Resumo: In primo loco, insta pontuar que o poder familiar, outrora denominado de pátrio poder pelo Ordenamento Pátrio, consiste em uma gama de direitos e obrigações, em relação à pessoa e bens do filho menor, ainda não emancipado, exercido, em paridade de condições, por ambos os genitores, a fim de desempenharem os encargos decorrentes do arcabouço normativo, tendo em vista, precipuamente, o interesse e a proteção do filho. Deste modo, o ideário de igualdade que norteia a relação dos genitores incide, também, no exercício do poder familiar, sendo carecida a colaboração de ambos. Ao lado disso, há que se arrazoar que ambos os genitores, em igualdade de condições, detêm o poder decisório sobre a pessoa e os bens do filho menor, ainda não emancipado. Depreende-se, desta sorte, que houve maciça restruturação do pátrio familiar, o qual vigeu até o Código Civil de 1916, no qual tão somente o pai possuía poder em relação à família e aos filhos, sendo a genitora renegada uma figura ausente na tomada de decisões do núcleo familiar. Entrementes, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, denota-se que tais ranços foram extirpados da sociedade, sendo conferido uma situação de igualdade entre os genitores, no que concerne ao poder exercido atinente aos filhos e os bens destes.
Palavras-chaves: Poder Familiar. Família Democrática. Igualdade.
Sumário: 1 Poder Familiar: Conceito, Finalidade e Aspectos Característicos; 2 Abrangência do Poder Familiar; 3 Conteúdo do Poder Familiar; 4 Suspensão do Poder Familiar; 5 Hipóteses de Destituição do Poder Familiar; 6 Procedimento da Perda e da Suspensão do Poder Familiar; 7 Extinção do Poder Familiar
1 Poder Familiar: Conceito, Finalidade e Aspectos Característicos
In primo loco, insta pontuar que o poder familiar, outrora denominado de pátrio poder pelo Ordenamento Pátrio, consiste em uma gama de direitos e obrigações, em relação à pessoa e bens do filho menor, ainda não emancipado, exercido, em paridade de condições, por ambos os genitores, a fim de desempenharem os encargos decorrentes do arcabouço normativo, tendo em vista, precipuamente, o interesse e a proteção do filho. Segundo Tartuce e Simão[1] obtemperam com ênfase, o instituto em comento pode ser “conceituado como sendo o poder exercido pelos pais em relação aos filhos, dentro da ideia de família democrática, do regime de colaboração familiar e se relações baseadas, sobretudo, no afeto”. Deste modo, o ideário de igualdade que norteia a relação dos genitores incide, também, no exercício do poder familiar, sendo carecida a colaboração de ambos.
Ao lado disso, há que se arrazoar que ambos os genitores, em igualdade de condições, detêm o poder decisório sobre a pessoa e os bens do filho menor, ainda não emancipado. Depreende-se, desta sorte, que houve maciça restruturação do pátrio familiar, o qual vigeu até o Código Civil de 1916[2], no qual tão somente o pai possuía poder em relação à família e aos filhos, sendo a genitora renegada uma figura ausente na tomada de decisões do núcleo familiar. “O poder familiar será exercido pelo pai e pela mãe, não sendo mais o caso de se utilizar, em hipótese alguma, a expressão pátrio poder, totalmente superada pela despatriarcalização do Direito de Família”[3], isto é, houve a perda do domínio exercido pela figura paterna em tempos pretéritos.
Entrementes, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil[4], denota-se que tais ranços foram extirpados da sociedade, sendo conferido uma situação de igualdade entre os genitores, no que concerne ao poder exercido atinente aos filhos e os bens destes. “Se porventura, houver divergência entre eles, qualquer deles poderá recorrer ao juiz a solução necessária, resguardando o interesse da prole”[5]. O poder em apreço é conferido, de maneira simultânea e igualitária, a ambos os genitores, e, apenas de maneira excepcional, a um deles, na falta do outro, que será exercido com foco no interesse, proveito e proteção dos filhos menores, o qual decorre de uma necessidade natural. Tal fato se dá, gize-se, em razão de todo ser humano, durante sua infância, precisar de alguém que a ele dedique criação, educação, amparo, defesa, guarda e cuide de seus interesses, regendo, desta forma, sua pessoa e seu acervo patrimonial. Ademais, com o intento de evitar o jugo paterno-materno, o Ente Estatal tem, de maneira robusta, intervindo, colocando o exercício do poder familiar sob sua fiscalização e limite, restringindo tal poder no tempo. Trata-se, com efeito, da colocação de rotundos pontos limítrofes ao uso do poder familiar e, por consequências, a gama de direitos dos genitores.
