Adriane Cristine Cabral Magalhães[1]
Resumo: O presente trabalho tem por objetivo discorrer acerca do Princípio da Eficiência, tratando primeiramente de sua definição, sua aplicação no Direito brasileiro e por fim elencando as vantagens de sua aplicação em âmbito processual civil. O trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica, utilizando-se como fontes de pesquisas autores que tratam do tema, objetiva-se a utilização de referências e autores não somente brasileiros, pois o referido princípio não é exclusividade do Direito pátrio, sendo assim, nada mais justo que utilizar-se de literatura internacional. Ao final do trabalho tratar-se-á de uma análise acerca do discorrido exprimindo a opinião crítica da autora em defender a aplicação do Princípio da Eficiência no processo civil brasileiro.
Palavras-chave: Princípio da eficiência; Processo Civil; Direito Constitucional; Direito Civil.
Abstract: This paper aims to discuss the Principle of Efficiency, dealing first with its definition, its application in Brazilian law and finally listing the advantages of its application in civil procedural scope. The work is a bibliographic review, using as sources of research authors who deal with the theme, the aim is to use references and authors not only Brazilian, since the referred principle is not exclusive of the Brazilian law, therefore, nothing more fair than using international literature. At the end of the work, it will be an analysis about the discourse expressing the author’s critical opinion in defending the application of the Efficiency Principle in the Brazilian civil process.
Keywords: Principle of efficiency; Civil Procedure; Constitutional right; Civil right.
Sumário: Introdução. 1. Princípio da Eficiência. 1.1. Definição do Princípio da Eficiência. 1.2. Definição de Princípios. 1.3. Princípio da Eficiência no Direito Brasileiro. 2. Eficiência no Poder Judiciário. 2.1. Princípio da Eficiência no Exercício da Jurisdição. 2.2. Resultados Práticos da Utilização do Princípio da Eficiência em Âmbito Processual. Conclusão. Referências.
Introdução
Existe no Brasil uma cultura de que a busca de soluções de conflitos através do Poder Judiciário é por vezes uma situação a qual demandará muito tempo e recursos para que se possa obter uma resposta satisfatória à lide. Tal cultura, ou pensamento, se dá pelo fato de que por anos o Poder Judiciário trata os processos de forma morosa e onerosa, principalmente no que tange ao rito processual civil.
Existem processos judiciais que se arrastam por anos a fio no Judiciário e não tem seu objeto julgado em tempo hábil, fazendo com que o mesmo se esvaia. Exemplo disso é o processo movido pela Princesa Isabel e por descendentes da família real brasileira acerca da propriedade do Palácio Guanabara, processo este que se estendeu por 125 (cento e vinte e cinco) anos, conforme decisão do ARE 1250467 A GR / RJ.[2] Tal prazo para que um processo tenha toda a sua tramitação é demasiadamente grande!
Visando combater tal morosidade e poder chegar ao real objetivo do Poder Judiciário, o Princípio da Eficiência, foi incluído no texto constitucional através da emenda constitucional 19/1998 e posteriormente inclusa no ordenamento processual civil brasileiro.
Assim sendo, tratar-se-á primeiramente de definir o que é o Princípio da Eficiência, bem como discorrer sobre sua inclusão no ordenamento jurídico brasileiro.
1.1 Definição do Princípio da Eficiência
O Princípio da Eficiência primeiramente foi concebido para ser um dos princípios norteadores da administração pública, fazendo com que o administrador público ou servidor, leia-se agente público, atue de modo a prestar o serviço público de forma eficiente otimizando assim os resultados obtidos através da prestação do serviço público. Neste sentido tem-se as lições de Hely Lopes Meirelles o qual expõe de forma brilhante o que seria o Princípio da Eficiência:
O que se impõe a todo o agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento profissional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros. (Meirelles, 2002)
Neste mesmo sentida Di Pietro declara:
O princípio apresenta-se sob dois aspectos, podendo tanto ser considerado em relação à forma de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, para lograr os melhores resultados, como também em relação ao modo racional de se organizar, estruturar, disciplinar a administração pública, e também com o intuito de alcance de resultados na prestação do serviço público. (grifo nosso) (Di Pietro, 2002)
Percebe-se que tal princípio foi pensado justamente para otimizar a prestação de serviços por parte da Administração Pública, da qual o poder judiciário faz parte.
Entendido o que é o Princípio da Eficiência, devemos entender o motivo dos princípios ter tamanha importância em nosso ordenamento jurídico.
1.2 Definição de Princípios
O Jurista Alemão Josef Esser (1961) define princípios “como normas que estabelecem fundamentos para que determinado mandamento seja encontrado, enquanto, para ele, as regras determinam a própria decisão”.
Percebe-se que para Esser os princípios tratam-se de uma das fontes do Direito, servindo, muitas vezes, de embasamento para que determinado dispositivo legal possa vir a existir ou a ser positivado. Pois para ele muito embora os princípios existam no direito positivo, eles por si só não constituem regras jurídicas, mas servem de fundamentação e justificação para que as regras jurídicas venham a existir.
Em consonância com o exposto por Esser discorre Larenz (2001):
Os princípios jurídicos não têm o caráter de regras concebidas de forma muito gerais, às quais se pudessem subsumir situações de facto, igualmente de índole muito geral. Carecem antes, sem excepção, de ser concretizados. […] Os princípios podem entra em contradição entre si. A sua actuação pode ocorrer diferentemente daquilo que acontece com a aplicação das regras, numa medida maior ou menor. (grifo nosso)
Para Robert Alexy (2002) “um princípio determina que algo seja realizado nas máximas medidas possíveis, levando em conta as possibilidades fáticas e jurídicas”, ou seja, não se trata de uma regra que deve ser cumprida a todo e qualquer custo, mas sim um norteador que na medida do possível deve ser alcançado.
