanadas minuciosamente durante o livro, estão articuladas com distintas abordagens de justiça que remetem às problemáticas sobre o que é de fato fazer a coisa certa na contemporaneidade.

Sandel divide seu trabalho em dez capítulos, onde discorre sobre três diferentes abordagens relativas ao significado de justiça, partindo de situações da vida cotidiana, ligadas à moral e que suscitam divergências éticas dentro de nós como membros de um grupo social. Segundo o autor, para saber se uma sociedade é justa, é necessário analisar o modo que ela distribui as coisas que valoriza, como riqueza, cargos e honrarias e a forma como distribui tais bens, dando a cada indivíduo o que lhe é devido. Sandel procura descobrir o que é fazer a coisa certa diante de questões cotidianas, indagando o que é justo defender e fazer. Inicia cada capítulo por dilemas situacionais em que cada cidadão é levado a refletir e a tomar posição. Tais acontecimentos incluem desigualdade de renda, sistemas de cotas, casamento entre pessoas do mesmo sexo, aborto, células-tronco embrionárias, tortura de suspeitos de terrorismo, etc.

Introduzindo o seu livro com um capítulo intitulado “Fazendo a coisa certa”, onde é apresentada uma situação em que uma das hipóteses suscitadas para reflexão consiste na trajetória de um bonde desgovernado em direção a um grupo de cinco operários que, embora nos trilhos, não percebem a ameaça do choque. Contudo, há uma solução: a realização de um desvio para uma pista fechada para manutenção, na qual somente um operário trabalha no reparo dos trilhos. Em referida situação, seria correto desviar o trem para a pista em manutenção, sacrificando apenas um operário, sob a justificativa de salvar os outros cinco que estavam na pista principal? É a partir de exemplos como esses que Sandel conduz sua obra, instigando o leitor a refletir sobre o que é justiça a partir de três concepções diferentes.

A primeira concepção de justiça apresentada é a corrente utilitarista, teoria que tem como principais autores Jeremy Bentham e John Stuart Mill, em que acredita-se que o justo é a forma de agir que ira garantir o maior bem estar possível para a comunidade. Ulteriormente, a segunda visão exposta é a justiça como respeito à liberdade, defendida por Immanuel Kant, que argumentava que uma sociedade justa é aquela que respeita a liberdade de cada indivíduo para escolher como e qual é uma boa forma de viver, destacando também o pensamento dos libertários que defendem os mercados livres e se opõem à regulamentação do governo, em nome da liberdade do indivíduo. Já o terceiro conceito de justiça está associado à virtude, ideia encontrada em Aristóteles, e era tido como crença que justiça era dar aos indivíduos aquilo que lhes é devido, ou seja, uma concepção de equidade.

O autor elucida que o objetivo de seu livro é convidar o leitor a conceber seu próprio parecer acerca do que seria justiça, submetendo suas visões a um exame crítico para que haja compreensão sobre o que pensam e por que, mas evitando ao máximo não mostrar influência de pensamentos políticos.

 

1.Fazendo a Coisa Certa

Michael Sandel abre seu livro com um capítulo cheio de situações que provocam sérios questionamentos morais no leitor. Logo de início, ele propõe uma comparação econômica que consiste em: ainda que preços altos proporcionem maior fornecimento de mercadorias, tal benefício confronta-se com a sobrecarga imposta às pessoas de menor poder aquisitivo. Em situações calamitosas, como uma enchente, pessoas abastadas podem se aborrecer por ter de pagar mais caro, enquanto quem tem menos recursos encontra dificuldade e acaba permanecendo no local sem buscar segurança. Deveria-se considerar o bem-estar desses indivíduos nos momentos emergenciais, que o mercado livre não é livre ao se comprar sob coação imposta pela necessidade: se uma pessoa estiver fugindo de um furacão pagará o preço da gasolina involuntariamente. Uma boa sociedade se mantém unida na dificuldade, com ajuda mútua, em vez de tentar obter vantagens, afirma a virtude cívica ao compartilhar o sacrifício em defesa do bem comum (SANDEL, 2012).