À luz do expendido, é verificável que o poder familiar apresenta como aspecto característico o fato de constituir um múnus público, id est, uma espécie de função correspondente a um cargo de natureza privada, sendo o instituto em destaque um direito-função e um poder-dever, o qual figuraria em uma posição intermediária entre o poder e o direito subjetivo. Tal aspecto s apresenta de maneira proeminente uma vez que interessa ao Estado, de maneira robusta, a manutenção da ordem social e do desenvolvimento sadio de todos os cidadãos. Logo, para que os requisitos supramencionados sejam alcançados, é imprescindível uma infância e adolescência sadia. Trata-se, desta sorte, de um encargo imposto pelo Estado aos genitores, com o escopo destes zelarem pelo futuro de seus filhos. Neste sentido, colhe-se, oportunamente, o entendimento jurisprudencial que acena:
“Ementa: Apelação Cível. Ação de Alimentos. Obrigação Avoenga. Caráter subsidiário ou complementar, porquanto aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos, decorrente do poder familiar (arts. 1.566, IV e 1.698 do Código Civil). Para a fixação de alimentos deve-se observar o binômio alimentar de forma a atender as necessidades do alimentando sem onerar em demasia o alimentante (art. 1694, § 1º, CC). Apelação Cível desprovida”. (Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – Sétima Câmara Cível/ Apelação Cível Nº. 70048091979/ Relator Desembargador Jorge Luís Dall'Agnol/ Julgado em 27.06.2012)
Outrossim, o poder familiar é irrenunciável, não sendo, portanto, facultado aos genitores abrirem mão dele. Outro caractere digno de nota cinge ao fato de ser o poder familiar irrenunciável ou indisponível, uma vez que o Ordenamento Pátrio veda a transferência pelos pais a outrem, a título gratuito ou oneroso, excetuando, tão somente, a hipótese de delegação, que é permitida pelo arcabouço legal. A situação excepcional em comento se alicerça na necessidade dos pais ou dos responsáveis de prevenir a situação irregular do menor. O poder família é imprescritível, uma vez que dele não decaem os genitores pelo simples fato de deixarem de exercê-lo, sendo que a sua perda só se dará em razão de uma das hipóteses previstas na legislação. Igualmente, o instituto em comento é incompatível com a tutela, não sendo, deste modo, possível a nomeação de um tutor a menor, cujo pai ou a mãe foi suspenso ou destituído do exercício do poder familiar. Por derradeiro, é conservado, ainda, um aspecto de relação de autoridade, uma vez que há o vínculo de subordinação entre os genitores e os filhos, pois os pais têm o poder de mando, ao passo que a prole tem o dever de obediência.
2 Abrangência do Poder Familiar
Ao se esmiuçar a abrangência do poder familiar, há que se ter mente, por necessário, a hipótese erigida como padrão pelo Ordenamento Pátrio, consistente no núcleo familiar em que o pai e a mãe estão vivos e unidos, em decorrência de matrimônio ou pela união estável, sendo ambos plenamente capazes para o exercício do encargo. Em tal hipótese, o poder familiar é exercido de maneira simultânea, por ambos os cônjuges ou companheiros, sendo que, em havendo divergência entre eles, qualquer um dos interessados possui o direito de recorrer ao magistrado, com o escopo de alcançar uma solução para o impasse, com o escopo de evitar uma decisão inexorável. Nesta senda, inclusive, expressamente ressoar o parágrafo único do artigo 1.631 do Código Civil: “Art. 1.631. [omissis] Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo”[6].
2.1 Família Matrimonial
Diversas são as situações que se afastam do modelo padrão erigido pela Codificação Civil em vigor. Em se tratando de família matrimonial, por exemplo, observa-se a ocorrência de três hipóteses distintas. A primeira hipótese tem assento na situação em que os cônjuges se encontram casados e o poder familiar só será exercido por um deles quando o outro estiver com o poder suspenso ou destituído do múnus público. De igual forma, o poder familiar só será exercido por um dos cônjuge se o outro não puder fazê-lo por motivo de força maior para manifestar sua vontade, como, por exemplo, é o caso da superveniência de incapacidade mental.
A segunda, por seu turno, compreende a situação em que os cônjuges estão divorciados ou separados de fato. Há que se assinalar, em um primeiro momento, que o divórcio não tem o condão de provocar qualquer alteração nas relações entre pais e filhos, exceto o direito assegurado aos primeiros de terem os segundos em sua companhia. Nesta situação, “o exercício do poder familiar pode ser alterado pela atribuição do direito de guarda a um deles, ficando o outro com o de visitar a prole”[7]. Ora, os ex-cônjuges permanecem como titulares do poder, todavia, em decorrência da fixação da guarda dos filhos apenas com um dos genitores, há um deslocamento do exercício do poder familiar, já que o guardião precisa exercê-lo, o que não significa que o outro genitor deixa de ser seu titular conjunto, podendo, inclusive, vindicar em Juízo que haja a modificação da guarda da prole.
Quadra assinalar, com destaque, que óbice não subsiste para que o magistrado defira a guarda compartilhada, hipótese em que o exercício do poder familiar incumbirá ao casal parental, uma vez que deixou de existir o casal conjugal. Ao lado disso, se, porventura, a guarda dos filhos for, por meio de decisão judicial, confiada à pessoa idônea da família de qualquer um dos cônjuges, o encargo em comento continuará a ser exercido pelos genitores, subsistindo a possibilidade de manejar recurso judicial, com o escopo de atacar o ato decisório vergastado.
A terceira hipótese faz menção ao vinculo conjugal dissolvido pela morte de um dos cônjuges, evento em que o poder familiar passará a ser exercido pelo consorte supérstite. Destarte, se um dos genitores vier a óbito, o sobrevivente assumirá sozinho o poder familiar e o conservará, mesmo que venha a contrair novas núpcias ou formar união estável, exercendo-o sem qualquer interferência do novo cônjuge ou convivente, como bem preceitua o parágrafo único do artigo 1.636 do Código Civil: “Art. 1.636. [omissis] Parágrafo único. Igual preceito ao estabelecido neste artigo aplica-se ao pai ou à mãe solteiros que casarem ou estabelecerem união estável”[8]. Conferindo uma interpretação extensiva aos cânons albergados no dispositivo legal ora mencionado, infere-se o pai ou mãe solteiros que contraírem matrimônio ou passarem a conviver sob o regime de união estável, os quais passarão a exercer o poder familiar sobre seus filhos menores, sem que ocorra qualquer intervenção do consorte ou companheiro sobre a educação, representação ou assistência àqueles filhos.
