Thalyta Martins Carvalho[1]
Resumo: A garantia da comunicação e informação do preso, com o mundo exterior, através de aparelho telefônico, de rádio ou similar e o artigo 50, inciso VII da Lei 7.210/84, com redação dada pela Lei 11.466/07. Este artigo visa apurar eventual incompatibilidade dessa proibição com os direitos do preso, através de uma pesquisa bibliográfica e documental. Tem-se como principal resultado da pesquisa a conclusão da ilegalidade dessa proibição, pois além de ferir a ordem constitucional e contrariar Tratados Internacionais, ficou constatado que não há nenhuma contradição entre a pena privativa de liberdade e o acesso a tais objetos pelo apenado, ora que a sanção se impõe como medida de custódia física do indivíduo, no tocante a sua liberdade de “ir e vir”, não dizendo respeito a exteriorização de pensamentos e ao relacionamento, supervisionado, fora do cárcere.
Palavras-chave: Proibição. Comunicação. Informação. Incompatibilidade. Preso.
Abstract: The guarantee of communication and information of the prisoner, with the outside world, by telephone, radio or similar and of Article 50, item VII of Law 7,210 / 84, as amended by Law 11,466 / 07. This article aims to investigate any incompatibility of this prohibition with the rights of the prisoner, through a bibliographic and documentary search. The main result of the research is the conclusion that this prohibition is illegal, since in addition to violating the constitutional order and contradicting international treaties, it was found that there is no contradiction between the penalty of deprivation of liberty and access to such objects by the convict, now that the sanction is imposed as a measure of physical custody of the individual, with regard to his freedom to “come and go”, not concerning the externalization of thoughts and the relationship, supervised, outside the prison.
Keywords: Prohibition. Communication. Information. Incompatibility. Stuck.
Sumário: Introdução. 1. A prisão como medida de constrição física do indivíduo. 2. O dissenso entre o direito a comunicação e a prisão. 3. A importância da comunicação e o controle penitenciário. 4. Regras de Mandela e a incompatibilidade da Lei de Execuções Penais. Considerações finais. Referências.
Introdução
A liberdade[2] trazida pela Constituição Federal do Brasil em seu rol de direitos fundamentais é o corolário do Estado Democrático de Direito. Contudo, tal garantia também apontada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, não é ilimitada, pois sofre restrições necessárias aos direitos e interesses da coletividade, sobretudo no cárcere.
A princípio tem-se que o preso não perde nenhum direito incompatível com a perda de sua liberdade de “ir e vir” por estar sob custódia do Estado em um estabelecimento prisional. Ou seja, a rigor ele não está isolado do mundo exterior, no tocante a difusão de seus pensamentos, a receptação de informações e a comunicação com seus semelhantes, podendo receber visitas, ler livros, jornais e cartas.
Por outro lado, de acordo com a Lei de Execuções penais, o custodiado, no cumprimento da pena provisória ou definitiva, não pode se relacionar com o mundo exterior através de nenhum aparelho telefônico, de rádio ou similar, sob pena de cometimento de falta grave (art. 50, inciso VII, da Lei 7.210/84, incluído pela Lei nº 11.466/07). Logo, aquele que exerce quaisquer dos verbos descritos nesta norma incorre no impedimento ou revogação dos benefícios adquiridos durante a execução penal.
Embora tal fato não seja considerado crime, mas sim norma interna dos presídios, o artigo 349 – A do Código Penal[3] ainda prevê que àqueles que ingressam, promovem, intermediam ou facilitam a entrada destes artefatos de comunicação nas instalações prisionais cometem crime. Assim, além da reprimenda administrativa, objeto do presente estudo, ainda há uma sanção criminal vinculada a tal restrição.
Outrossim, além dos mecanismos de controle já existentes ainda se pode mencionar o Projeto de Lei nº 236, de 2012[4], Novo Código Penal, que traz em seu bojo um novo tipo incriminador que visa punir não apenas aqueles que ingressam em instalações prisionais com telefones celulares ou similares, mas também o condenado favorecido pela recepção destes objetos, em face da união de desígnios. Isto é, as normas, até agora destacadas, já revelam o posicionamento do Estado pela restrição dessa forma de comunicação do preso com o mundo exterior.
A razão de tudo isso é que, arraigada a tendência histórica do punitivismo, a Lei 7.210/84 se enveredou no sentido do endurecimento das sanções atrelando-se ao rigor da disciplina carcerária. Ainda que a comunicação seja um processo inerente a condição humana e tenha mudado drasticamente nos últimos anos, o Brasil ainda se recusa a permitir esses veículos de interação social e informação dentro dos presídios, sob o argumento de suposta possibilidade de reiteração criminosa dos seus detentos.
Ocorre que, em que pese entendimentos contrários, tal vedação é questionável, não só tendo em vista a necessidade de reinserir o indivíduo na sociedade, como também, em razão da ilegalidade do Estado para a imposição dessa medida, à luz da ordem jurídica constitucional vigente. Sendo que há no ordenamento jurídico outras formas de comprovar desvios na utilização desses bens, tal manejo só aduz uma imputação objetiva ao preso que fere a presunção de inocência e se funda em um perigo abstrato, sem elementos sólidos que o justifiquem.
O estudo desse tema é importante, tendo em vista subsidiar a tomada de decisão na esfera jurídico-política quanto a previsão trazida na Lei de Execuções Penais e no projeto do Novo Código Penal, que se encontra em trâmite na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Por conseguinte, ele ainda poderá viabilizar uma reflexão no tocante a alusiva estigmatização do condenado, como sendo, simplesmente por essa condição de cativo, passível a supressão de direitos.