Reforçando tal exegese tem-se o afirmado por Humberto Ávila (2015), na obra Teoria dos Princípios, o qual explica que:
Nessa perspectiva, afirma-se que os princípios possuem força normativa prima facie, no sentido de irradiarem uma força provisória, dissipável em razão de princípios contrários. (…) Os princípios são, portanto, normas que atribuem fundamento a outras normas, por indicarem fins a serem promovidos, sem, no entanto, promoverem meios para sua realização.
José Joaquim Gomes Canotilho (1997, p. 1124) esclarece que os princípios, “por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras”, enquanto que as regras “são suscetíveis de aplicação direta”.
Dworkin (2002) chama de princípio aquele standard que deve ser observado, não por ter em vista uma finalidade econômica, política, ou social, que se possa considerar favorável, mas porque seja uma exigência de justiça, ou equidade, ou alguma outra dimensão de moralidade.
Percebe-se que os autores convergem ao afirmarem que os princípios são fontes do Direito, mas não são o Direito positivado em si, ou seja, os princípios podem servir de motivação para o nascimento de novas legislações e modernizações nos ordenamentos jurídicos já existentes, tamanha é a sua importância.
Pode-se afirmar com convicção que os princípios são as origens de inúmeras normas jurídicas que regem o comportamento social!
Entendido a definição do Princípio da Eficiência, bem como qual a função dos princípios dentro de um ordenamento jurídico, faz-se necessário entender o surgimento de tal princípio na legislação constitucional e infraconstitucional brasileira.
1.3 Princípio da Eficiência no Direito Brasileiro
Oficialmente o Princípio da Eficiência foi incluído no ordenamento jurídico brasileiro a partir da Emenda Constitucional (EC) 19/1998, a qual alterou a redação do caput do artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988 (CF/88) tornando o Princípio da Eficiência como sendo fundamental à administração pública, vejamos como ficou a redação do referido artigo após esta alteração:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (grifo nosso) (BRASIL, 1988)
Apesar de somente figurar de forma explicita no Direito brasileiro a partir da EC 19/1998 o princípio da eficiência era vislumbrado no ordenamento jurídico brasileiro, cita-se como exemplo de tal o Decreto-lei nº 200, de 25/02/1967 que estabelecera diretrizes para reforma da Administração Pública federal. O princípio também já era aplicado pela jurisprudência antes da sua inserção no texto constitucional. (CAMPOS, 2017)
Alguns autores já identificavam tal princípio mediante a interpretação de outros dispositivos constitucionais, como o §7º do artigo 144, que determina o disciplinamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades; a exigência presente no artigo 175, de que consta a obrigação de prestar serviço adequado; o artigo 70, que versa sobre a autorização constitucional dada ao Tribunal de Contas para avaliar a “legitimidade e economicidade” da atuação administrativa em geral.
Pode-se dizer que com a incorporação deste princípio no Direito Administrativo o modelo administrativo brasileiro deixou de ser burocrático e passou a ser um modelo gerencial o qual trouxe inúmeros avanços tanto em sentido social, quanto na governança e na economia.
O cidadão é valorizado no modelo gerencial como destinatário final de serviços que devem ser prestados com qualidade.
É possível afirmar que a eficiência que se demanda do Poder Público perpassa pelo dever de resultado satisfatório, e está intimamente ligada à presteza do administrador, ao seu rendimento funcional e à responsabilidade no cumprimento de deveres atribuídos aos agentes públicos; a eficiência na Administração Pública opõe-se à ideia de lentidão, descaso, negligência e omissão.
Edilson Nobre Jr. (2006) explica que o princípio da eficiência corresponde ao dever administrativo de melhor atender à consecução dos fins, de interesse público, a que está vinculada a Administração, utilizando-se do menor custo. Importante ressaltar que para a doutrina brasileira a eficiência não é apenas um valor ou princípio o qual, na medida do possível, deve ser buscado, mas sim uma norma jurídica que impõe deveres ao administrador público. (CAMPOS, 2017)
Com isto em mente ver-se-á o Princípio da Eficiência no âmbito do Poder Judiciário.
Neste ponto do estudo deve-se compreender que o Poder Judiciário possui sua própria administração a qual também deve ser regida pelo Princípio da Eficiência, pois a prestação do serviço jurisdicional prestado pelo Poder Judiciário deve ser encarada como serviço público, tanto é assim que Hely Lopes Meirelles (2004) define como administração pública como sendo “o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado”. O Mestre segue ainda definindo sobre o que seria a administração pública, como se observa a seguir:
Numa visão global, a administração é, pois, todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas. (grifo nosso) (MEIRELLES, 2004)
Pelo fato de a prestação do “serviço” jurisdicional possuir um sistema aparelhado promovido pelo Estado para que hajam soluções de demandas e conflitos que possuem potencial de afetar toda a sociedade, ela tem caráter de serviço público, podendo ser aplicado o Princípio da Eficiência.
Carvalho Filho (2008) traz consigo uma importante consideração acerca do Princípio da Eficiência, vejamos:
A eficiência não se confunde com eficácia nem com efetividade. A eficiência transmite sentido relacionado ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade administrativa; a idéia diz respeito, portanto, à conduta dos agentes. (…) eficácia tem relação com os meios e instrumentos. (…) efetividade é voltada para resultados.