Por derradeiro, insta frisar que tais hipóteses podem ser plenamente empregadas quando ocorrerem na família constituída sob o regime da união estável, em caso de morte de um dos companheiros, de perda ou suspensão do poder familiar por um deles ou em razão da ruptura da convivência. Por analogia, obviamente, lançar-se-ão mão das mesmas soluções ofertadas para a família matrimonial.
2.2 Família Não-Matrimonial
Ao se examinar a família não-matrimonial, denota-se que duas hipóteses podem se apresentar, no que tange à abrangência do poder familiar. A primeira delas centra-se na possibilidade ser reconhecido pelos genitores, simultânea ou sucessivamente, determinando, desta maneira, o parentesco, ficando sujeito ao poder familiar de um deles, se não viverem em união estável, tendo o outro o direito de visitação, exceto se o juiz decidir de modo diverso. A segunda hipótese, por sua vez, faz menção ao filho reconhecido apenas por um dos genitores, logo, tão somente aquele que o reconheceu poderá exercer o poder familiar. “Encerrando as regras gerais quanto ao poder familiar, enuncia o art. 1.633 do CC que o filho, não reconhecido pelo pai, fica sob poder familiar exclusivo da mãe”[9]. Em sendo a genitora desconhecida ou incapaz, em razão de processo de interdição ou, ainda, destituída ou suspendida do exercício do poder familiar, será dado tutor ao menor.
2.3 Família Civil ou Socioafetiva
Em se tratando de núcleo familiar civil ou socioafetivo, há duas hipóteses que merecem análise. A primeira junge-se ao fato do filho adotivo ser adotado por ambos os genitores, logo, em razão de sua equiparação ao filho matrimonial, competirá a ambos os genitores o exercício do poder familiar. Todavia, em sendo o infante adotado por tão somente um dos genitores, somente o adotante poderá sobre ele exercer o poder familiar, não se estendendo tal encargo ao outro.
3 Conteúdo do Poder Familiar
O instituto do poder familiar compreende uma gama de normas concernentes aos direitos e deveres dos genitores em relação à pessoa e ao acervo patrimonial dos filhos menores, ainda não emancipados.
3.1 Conteúdo do Poder Familiar quanto à pessoa dos filhos menores
3.1.1 Dirigir-lhes a criação e educação (art. 1.634, I, do Código Civil)
Em uma primeira plana, infere-se que compete aos genitores dirigirem a criação e a educação dos filhos, sendo, inclusive, tal dever expressamente acinzelado na redação do artigo 229 da Constituição Federal[10] e no inciso I do artigo 1.634 do Código Civil[11]. Ao lado disso, cuida assinalar que os genitores deverão prover os meios materiais para a subsistência de sua prole e instrução em consonância com seus recursos e posição social, orientando-a para a vida, tornando-a útil à sociedade, salvaguardando todos os direitos fundamentais intrínsecos à pessoa humana. Nesta senda, como obtempera Diniz, “cabe-lhes ainda dirigir espiritual e moralmente os filhos, formando seu espírito e caráter, aconselhando-os e dando-lhes uma formação religiosa”[12].
Outrossim, incumbe, também, aos genitores capacitar os filhos física, espiritual, moral, social e intelectualmente em condições de liberdade e dignidade. O arcabouço jurídico em vigor, em altos alaridos, pondera que cumpre aos genitores dirigir a criação e educação da prole, atentando-se para os direitos de personalidade, assegurando sua dignidade enquanto seres humanos em desenvolvimento físico e psíquico. Nesta trilha, insta anotar que se quedou o Ordenamento Pátrio no que tange ao modo como os filhos devem ser criados, assim como os encargos parentais devem ser executados. Gize-se que tal decorre do preceito que a vida íntima da família evolui por si mesma, bem assim a disciplina do núcleo familiar é orientado pelo bom senso, pelos laços afetivos que atrelam seus membros, pela convivência familiar e pela conveniência das decisões adotadas.