Outro caso ilustrativo explanado por Sandel foi o “tsunami financeiro” (metáfora usada nos EUA para denominar a crise financeira de 2008 a 2009 ) que trouxe indagações acerca da operacionalização do mercado, a perseguição do lucro e o interesse pessoal. As apostas imprudentes dos bancos, permitidas pela regulamentação governamental inadequada, criaram a crise. O bem-estar da economia pareceu aumentar considerações da equidade. A notícia de bônus ocasionou protestos públicos, cuja ofensa eram as recompensas com os fundos do contribuinte aos membros do sistema financeiro. O episódio decorreu do público, relutante em gastar mais para remediar a confusão que a indústria financeira tinha criado para evitar o desastre econômico. Moralmente falando, sentiu-se que ocorria uma espécie de extorsão. Os bônus pareceram recompensar a ganância. Levanta-se a pergunta sobre a falha, o sucesso e a justiça (SANDEL, 2009).

A discussão sobre a virtude fundamenta-se na premissa de que o Estado deveria desencorajar a ganância, por ser uma falha moral. Nesse viés, há quem sustente a neutralidade do Estado acerca de vício e virtude, não lhe cabendo conservar as boas atitudes e desestimular as más. A neutralidade da sociedade ou promoção de virtudes divide o pensamento político.

O autor pondera que “a filosofia política não pode solucionar discordâncias desse tipo, mas pode dar forma aos nossos argumentos e trazer clareza moral para as alternativas com as quais nos confrontamos como cidadãos democráticos” (SANDEL, 2012, p.28).

Michael Sandel conclui esse primeiro capítulo perguntando se certas virtudes e bens de natureza tão elevada, transcenderiam às leis do mercado e ao poder do dinheiro. A partir dessa reflexão a seção seguinte apresenta a discussão do libertarismo, que esclarece uma ideia radical de liberdade do indivíduo em relação à própria vida privada e à vida em sociedade. Nesse sentido, o ponto de vista libertário se posiciona contrariamente a legislações que protejam os indivíduos de si mesmos (SANDEL, 2012).

 

2.Corrente utilitarista

Jeremy Bentham, filósofo e jurista inglês, foi o idealizador da corrente utilitarista como filosofia moral. Essa ideia de utilitarismo surgiu num contexto histórico revolucionário, a era da razão. O Iluminismo acreditava na ideia de que todos os fenômenos, como a política e a economia, poderiam ser explicados racionalmente. Partindo dessa concepção, Bentham dirigia críticas ao direito insistindo que as leis deveriam ser codificadas, mesmo em seu país que, conhecidamente, possuía um direito consuetudinário. O primórdio da ideia a de referida crítica era o principio da utilidade, visto que ele indagou acerca da utilidade de todo e qualquer conceito e da norma jurídica, questionando o objetivo prático de tais para o homem e a sociedade de sua época. Alicerçando-se sobre o princípio da utilidade, Jeremy Bentham, então, construiu toda uma filosofia em um posicionamento que oscila entre o apelo à concretude e à ideia da abstração universalista, definindo o princípio da utilidade como “o princípio que aprova ou desaprova qualquer ação, segundo a tendência que tem de aumentar ou a diminuir a felicidade da pessoa cujo o interesse está em jogo, ou, o que é a mesma coisa em outros termos, segundo a tendência a promover ou a comprometer referida felicidade. (1979, p. 4)”

Na corrente utilitarista, a felicidade é considerada como sinônimo de experiências que levam a uma sensação de prazer. Para Bentham o cidadão deveria obedecer ao Estado na medida em que a felicidade geral viria como sua contribuição (obediência). Essa felicidade geral, seria como uma espécie de equação hedonista. Assim, a teoria do direito natural é substituída pela teoria da utilidade, e o principal significado dessa transformação é a passagem de um mundo fictício para o mundo dos fatos. É no mundo empírico, afirma Bentham, que é possível a verificação de uma ação ou instituição, sua utilidade ou não. O direito de livre discussão na crítica é constituída pelo que é necessário em primeiro plano.