Percebe-se que a eficiência tem caráter dinâmico, neste sentido dispõe MARINELA (2011):
Consiste na busca de resultados práticos de produtividade, de economicidade, com conseqüente redução de desperdícios do dinheiro público e rendimentos típicos da iniciativa privada, sendo que, nessa situação, o lucro é do povo.
O termo eficiência carrega consigo, ainda, as ideias de otimização de resultados, eliminação dos desperdícios, realização das finalidades com mais e melhores resultados reduzindo os custos e em menor tempo. Exige-se do gestor presteza, competência, rendimento e, principalmente, resultados. Ademais, apesar de a eficiência de determinado processo representar algo que só pode ser medido posteriormente, é possível fixar parâmetros de eficiência que podem guiar os gestores para melhorar a qualidade do processo e incrementar a sua produtividade.
Pode-se concluir que os serviços prestados pelo poder Judiciário devem ter regularidade, continuidade, adequação, segurança, atualidade, generalidade, cortesia e modicidade dos custos exigidos no artigo 6º, § 1º da Lei nº 8.978/1995, tal qual qualquer serviço público deve ofertar.
Assim sendo deve-se aplicar aos serviços prestados pelo Poder Judiciário o disposto no artigo 37 da CF/88, utilizando-se do pressuposto que os serviços prestados pelo referido são serviços de natureza pública.
Pois bem com o exposto em mente é necessário realizar o seguinte questionamento, como o Princípio da Eficiência poderá ser aplicado em âmbito processual?
2.1 Princípio da Eficiência no Exercício da Jurisdição
Como já esclarecido em tópicos anteriores o Poder Judiciário tem o dever de prestar sua jurisdição pautada pela eficiência. Tal qual é a obrigação que o Código de Processo Civil Brasileiro de 2015 (CPC/2015) traz em seu artigo 8º o princípio da eficiência como sendo um dos princípios norteadores ou fundamentais do Processo Civil brasileiro, vejamos sua redação:
Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. (Grifo nosso) (Brasil, 2015)
Tamanha é a importância deste princípio que, o mesmo, é suscitado logo no início do CPC/2015, demonstrando a preocupação do legislador em prestar um serviço jurisdicional de forma eficiente, atendendo os ditames constitucionais constantes no caput do artigo 37 da CF/88.
Neste sentido Didier Jr. (2016) discorre que o Princípio da Eficiência se trata de uma versão “melhorada” do princípio da economia processual. Para o autor é “uma busca por uma gestão processual eficiente que assegure ao jurisdicionado uma resposta estatal razoavelmente célere e com qualidade.”
Sobre o princípio da economia processual ressaltamos a definição do Professor Newton Teixeira Carvalho (2017), o qual discorre:
Tal princípio é a busca constante do resultado útil do processo (julgamento de mérito), com o dispêndio de um esforço mínimo processual. Assim, o princípio da economia processual ou da economicidade repele a prática de atos desnecessários e inúteis, durante a tramitação do processo, a exemplo da realização de provas desnecessárias ou a repetição de atos processuais dispensáveis, apenas em razão de não ter seguido, o ato já praticado, o modelo legal, apesar não ter causado, a realização do ato em desconformidade com a lei, prejuízo algum às partes no processo.
Assim, o atual CPC, ao dispensar a postulação da reconvenção em petição própria; ao permitir que na contestação o réu, em preliminar, também impugne o requerimento de assistência judiciária ou o valor da causa, preocupou, sobremaneira, com uma maior rapidez na tramitação dos feitos e, portanto, com a desnecessidade da prática de vários atos que serviam, no Código anterior, apenas para embaraçar ou dificultar a discussão do assunto principal em debate e que necessitavam de análise, rápida, de mérito.
Percebe-se que o Princípio da Eficiência é muito abrangente e por assim o ser acaba por ser considerado abstrato por alguns autores, os quais o desabonam, denotando que tal abrangência é sinal de fraqueza e que o princípio seria mais um adereço processual, em vernáculo vulgar um penduricalho jurídico que de nada serve ao processo de forma prática. Um dos defensores desta vertente, Celso Antônio Bandeira de Melo (2004), prega:
(…) é juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do direito, que mais parece um simples adorno agregado ao artigo 37 ou o extravasamento de uma aspiração dos que burilaram o texto.
Em que pese o posicionamento do jurista Bandeiro de Melo ser de grande relevância para o correto entendimento e aplicação da eficiência esta autora discorda da respeitável opinião do jurista, pois a eficiência como princípio é muito mais que um simples valor abstrato, como já demonstrado a eficiência é uma norma constitucional e processual civil a qual são submetidos todos os processos cíveis tramitado no Poder Judiciário brasileiro, tendo sim força e auxiliado na melhoria do desempenho da jurisdição pátria.
Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (1999) entende que a aplicação ao processo das ideias de utilidade, oportunidade, eficácia, eficiência e efetividade apenas são legítimas se não desprezarem outros valores importantes ao processo. Defende o processualista que a legitimação do exercício da atividade jurisdicional não pode dar-se pela performance, usurpando o lugar da ética, não podendo o discurso racional do juízo ser substituído, por completo, por uma racionalidade tecnológico-estratégica. Ele diz:
O que ponho em questão é a eficiência como fim, sem temperamentos, como meta absoluta, desatenta a outros valores e princípios normativos. O ponto é importante porque esses ditames axiológicos, além de se afinarem mais com a visão de um Estado democrático e participativo, poderão não só contribuir para a justiça da decisão corno até para a própria efetividade
Nessa perspectiva, seria incompatível com a ética democrática o entendimento de que a eficiência processual permitiria o atropelamento de garantias constitucionais, como a liberdade, o contraditório, a ampla defesa, a cooperação, a motivação, dentre tantas outras conquistas dos cidadãos auferidas ao longo dos séculos. A eficiência processual, enfim, não pode ser entendida como uma cláusula geral permissiva para atropelamento de garantias. A ideia de que processo eficiente é o processo rápido, por exemplo, não se coaduna com a ética democrática. Esse não é um significado (norma) juridicamente aceitável do texto (significante) que impõe ao juiz a observância da eficiência processual na aplicação do ordenamento jurídico (art. 8º do CPC).
Portanto, agir com eficiência na aplicação do ordenamento jurídico processual não pode significar um esvaziamento do seu conteúdo ético.
O modelo de processo adotado pelo novo CPC se aproxima muito mais do modelo cooperativo, o qual não elege um ou outro sujeito processual como protagonista (policentrismo), nem determina a condução do procedimento pelas partes, nem permite o acúmulo exagerado de poderes pelo juiz. Todos os participantes do processo devem colaborar para que seja tomada a melhor decisão (comparticipação). Deve-se partir da clara percepção da interdependência entre os sujeitos processuais, notadamente quando estabelece, em seu artigo 6º, que todos os sujeitos devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. O texto positiva, no plano infraconstitucional, o princípio da cooperação, que desenha o próprio modelo cooperativo ou colaborativo, no qual o juiz possui amplos poderes, mas não pode exercê-los solitariamente, sem as partes. O processo passa a ser encarado como um espaço privilegiado de exercício direto do poder pelo povo, potencializando-se o valor participação no processo.
A postura do juiz no modelo traçado pelo novo Código de Processo Civil deve ser ativa (o que distancia o nosso processo do modelo adversarial), concentrando diversos poderes, como amplos poderes probatórios. Por outro lado, com a intensificação do debate, o contraditório passa a ser encarado como poder de influência (artigos 10 e 489, §1º do CPC), distanciando-se tanto do modelo adversarial como do inquisitorial. Isso quer dizer que a parte sabe que seu argumento será analisado pelo órgão jurisdicional.
Exige-se, com isso, a análise pelo juiz, seja para acolher ou negar, de todos os argumentos levantados pelas partes. Elas devem estar cientes de que todos os argumentos serão analisados e, portanto, não se acomodarão, o que sem dúvida irá enriquecer o debate e permitir uma decisão mais bem fundamentada e com menor potencial de recorribilidade.
Portanto, o Código de Processo Civil estabelece no plano legislativo infraconstitucional um novo modelo de processo, que pode ser denominado cooperativo, colaborativo ou comparticipativo. Seu fundamento ideológico é o procedimentalismo democrático participativo.
Se a eficiência for entendida como a possibilidade de o juiz atropelar as demais garantias processuais, a fim de tornar o processo mais rápido ou melhor unicamente a partir de seus valores pessoais, sem a efetiva análise dos argumentos dos demais envolvidos, certamente a eficiência processual não teria compatibilidade com o modelo cooperativo. Ao contrário, a eficiência seria um germe de autodestruição do próprio modelo, pois representaria, em última análise, tudo que a cooperação processual pretende evitar.
No entanto, se a eficiência for entendida como uma ferramenta para aprimorar a forma de gestão do processo, fundamentando inclusive a gestão compartilhada do processo, garantindo a possibilidade de adaptação procedimental, desde que haja fundamentação específica para tanto, evitando-se as dilações indevidas e desnecessárias, como vem sendo defendido no presente trabalho, ela será mais um elemento a somar ao modelo e contribuirá, sem dúvida, para tornar o processo mais democrático.
Ademais as palavras do Professor Nalini (2018) afirmando que se “O Judiciário, se não estiver atento, será ameaçado pelo fantasma da inutilidade.” Não poderiam ser mais atuais e dentro do contexto de todo o exposto neste estudo!
Dito, isto é, de extrema importância demonstrar alguns dos efeitos práticos da aplicação da eficiência no âmbito processual brasileiro.
2.2 Resultados Práticos da Utilização do Princípio da Eficiência em Âmbito Processual
Como já mencionado a eficiência é um princípio multidisciplinar o qual abrange inúmeros princípios e ramos do Direito, em âmbito processual, onde na maioria das vezes o ordenamento jurídico é concretizado, não poderia ser diferente. Vejamos como ela é utilizada em âmbito processual.
O primeiro ponto que irá se destacar o fato do princípio da eficiência ter absorvido o princípio da economia processual, neste sentido tem-se a fala de Neves (2016):
O objetivo do princípio da economia processual é obter menos atividade judicial e mais resultados. (…). Por outro lado, o princípio da economia processual, quando analisado sob a ótica microscópica, também pode ser entendido com a tentativa de ser o processo mais barato possível, gerando o menor valor de gastos.
A economia processual visava exclusivamente a redução dos custos dos processos quer seja tempo de duração do processo, quer sejam as despesas pecuniárias inerentes ao processo. Enquanto a eficiência busca além da redução dos custos processuais a obtenção do melhor resultado possível possibilitando uma solução satisfatória à lide.
Outro aspecto da eficiência em âmbito processual trata da cooperação processual, conforme é expresso no artigo 6º do CPC. Sobre este tema Didier (2016) discorre:
O princípio da cooperação torna devidos os comportamentos necessários à obtenção de um processo leal e cooperativo. Os deveres de cooperação podem ser divididos em deveres de esclarecimento, lealdade e proteção.