Ademais, podem os genitores empregar, de modo moderado, o direito de correção, como sanção do dever educacional, eis que o poder familiar não poderia ser exercido, de modo efetivo, se os pais fossem tolhidos da possibilidade de castigar sua prole, com o escopo de corrigi-los. Entrementes, com bastante realce, há que se esclarecer que, conquanto os pais gozem de legitimidade para castigar seus filhos, no exercício de seu poder disciplinar, não estão autorizados a empregar os castigos de maneira imoderada e destemperada. Desta sorte, os pais que abusarem dos meios corretivos poderão ser destituídos do poder familiar, além de incorrerem em responsabilidade pena, como assinala o artigo 1.638, inciso I, do Código Civil[13]. Colaciona-se, por oportuno, o entendimento jurisprudencial que se amolda às ponderações aventadas até o momento:
“Ementa: Apelação Cível. Destituição do Poder Familiar. Cinco Filhos. Condenação do companheiro da genitora por atentado violento ao pudor em relação a uma das filhas da recorrente. Maus-Tratos. Castigos Imoderados. Situação de Negligência. Art. 22 do ECA. Hipótese em que se justifica a destituição da genitora do poder familiar, porquanto demonstrado comportamento complacente dela para com a conduta do companheiro, que abusou sexualmente de uma de suas filhas por reiteradas vezes, o que, inclusive, resultou na condenação dele na esfera penal à reclusão por mais de 10 anos. Filhos que escolheram morar, por certo tempo, com o pai, em virtude dos castigos imoderados a que eram submetidos. Incidência do art. 1.638, I ao IV, do CC. Apelação Desprovida.” (Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – Oitava Câmara Cível/ Apelação Cível Nº. 70048483457/ Relator Desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl/ Julgado em 14.06.2012)
Nesse diapasão, caso os pais não cumpram o dever legal e moral de criar e educar sua prole, poderão perder o poder familiar, além de sofrerem as sanções penais contidas no artigo 244 e 246 do Código Penal, em razão da prática do crime material e intelectual de menores[14]. Igualmente, arcarão com a responsabilidade civil pelo dano moral causado aos filhos, referente aos seus direitos da personalidade que restaram aviltados. Neste sentido, inclusive, colhe-se o entendimento jurisprudencial que se coaduna com o expendido:
“Ementa: Agravo de Instrumento. Destituição de Poder Familiar. Menor de tenra idade. Guardiã viciada em crack. Avós maternos alcoolistas. Criança em estado de abandono. Deferimento da liminar. Genitora da menor vítima de negligência, de apenas 16 anos de idade, usuária de crack e filha de pais alcoolistas, apresentando conduta inadequada para criar e educar a filha. Núcleo familiar que apresenta vulnerabilidade em sua estrutura para a criação dos filhos. Prova demonstrando o cabimento da liminar de suspensão do poder familiar, colocando a menor em família substituta, medida já efetivada segundo notícia dos autos. Negaram Provimento ao Agravo de Instrumento”. (Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – Sétima Câmara Cível/ Agravo de Instrumento Nº. 70034657635/ Relator Desembargador André Luiz Planella Villarinho/ Julgado em 12.05.2010)
3.1.2 Tê-los em sua companhia e guarda (art. 1.634, II, do Código Civil)
Compete, outrossim, aos genitores ter a prole sob sua companhia e guarda, como, em altos alaridos, verbaliza o inciso II do artigo 1.634 do Código Civil vigente[15]. Ao lado disso, cuida anotar que o direito de guarda se apresenta, de maneira concomitante, como poder-dever daqueles que são titulares do poder familiar. “Dever porque aos pais, a quem cabe criar, incumbe guardar. Constitui um direito, ou melhor, um poder porque os pais podem reter os filhos no lar, conservando-os junto a si”[16]. Igualmente, incumbe aos pais regerem o comportamento dos infantes em relações com terceiros, podendo proibir a convivência com certas pessoas ou ainda a sua frequência a determinados locais, uma vez que julgam inconveniente aos interesses da prole. Em conferindo a guarda de seus filhos a pessoas que sabem que os prejudicarão, material ou moralmente, os genitores perpetrarão a conduta delituosa insculpida no artigo 245 do Código Penal Brasileiro.
Plus ultra, o direito de guarda dos genitores abrange também o de vigilância, o que substancializa o poder de dirigir a formação moral da prole, porquanto os pais são civilmente responsáveis pelos atos dos filhos menores que se encontram sob sua companhia e guarda. Neste alamiré, as ingerências dos genitores podem incidir, inclusive, na proibição ou liberação da leitura de determinado material, uma vez que os filhos se encontram em uma fase formação, zelando para o aprimoramento do desenvolvimento da prole.
No mais, como os genitores possuem o direito de ter a prole em sua companhia, com eles vivendo, são responsáveis por fixar o domicílio dos filhos. Em estando os genitores separados de fato, os direitos de ter os filhos em sua companhia e guarda compete ao pai e à mãe. De igual modo, se a prole for confiada à mãe, inexiste ofensa ao poder familiar, eis que o direito de guarda é da natureza do instituto em comento e não de sua essência, podendo até mesmo ser confiado a outrem.
3.1.3 Conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casar (art. 1.634, III, do Código Civil)
Os genitores, como bem preceitua o inciso III do artigo 1.634 do Código Civil[17], poderão conceder ou negar o consentimento para que o filho contraía casamento. Nesta última hipótese, o magistrado poderá, após detida análise da situação concreta, suprir o consentimento, concedendo, por consequência, autorização para que o filho possa contrair matrimônio, desde que a negativa se funde em motivo considerado como injusto, como bem espanca o artigo 1.519 do Estatuto de 2002: “Art. 1.519. A denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz”[18]. Doutro modo, se o motivo apresentado pelo genitores para negar o consentimento para contrair casamento se apresentar como rotundo, o juiz não suprirá.
3.1.4 Nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais lhe não sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercitar o poder familiar (art. 1.634, IV, do Código Civil)
Em uma primeira plana, fato a ser destacado é que ninguém melhor do que o genitor para promover a escolha da pessoa a quem confiará a tutela de seus filhos menores, motivo pelo qual o inciso IV do artigo 1.634 do Código Civil alberga tal situação como um dos direitos inerentes ao exercício do poder familiar. “Trata-se da tutela testamentária cabível, ante o fato de que a um consorte não é lícito privar o outro do poder familiar, apenas quando o outro cônjuge já tiver falecido ou for incapaz de exercer o poder”[19], quer seja parental, quer seja maternal. Cumpre assinalar que se o genitor dispuser cláusula que ambicione privar o genitor sobrevivo do exercício do poder familiar de maneira infunda, nula será a cláusula, porquanto a situação autorizadora não restará devidamente preenchida.