Sandel discorda do pensamento de Bentham ao expor que ele não leva em conta os direitos individuais e que trata os valores como algo resultante de uma operação que consiste em uma subtração do infortúnio pela beatitude, onde um resultado aceitável é aquele que apresenta o maior nível de bem-estar. O autor ilustra seu ponto de vista utilizando-se de alguns exemplos, tal como uma discussão acerca do momento em que os cristãos que eram jogados aos leões na antiga Roma. Qualquer indivíduo diria que isso é uma coisa injusta, porém se analisado do ponto de vista utilitarista, proposto por Bentham, a luta pela sobrevivência daquelas pessoas frente aos leões era fonte de grande prazer para milhares de romanos, logo a relação entre dor e felicidade era maior para a felicidade, ou seja, era algo considerado justo. Discordando disso, ele afirma que “não se pode alcançar uma sociedade justa simplesmente maximizando a utilidade ou garantindo a liberdade de escolha. Para alcançar uma sociedade justa, precisamos raciocinar juntos sobre o significado da vida boa e criar uma

cultura pública que aceite as divergências que inevitavelmente ocorrerão” (2012, p. 322).”

Outro pensador que considera a essência da teoria de Bentham, porém defende com mais intensidade os direitos individuais e propõe que o utilitarismo não necessariamente reduz os valores a uma única escala, é o filósofo e economista britânico John Stuart Mill. Possuindo um conceito mais amplo, ele foca nas regras ao invés de concentrar-se somente nas ações morais individuais. Em sua conceituação, levava em conta não apenas a quantidade, mas também a qualidade do prazer que as ações dos indivíduos proporcionavam.

Mill (1859, p. 9) em seu livro On Liberty, teve uma árdua tentativa de conciliar os direitos do indivíduo com a filosofia utilitarista, o princípio central é de que “as pessoas devem ser livres para fazer o que quiserem desde que não façam mal a ninguém. Desde que não esteja prejudicando aos demais, minha independência é, por direito, absoluta. Se a felicidade coletiva compensara o sofrimento dos outros, fica evidenciada que o utilitarismo, é uma base fraca e não confiável”. O princípio de liberdade de John Stuart Mill necessitava de uma base moral mais concreta.

Mill argumenta que os cidadãos devem ser livres para fazerem o que bem entendem, contanto que não façam mal a outrem. A liberdade, nessa perspectiva, é encarada como meio e a principal justificativa é de que, com o tempo, o respeito à liberdade individual conduzirá a máxima felicidade da sociedade, analisando sob uma perspectiva de utilidade a longo prazo. Desse modo, é preciso levar em consideração que há uma distinção qualitativa entre os tipos de prazeres. Para uma melhor assimilação por parte do leitor, Sandel recapitula o exemplo dos cristãos jogados aos leões. A partir da visão de Mill, fica claro que, tal espetáculo que antes era fonte de grande alacridade aos romanos ocasiona, na realidade, um tipo de prazer cruel e desumano, não capaz de conduzir a sociedade a um futuro feliz e próspero, portanto é preferível modificar esse arquétipo de felicidade ao invés de satisfazê-lo.

Quando se considera o bem-estar da maioria em detrimento ao de um indivíduo, tem-se uma visão utilitarista. Lon Luvois Fuller, jurista estadunidense, traz em sua obra “Caso dos Exploradores de Cavernas” uma situação que conta a história de quatro exploradores que, após um desmoronamento acidental de terra e pedregulhos, ficam impedidos de sair de uma caverna em uma de suas explorações. No mesmo dia o resgate foi acionado, porém, por diversas vezes, foi frustrado em decorrência de novos desmoronamentos o que acarretou no retardamento da desobstrução da caverna. No vigésimo dia de confinamento, os exploradores foram informados através de um rádio que o resgate iria demorar pelo menos mais dez dias para ser efetuado.

Desesperados, entraram em acordo para que um sorteio fosse feito para saber qual deles seria morto e serviria de alimento aos outros, assim, no vigésimo terceiro dia, um deles foi morto e garantiu a sobrevivência dos demais. Somente no trigésimo segundo dia foram resgatados e, após serem hospitalizados e tratados, os sobreviventes foram presos e condenados à morte pela prática de homicídio. Na situação exposta acima, os réus devem realmente ser condenados por homicídio, se considerarmos a visão utilitária?

Entendendo o funcionamento do utilitarismo é possível observar que a justiça em sua maioria cultiva a ideia de priorizar o bem da coletividade, assim, percebe-se que a concepção de justiça utilitarista é mais aplicada para solucionar situações conflituosas, tal como a exemplificada acima. Mas mesmo o abrandado utilitarismo de Stuart Mill é sujeito a objeções por parte de Sandel, principalmente por tratar o não respeito aos direitos individuais como problemas da sociedade em geral e não uma injustiça em si aos que tem suas liberdades negadas.