A justificativa de escolha do tema se perfaz perante a questão já elencada, ora que tal discussão ainda é polêmica. Costuma-se repetir o discurso de que o acesso dos presos a determinados direitos corresponde a um afrouxamento punitivo que é inadmissível para “bandidos”, o que acentua a dicotomia existente entre a vida livre e a execução progressiva da pena, frisando essa relação de sujeição que constitui a prisão.
O punitivismo legal não é único, há o ilegal agregado. Embora o Estado seja o titular do poder de punir, a instabilidade social causada pela criminalidade dissemina a cultura do medo e, consequentemente, se percebe no exercício dessa governança afronta as garantias constitucionais basilares do Estado Democrático de Direito. Para Bauman (2008, p. 27 e 149) isso corresponde à modernidade líquida, pois a sociedade ao supor determinado perigo usa a mesma estratégia do passado, qual seja, a busca por “remédios” imediatos aos problemas sociais, que findam em entraves na aplicação de direitos ante a proliferação de discursos extremistas.
Hoje o que se entende como sendo a prisão e a justificativa do seu modo de intervenção na vida do custodiado é apenas um reflexo desse sistema que tende ao endurecimento das sanções e a diminuição da liberdade, para supostamente coibir e remediar determinadas condutas com a atuação interventiva do judiciário no arbítrio particular.
Pegoraro (2010, p. 73) aponta que em todas as sociedades foram surgindo esse gerenciamento de prêmios e castigos para os limites de controle e segurança, que a despeito de seu objetivo nem sempre detém legitimidade[5]. Ocorre que, diante das ingerências sociais o arcabouço jurídico do Estado acabou aplicando um tipo específico de análise as ações contrárias ao que é tido como ideal, vinculando a demonstração da atividade legislativa e da justiça social ao Direito Penal, ramo do direito que deveria ser subsidiário[6].
Isso comungou em uma percepção voltada aos pressupostos e consequências de determinados direitos. Se antes a punição se deu através da tortura, vingança, banimento e até morte, atualmente se tem na privação uma forma de explicitar e consagrar uma relação de antagonismo entre o apenado e a sociedade (SÁ, 2010, p. 114)
Como já afirmava Hobbes (1651, p. 231) o estabelecimento prisional veio justamente materializar a supressão da liberdade pela autoridade pública. Assim o Estado se comprometia a prender determinado agente para assegurar seu bem-estar contra vinganças do particular à medida que lhe aplicava uma sanção pela transgressão cometida.
No Brasil, esse mecanismo de segregação social foi inaugurado em 1830, muito embora se tenha construído a primeira Casa de Correção da Corte apenas em 1850, no Rio de Janeiro. Desde o Período Republicano, o Código Criminal, de 1890, tinha como enfoque isolar todos aqueles que apresentassem eventual ameaça à segurança do Estado (ZAFFARONI, 2003, p. 443) Ou seja, a concepção majoritária era de que se deveria buscar o enjaulamento em seu máximo rigor, para que, sem a circulação dos criminosos no seio social, houvesse um suposto comedimento coletivo (MOTTA, 2011, p. 294)
E, assim caminhou o Código Penal de 1940, ora vigente, bem como a Lei 7.210, de Execuções Penais, com uma rígida disciplina carcerária, que a despeito da razão[7] para qual fora criada ressaltou a soberania da autoridade penitenciária e reforçou os laços de submissão (ROIG, 2005) visando a reprimenda dos indivíduos considerados desviados e um risco a administração pública.
Embora a referida lei penal traga no seu artigo 59[8] que a pena não deve buscar estritamente a punição do agente, mas também uma prevenção de caráter intimidatório e reafirmador do sistema, que possa preparar o apenado para a reinserção social, não é isso que tem ocorrido, em razão dos recorrentes prejuízos as distintas formas de liberdade do preso. Assim, a realização de atividades corriqueiras da vida, que não confrontam diretamente o efetivo cumprimento da pena, são entendidas como privilégios do cidadão comum, intoleráveis ao custodiado.
Essa inclinação punitivista destoa, contudo, do contexto inserido na constrição física do preso e se torna um veículo de restrição de garantias constitucionais. “Um dos grandes dilemas é que as engrenagens que fazem a prisão existir e funcionar permitem uma série de punições alternativas que se aplicam juntamente com, e além da, restrição de liberdade”. (GILBERTO, 1984, apud HIGA, 2017, p. 101)
Desde o século XIX que esse estabelecimento se tornou a principal resposta penológica as questões sociais, o que fez com que a população carcerária no Brasil crescesse 83 vezes em setenta anos[9], segundo estudos realizados pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa Aplicada (2015). Destes encarcerados, só em São Paulo, 327.709 [10]estão no regime mais grave, o fechado.
Segundo Rodrigues (2011, p. 16) o Estado, neste tipo de pena, intervém no arbítrio de certa parcela de cidadãos de modo a limitar seu “ir e vir” e sua privacidade, inserindo-os em uma relação de sujeição. Isto é, enquanto presa a pessoa deixa de ter autorização para circular livremente em sociedade, havendo uma evidente limitação corpórea ao estabelecimento prisional.
Sob isso se conclui que há uma relativização normativa do direito constitucional, previsto no inciso XV do art. 5º da Magna Carta[11], dentro do aspecto de “ir vir, ficar e parar”, pelo advento assecuratório do Direito Penal trazido em sentença condenatória transitada em julgado ou em superveniente isolamento preventivo, da prisão cautelar.