3.1.5 Representá-los, até aos 16 anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento (art. 1.634, V, do Código Civil)
Computa-se dentre os deveres dos genitores representar os filhos menores de 16 (dezesseis) anos e assistir àqueles que possuírem idade superior àquela e inferior a 18 (dezoito) anos, nos atos da vida civil. Tal fato se dá porque os primeiros são considerados, pelo Ordenamento vigente, como absolutamente incapazes para os atos da vida civil, logo, não detêm capacidade para exprimir, legalmente, sua vontade. Já os segundos, por sua vez, são considerados relativamente capazes, logo, para exprimir suas vontades carecem da assistência de seus genitores. Em ambos os casos, gize-se, o exercício do poder familiar pelos genitores deve ambicionar a promoção do melhor interesse dos filhos menores não emancipados.
3.1.6 Reclamá-los de quem ilegalmente os detenha (art. 1.634, VI, do Código Civil)
Lançando mão da ação de busca e apreensão, os genitores poderão reclamar sua prole de quem ilegalmente a detenha, como obtempera, com clareza solar, o inciso VI do artigo 1.634 do Código Civil[20]. Ao receber o pedido de busca e apreensão, o magistrado buscará examinar as informações contidas no apostilado processual, assim como se há elementos que apontem para a ilegalidade da detenção do menor feita pela parte ex adversa. Há que se anotar que a busca e apreensão de menor é medida drástica que só deve ser adotada em situação extrema, quando restar devidamente demonstrada a situação de risco a que o menor se encontrar submetido.
Entrementes, há que se salientar que, segundo entendimentos jurisprudenciais, já houve o indeferimento do pedido de busca e apreensão quando não foi verificada qualquer situação de risco ou negligência dos menores que se encontravam sob a guarda paterna ou materna. Deste modo, em sendo a situação em que os filhos menores se encontram sob a guarda de apenas um dos genitores, a busca e apreensão só será deferida se houver acervo documental nos autos que demonstre a situação de risco, porquanto o genitor que é guardião e o outro são detentores do poder familiar, já que em tal hipótese a detenção não é ilegal, todavia, pode ofertar risco para os menores.
3.1.7 Exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição (art. 1.634, VII, do Código Civil)
O Estatuto de 2002 elenca que os filhos menores não emancipados deverão não apenas respeitar e obedecer aos genitores, mas também prestar-lhes serviços compatíveis com sua situação, participando, deste modo, da mantença do núcleo familiar, preparando-se para as dificuldades próprias da vida adulta. “A fim de proteger o menor, a lei proíbe que trabalhe fora do lar até os 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos […] e à noite até os 18 anos”[21]. O adolescente, com idade superior a 14 (quatorze) anos, a fim de que possa trabalhar, cursará estabelecimento educacional, percebendo, para tanto, a bolsa de aprendizagem.
Nesse diapasão, ainda, será proibido ao menor aprendiz o trabalho noturno, compreendido como aquele exercido entre as vinte e duas horas de um dias e as cinco horas da manhã do dia seguinte, bem assim o tido como perigoso, insalubre ou penoso e o praticado em local que lhe seja tido como prejudicial ou que embarace a frequência escolar. Igualmente, é possível exigir do menor a execução de pequenas tarefas domésticas ou remuneradas, desde que haja a observância das restrições acinzeladas na legislação trabalhista, como também não coloque em risco o desenvolvimento físico, moral, psíquico e educacional do menor.
3.2 Conteúdo do Poder Familiar quanto ao patrimônio dos filhos menores
3.2.1 Administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade ou não emancipados (art. 1.689, II, do Código Civil)
Trata-se da prática de atos idôneos à conservação e incremento desse acervo patrimonial, sendo permitido aos genitores à celebração de contratos, como, por exemplo, o de locação de imóveis, efetuar o adimplemento de imposto, promover a defesa judicial, perceber juros ou quaisquer rendimentos, adquirir bens e promover sua alienação, se móveis. Todavia, é defeso é aos genitores dispor dos bens imóveis pertencentes à prole, como também contrair obrigações que ultrapassem os pontos limítrofes da simples administração, eis que tais atos implicam em minoração do patrimônio.
Caso os genitores logrem êxito em demonstrar a necessidade, a vantagem econômica ou ainda a evidente utilidade da prole, será permitida a venda, hipoteca ou gravamento de ônus real dos bens imóveis, sendo carecida, porém, a prévia autorização do juiz competente, sem a necessidade de hasta pública, conquanto possa o magistrado determinar, caso desconfie da simulação de preço. Os genitores não responderão pela administração dos bens do filho, exceto se atuarem com culpa, não estando, via de regra, a prestarem caução nem a apresentação de contas, contudo, só poderão reter quantias de dinheiro que pertençam à prole se houverem assegurado a gestão com hipoteca legal. Os genitores poderão promover o levantamento de numerários depositados em cadernetas de poupança com o escopo de atender os gastos relativos à instrução, alimentação ou outra necessidade do menor.