 

  1. Justiça como respeito à liberdade

Outra grande linha de pensamento apresentada na obra é a ideologia libertária, que defendem os mercados livres e se opõem à regulamentação do governo, não em nome da eficiência econômica, e sim em nome da liberdade humana. Seu principal argumento alicerça- se no fato de que cada um tem o direito fundamental à liberdade, ou seja, temos o direito de fazermos o que quisermos com aquilo que nos pertence, contanto que respeitemos os direitos dos outros de fazer o mesmo (SANDEL, 2012).

Os libertários são contra qualquer tipo de paternalismo estatal, ou alguma legislação sobre a moral e são fortemente contra qualquer tipo de redistribuição de renda. Admitem que não cabe ao Estado obrigar um indivíduo a ajudar outras pessoas, pois isso deve ser facultativo e não uma obrigação, já que cada um deve fazer o que bem entender com o que possui.

Exemplos como serviço militar não compulsório e aborto são utilizados para discutir essa concepção de justiça. Ambos os casos são defendidos pelos libertários, para eles o serviço militar não deve ser obrigatório, pois cada indivíduo deve ser capaz de decidir se pretende ou não se alistar nas forças armadas de seu país, e da mesma maneira a mulher que decide se quer ou não engravidar e ter um filho. Porém diferentes situações podem influenciar tais decisões, tornando-as nem sempre justas. Pois, em um período de guerra, por exemplo, muito provavelmente alguém que não tenha necessidade do dinheiro pago pelo exército não arriscara a vida em função do seu país, onde a maioria dos soldados advém de uma camada mais humilde da população. Esta lógica também é aplicada ao caso das mulheres que se submetem a um aborto. De tal modo, a liberdade de escolha é simplesmente uma ilusão, pois a realidade social muitas vezes é tão, se não mais, coercitiva quanto uma norma jurídica.

Sandel discute os limites do interesse público contra as ambições privadas à luz de argumentos libertários, segundo os quais não há injustiça desde que ela não resulte do uso da força, mas sim que seja resultado de escolhas feitas numa economia de livre mercado. Segundo os libertários, é injusto que se cobre impostos dos ricos para beneficiar os pobres, pois isto seria uma violência direta ao direito inalienável da liberdade, cabendo a somente uma decisão autônoma dos indivíduos de cederem ou não parte de suas riquezas e bens ao Estado. De grosso modo, querem fazer valer o direito fundamental aos livres mercados e pregam a ausência de regulação do Governo em todas as áreas para que se possa resguardar a liberdade humana de ação.

O autor olha para o liberalismo radical por uma perspectiva mais crítica, apontando falhas e limitações deste pensamento teórico fazendo-nos refletir se, e em quais condições, nós somos realmente livres ao agir em um, supostamente, livre mercado.

Michael Sandel aborda ainda outra importante linha de pensamento teórico para fomentar as reflexões sobre a justiça ao discorrer sobre Immanuel Kant e a motivação como um fator determinante para a ação moral. A moralidade e a justiça para Kant estão ligados fundamentalmente aos princípios, muito mais do que às consequências das ações humanas. Assim, segundo essa visão, o que importa para que os indivíduos ajam de maneira moralmente válida é que sejam governados por uma lei auto-imposta pelo livre arbítrio dos indivíduos, caracterizando a autonomia kantiana.

Kant parte da premissa de que somos seres racionais e merecedores de dignidade e respeito. Desta forma os indivíduos não podem ser considerados meios para a felicidade, algo não deve ser bom por ser melhor para a sociedade, a finalidade sempre deve ser o indivíduo em si (SANDEL, 2012). Ao agir livremente, faz-se algo por fazer e não como uma maneira para alcançar outra coisa. Essa capacidade de agir autonomamente, através da racionalidade, para Kant, é o que confere a vida humana a sua dignidade, pois diferencia pessoas de coisas. Porém isso não e tudo, Sandel ainda afirma que “Kant admite que nossa capacidade de raciocínio não é a única que possuímos. Somos capazes também de sentir prazer e dor. Ele reconhece que somos criaturas sencientes, bem como racionais. Kant quer dizer que respondemos aos nossos sentidos, aos nossos sentimentos (2012, p. 139).”