Tem-se que, a rigor, o custodiado não está isolado do mundo exterior, pois não tem a proibição da informação, comunicação e convívio social como caráter da sanção, tendo em vista que a Lei de Execuções Penais não aponta incompatibilidade explícita entre a pena privativa de liberdade e o direito a comunicação, o que pode ser percebido pela simples leitura da seção II do aludido texto normativo, sobre os direitos do preso.
Conforme dispõe essa passagem da lei, os presos podem se comunicar com seus advogados e defensores, reservadamente, receber visitas de seus cônjuges, companheiros, parentes e amigos, em dias determinados, e estabelecer contato fora do estabelecimento prisional por meio de correspondência escrita, leitura e outros meios de comunicação que não comprometam a moral e os bons costumes[12].
Isto está em consonância com a Resolução nº 14 de 1994 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária que traz no seu art. 33, §1º, nos seguintes termos: […] o preso estará autorizado a comunicar-se periodicamente, sob vigilância, com sua família, parentes, amigos ou instituições idôneas, por correspondências ou por meio de visitas. (CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA, 1994).
O problema é que esta mesma legislação ao dispor sobre faltas disciplinares, prevê no seu artigo 50, inciso VII[13], com redação dada pela Lei 11.466 de 2007, que constitui uma falta grave que o detento tenha em sua posse, utilize ou forneça a outrem aparelho eletrônico, de rádio ou similar.
Embora alguns doutrinadores avaliem essa restrição como necessária a contenção da comunicação nos estabelecimentos prisionais, a fim de inviabilizar a possibilidade de um apenado se munir de instrumento hábil a reiteração criminosa, como o caso de portar, principalmente aparelhos celulares (FERREIRA; KUEHNE, 2009, p. 21) é importante considerar a repercussão dessa medida, e sobretudo sua legitimidade.
Opina Cunha (2017) que os presos dificilmente têm acesso a esses aparelhos para se comunicar com seus entes queridos, sendo tal instituto relacionado a proteção da administração da justiça. Porém, o que não é trazido juntamente a alegação é uma prova concreta desse risco, senão um perigo abstrato[14] anterior a possíveis condutas danosas dos agentes.
Os defensores desta proibição afirmam que não se trata de uma categorização de indivíduos, o que difere da realidade. Como fora trazido por Jakobs (2004, p. 45) os destinatários da norma são, neste caso, pessoas trazidas como autoras em potencial de um delito, o que é à perspectiva da criminologia crítica uma visão do direito penal do inimigo e de escolha dos vilões sociais.
Isso viola a presunção de inocência e as particularidades do caso concreto, corroborando uma ilegalidade ante a evidente desobediência ao que prevê o texto constitucional, em seu artigo 5º, inciso LVII[15]. Sem falar que caracterizada esta transgressão, concretizada apenas na posse dos aparelhos e não em seu uso, os presos incorrerem no impedimento ou revogação dos benefícios adquiridos no regime de execução penal e se veem ainda mais afastados de uma propensa oportunidade de reinserção na sociedade, podendo perder até um terço dos dias remidos[16] em sua pena.
A falta grave é quase uma nova pena dentro daquela imposta em uma decisão judicial, que apesar do seu rigor sequer traz, para imposição do inciso VII, elementos sólidos e dados estatísticos em sua fundamentação. Em 2017, mais de 14 mil celulares foram encontrados, isso apenas nas penitenciárias de São Paulo[17], mas a contrario sensu[18] não há dado algum quanto ao número de crimes praticados com esses bens que possam justificar à medida que se impõe.
Articula-se também, neste sentido, a lesividade, pois como ensina Greco (2006, p. 58) deve se impedir que o agente seja punido por aquilo que eventualmente ele seja e não pelo que ele fez. Vez que, à sombra de que exista arbítrio estatal o Estado deve sempre buscar comprovar a culpabilidade do indivíduo (MORAES, 2005, p. 103) e não pressupor. Ademais, na hipótese de aludida falta, o artigo 60 da lei 7.210/84 ainda prevê que o custodiado poderá ter decretada pela autoridade administrativa o isolamento preventivo, longe dos outros presos, pelo prazo de lei, além da possibilidade de ter incluído seu nome no regime disciplinar diferenciado[19], mediante despacho do juízo competente.
O que existe, na verdade, é um cenário de privações trasvestido de manejo e organização penitenciária, em que o presídio subtrai sinais clássicos de pertencimento a sociedade (ONOFRE, 2006, p. 02) com a desvinculação de coisas do apenado, a exemplo da possibilidade de portar, como qualquer pessoa, um objeto de comunicação e informação direta.
É essencial se verificar quando o aparelho telefônico, de rádio ou similar veio a ser considerado uma ameaça à paz social e ao gerenciamento da justiça. Se a comunicação acontecia através de cartas, telegramas, livros e jornais, hoje a leitura, conversa e acesso informação estão concentradas em um simples celular, que não aponta qualquer impacto a privação da liberdade física do preso.
Mister mencionar que todo esse processo de troca de experiências, através de diálogos e manifestações deixa a espécie humana em diferença aos demais seres vivos, sendo uma vantagem evolutiva indispensável à formação das construções sociais, que não pode ser limitada ao ambiente de custódia.