Insta arrazoar que os genitores, pela administração do acervo patrimonial dos filhos, não receberão qualquer remuneração, eis que estão exercendo o poder familiar, o encargo a eles atribuído pelo Estado. Entrementes, em havendo colisão entre os interesses dos pais com o do filho, a pleito deste ou do representante do Órgão do Ministério Público, o juiz lhe dará curador especial, com o escopo de fiscalizar a solução do conflito de interesses, zelando pelo menor. Trata-se, com efeito, de medida que possui caráter preventivo, cujo fundamento maciço é o justo receio de que os genitores, cujos interesses conflituam com o do filho, tenha o condão de causar-lhe dano, uma vez que são suspeitos para tomarem qualquer decisão sobre negócios atinentes à prole.
Ocorrendo a infração das normas ditas alhures, será oponível a nulidade dos atos dela resultante: a) o filho, após alcançar a maioridade ou for emancipado; b) os herdeiros e o representante legal da prole, se ainda durante a menoridade cessar o poder familiar, id est, se ocorrer o falecimento do menor ou sucessão da mãe ou do pai na sua representação.
3.2.2 Usufruto sobre os bens dos filhos menores que se acham sob o seu poder (art. 1.689, I, do Código Civil)
Inicialmente, há que se frisar que o usufruto é inerente ao exercício do poder familiar, ocorrendo sua cessação com a inibição do poder paternal ou maternal, maioridade, emancipação ou morte do filho. Ao lado disso, quadra salientar que o usufruto paterno ou materno é proveniente de imposição legal, carecendo de registro se incidir sobre bem imóvel, dando corpo a um direito irrenunciável. Como assinala o artigo 1.400 do Código Civil, os pais usufrutuários do acervo patrimonial dos filhos menores não são obrigados a prestar caução, porquanto os filhos dificilmente o reclamarão.
É permitido aos genitores reterem as rendas advindas dos bens do filho menor sem que tenha que prestar contas, podendo, inclusive, consumi-las legalmente, uma vez que o arcabouço normativo autoriza-os a fazê-lo. Trata-se, com destaque, de uma espécie de compensação dos encargos provenientes da criação e da educação da prole, conquanto possam, ainda que eventualmente, ser obrigados a prestar contas dos rendimentos dos bens sujeitados ao usufruto. O usufruto legal recai sobre todo o acervo patrimonial do filho, exceto: a) nos bens deixados ou doados ao filho com exclusão do usufruto paterno, uma vez que, nesta hipótese, o doador ambiciona que as rendas desses bens sejam somadas ao patrimônio do donatário; b) nos bens deixados ao filho com fim certo e determinado.
Ademais, é fato que o direito de usufruto, via de regra, encontra-se atrelado ao de administração, uma vez que o genitor que é detentor do poder familiar percebe os frutos decorrentes do patrimônio administrado, conquanto seja possível existir um sem o outro. Ao lado disso, prima evidenciar que é plenamente possível a administração sem o usufruto e vis a vis, situação em que assiste apenas uma pretensão da entrega dos frutos em relação ao administrador. Por derradeiro, há o acervo patrimonial que é excluído tanto do usufruto como da administração paternal ou maternal, competindo a sua gerência a um curador especial, nomeado pelo magistrado, a saber: a) os bens adquiridos pelo filho havido fora do matrimônio, antes que se operasse o reconhecimento, com o escopo de evitar que o pai ou a mãe o reconheça tão apenas com o objetivo de se beneficiar com a administração e usufruto de seus bens; b) os numerários auferidos pelo filho com idade superior a 16 (dezesseis) anos, no exercício da atividade profissional e o acervo patrimonial adquirido com tal recurso; c) os deixados ou doados ao filho com a expressa condição de não serem usufruídos ou administrados pelos genitores; e, d) os bens que ao filho couberem na herança, quando os genitores forem excluídos da sucessão, “pois se o indigno, ou o deserdado, pudesse administrar ou usufruir os bens havidos por seu filho, em sucessão de que foi excluído, a pena a ele imposta não teria sentido, perderia sua eficácia parcialmente”[22].
4 Suspensão do Poder Familiar
Ab initio, em sendo o poder familiar um encargo público que deve ser executado com o objetivo de se promover o interesse dos filhos menores não emancipados, o Ente Estatal exerce sobre ele controle, hasteando normas que enumeram os casos que autorizam o magistrado a privar o genitor do exercício, temporariamente, do poder familiar, uma vez que prejudica a prole com seu comportamento, hipótese em que a suspensão do poder familiar se assenta, sendo, no curso da ação, nomeado curador especial ao menor. Ao lado disso, cuida anotar que, na suspensão, o genitor é privado do exercício do poder familiar, por um lapso temporal determinado, de todos os seus atributos ou apenas de parte deles, referindo-se tanto à prole toda como somente a um dos filhos. Nesta trilha, desaparecendo a causa ensejadora da suspensão, poderá o genitor retornar ao exercício do poder familiar.
A suspensão do poder familiar substancializa uma sanção que ambiciona salvaguardar os interesses dos menores, afastando-os da má influência do genitor que viola o dever de exercer o poder familiar conforme a lei. Plus ultra, as causas determinantes da suspensão do poder familiar estão entalhadas, de maneira genérica, na redação do artigo 1.637 do Código Civil, a saber: abuso do poder pelo pai ou pela mãe; falta aos deveres paternos; e, dilapidação dos bens do filho. O juiz, a requerimento de algum parente ou do representante do Ministério Público, pode adotar a medida que lhe pareça mais conveniente à segurança do filho e seus haveres, suspendendo, até quando subsistir a causa ensejadora, o poder familiar. Igualmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente[23] arrazoa que poderá o magistrado suspender o poder familiar do pai ou da mãe que der causa à situação irregular do filho. Da mesma forma, será passível de suspensão do poder familiar o pai ou a mãe que sofrer condenação por sentença irrecorrível por ter cometido conduta delituosa cuja pena exceda a dois anos de prisão, podendo a prisão ser tanto fixada na forma de detenção quanto de reclusão.