Para Kant, o valor moral não consiste nas consequências, mas na intenção da ação, ou seja, se agirmos por algum outro motivo que não o dever, a ação estará despida de valor moral. Sandel apresenta como exemplo uma situação em que um comerciante atende uma criança que vai comprar pão. O comerciante poderia cobrar um valor mais alto e a criança não perceberia, porém se descobrissem a sua reputação e seu comércio seriam prejudicados pela notícia, assim não explora a criança e cobra o preço adequado. A razão para que o homem agisse honestamente foi a proteção de sua imagem e, então, não há valor em uma honestidade condicionada. O filósofo alemão esclarece que há o que ele chama de imperativo categórico, onde seria o que representasse uma ação necessária por si. O imperativo categórico é este: “age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne uma lei universal” (2005, p. 52).

A ideia de ser dono de si mesmo traz implicações que apenas um libertário poderia aceitar: mercado sem proteção alguma, Estado mínimo – sem medidas para diminuir a desigualdade e promover o bem comum – e uma celebração do consentimento que permita infligir afrontas à própria dignidade, como canibalismo ou venda de si mesmo feito escravo. Das mais influentes questões de direitos e deveres feita por um filósofo, a teoria kantiana parte de que somos seres racionais merecedores de dignidade e respeito. liberdade de mercado ou escolha do consumidor não seria liberdade verdadeira para Kant por envolver satisfação de desejos que não escolhemos. Ao afirmar que a moralidade não deva ser baseada em considerações empíricas, interesses, vontades, desejos, Kant diz que alicerçar a moralidade em interesses aniquila sua dignidade. Merecemos respeito por sermos racionais, capazes de pensar; autônomos, capazes de agir e escolher livremente. Kant defende a soberania da razão que, quando comanda a vontade, domina o desejo de procurar o prazer e evitar a dor. A capacidade de raciocinar está ligada a capacidade de ser livre. Costuma-se definir liberdade como poder fazer o que se quer sem obstáculos. Kant define de maneira mais rigorosa, com o raciocínio de que quando buscamos o prazer ou evitamos a dor, não se age livremente mas de acordo com determinação exterior. O anúncio da Sprite “obedeça à sua sede” é um exemplo de inspiração kantiana. Discute-se o papel no comportamento da natureza e cultura. Não é livre o desejo condicionado ou biologicamente determinado. (SANDEL, 2012)

Kant também coloca em questão a motivação do dever. Cita um caso imaginário de um indivíduo infeliz e sem esperança que não aguenta mais viver. Há contrastes em Kant sobre dever e inclinação; autonomia e heteronomia; imperativos categóricos e imperativos hipotéticos. Kant diz que se deve ter a capacidade de agir não com uma lei imposta, mas com uma lei outorgada pelo indivíduo. Se para escapar de seu desespero o indivíduo suicida-se, utiliza a si mesmo como meio para aliviar o sofrimento. Kant afirma que o ser humano não é coisa para ser meio, ou seja, homicídio e suicídio são incompatíveis com o imperativo categórico.

O respeito é uma finalidade exigida pelo imperativo categórico, que trate a si mesmo e as pessoas com respeito e não transforme o corpo em um objeto, não o utilizando como bem entender. Kant defende uma teoria de justiça fundamentada em um contrato social. Para o filósofo, uma Constituição justa objetiva harmonizar a liberdade individual e a coletiva (SANDEL, 2012).

 

  1. Justiça como virtude e equidade

Sandel explana também uma noção de justiça baseada na equidade, expressa no pensamento de John Rawls. Segundo esse filósofo, podemos entender o que é a justiça através de uma situação puramente hipotética, na qual pessoas racionais e com interesses próprios celebrariam um contrato social em posições de equidade. O resultado disso, em termos ideais, seria a escolha de dois princípios base de justiça, sendo o primeiro relacionado às liberdades básicas de expressão e o segundo relativo à equidade social e econômica.

O autor pondera sobre as insuficiências morais dos contratos reais, afirmando que eles nem sempre são justos, pois alguma das partes pode estar em posição privilegiada devido ao maior nível de conhecimento ou maior poder de barganha na hora da negociação. Além disso, um acordo consentido não garante necessariamente a equidade, e um contrato verdadeiramente justo e equânime deve prezar pelos benefícios mútuos e pela reciprocidade absoluta entre ambas as partes (SANDEL, 2012).