Para o autor todos os sujeitos envolvidos no processo, quer sejam as partes, magistrados, membros do Ministério Público, devem adotar certos atos e atitudes afim de que o resultado útil do processo seja garantido com máxima eficiência! Uma relação processual desleal e obscura traria graves empecilhos ao processo.
O Princípio da Eficiência proporcionou a criação da repercussão geral. Entretanto antes de adentrar ao mérito aqui proposto faz-se necessário que se entenda o que é o instituto da repercussão geral, neste sentido tem-se a definição de Marinoni e Mitidiero (2008):
Impõe-se que a questão debatida, além de se ensartar como de relevante importe econômico, social, político ou jurídico, ultrapasse o âmbito de interesse das partes. Vale dizer: tem de ser transcendente. Também aqui o legislador infraconstitucional alça mão de linguagem propositalmente vaga, consentindo ao Supremo Tribunal Federal a aferição da transcendência da questão debatida a partir do caso concreto. A transcendência da controvérsia constitucional levada ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal pode ser caracterizada tanto em um perspectiva qualitativa como quantitativa. Na primeira, sobreleva para individualização da transcendência o importe da questão debatida para a sistematização e desenvolvimento do direito; na segunda, o número de pessoas susceptíveis de alcance, atual ou futuro, pela decisão daquela questão pelo Supremo e, bem assim, a natureza do direito posto em causa (notadamente, coletivo ou difuso).
Para facilitar o entendimento acerca do que seria o instituto Medina (2009) exemplifica:
A repercussão geral jurídica no sentido estrito existiria, por exemplo, quando estivesse em discussão o conceito ou a noção de um instituto básico de nosso direito, de molde a que aquela decisão, se subsistisse, pudesse significar perigoso e relevante precedente, como, por exemplo, o de direito adquirido. Relevância social haveria numa ação em que se discutissem problemas relativos à escola, à moradia ou mesmo à legitimidade do Ministério Público para a propositura de certas ações. Pensamos, aliás, que essa repercussão geral deverá ser pressuposta em um número considerável de ações coletivas, só pelo fato de serem coletivas. Repercussão econômica haveria em ações que discutissem, por exemplo, o sistema financeiro de habitação ou a privatização de serviços públicos essenciais, como a telefonia, o saneamento básico, a infra-estrutura etc. Repercussão política haveria quando, por exemplo, de uma causa pudesse emergir decisão capaz de influenciar relações com Estados estrangeiros ou organismos internacionais.
Percebe-se no instituto a clara tentativa de obter-se a melhor prestação jurisdicional para casos semelhantes e que versem do mesmo tema, pacificando suas soluções por meio de uma decisão que serviria para tal fim, promovendo segurança jurídica.
Neste ponto é interessante destacar como o direito brasileiro vem se aproximando do sistema common law o qual a principal fonte do direito são as decisões judiciais ou precedentes judiciais. (CAENAGEM, 2010)
O instituto da repercussão geral está previsto no artigo 102, § 3º da CF/88, o qual foi incluído pela EC nº 45/2004, conforme se lê:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
(…)
3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros. (Brasil, 1988)
Posteriormente foi regulamentada pelo artigo 1.035 do CPC/2015, objetivando assim desafogar o STF por gerar precedente e desestimulando recursos meramente protelatórios.
Neste lastro o Princípio da Eficiência também serve de motivação para a criação do instituto da Súmula Vinculante. Diferentemente das outras súmulas e resoluções editadas pelos diversos tribunais espalhados pelo Brasil, a Súmula Vinculante é exclusividade do Supremo Tribunal Federal (STF) e possui caráter vinculante, ou seja, obriga sua observância por todos os órgãos do Poder Judiciário.
Segundo André Ramos Tavares (2005) a Súmula Vinculante é reconhecida como a possibilidade de construção de enunciados que sintetizam a posição anterior do tribunal constitucional sobre um determinado assunto, entendimento este que vinculará todas as outras decisões futuras sobre a matéria.
Importante citar que institutos como a Súmula Vinculante já eram defendidos por juristas como Hans Kelsen (1998), o qual defendia que apenas um órgão deveria criar as normas, leia-se Direito, e realizar a aplicação do mesmo. Ou seja, para Kelsen institutos em que o órgão que aplica o Direito, no caso brasileiro o Poder Judiciário, deveria ser responsável por criar o mesmo.
Desta maneira percebe-se que a intenção do legislador em criar o instituto da Sumula Vinculante é a busca da eficiência por evitar a judicialização desnecessária de temas já pacificados pelo STF.
O ponto de aplicação do Princípio da Eficiência, na opinião desta autora, mais relevante ao processo judicial é a digitalização do processo o famoso processo eletrônico.
O processo eletrônico trouxe inúmeras inovações, tais como tramitação mais rápida do processo, uma vez não ser necessária a presença física do peticionante ao cartório da Vara ou Tribunal para realizar o protocolo da petição ou ato processual, bem como a possibilidade de se protocolar em qualquer do mundo, desde que possua acesso à internet.
Proporciona também a economia de não ser necessário realizar carga de processo, haja vista que os mesmos estão disponíveis digitalmente, além da desnecessidade de manter arquivos físicos de processos volumosos que ocupam muito espaço.
O processo eletrônico abre a possibilidade de que duas ou mais pessoas trabalhem nele ao mesmo tempo, reduzindo grandemente o seu prazo de tramitação.