Além disso, o Estatuto de Ritos Civis, em seu artigo 888, inciso V, estipula que poderá ser empregada a medida cautelar de depósito, por determinação ou autorização judicial, de menores ou incapazes que tenham sido, de maneira imoderada, castigados por seus genitores, tutores ou curadores, ou ainda por eles induzidos à perpetração de atos contrários ao ordenamento pátrio e à moral. “O juiz, para evitar o prosseguimento de uma situação deplorável, poderá ordenar, como medida provisória, a remoção do menor da da guarda dos pais, até a decisão final”[24]. Se a pena de suspensão do poder familiar for imposta ao genitor, a mãe assumirá o exercício do poder familiar; se já tiver falecido ou for incapaz, o juiz nomeará um tutor ao menor ou ainda o incluirá em programa de colocação familiar. No mais, a suspensão do poder familiar acarreta ao pai a perda de alguns direitos em relação ao filho, entrementes não o isenta do dever de prestar alimentos.
5 Hipóteses de Destituição do Poder Familiar
A destituição do poder familiar se apresenta como uma sanção mais grave do que a suspensão, tendo seus efeitos provenientes de uma sentença sentença judicial, se o magistrado estiver convencido de que houve uma das causas de que justificam a aplicação do instituto em destaque, abrangendo, por ser medida imperativa, toda a prole e não apenas um único filho ou alguns filhos. A ação com este fito deverá ser intentada pelo outro cônjuge; por algum dos parentes do menor; pelo próprio menor, se púbere, pelo indivíduo a quem foi confiada a sua guarda ou ainda pelo Ministério Público. Em regra, a perda do poder familiar é permanente, conquanto, de maneira excepcional, o seu exercício possa ser restabelecido, desde que seja devidamente provada a regeneração do genitor ou ainda se desaparecida a causa ensejadora, mediante procedimento judicial de caráter contencioso.
Em altos alaridos, o artigo 1.638 do Código Civil dicciona as hipóteses em que o poder familiar será destituído. Ao lado disso, cuida ponderar que “a perda do poder familiar deve ter como base uma das hipóteses previstas no art. 1638 do Código Civil/2002, não sendo a incapacidade da recorrida fator suficiente para a destituição do instituto”[25]. A primeira delas se cinge a castigar imoderadamente o filho, uma vez que é permitido ao magistrado decretar a destituição do poder familiar do pai ou da mãe que infligir em sua prole maus-tratos, opressão ou castigos imoderados. Ao lado disso, a violência familiar acarreta também a responsabilidade civil por dano moral. Outra hipótese, deixar o filho em abandono material e/ou moral, privando-o da convivência em seu núcleo familiar e de condições consideradas como imprescindíveis para sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que de maneira eventual, em decorrência de falta, ação ou omissão.
Praticar atos contrários à moral e aos bons costumes também são consideradores como ensejadores da destituição do poder familiar, podendo, em razão disso, ser considerado como situação de risco o menor que se encontra em perigo moral, por encontrar-se, de maneira reiterada, em ambiente promíscuo, inadequado ou que seja contrário aos bons costumes. Dentre os muitos exemplos que são compreendidos por esta hipótese, pode-se enumerar a criança que vive em companhia da genitora prostituta ou do pai que se entrega à ociosidade, ao uso de substâncias entorpecentes ou ao tráfico de drogas. De igual modo, a Consolidação das Leis do Trabalho estipula que haverá a perda do poder familiar quando o genitor concorrer, por ação ou omissão, para que o menor trabalhe em locais ou serviços perigosos, insalubres ou prejudiciais à sua moralidade.
Por derradeiro, afigura-se como última hipótese que culmina com a destituição do poder familiar quando o genitor incidir, de maneira reiterada, no abuso de sua autoridade, na falta dos deveres paterno-maternos, na dilapidação dos bens da prole e na prática dos crimes punidos com mais de dois anos de prisão. “Tal medida, ante a sua gravidade, requer cautela e ponderação dos magistrados ao analisar a incidência reiterada dos atos omissivos ou comissivos previstos no art. 1.537”[26], só sendo possível sua aplicação quando for conveniente e em situações excepcionais, valorando-se, de modo rotundo, o superior interesse dos filhos. Cuida anotar que o rol contido no artigo 1.638 do Código Civil não é taxativo, podendo-se cogitar em outras situações que, em razão de sua gravidade, ensejam na destituição do poder familiar, em razão de serem vergonhosos ou reprováveis, sendo imperiosa a sua consideração no pedido de destituição do poder familiar, uma vez que demonstra a insuficiência da sanção da suspensão do poder familiar, a fim de corrigir o mau comportamento paterno ou materno em relação aos filhos.
6 Procedimento da Perda e da Suspensão do Poder Familiar
O procedimento para a perda ou suspensão do poder familiar tem início com a provocação do representante do Parquet ou de quem tenha legítimo interesse, competindo a apreciação desta ação ao Juízo da Infância e da Juventude. Cuida salientar que tal legitimidade para aforar do procedimento em testilha é matéria remansosa nas Cortes Tupiniquins. Para tanto, à fim de ilustrar a visão expendida, há que se trazer à colação, de maneira oportuna e pertinente, o entendimento jurisprudencial construído pelo Superior Tribunal de Justiça, no qual o procedimento deperda ou destituição do poder familiar “terá início por provocação do Ministério Público ou de pessoa dotada de legítimo interesse, que se caracteriza por uma estreita relação entre o interesse pessoal do sujeito ativo e o bem-estar da criança”[27].