Hoje se vive em um mundo globalizado, onde não se faz quase nada sem meios telemáticos ou digitais, não parece razoável sustentar que seu uso cause repulsa a moral e aos bons costumes, uma vez que esses meios de comunicação são amplamente difundidos e fomentados no meio social. (SCHIMIDT, 2007, p. 226)
A quem fosse contra, não é apenas a comunicação dos presidiários com seus pares que fica prejudicada, mas também a informação, pois a distribuição de conteúdo por plataformas móveis é o novo recurso do século XXI. Segundo matérias noticiadas, nos últimos anos a leitura e a receita publicitária das mídias digitais já superaram os jornais em papel[20] fazendo com que empresas como a New York Times atravessassem uma crise aguda[21] diante da revolução digital que tem trazido uma nova roupagem ao mercado, mas que, em regra, pouco interessa ao punitivismo do Estado, que, como já demonstrado, só dificulta a modernização das técnicas de controle da comunicação empregadas em seus estabelecimentos.
Destarte é preciso considerar que a carência de informação e comunicação fora das grades consolida barreiras da ressocialização (RUDNICKI; VEECK, 2018, p. 72) e que o encarceramento e seu consequente isolamento humano, pelo endurecimento das privações, não resolve os problemas sociais existentes, mas sim os acentua[22].
Tem-se que considerar que eventual “reintegração social do preso se viabilizará na medida em que se promover uma aproximação entre ele e a sociedade, ou seja, na medida em que o cárcere se abrir para a sociedade e esta se abrir para o cárcere”. (SÁ, 2010, p. 115) Não pode se olvidar que ao conviver exclusivamente com outros presos há uma interferência nas características psíquicas do custodiado, não fosse suficiente as próprias ingerências desta extensa vida em apartado.
A lei penal já traz em seu bojo normas proibitivas para ilícitos realizados com o uso de tecnologia, essas poderiam ser aplicadas no mau uso desses veículos de comunicação, quer o sujeito esteja preso ou não, o que não cabe é antecipar a sanção, tendo como critério possível reincidência criminosa, sendo que todo sujeito é um criminoso em potencial[23]. Todos os membros da sociedade civil podem configurar como vítima e autor de múltiplos delitos, desde que não ajam quaisquer condições especiais, como são na maioria dos crimes digitais[24].
Sem falar que, a fim de manejar o controle no uso desses instrumentos de comunicação a Lei 9.296/96, conhecida como Lei de Interceptações Telefônicas[25], poderia muito bem funcionar e efetivamente comprovar desvios a ordem pública que justificassem qualquer proibição ou intervenção do Estado no direito individual.
Aludida norma autoriza que a autoridade policial ou o representante do Ministério Público visando obter prova em investigação ou instrução processual penal intercepte canais de comunicação. Logo, quem quer que fosse, preso ou não, poderia ter factível crime descoberto para que após isso o judiciário pudesse limitar seu uso. Além do que as obtenções de provas através desses veículos são mais simples do que a palavra falada pessoalmente, por exemplo, pois que estes primeiros podem sofrer monitoração eletrônica em tempo real.
O que não pode ocorrer é a opção do Estado pela via emergencial, qual seja: a privação de liberdades e garantias, nas quais ilegalidades são consentidas pela sociedade. (WOLFF, 2005, p. 119) Não são os rádios, comunicadores ou similares que são um problema no presídio e sim a negativa do sistema em rever a compatibilidade da pena privativa de liberdade e a comunicação com o mundo exterior.
Em nenhum momento desde a constituição da prisão houve qualquer manifestação normativa no sentido de que a comunicação do custodiado desconstituísse o que se tem como limitação da liberdade física. Ou seja, o direito a comunicação e informação externa do preso nada tem a ver com o fato dele ter que ficar recluso no estabelecimento prisional, sendo que esse processo de contato com o mundo exterior é reconhecido como necessário na própria Lei 7.210/84[26].
O direito a comunicação é sobretudo natural[27], pois antecede o surgimento da figura do Estado. Limitá-lo sem elementos sólidos é um abuso estatal, ora que a pena privativa de liberdade se refere apenas a abstenção da locomoção do apenado fora do estabelecimento prisional. Milita em favor dessa alegação o item 2 da Declaração Universal de Direitos Humanos que afirma que as limitações de direitos de qualquer pessoa devem satisfazer exclusivamente as justas exigências da ordem pública, tendo parâmetros consolidados que justifiquem a intromissão do Estado na vida do particular.
Há na prisão uma instrumentalização do controle que visa a manutenção da dominação e reflete um problema estrutural[28] do sistema prisional. Porém a ordem jurídica internacional já apontou hipóteses humanitárias de reorganização penitenciária, a fim de atenuar os resquícios do punitivismo.
A Resolução nº 14 do Conselho de Política Criminal instituiu as Regras Mínimas para o Tratamento dos Reclusos[29], em 1955. Durante o evento realizado em Genebra, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias, visando se manifestar quanto as garantias basilares dos presos e os impactos da segregação social, trouxe no seu item 60 a previsão de que os estabelecimentos prisionais devem tentar reduzir ao máximo as diferenças existentes entre a vida livre a vida na prisão.
Prosseguindo nos tópicos seguintes que não deve ser incentivada a exclusão dos presos em relação à sociedade, devendo cada um deles ter tratamento respectivo, em estabelecimentos distintos que visem de maneira flexível lograr êxito na reabilitação, sendo que não deverão ser adotadas as mesmas medidas de segurança para todos, em razão dos diferentes graus de periculosidade[30].