Reforçando o entendimento de que o processo eletrônico é de fato revolucionário, tem-se a fala de Telmo Gonçalves Lima (2019):
Não bastasse essa boa vantagem, o processo digital permite que várias pessoas trabalhem no processo ao mesmo tempo. Dois advogados podem preparar suas alegações finais ao mesmo tempo enquanto o juiz pode iniciar o relatório da sentença. No mesmo momento o servidor do cartório pode ter vista dos autos para juntar uma certidão pendente. Isso é revolucionário.
Com o avanço dos sistemas os processos com recursos subirão aos tribunais com apenas um clique evitando todo o fluxo de remessa física pelos correios. Portanto não há dúvida que o processo digital está consonante com a eficiência jurisdicional.
Com respeito ao processo eletrônico há de se destacar o período de pandemia de COVID-19 a qual aflige todo o mundo em especial o Brasil. Pois logo que a situação pandêmica foi decretada no país o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, por meio de sua Resolução nº 313/2020 suspendeu a tramitação de todos os prazos processuais e por consequência a maior parte das atividades jurisdicionais, tendo em vista que o atendimento presencial não seria possível, pois o distanciamento social é condição necessária para evitar contaminação pela referida doença.
Neste período, através de muito trabalho e com a cooperação institucional da procuradoria de prerrogativas da OAB/AM, o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM)[3], por ser um tribunal 100% digital, conseguiu adequar-se à nova realidade, possibilitando assim o retorno às atividades forenses através de atendimentos por vias eletrônicas, quais sejam telefones, aplicativos de mensagens instantâneas, e-mails, videoconferências e claro o processo eletrônico.
O TJAM conseguiu adaptar-se à situação pautando seus atos normativos e portarias através do Princípio da Eficiência, tal foi evidenciado pelo CNJ, o qual concedeu ao TJAM o Prêmio Ouro de Qualidade 2020[4] e Certificação de 100% de Produtividade em 2020[5].
Verificou-se que em muitos processos obteve-se sentença em até 03 (três) meses desde a petição inicial do mesmo, trazendo a voga outro aspecto de suma importância decorrente da aplicação do Princípio da Eficiência em âmbito processual, qual seja o princípio da duração razoável do processo.
Tal princípio é insculpido na Constituição Federal de 1988 logo no artigo 5º, inciso LXXVIII, sendo tido como direito fundamental. Mas tarde tal direito foi confirmado pelo Novo Código de Processo Civil de 2015 em seu artigo 4º, o qual traz a seguinte redação:
Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
Com isto o legislador pátrio deixou claro sua intenção em tornar o processo judicial brasileiro e por consequência a justiça brasileira mais célere evitando que um processo se arraste por muitos anos, sendo quase que interminável, entretanto garantindo a todos a ampla defesa e contraditório.
É possível afirmar que a duração razoável do processo está vinculada diretamente ao conceito de devido processo legal. Verifica-se que a duração razoável do processo está presente em vários ordenamentos jurídicos como no dos Estados Unidos da América, no Italiano e no Alemão.
No Brasil, o princípio da razoável duração do processo não é novo. No Código de Processo Civil de 1973, já havia tal previsão, junto aos poderes do juiz, no artigo 125 do CPC, determinando que deveria o juiz velar pela rápida solução do litígio. No CPC/1973, o juiz era o agente garantidor pela duração razoável do processo.
Mas, além desse artigo, tem-se a Convenção Americana de Direitos Humanos assinado no ano de 1969, que também prevê, nos artigos 7º, 5, e 8º, 1, o direito a um processo de duração razoável, e que também o Brasil foi signatário.
Com a assinatura do Pacto São José da Costa Rica, pelo Brasil, que versava sobre inúmeras questões, inclusive sobre direitos fundamentais, acabou entrando no ordenamento jurídico brasileiro, for força do art. 60, § 4º, da CF/88, a garantia da duração razoável do processo, que, para evitar qualquer discussão sobre constitucionalidade, foi positivado em norma constitucional pela Emenda Constitucional nº 45/2004 no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República, assegurando expressamente a todos os interessados, no âmbito judicial e administrativo, o direito à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
Já no novo Código de Processo Civil brasileiro pode-se perceber, novamente, uma preocupação enorme com a duração razoável do processo, tanto que, no capítulo que versa sobre “normas fundamentais do processo civil”, entre os artigos 1º ao 12º., verificamos que a expressão “duração razoável do processo” aparece em duas oportunidades, quais sejam, no artigo 4º e no artigo 6º.
Importante frisar que a duração razoável do processo não é somente responsabilidade do juiz, mas sim de todos os atores que figuram no processo, tanto o é que a proposital litigância é punida com instituto da litigância de má fé, conforme artigo 142 do CPC.
Ressalta-se que o termo duração razoável do processo infelizmente não determina qual o prazo máximo um processo deve durar, entretanto o processo deve durar tempo suficiente para que não demore muito a ponto de levar a uma ausência da aplicação do direito material ao caso concreto e a perda do direito, e nem ande rápido demais, a ponto de violar os diretos fundamentais do processo, quais sejam, o contraditório, a ampla defesa, a isonomia e o devido processo constitucional.
A expressão prazo razoável indica uma relação com o tempo, ou seja, um meio termo entre a celeridade e a morosidade procedimental. No entanto, a expressão razoável é imprecisa e subjetiva, e não contribui para afastar dúvidas sobre a aplicação nos casos concretos e muito menos permite a possibilidade de uma discussão objetiva sobre a fixação de um termo de duração mínimo e máximo para os procedimentos judiciais civis, penais ou trabalhistas.