Os contratos formais que existem na realidade não são instrumentos morais autossuficientes. Desse modo, justifica-se o raciocínio filosófico a partir de uma concepção ideal de um contrato hipotético perfeito como uma ferramenta moral para estabelecer os princípios básicos de uma justiça distributiva. Porém, segundo o filósofo, “não se pretende que a concepção da posição original explique a conduta humana, exceto na medida em que ela tenta dar conta de nossos juízos morais e nos ajuda a explicar o fato de termos um senso de justiça” (Rawls, Uma Teoria da Justiça, p.130).

Rawls esclarece que sua proposta não é de uma sociedade igualitária, mas sim equânime. Pois as objeções a sua teoria partem de que, colocadas em pratica suas ideias, as pessoas não teriam incentivos para produzirem mais e por isso não se esforçariam tanto. Contudo, ele diz essa diferença permitida é exatamente a nível de incentivo, mas apenas na medida em que isso beneficie as demais pessoas, e não da maneira extrema de uma sociedade mercadológica.

O mais ilustre representante da ideia de justiça como uma virtude é Aristóteles. O macedônico (384 a 322 a.C.), também marcou a história ao definir o conceito de justiça. Em primeiro lugar, ele subclassificou a justiça em universal e particular.A justiça universal ou total é a união das virtudes, é a virtude que acompanha todas as demais virtudes. O indivíduo justo é aquele que cumpre as leis e que faz o bem para o outro, e não para si mesmo. A justiça particular, que pode ser considerada uma subespécie da justiça universal, se refere à distribuição de bens, cargos e honrarias, que deve observar a igualdade. Aqui aplica-se a máxima de que se deve dar a cada um o que é seu.A justiça particular se subdivide em distributiva e corretiva. A justiça distributiva funda- se na meritocracia para a atribuição de cargos, bens e honrarias; neste caso, há um juízo de proporcionalidade; o Estado deve buscar a igualdade proporcional; os desiguais devem ser tratados desigualmente na medida de sua desigualdade e na proporção do seu mérito.

O principal conceito que devemos levar em conta para entendermos as ideias aristotélicas é o de teleologia. Para o filósofo, todas as coisas têm uma finalidade, um objetivo a cumprir, isto é, uma teleologia, que vem do grego, télos, que significa, propósito, finalidade ou objetivo. Para Aristóteles, a justiça não pode ser neutra, para ele justiça é dar a cada um o que lhe é devido, envolvendo as coisas e as pessoas a quem elas são destinadas. Como exemplo Sandel mostra que para o filosofo grego, se fossem ser distribuídas flautas, as melhores flautas iriam para os melhores flautistas, visto que devem ser tocadas para que o melhor e mais agradável som seja produzido aos ouvidos.

Aristóteles ensina duas espécies de justiça: a distributiva e a corretiva. A justiça distributiva consiste em uma espécie de proporção, o justo seria um meio termo. Já a justiça corretiva ocorre em transações voluntárias e involuntárias. A justiça em transações entre pessoas constitui espécie de igualdade, enquanto a injustiça nessas relações é uma espécie de desigualdade, de acordo com uma proporção aritmética. Aristóteles explica que o meio termo entre os dois é o igual, o qual ele chama justo e conceitua justiça corretiva como o meio termo entre perda e ganho. Justiça é o que o homem justo pratica, o justo, por escolha própria, que ao distribuir, quer entre si mesmo e outra pessoa, não dá mais do que convém a si mesmo e menos do que convém ou não convém ao próximo.

Determina Aristóteles (2007, p.104), como ponto de partida, acepções em que se diz que um homem é injusto: tanto o homem que infringe a lei quanto o homem ganancioso e ímprobo são considerados injustos, de tal modo que tanto aquele que cumpre a lei quanto o homem honesto obviamente serão justos. O justo, portanto, é aquele que cumpre e respeita a lei e é probo, e o injusto é o homem sem lei e ímprobo. Desse modo, como o homem sem lei é injusto e o cumpridor da lei é justo, evidentemente todos os atos conforme à lei são atos justos em certo sentido, pois os atos prescritos pela arte do legislador são conforme à lei, e dizemos que cada um deles é justo.