Sob esse aspecto se conclui que ainda que tal proibição da Lei 7.210/84 fosse admitida, à luz da dogmática pátria, ela não poderia ser aplicada a todos os presos, indistintamente, em razão da individualização da pena, também prevista na Constituição do Brasil, em seu artigo 5º, inciso XLVI[31].
Superado esse adento, considerando que normas direitos do preso foram adotadas no Brasil em 31 de agosto de 1955 pelo Conselho Econômico e Social, conclui-se que: tal vinculação é deveras necessária e pertinente no ordenamento brasileiro. Afinal um Tratado Internacional tem como fim a formalização de um pacto normativo celebrado entre determinados países e deve ser harmonizado com a legislação interna de cada ente federativo signatário.
Contudo, a respeito dessa previsão incorporada no direito brasileiro ser essencial na interpretação das garantias do preso ela é datada na década de XC, ou seja, não contempla a comunicação do preso em alcance aos veículos de comunicação existentes hoje, pois foi apenas em 1990 que foi lançado o primeiro aparelho de comunicação móvel no Brasil[32], sendo que antes disso a comunicação e informação direta era um privilégio de poucos.
Para atualizar as doutrinas de Direitos Humanos e, obviamente, a norma internacional supracitada que já vigia por mais de 50 anos houve a implementação das Regras de Mandela. Trazida também pela Organização das Nações Unidas, em 2015, ela veio estruturar os sistemas penitenciários no mundo e incorporar um novo quadro de normas, também adotadas no Brasil[33].
Segundo o Ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Conselho Nacional de Justiça, à época, essa atualização visava enfrentar a negligência estatal com os indivíduos em cumprimento de pena privativa de liberdade, pois, para ele, as ações do Brasil tendem a ser mais punitivas que inclusivas (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, p. 9-10) além de não acompanhar a dinâmica social.
As análises de tais regras são importantes uma vez que a previsão do artigo 50, inciso VII, da Lei 7.210, foi trazida pela Lei 11.466, no ano de 2007, isto é, antes dessa necessária atualização normativa sobre organização penitenciária, a nível mundial. Como se segue no trecho abaixo um dos itens explorados por esse instrumento foi justamente a comunicação dos presos com o mundo exterior:
Regra 58. 1. Os prisioneiros devem ter permissão, sob supervisão necessária, de comunicarem-se periodicamente com seus familiares e amigos: (a) por correspondência e utilizando, onde houver, de telecomunicações, meios digitais, eletrônicos e outros. (REGRAS DE MANDELA, 2015, p. 31).
Desprende- se que, diante da transcendência dos efeitos da pena privativa de liberdade, que além da privação da liberdade física também impactava a comunicabilidade do preso, houve uma nova interpretação quanto a possibilidade do uso de aparelho telefônico, de rádio ou similar, pelos condenados a pena privativa de liberdade. Logo, sob a indispensável supervisão os apenados poderão comunicar-se com sua família e amigos por telecomunicações, meios digitais e eletrônicos, onde houver, o que ainda beneficiaria os presos alocados para longe de suas comarcas, ante a dificuldade de seus familiares em visitá-los.
A questão é, tal possibilidade trazida nas Regras de Mandela restou-se em caráter programático[34], sem uma manifestação plena e consequencial a omissão legislativa e jurisdicional. Assim como tantas normas carcerárias e de Direitos Humanos adotadas no Brasil, não houve qualquer reverberação na norma infraconstitucional. Logo, não é possível falar em legitimidade deste Tratado, uma vez que a jurisdição internacional não conseguiu se realizar “dentro” do Estado (BOBBIO, 1992, p. 41-42).
Ficou apenas estabelecido que os governos deveriam adotar as medidas pertinentes pensando em uma vida após o cumprimento da pena que atenuasse os estigmas[35] trazidos no complexo prisional, em contraponto ao endurecimento do punitivismo e a tendência ao afastamento do apenado do mundo exterior, pela rejeição moral da comunidade (CAMMAROSANO, 2007, p. 07) Desse modo, embora não haja interesse do Estado[36] em abrir novos canais de comunicação e informação para o preso, há uma latente distorção da concepção de liberdade na ordem jurídica vigente. Talvez o interesse dessa privação seja esconder o que tem se constituído as celas, um depósito humano[37], e não o controle social.
Mesmo diante de Tratados Internacionais se percebe a repetição do senso comum de que liberdades e regalias podem corresponder a um afrouxamento punitivo que são inadmissíveis para “bandidos” (HIGA, 2017, p. 2016). E, assim a norma jurídica ultimamente tem se tornado um juízo de valor do legislador sobre os fatos sociais e não a interpretação da realidade (GAZOTO, 1997, p. 488)
Em que pesem críticas a essa transcendência do limite de custódia corpórea do indivíduo o Estado, no intuito de endurecer o acesso dos presos a tais veículos de interação com a sociedade, ainda criou um tipo penal específico. Desse modo, sob pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, o artigo 349 – A do Código Penal prevê a proibição do ingresso, intermediação, auxílio ou facilitação da entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, nos estabelecimentos prisionais. Ou seja, não é apenas o custodiado que sofre sanção, ainda que administrativa, pelo uso dos aludidos bens, mas também aqueles que o beneficiaram.
Apesar dessa norma também ser controvertida, tendo inclusive um precedente[38] pela sua inconstitucionalidade, uma situação peculiar ainda traz mais discussão em relação a essa incomunicabilidade: o Projeto de Lei nº 236/12, Novo Código Penal. Este visa punir não apenas o sujeito ativo do 349 – A, mas também o condenado favorecido por aquela conduta, ora a união de desígnios. Quer dizer, se há um receptor do bem que se encontra preso pela teoria monista[39] ele também deveria responder pelo delito.