O termo duração razoável do processo para a sua definição como elemento necessário para a garantia da democracia e de instrumento de proteção aos direitos fundamentais deve levar em consideração duas perspectivas. A primeira, voltada para as partes, indicando o tempo necessário para a realização dos atos procedimentais. A segunda é voltada para a atuação do órgão jurisdicional, indicando o tempo necessário para se proferir decisões judiciais de mérito ou interlocutórias.
Muitas vezes, a demora na realização de um único ato procedimental não causa a violação razoável do processo. No entanto, a demora ou a rapidez em praticar um conjunto de atos procedimentais, invariavelmente, pode trazer uma violação ao direito razoável ao processo e à prestação jurisdicional ou à violação do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Ana Maria Scartezzini (2005) sustenta que a razoabilidade tem um conteúdo mínimo, que abrange o tempo mínimo de apreciação por parte do magistrado, para se inteirar dos interesses do autor e réu e definir quem tem razão; de outro lado, contém a expectativa do detentor do direito em ver solvida a lide, com a análise de sua pretensão deduzida em juízo.
O processo não apenas deve outorgar uma satisfação jurídica às partes, como também, para que essa resposta seja a mais plena possível, a decisão final deve ser pronunciada em um lapso de tempo compatível com a natureza do objeto litigioso, visto que – caso contrário – se tornaria utópica a tutela jurisdicional de qualquer direito. Como já se afirmou, com muita razão, para que a Justiça seja injusta não faz falta que contenha equívoco, basta que não julgue quando deve julgar! (BIELSA e GRANÃ, 1994)
A maioria dos doutrinadores e Tribunais (nacionais e internacionais) que já tiveram a oportunidade de se pronunciar sobre o tema da duração razoável do processo sempre tenta explicar o termo razoável de modo empírico e casuístico, ou seja, por meio de estudos de casos práticos, extraindo um conjunto de regras e requisitos que deveriam ser generalizados para serem aplicados em casos semelhante. A explicação que parte do caso concreto para explicar a realidade é o que chamamos de método indutivo.
Como afirmado, o termo razoável está impregnado de conotação subjetiva, uma verdadeira cláusula geral e abstrata, sem qualquer conteúdo normativo. O termo razoável é inexplicável do ponto de vista científico, pois tanto pode justificar a demora da prestação jurisdicional quanto pode justificar a celeridade na prestação jurisdicional.
A utilização desse termo razoável, sem a necessária explicação legal do mesmo, como dito, é uma cláusula geral, e, portanto, inexequível, do ponto de vista de eficiência, efetividade e eficácia dos direitos procedimentais e processuais. Ou seja, razoável, processualmente falando, é um termo hermético, impossível de ser creditado e extraído de normas para implementar a sua aplicação em casos concretos.
Diante da dificuldade em entender o conceito do processo em prazo razoável, tendo em vista a sua difícil interpretação, além do alto grau de subjetividade e abstração, seria interessante entender que o termo razoável tem ligação direta com o tempo e, portanto, melhor seria utilizar a expressão: “Tempestividade procedimental e jurisdicional”.
A razoável duração do processo deve ser compreendida como direito do cidadão, a resolução dos direitos colocados em juízos em tempo procedimental e judicial legalmente estabelecidos. Isso significa que os atos das partes e dos juízes devem ser pautados pelo tempo.
Sustenta-se a ideia de que a lei tenha que fixar o conceito para a expressão razoável, permitindo, assim, delimitar quando um processo durou razoavelmente ou não.
Fernando Fonseca Gajardoni (2003), de forma legalista, explica que em sistemas processuais preclusivos e de prazos majoritariamente peremptórios, como o brasileiro, o tempo ideal do processo é aquele resultante do somatório dos prazos do Código de Processo Civil para o cumprimento de todos os atos que compõem o procedimento, somado ao tempo de trânsito em julgado. A tutela jurisdicional prestada além desse prazo seria intempestiva.
Além disso, quando se fala em duração razoável do processo, ficamos com a falsa ideia de que apenas o iter procedimental deve ser controlado e fiscalizado. No entanto, também sabemos que o atraso na atividade jurisdicional interfere na duração do processo em tempo razoável. Isso significa dizer que os atos jurisdicionais também devem ser regidos pelo tempo, sob pena de inviabilizar qualquer garantia de duração razoável do processo. Não adianta esperar um processo com duração tempestiva, sem que o órgão jurisdicional tenha, também, a obrigação de dar, tempestivamente, a decisão jurisdicional.
Razoável seria praticar atos procedimentais/processuais em tempo previsto em lei, bem como praticar atos jurisdicionais também em tempo previsto em lei. Razoável é o processo que possui atos jurisdicionais e procedimentais dentro dos prazos legais. Razoável está diretamente ligado à ideia de tempo.
O tempo é o elemento caracterizador e norteador da palavra razoável, permitindo entender o que seria ou não irrazoável. A razoável duração do processo não pode ser uma cláusula geral em branco, e não pode ficar sem aplicação, por dificuldade de sua compreensão. A duração razoável do processo não é uma norma programática.
O termo razoável deve ser usado nos discursos de fundamentação do Direito, mas não nos discursos de aplicação do Direito. Isso significa dizer que o termo razoável deve ser uma preocupação do legislador, e não do órgão jurisdicional. Para o órgão legislador, a apresentação do problema sobre o tempo máximo de um processo pode gerar debates acalorados, determinando-se, portanto, um tempo médio, um prazo razoável, um denominador comum. Já, no discurso apresentado para o órgão jurisdicional, deve-se ter como pressuposto a legalidade, e, portanto, o razoável deve ser aquilo que determina a lei, nem mais nem menos.
