O valor jurídico do like

Resumo: O presente artigo aborda a recente discussão acerca do valor jurídico do like (curtir) nas publicações que são veiculadas no mundo virtual. Discute-se, por exemplo, se a atitude de curtir uma publicação teria o significado de endossar o pensamento do que se veicula, ou se apenas se estaria dando conta de que a publicação foi lida pelo internauta. Inúmeras são as interpretações possíveis, de modo que o maior interesse perquirido nesse trabalho é ventilar o valor jurídico do like, já que essa atitude de curtir publicações já está sendo objeto de apreciação na esfera judicial, tendo sido, inclusive, motivo de condenação na esfera trabalhista, conforme demonstrado adiante.

Palavras-chave: O valor jurídico do like. Interpretações para o like. Liberdade de expressão.

Sumário Introdução. 1.2 Caso de campinas: demissão de empregado por curtida em facebook; 1.3 Possíveis interpretações para o like e seu valor jurídico; 1.4 O princípio da liberdade de expressão e o like; 2 Conclusão

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INTRODUÇÃO

A atual conjuntura social dedicada à intensa comunicação por meio da rede mundial de computadores, faz-nos repensar acerca dos limites nas divulgações publicadas na internet, de sorte que, nem sempre o que se lê é passível de concordância expressa. Nesse modelo de comunicação atual, eis uma questão a ser debatida: quais os significados e possíveis consequências de se curtir uma publicação veiculada em rede social?

A resposta a essa pergunta não é tão simples como se imagina, sobretudo quando pensada sob a ótica jurídica, sendo o aspecto que mais nos interessa nesse artigo. Sendo assim, sem pretensão de esgotar as possibilidades de resposta ao questionamento feito acima, prossigamos com o debate.

Antes, porém, esclareça-se que a expressão “like” utilizada ao longo do texto equivale à palavra “curtir”, sendo sinônimas nessa oportunidade.

Pois bem. Sabe-se que a comunicação virtual é uma necessidade inerente ao ser humano. Tanto é assim, que a ONU-Organizações das Nações Unidas, declarou que o acesso à internet é um direito fundamental, recebendo status como ao que foi dado ao direito à vida e à liberdade, por exemplo[1].

Todavia, esse direito fundamental não é absoluto. O campo virtual não é “terra de ninguém”, sendo despiciendo que os seus usuários se pautem por limites morais, éticos e jurídicos para permear esse terreno virtual de incertezas e opiniões de toda ordem.

Alguns limites são necessários diante de certas indagações debatidas nesse momento, a saber: quais as consequências de se curtir (dar um like) na postagem de alguém? Ao “dar um like”, estar-se-ia endossando a opinião alheia? É o que vamos amadurecer adiante.

A fim de, precipuamente, exemplificar melhor a discussão, eis a seguir um caso recente que colocou em pauta o tema proposto neste artigo.

1.2 Caso de campinas: demissão de empregado por curtida em facebook

Um caso ocorrido em Campinas/SP chamou atenção para o fato de que uma juíza considerou válida demissão por justa causa de um empregado que curtiu publicação de um colega ex-funcionário da mesma empresa[2].

No caso concreto, o trabalhador curtiu a publicação de um ex-funcionário que dirigiu críticas ofensivas a uma das proprietárias da empresa. Ao tomar conhecimento do fato, a empresa optou por encerrar o contrato de trabalho, demitindo o trabalhador por justa causa. Insatisfeito, ele buscou o Judiciário aludindo que nunca inseriu comentários injuriosos à empresa ou à sua sócia.

No referido processo, o empregado invocou o direito constitucional à liberdade de expressão, ocasião em que o juízo de Campinas considerou que o fato foi grave, dado o largo alcance das redes socais, aduzindo que a liberdade de expressão não permite ao empregado travar conversas públicas em rede social ofendendo a reclamante.

Pois bem. Entendido o tema do artigo através do caso prático apresentado, façamos uma análise abstrata do tema. Avante.

1.3 Possíveis interpretações para o like e seu valor jurídico

Afastando-se por hora do caso ocorrido em Campinas, analisemos abstratamente o significado de um like na postagem de uma mensagem.

Nesse toar, considerando a interpretação do senso comum, talvez soe automático que o ato de curtir a postagem de alguém seja simplesmente concordar com o que ela posta, ou até mesmo signifique que quem deu um like gostou da postagem.

Entretanto, numa análise técnico-jurídica, é preciso que se tenha cuidado ao opinar acerca do que seria a “curtida” (ou like) nas publicações apresentadas ao público virtual. Nesta órbita, pode-se entender que uma curtida tanto pode significar concordância de pensamento como um simples aviso de que se leu aquilo que foi escrito, como quando, por exemplo, presencialmente, balançamos a cabeça ao ouvir alguém argumentar algo (o que nem sempre é concordar).

Numa breve passagem pelas páginas virtuais encontramos pessoas que, além de “curtir” uma mensagem, comentam sua opinião logo em seguida, o que torna mais fácil a identificação e intenção opinativa, ao passo que existem pessoas que apenas curtem por educação ou até mesmo para fazer constar sua passagem por determinada publicação postada.

A curtida pode ser um “gostei”, ou um “entendo” (com ou sem discordância), sendo que referida análise jurídica somente poderá ser atestada no caso concreto, com a reunião de outros elementos de prova que auxiliem o juízo no tocante à valoração do like, tudo devidamente fundamentado, por óbvio.