Tal projeto, também anterior as Regras de Mandela, só acentua e reitera o posicionamento sedimentado do Estado no sentido da resistência a abertura dos canais de comunicação nos presídios, questão que deve ser enfrentada. Caso tal lei seja aprovada os gravames da conduta não incidirão só na possibilidade de concessão de benefícios ao preso, mas também na pena em si. Segundo Gazoto (1997, p. 487) o que acontece é que para tentar supostamente reduzir a criminalidade e dar uma resposta hipócrita a sociedade o Estado tem preferido criar tipos penais e aumentar os castigos e privações.
Por fim se vislumbra a manutenção da extrapolação dos limites da pena privativa de liberdade, em prejuízo aos direitos do preso. Sendo que além da afronta aos mandamentos da ordem internacional ainda se desrespeita os princípios limitadores do direito de punir do Estado a fim de perpetuar preceitos atrelados ao punitivismo, sobretudo a supressão de liberdades, ainda que compatíveis entre si.
Considerações finais
Diante do que fora apontado se conclui que a pena privativa de liberdade não é incompatível com o direito a comunicação e informação do preso. Em verdade proibições além da constrição da liberdade física do preso não poderiam ser concebidas para solucionar questões presumidamente sociais. Isto é, o direito alheio não poderia servir de mecanismo para manutenção do poder e do sistema prisional, sob a falácia de que a privação do acesso dos apenados a meios telemáticos e digitais podem reduzir os problemas da vida em comunidade e evitar crimes.
As consequências da falta grave repercutem em toda execução penal, sendo quase que uma nova punição. Esse rigor, além de histórico, tem impulso na descredibilidade do sistema. Para evitar que a sociedade civil encare direitos do preso como ineficiência persecutória do Direito Penal o Estado endurece a pena e traz suposta satisfação social.
Infelizmente, o que vigora é a repetição de um sistema punitivista em que prevalece a privação de garantias constitucionais, em latente ilegalidade. Diante disso põe-se em confronto o artigo VII da Lei 7.210/84 e o direito à liberdade de informação e a comunicação do apenado, ainda que estes não sejam contrários entre si.
Embora alguns doutrinadores sejam resistentes ao acesso dos presos a aparelhos telefônicos, de rádio ou similares, nenhum deles aponta em dados estatísticos a alegada e falaciosa reiteração criminosa, o que é senão um preconceito, estigmatizante, uma violação a presunção de inocência.
Mesmo que o preso não cometa nenhum crime munido do aparelho ou nunca tenha estado envolvido em organizações criminosas ele sofrerá os impactos dessa imposição, dada de maneira genérica. Proibir tais instrumentos sendo que há outras formas de controle, como a interceptação telefônica, além de prejudicar a garantia constitucional de individualização da pena, acentua a segregação do custodiado e traz transtorno a sua reabilitação, aumentando o abismo entre o mundo exterior e o cárcere.
Se existem delitos que podem ser realizados com uso desses bens, antes de restringi-los se deve demonstrar a consumação de uma atividade danosa, adequando o feito ao tipo penal respectivo. É preciso compreender que a probabilidade de existência da conduta criminosa preexiste dentro e fora das grades, estando toda e qualquer pessoa apta e passível a cometer um crime munido de um aparelho de comunicação.
Destarte, em que pesem as tendências internacionais contrárias a essa previsão normativa nada foi feito. O Brasil é signatário das Regras de Mandela, uma previsão internacional superveniente, que veio atualizar as regras carcerárias e de direitos humanos no mundo, devendo tal previsão da Lei de Execuções Penais ser revista, ante a nova ordem jurídica. Somente assim Tratados Internacionais poderão sair do papel e ter efetividade.
Não dá para pensar na sociedade atual sem as mídias digitais, ainda que o acesso destas não fosse concedido diretamente ao preso. Mediante a supervisão cabível poderia o estabelecimento penal permitir que os detentos se comunicassem e se informassem periodicamente com seus entes, tendo a possibilidade de estudar a distância ou realizar trabalhos de maneira online.
Ademais não é razoável admitir que um ser humano fique isolado por anos cumprindo uma pena de liberdade para depois ser simplesmente lançado de volta a sociedade, ao mercado de trabalho, competindo diretamente com pessoas livres e cercadas de oportunidades e atualizações do mundo.
Há uma evidente transcendência aos limites de custódia física. Ao contrário do que ocorre hoje a prisão deveria buscar, sob óbice da tutela do Estado, o cuidado desses apenados a fim de readequá-los para a vida livre e não os esquecer dentro de um microscópio prisional, mantendo-os afastados de qualquer aproximação direta e imediata com o povo.
Quando as diretrizes sobre direitos do preso foram atualizadas em 2015 se visou justamente enfrentar essas questões pormenorizadas no tocante a evolução da tecnologia e do punitivismo do Estado incorporando um novo quadro de normas que pudesse recompor a legislação vigente, à vista ainda do necessário enfrentamento da negligência estatal que sobrepujava seus detentos.
Seguindo uma linha contrária ao que previa o Novo Código Penal, hoje em trâmite na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que só reitera a preocupante situação que deu causa ao presente estudo, pois o legislador para tentar atenuar a criminalidade tem optado por criar tipos penais e intervir mais abruptamente no arbítrio dos cidadãos, ainda que sem elementos sólidos que o fundamentem.