Somente o elemento tempo pode permitir a conceituação do termo razoável. Temos que ter um processo jurisdicional e uma atividade jurisdicional regida pelo binômio: tempo-lei ou teremos um processo e uma atividade jurisdicional irrazoável. Nesse sentido, o princípio da razoável duração do processo deve ser compreendido como uma garantia da observância à tempestividade procedimental e jurisdicional.
Para fins de determinação do lapso temporal procedimental é utilizado no processo de conhecimento o tempo entre a citação e o trânsito em julgado da sentença (com ou sem a resolução do mérito) e, no processo de execução, o tempo necessário para o término do respectivo procedimento, pouco importando se houve ou não a satisfação do crédito.
Segundo Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias (2015), quando os órgãos jurisdicionais descumprem essas normas do ordenamento jurídico, relativas aos prazos, o que é prática ilícita corriqueira no Estado Brasileiro, a jurisdição se apresenta morosa, intempestiva e ineficiente.
No entanto, a duração do processo em tempo razoável não pode ser interpretada de modo absoluto, sendo admitido, em determinados casos, a sua extrapolação para garantir o direito ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo. E, para que haja a extrapolação dos prazos legais-legais processuais, devemos nos pautar pela fundamentação de tal necessidade, nos termos previstos pelo art. 93, IX, da CF/88, art. 10 e art. 489, § 1º, do novo CPC/2015.
Portanto, os critérios fornecidos pelas Cortes Internacionais de Direitos Humanos, que em casos concretos retirou normas e critérios para entender a expressão razoável, não servem para garantir que um processo demore tempo razoável. Os limites não estão na complexidade da causa, no comportamento dos litigantes e na atuação jurisdicional, mas, sim, na necessidade de observar o tempo procedimental e jurisdicional, e, com permissão de extrapolar, excepcionalmente, e desde que fundamentados, para a observância do contraditório, da ampla defesa e do devido processo.
Percebe-se a ligação profunda dos dois temas aqui abordados, pois o processo deve tramitar de forma eficiente, isto é, deve oportunizar a todos os direitos constitucionais a ampla defesa e ao contraditório, bem como seguir os ditames legais para apresentar uma resposta aos casos concretos.
Quanto a duração razoável do processo, conclui-se que o mesmo deve ter duração suficiente para dar uma resposta adequada ao caso concreto, mantendo a aplicabilidade do direito material em tempo hábil, pois conforme as palavras de Ruy Barbosa “Justiça atrasada não é Justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito das partes e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade”.
Conclusão
Conclui-se com o presente estudo uma análise acerca do Princípio da Eficiência, um princípio norteador do Direito originalmente desenvolvido para o Direito Administrativo, pois vincula a Administração Pública do Estado Brasileiro a uma administração eficiente dos recursos disponíveis ao Estado, tal princípio deve ser observado em qualquer ramo da administração pública.
Verificou-se que muito embora tal princípio seja direcionado à administração pública ele deve afetar o poder judiciário e por consequência o processo judicial, que deve tramitar regrado pela eficiência, conforme determina o artigo 8º do CPC/2015.
Tal norma de operar com eficiência é imposta ao Poder Judiciário, pois o mesmo desempenha função que atinge toda a coletividade, sendo um serviço essencial à resolução de conflitos.
Verificou-se que um dos maiores problemas do direito processual civil brasileiro é morosidade a qual os processos tramitam! Muito tem-se feito para que tal morosidade seja reduzida, a implementação do processo eletrônico é a mais notável delas e se provou extremamente útil durante o período da pandemia da COVID-19, pois elimina a necessidade de atendimento presencial para fins de protocolar atos processuais e audiências presenciais.
Neste sentido expôs-se a ótima experiência do Tribunal de Justiça do Amazonas –TJAM, Tribunal Regional do Trabalho – TRT em implementar meios para que os serviços jurisdicionais prestados por eles não fossem afetados sobremaneira durante o período de restrições ao atendimento presencial.
Por fim, conclui-se com convicção que a utilização do Princípio da Eficiência no âmbito processual civil brasileiro trouxe inúmeras vantagens e a multidisciplinariedade do referido princípio é mostra de força do mesmo em garantir que direitos fundamentais como o acesso à jurisdição e que a mesma tenha sua causa julgada em tempo razoável sejam cumpridas por todo o Poder Judiciário.
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[1] Mestranda na Universidade Nove de Julho. Artigo científico apresentado para obtenção de nota e grau de aprovação na disciplina de Atividade Judicial: (RE)Leitura do Paradigma da Eficiência, ministrada pelos Docentes Prof. Dr. José Renato Nalini e Profa. Dra. Samantha Ribeiro Meyer-Pfug Marques.
[2] Reportagem de Revista Consultor Jurídico, 2 de setembro de 2020, 10h47. A JUSTIÇA TARDA…
Supremo coloca fim a processo de 125 anos, iniciado pela Princesa Isabel. Disponível em https://www.conjur.com.br/2020-set-02/stf-poe-fim-processo-125-anos-iniciado-princesa-isabel. Acesso em 06/01/2021 às 21h37min
[3] Utilizar-se-á o Tribunal de Justiça do Amazonas pelo fato do Estado do Amazonas ser a Unidade Federativa a qual esta autora reside e atua como advogada.
[4] Informações constantes no site do Tribunal, disponível em https://www.tjam.jus.br/
[5] Idem.
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