Por isso, Aristóteles (2007, p.105) considera que somente a justiça, entre todas as virtudes, é o “bem de um outro”, pois se relaciona e faz o que é vantajoso ao próximo, quer se trate de um governante, quer de um membro da comunidade. O pior dos homens é aquele que exerce a sua deficiência moral tanto em relação a si mesmo, quanto em relação aos seus amigos; e o melhor dos homens não é o que exerce a sua virtude em relação a si.

De acordo com Aristóteles, a justiça é uma questão de adequação – noção não muito aceita pelas teorias políticas modernas. De Kant a Rawls, as teorias liberais de justiça temem um conflito das concepções de justiça com teorias teológicas. Para elas, justiça é deixar livre as escolhas pessoais em vez de adequação. Desse ponto de vista, a escravidão é errada por coagir os indivíduos a desempenhar papéis que eles não escolheram; é coercitiva, segundo a teoria político liberal. Enquanto que, esclarece Sandel (2012, p.250), “para as teorias teleológicas, a escravidão é injusta por contrariar a natureza; a coerção é uma característica da injustiça, não sua origem”. Em relação ao trabalho, para Rawls, só há negociação justa se as condições de troca também o forem. Para Aristóteles, não é suficiente o consentimento sob condições justas para que o trabalho seja justo, devendo este estar em conformidade com a natureza dos trabalhadores que o desempenham. Há trabalhos periculosos, repetitivos, arriscados, inadequados à natureza dos trabalhadores que os desempenham.

O autor (2012) insiste: se debates sobre justiça constantemente nos coadunam em questões morais substanciosas, resta-nos indagar sobre uma continuação dessas discussões. Poder-se-ia discutir publicamente sobre o bem sem deslizar em disputas religiosas? Como diferenciar o argumento político habitual de um discurso comprometido com a moral? Para além da mera filosofia, essas questões estão no núcleo das tentativas de renovar o discurso político e a vida cívica. Após estudar as constituições seremos mais capazes de perceber, com maior amplitude, qual é a melhor, como devem ser estruturadas, e quais as leis e costumes convenientes a uma constituição para adotar a melhor possível. (ARISTÓTELES, 2007)

Para Aristóteles e sua teoria teleológica, ser justo é agir justamente: cumprir e respeitar a lei. O justo é o equilíbrio, o igual, o meio-termo entre a perda e o ganho. Justiça é uma distribuição proporcional; essencialmente humana, e sem excessos. Se é justo em relação ao próximo. Neste prisma, Michael Sandel compartilha uma abordagem de bem comum: a solidariedade como uma virtude virtude cívica.

 

  1. Considerações finais

Sandel traz exemplos de problemas sociais, de catástrofes, para demonstrar que esses assuntos deveriam ser debatidos publicamente, até o mais independente depara-se com dificuldade de se realocar em situações de calamidade.

O presente trabalho, na exposição do raciocínio sandeliano sobre Justiça, reforçou as disputas identificadas a respeito de justiça. A partir do exposto desfecha-se, na primeira seção, que Sandel traz exemplos de desgraças sociais, para demonstrar que esses assuntos deveriam ser debatidos publicamente. Explica que os menos abastados deparam-se com dificuldade de se realocarem em situações de fatalidade.

Tratou-se de expor o pensamento de Michael Sandel e sua obra “Justiça: o que é fazer a coisa certa”, enfatizando as discussões apresentadas por ele a respeito de justiça. A partir do exposto, conclui-se, nos dilemas morais econômicos tratados no primeiro capítulo, que Sandel traz exemplos de problemas sociais conhecidos pelos norte-americanos, de catástrofes e calamidades, para demonstrar que esses assuntos deveriam ser debatidos publicamente. Explica que, em tempos de enchentes, os menos abastados deparam-se com grande dificuldade financeira que pode, inclusive, impedir essas pessoas de se realocarem em situações de calamidade. Afirma que isso surpreenderia o público pelo fato de as conclusões não estarem propriamente na esfera moral, que costuma ser escamoteada, por não haver interesse em levar a questão fundamental de justiça, que subjaz ao tema, e é sua solução.