A petição, além das regras gerais contidas no artigo 282 e seguintes do Código de Processo Civil, deverá conter as especificidades constantes no artigo 156, incisos I a IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente[28]. A parte requerida será citada pessoalmente, para que, no prazo de 10 (dez) dias, apresenta, caso queira, resposta, indicando as testemunhas e as demais provas que ambiciona produzir, como estabelece expressamente o artigo 158 do diploma legal supramencionado.
Em não tendo o requerido condições de constituir advogado, deverá requerer, em cartório, a nomeação de advogado dativo, que, então, apresentará defesa, contando-se o prazo a partir da data da intimação do despacho que deferiu o pedido de nomeação, em consonância com o expendido no artigo 159 do ECRIAD. “O magistrado, se for necessário, poderá requisitar, de ofício, a pedido das partes ou do Ministério Público, de qualquer repartição pública, a apresentação de documento que interessa à causa”[29]. Em sendo necessário e a fim de robustecer seu convencimento, o juiz poderá ordenar a realização de estudo social ou de perícia por equipe interprofissional, como bem entalha a redação do artigo 161 do Estatuto em comento:
“Art. 161. [omissis] §1o A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo social ou perícia por equipe interprofissional ou multidisciplinar, bem como a oitiva de testemunhas que comprovem a presença de uma das causas de suspensão ou destituição do poder familiar previstas nos arts. 1.637 e 1.638 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, ou no art. 24 desta lei”[30].
Com destaque, há que se assinalar que sendo os genitores provenientes de comunidade indígena, é ainda obrigatória a intervenção, junto à equipe profissional ou multidisciplinar, de representantes do órgão federal responsável pela política indigenista. “Se o pedido importar em modificação de guarda, será obrigatória, desde que possível e razoável, a oitiva da criança ou do adolescente, respeitado seu estágio de desenvolvimento”[31], bem como o grau de compreensão acerca das implicações da medida a ser estabelecida. Ao lado disso, cuida destacar que é obrigatória a oitiva dos genitores, quando estes forem identificados e se encontrarem em local certo.
Em apresentada a peça de defesa, será dada, pelo órgão judicante, vista do apostilado processual ao Ministério Púbico, pelo prazo de cinco dias, se este não figurar como autor da ação, designando, ao depois, audiência de instrução e julgamento. Com a presença das partes e o Parquet, será realizada a colheita dos depoimento das testemunhas e do parecer técnico, caso não tenha sido, previamente, apresentado por escrito, manifestando-se, sucessivamente, a parte autora, requerida e o Ministério Público pelo período de 20 (vinte) minutos, cada um, prorrogável por mais 10 (dez) minutos. A decisão poderá ser proferida em audiência, conquanto o magistrado possa, de maneira excepcional, designar data para a sua leitura dentro de cinco dias.
Em não sendo o pedido contestado, o juiz dará vista do caderno processual ao Ministério Público, pelo período de 05 (cinco) dias, se ele não foi a parte autora, prolatando decisão em igual período. Conforme estatui o Diploma de 1990, o prazo máximo para a conclusão do procedimento será de cento e vinte dias. Ao lado disso, cuida frisar que a sentença que decretar a perda ou a suspensão do poder familiar será à margem do registro de nascimento do menor devidamente averbada, ficando sujeita à apelação, que deverá ser recebida tão somente no efeito devolutivo, como acinzela a redação do artigo 199-B do Estatuto da Criança e do Adolescente[32].
7 Extinção do Poder Familiar
O artigo 1.635 do Código Civil em vigor apresenta as hipóteses em que o poder familiar se extinguirá. Dentre as hipóteses albergadas no rol do dispositivo legal supramencionado está morte dos pais ou do filho, uma vez que o falecimento de um deles não extingue o poder familiar, porquanto o outro o exercerá sozinho. O poder familiar só cessará quando ambos os genitores vierem a óbito, sendo os filhos menores não emancipados colocados sob tutela. A morte do filho, por sua vez, tem o condão de eliminar a relação jurídica, uma vez que não prospera a razão do poder familiar ser exercido.
Outra hipótese que acarreta a extinção do poder familiar, a emancipação do filho, isto é, a aquisição da capacidade civil antes da idade legal equipara a pessoa maior, deixando, por consequência, de se submeter ao poder familiar. Igualmente, a maioridade do filho tem o condão de causar a extinção do poder familiar, pois confere ao indivíduo a plenitude dos direitos civis, acarretando a cessação da dependência paterna, eis que subsiste a presunção de que o indivíduo, ao atingir 18 (dezoito) anos, não mais reclama proteção. A adoção, que extingue o poder familiar do pai ou mãe biológicos, sendo transferido ao adotante. Ora, há que se assinalar que vindo o genitor adotante a óbito, o poder familiar natural não será restaurado, nomeando-se, doutro modo, tutor ao menor. Por derradeiro, a decisão judicial decretando a perda do poder familiar pela materialização das hipóteses contidas no artigo 1.638 do Código Civil, que deverá ser devidamente averbada à margem do registro de nascimento do menor de idade não emancipado.
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
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