Como exemplo, digamos que seja veiculada imagem de um brutal assassinato. Ao curtir a publicação, estar-se-ia concordando com o ocorrido? Ou apenas demonstrando que se inteirou da notícia? A resposta é: depende. Há quem expresse ambas reações. O mesmo exemplo de interpretação se aplica à veiculação de palavras e desabafos seguidos de diferentes formas de curtir.

Com isso, pode-se dizer que, analisar isoladamente uma curtida (ou like) com o intuito apenas de condenar, é, sem dúvida, inverter o comando jurídico que orienta ser a boa-fé presumida, o passo que a má-fé é a que precisa ser provada. Se um like serve para condenar, outros likes, diferentemente, servirão para absolver. É, inevitavelmente, uma via de mão dupla.

Nessa análise do like, deve o julgador se valer do conjunto probatório trazido aos autos para que possa emitir um juízo de valor dotado de certeza jurídica. Um like, por si só, tem uma carga muito subjetiva, de modo que não deve ser usado para, isoladamente, condenar uma pessoa.

Nesse universo de interpretações, é certo que não há como padronizar o significado de um like. O significado do curtir está na esfera subjetiva de cada um. Para o like, vale o adágio popular: cada cabeça é um mundo.

No caso particular aqui ventilado, o juízo de Campinas deixou claro o expressivo valor jurídico do like, entendendo que, naquela oportunidade, a curtida revelou concordância com as palavras ofensivas escritas por um ex-funcionário da empresa e curtidas por outro funcionário que foi posteriormente demitido.

Esta é umas das possibilidades de interpretação para o like, mas não é a única, tampouco a regra. Juridicamente falando, a análise probatória deve ser misturada a uma dose de bom senso, de modo que se saiba o animus do autor da curtida, ficando claro se ele curtiu porque endossou o pensamento, se curtiu porque apenas leu, ou até mesmo se curtiu acidentalmente.

1.4 O princípio da liberdade de expressão e o like

Sendo por muitos invocado para justificar o direito de opinar, o princípio da liberdade de expressão tem o condão de garantir que qualquer pessoa expresse seus comentários acerca de qualquer assunto que se coloque em pauta, vedado o anonimato para que se garanta o direito de resposta.

Nesse aspecto, como nenhum princípio é absoluto, a liberdade de expressão encontra limites na preservação da honra de outrem, por exemplo.

Considerando o princípio supramencionado, fica claro que a atitude de curtir uma publicação se encontra amparada pela liberdade de expressão, mas, como tal, está sujeita à interpretação dentro de um contexto fático-probatório, quando submetida à apreciação judicial.

Desta feita, em nome da ampla cooperação social, cabe aos usuários do mundo virtual policiar seus comportamentos e palavras, ajustando-os à boa convivência social, de modo a não afetar a esfera de direitos do outro, evitando violar, por exemplo, a honra de outrem.

É evidente que não se está aqui buscando um mundo ideal de inteira paz e compreensão universal na comunicação. Isso é utopia. Em verdade, o que se sugere nesse diálogo é que analisemos as opiniões dos outros procurando curtir ou dar um like seguido de um comentário endossador ou não da opinião, a fim de que seja de possível a interpretação por aquele que será atingido pelas palavras ventiladas e curtidas.

2 Conclusão

Considerando as argumentações exploradas acima, podemos concluir que, interagir, curtindo e dando like nas publicações veiculadas na internet, é uma atitude normal e esperada daqueles que visitam o mundo virtual. Todavia, essa interação não deve ser de forma irresponsável e obscura, haja vista que o ato de curtir uma mensagem pode ter um valor jurídico capaz de refletir diretamente na vida de quem o faz.

Dessa forma, é evidente que a liberdade de expressão é garantia que permite a qualquer pessoa externar suas opiniões no ambiente virtual, inclusive curtindo uma publicação. Mas, como nenhuma garantia constitucional é absoluta, se o aparentemente inofensivo like passar pelo crivo judicial e for entendido como a concordância com um dizer ofensivo, a liberdade de expressão será afastada para dar lugar à reprovação jurídica da conduta.

Sendo assim, sabendo que tribunais do nosso país já foram instados a se manifestar acerca de curtidas direcionadas às publicações na internet, conferindo valor jurídico ao like, o que resta aos jurisdicionados é fazer bom uso da liberdade de expressão, fazendo uma leitura cuidadosa e reflexiva das opiniões alheias antes de dar um like.

 

Referências
______http://computerhoy.com/noticias/internet/onu-declara-acceso-internet-como-derecho-humano-47674 (acessado em 27.01.2017);
PROCESSO Nº 0000656-55.2013.5.15.0002 ROPS – RECURSO ORDINÁRIO EM PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO RECORRENTE: JONATHAN PIRES VIDAL DA ROCHA RECORRIDA: COMÉRCIO DE VEÍCULOS E MOTOCICLETAS JUNDIAÍ LTDA ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE JUNDIAÍ.

Notas
[2] PROCESSO Nº 0000656-55.2013.5.15.0002 ROPS – RECURSO ORDINÁRIO EM PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO RECORRENTE: JONATHAN PIRES VIDAL DA ROCHA RECORRIDA: COMÉRCIO DE VEÍCULOS E MOTOCICLETAS JUNDIAÍ LTDA ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE JUNDIAÍ.

Informações Sobre o Autor

Kelly Priscilla Tavares de Menezes Alencar

Graduada em Direito pela UNIFAVIP pós graduada em Direito das Sucessões e Família Servidora Pública do Tribunal de Justiça de Pernambuco TJPE


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Equipe Âmbito Jurídico

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