A sociedade está dividida atualmente em: ricos têm escolas específicas, condomínios fechados, os cidadãos não se misturam, por outro lado: parques públicos são abandonados sem cuidados devido à escassez de subsídios para pagar custos de manutenção. Isso proporciona um isolamento de ambos os lados dessa disparidade. A solidariedade só favoreceria a sociedade, no sentido de que, se todos convivessem juntos.

Em seguida o autor trabalha o libertarismo: o Estado pode ingerir-se na vontade do indivíduo? Subordina-se à visão filosófica escolhida. Na libertária, o Estado não tem o direito, pois cada personalidade é desamarrada para afrontar seu corpo. Tal liberdade para Kant jamais seria autorizada por ser contra o dever, a lei autoimposta. Sandel descreve esplendidamente a justiça em Kant. O olhar kantiano denota a autonomia da vontade, um mandamento imposto pelo indivíduo por uma lei universal. Há teorias que assumem o filósofo alemão como religioso.

Michael Sandel, em contrapeso, analisa que o racionalismo kantiano se legitima no dever, nega valores cristãos como amor, compaixão. Se filantropia faz bem, não tem valor moral para o filósofo iluminista: o correto é socorrer por dever. Consequentemente, encerram-se as alegações acerca das rígidas concepções morais kantianas. Aristóteles confere o justo e o injusto, a justiça é o meio-termo entre os opostos contraditórios, o equilíbrio, proporcionalidade, igualdade que é alcançada por meio da equidade. Justo é dar a cada um o que lhe é devido. Rawls segue a tradição aristotélica da equidade. A posição inicial é hipotética, uma experiência mental para se afastar da realidade e da categoria a qual se está inserido, estando coberto por um véu de ignorância, sem saber quais vantagens ou desvantagens se alcançaria a imparcialidade.

Na modernidade foram superadas algumas ideias clássicas. Rawls pensa a justiça na modernidade fundado no contratualismo, baseado nas ideias clássicas de Rousseau, Kant e Locke. A equidade parte de uma igualdade. Segue a tradição aristotélica. Seu livro “Uma teoria da justiça” é um esforço de adaptar a justiça ao liberalismo. Para o filósofo do século XX, a posição inicial é hipotética, uma experiência mental para se afastar da realidade e da categoria a qual se está inserido, desconhecendo a qual classe social se pertence, estando coberto assim, por um véu de ignorância, sem saber quais vantagens e quais desvantagens teria.

Na última seção, a asserção de Michael Sandel é sobre a virtude cívica, o comunitarismo: ricos e pobres deveriam se unir. Atualmente, a sociedade se divide: ricos têm escolas específicas, condomínios fechados, os cidadãos não se misturam. Enquanto isso, parques públicos são abandonados sem cuidados devido à escassez de subsídios para pagar custos de manutenção. Isso oportuniza um isolamento de ambos os lados dessa disparidade. A solidariedade só colaboraria a sociedade, no sentido de que, se todos convivessem juntos, as pessoas seriam mais felizes.

Têm-se mais dúvidas do que respostas, mas ao levantar questionamentos, podem-se criar espaços para debates, levantamento de ideias, visando satisfazer o objetivo da Filosofia. Eis o fundamento da teoria da justiça de Michael Sandel.

 

Referências bibliográficas

ARENDT, Hannah. Love and Saint Augustine. Chicago: The University of Chicado Press, 1996.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco; Poética – Os Pensadores; Seleção de Textos de José Américo Motta Pessanha. 4. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991.

BOBBIO, Norberto. Liberalismo e democracia. 1 edição. São Paulo, 2017

CUNHA, Maria Carolina S. P. da. O CONCEITO DE JUSTIÇA PARA MICHAEL SANDEL NA OBRA “JUSTIÇA: O QUE É FAZER A COISA CERTA?”. REGRAD, UNIVEM/Marília- SP, v. 10, n. 1, p 129 – 146, outubro de 2017.

FULLER, Lon Luvois, O caso dos exploradores de cavernas/ Lon L. Fuller; tradução do original inglês por Sabrina Lotaif Kheirallah. São Paulo: Hunter Books, 2012, p. 9.

SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa? [trad. 6 ed. de Heloísa Matias e Maria Alice Máximo]. 6 edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012

RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

 

Âmbito Jurídico

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