É preciso quebrar o preconceito existente entre o preso e a sociedade, em destaque a condição humana pautada na interação. Não é necessário retirar direitos para exercer o poder punitivo, tampouco enrijecer as consequências da sanção, pois se assim fosse o elevado crescimento da população carcerária teria resolvido os problemas sociais, que a despeito de todas as técnicas de controle empregadas acompanham a sociedade ao longo dos séculos.
Com a expansão da comunicação e informação do preso a pena irá se tornar mais digna e promoverá outras formas de implementar sistemas para manutenção de vínculos fora do cárcere que possam trazer um referencial ao apenado, criando uma perspectiva da vida fora daquele estabelecimento e uma sensação de pertencimento a comunidade e de sujeito de direitos.
Referências
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[1]Bacharela em Direito pela Universidade Católica do Salvador. Pós Graduanda em Direito Penal e Processual Penal. Advogada. Membro da Liga de Estudos Jurídicos da Bahia. E-mail: thalytaadv@hotmail.com.
[2]A ideia de liberdade é uma herança do século das luzes, sendo essencial a ordem jurídica constitucional. Tal preceito foi invocado pela primeira vez durante a Revolução Francesa: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”.
[3]O artigo 349 – A do Código Penal foi introduzido pela Lei 12.012, em 2009, in verbis: “Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico, de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional. Pena — detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano”.
[4]O projeto do Novo Código Penal é de autoria do Senador José Sarney (MDB/AP) e tem natureza de norma geral. Mais informações disponíveis em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/106404>. Acesso em: 20 de abril de 2019.
[5] Legitimidade aqui é entendida como sendo um fenômeno normativo em que se harmoniza todo sistema jurídico ao caso concreto e a ordem constitucional.
3[6]O direito penal, segundo o princípio da fragmentariedade, só deveria ser utilizado quando outros ramos do direito não satisfizessem a proteção dos bens jurídicos importantes no caso concreto. Logo qualquer privação de direitos e liberdades humanas, sob a égide dessa disciplina, devem ser encarados de forma subsidiária com atenção especial aos direitos da pessoa.
[7]Segundo o artigo 1º da Lei de Execuções Penais o objetivo desta norma é proporcionar condições de harmonia e integração social do condenado e internado, isto é, ao passo que ocorre a punição deverá também ser proporcionada a reinserção social.
[8]Art. 59 do Código Penal: “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Ou seja, deveria ser estabelecido na norma apenas o suficiente ao exercício do poder de punir do Estado, visando não só a sanção, mas também o caráter educativo e de reinserção social.
[9]Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&id=25590>. Acesso em: 26 de outubro de 2018.
[10]Informação disponível em: <http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php>. Acesso em: 25 de março de 2019.
[11]Artigo 5º da Constituição Federal: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] XV – é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”
[12] Sob tal perspectiva cabe uma crítica, pois a análise do que vem a ser moral e costumeiro aduz uma subjetividade que não comporta o direito, com base nos ensinamentos de Reale (2001, p. 38) é imprescindível distinguir o direito e a moral, sob pena de decaimento de garantias da sociedade.
[13] Artigo 50 da Lei de Execuções Penais: “Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que: […] VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”. (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007).
[14]A doutrina conceitua esse perigo abstrato como decorrente de um comportamento, sem a imputação de determinado resultado trazido de forma expressa. Embora admissível em certos tipos, como nos crimes de mera conduta, a exemplo da invasão de domicílio (artigo 150 do Código Penal) é preciso considerar que para a responsabilidade criminal não basta a caracterização de uma ação como sendo potencialmente lesiva, mas sim a observância a critérios sólidos de risco. Até mesmo porque os instrumentos trazidos como proibidos pela Lei de Execução Penal são lícitos e adequados socialmente, logo não há nenhuma ofensa real em seu uso, quando no âmbito prisional.
[15]Artigo 5º da Constituição Federal: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
[16]Essa remição da pena é um direito do preso e corresponde ao abatimento dos dias e horas de trabalho ou estudo do preso que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto.
[17]Informação disponível em: <https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/mais-de-14-mil-celulares- foram-apreendidos-em-presidios-de-sp-em-2017.ghtml>. Acesso em: 02 de março de 2019.
[18] Locução latina que significa “a contrário”.
[19]O regime disciplinar diferenciado é uma sanção disciplinar trazida no artigo 52 da Lei de Execuções Penais.
[20]Disponível em: <https://exame.abril.com.br/tecnologia/leitura-e-receita-publicitaria-online-superam- jornais-em-papel/>. Acesso em: 20 de outubro de 2018.
[21]Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/jornal-de-debates/ha-luz-no-fim-do-tunel- dos-jornais-impressos/>. Acesso em: 20 de outubro de 2018
[22]Corrobora a essa crítica social um estudo realizado no Canadá que concluiu que a maioria das pessoas que cometem crime desconsidera os impactos de suas ações. Ou seja, não é o rigor da sanção, quiçá dos modos de Execução Penal, que resolve a criminalidade ou os problemas sociais, devendo tais questões serem enfrentadas mais minunciosamente. Informação disponível em:
<https://revistas.ufrj.br/index.php/dilemas/article/download/7187/5766>. Acesso em: 02 de fevereiro de 2019.
[23]Nesse sentido qualquer pessoa pode cometer crimes comuns, isto é, não se exige qualquer qualidade especial do sujeito ativo ou passivo do delito, quer seja com o uso de aparelhos de comunicação ou não toda pessoa está apta a delinquir.
[24]A maioria dos delitos praticados com o uso das mídias digitais não exigem qualquer especialidade do sujeito ativo, sendo que cada uma dessas condutas detém uma tipificação respectiva, podendo a vítima recorrer ao judiciário para que este exerça seu poder punitivo ante a determinado prejuízo do seu bem jurídico. Mais informações disponíveis em: <http://www.justificando.com/2018/06/25/crimes- digitais-quais-sao-quais-leis-os-definem-e-como-denunciar/>. Acesso em 28 de maio de 2019.
[25]A Lei de Interceptação Telefônica veio regulamentar o inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, no tocante a inviolabilidade das comunicações. Assim, através da norma, poderia o poder judiciário para justificar a limitação da comunicação do preso demonstrar o uso indevido do rádio, telefônico ou similar, para que assim pudesse prosseguir fundamentadamente qualquer limitação no gozo desse direito.
[26]Vide artigo 41 da Lei de Execuções Penais.
[27]É natural pois vem da ideia natural de justiça pautada no bom senso. É inerente ao ser humano se comunicar e relacionar com seus pares, antes que houvesse qualquer aglomerado humano político e juridicamente organizado já havia essa interação social.
[28]Sobre isso aponta Mirabete (2008, p. 26) pois para ele a prisão não cumpre sua função de ressocialização, pelo contrário, mantém a estrutura social de dominação do Estado, agravando as contradições existentes entre a sociedade e o apenado, à medida que estigmatiza o recluso e impede sua reincorporação social.
[29]Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes- permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-humanos-e-politica-externa/RegMinTratRec.html>.
Acesso em: 15 de agosto de 2018.
[30]“Regras de Mandela: “[…] 60. 1) O regime do estabelecimento deve procurar reduzir as diferenças que podem existir entre a vida na prisão e a vida em liberdade […] 2) Antes do termo da execução de uma pena ou de uma medida é desejável que sejam adotadas as medidas necessárias a assegurar ao recluso um regresso progressivo à vida na sociedade. [..] 61. O tratamento não deve acentuar a exclusão dos reclusos da sociedade, mas sim fazê-los compreender que eles continuam fazendo parte dela. […] 63. 1) A realização destes princípios exige a individualização do tratamento e, para este fim, um sistema flexível de classificação dos reclusos por grupos; […] 2) Estes estabelecimentos não devem possuir o mesmo grau de segurança para cada grupo. […]”.
[31]Artigo 5º da Constituição Federal: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: […]”
[32]Informação disponível em: < https://www.techtudo.com.br/noticias/noticia/2011/07/o-primeiro- celular-da-historia.html>. Acesso em 31 de outubro de 2018.
[33]Informação disponível em:
<http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/06/f4e6423c5499f6517ec15db4a4750b80.pdf>. Acesso em: 20 de julho de 2018.
[34]Normas programáticas são aquelas em que não há uma imposição normativa direta com repercussão consequencial ante a sua omissão ou desobediência, sendo, portanto, uma orientação legislativa.
[35]Sobre o assunto tem-se o seguinte fragmento: “Atualmente, nenhum especialista entende que as instituições de custódia estejam desenvolvendo as atividades de reabilitação e correção que a sociedade lhes atribui. O fenômeno da prisionização ou aculturação do detento, a potencialidade criminalizante do meio carcerário que condicionam futuras carreiras criminais (fenômeno de contágio), os efeitos da estigmatização, a transferência da pena e outras características próprias de toda instituição total inibem qualquer possibilidade de tratamento eficaz e as próprias cifras de reincidência são por si só eloquentes. Ademais, a carência de meios, instalações e pessoal capacitado agravam esse terrível problema”. (CERVINI, 1995, apud GRECO, 2006)
[36]Neste sentido também criticou o Ministro Ricardo Lewandowski (ob. Cit). Ele complementa a apresentação das Regras de Mandela fazendo referência a omissão do Brasil, aduzindo que embora tenha havido participação ativa na confecção deste instrumento apto a minimizar o sistema punitivo brasileiro, ainda não há qualquer repercussão no país.
[37]Sobre isso critica Rodrigues (2011) as cadeias brasileiras, não todas, mas grande parte delas apresentam características mais de depósitos de seres humanos do que propriamente de estabelecimentos prisionais, o que torna ainda mais grave a leniência com que o assunto vem sendo tratado pelas instâncias de poder.
[38]Em decisão proferida nos autos do Processo n. 0003023-49.2014.8.14.0049, a Juíza de Direito Andrea Ferreira Bispo rejeitou a denúncia oferecida pelo Ministério Público do Estado do Pará, na qual se denunciou a mulher de um detento que, ao realizar visita, teria tentado ingressar no estabelecimento prisional com um celular no interior da cavidade vaginal. Para ela a criminalização desta conduta se fundamenta em um perigo imaginário, direcionada a uma classe de pessoas, chamada de “bandidos”, como se eles não tivessem laços familiares ou de amizade, se esperando que eles sempre cometam delitos. Informação veiculada na imprensa, disponível em:
<http://ittc.org.br/celular-na-cavidade-vaginal-para-entrada-em-presidio-nao-e-crime-diz-juiza-ao- rejeitar-denuncia-oferecida-pelo-ministerio-publico/>. Acesso em 10 de abril de 2019.
[39]A teoria monista, adotada pelo Código Penal em seu artigo 29, prevê que ainda que tenha participado vários agentes de determinado fato criminoso, considera-se um crime único, sem distinção de sujeitos, pelo qual respondem cada um na medida de sua culpabilidade.
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