Resumo: A Lei Nº. 11.101/2005 inaugurou consigo uma nova realidade, considerada, por muitos, como uma das mais importantes alterações introduzidas na ramificação empresarial do Direito Pátrio. a construção de mecanismos aptos à permitir a tentativa da empresa ajustar com seus credores formas alternativas de pagamento dos créditos, evitando-se, com isso, o fechamento do estabelecimento, sua falência, com todos os efeitos perniciosos daí advindos. Há que se ponderar, neste tímido contato, a valoração, maciça e substancial, de preceitos que estão intrinsecamente associados, não somente, à essência privada do devedor empresarial, mas também as consequências que o término pode acarretar para a comunidade que mantém dependência da atividade desenvolvida. Trata-se de afirmação da função social desempenhada pelo devedor empresarial que, além de ambicionar o lucro, proporciona à sua mão-de-obra a promoção da dignidade da pessoa humana.
Palavras-chaves: Direito Empresarial. Recuperação Empresarial. Pessoa Jurídica.
Sumário: 1 À Guisa de Introito; 2 Recuperação Empresarial: Tracejos Conceituais; 3 Recuperação Empresarial Judicial: Definição e Requisitos; 4 Recuperação Empresarial Extrajudicial: Definição e Requisitos; 5 Comentário Final.
1 À Guisa de Introito
Em uma primeira plana, revela-se imperioso, antes de esmiuçar o objeto primário sobre o qual se assenta o presente estudo, trazer à baila as relevantes e robustas alterações que emolduram o Direito, como ciência dotada de arcabouço normativo e aportes teóricos densos, compreendendo, por extensão, as múltiplas ramificações que o integram. Neste alamiré, com o escopo de atribuir rotunda atenção ao progressivo aspecto de mutabilidade que passa alicerçar a Ciência Jurídica, oportunidade em que não mais se verifica a subsistência dos ranços de estagnação e inércia que outrora caracterizavam o Direito. Assim, não há que se falar, em razão do expendido, de perpetuação de apatia do ordenamento jurídico diante das situações díspares apresentadas pela sociedade.
Em razão do acinzelado, denota-se que não subsiste a imutabilidade dos corolários e princípios que norteiam a Ciência Jurídica, sendo extirpado tal aspecto, notadamente devido aos fatos peculiares vivenciados pelo ser humano, como catalizador para a evolução das fontes normativas produzidas. Neste passo, “é cogente a necessidade de adotar como prisma de avaliação o brocardo jurídico 'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade, está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação de interdependência que esse binômio mantém”[1]. Ressoa, com bastante propriedade, a essência do adágio ora mencionado, sendo que o ser humano é o verdadeiro axioma que impulsiona a constante e ininterrupta evolução da Ciência Jurídica.
Além do esposado, há que se salientar, ainda, que a utilização da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como pilar robusto de edificação e aprimoramento do Ordenamento Jurídico Pátrio apresenta-se como imprescindível. Nesta toada, impende ressaltar que tais ponderações se revelam ainda mais quando se constata, como objeto central do presente, a subsunção do texto legal, caracterizados por suas aspectos de generalidade e abstração das normas, às nuances e aspectos singulares provenientes da realidade atual que permeia a sociedade. “O direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um dinamismo”[2], assim já manifestou o Ministro Eros Grau. Prossegue, também, em sua exposição o mencionado magistrado salientando que:
“É do presente, na vida real, que se toma as forças que lhe conferem vida. E a realidade social é o presente; o presente é vida — e vida é movimento. Assim, o significado válidos dos textos é variável no tempo e no espaço, histórica e culturalmente. A interpretação do direito não é mera dedução dele, mas sim processo de contínua adaptação de seus textos normativos à realidade e seus conflitos”[3].
À sombra do apresentado, pode-se gizar que a ótica pós-positivista que, de maneira paulatina, passou a influenciar a Ciência Jurídica, teve o condão de propiciar uma autonomia no que concerne a aplicação das normas e sua forma de interpretação por estudiosos e operadores do Direito. A corrente pós-positivista retirou, de maneira absoluta, os grilhões que imobilizavam a aplicação do arcabouço normativo. Inclusive, há que se apresentar a visão construída por Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma progressiva evolução acerca do valor atribuído aos princípios em face da legislação”[4].
Nessa senda, tendo como ponto inicial de caminhada um exame substancial dos preceitos que estruturam a visão em tela, constata-se que o axioma central junge-se à valoração da tábua principiológica que orienta o Direito. Em tal perspectiva, verifica-se que os corolários e dogmas passam a se apresentar como normas de cunho vinculante, porquanto atuam como bandeiras desfraldadas a serem, imperiosamente, observadas quando da interpretação e aplicação do conteúdo que constitui os dispositivos legais
A partir do arrazoado, têm-se que os princípios jurídicos passam a desempenhar papel central na nova ordem inaugurada, atuando como elementos que, em seu bojo, contemplam uma abrangência mais ampla, quando comparados às normas que se revelam engessadas pela redação ofertada pelo legislador, quando de sua elaboração. Desta forma, cumpre salientar que os preceitos e corolários compreendem, ao influenciar a interpretação dos dispositivos legais, as multifacetadas que a sociedade oferece.
Nesse sedimento, é passível de percepção que os postulados principiológicos passam a se apresentar como super-normas, isto é, “preceitos que exprimem valor e, por tal fato, são como pontos de referências para as demais, que desdobram de seu conteúdo”[5]. Os dogmas jurídicos se desdobram em verdadeiros pilares sobre os quais o arcabouço teórico que compõe o Direito se estrutura, segundo a brilhante exposição de Tovar[6]. Obviamente, tal ideário deve englobar a interpretação das normas que dão substrato de edificação à ramificação Civilista da Ciência Jurídica, mormente as alterações introduzidas no âmbito empresarial das leis.
2 Recuperação Empresarial: Tracejos Conceituais
Ab initio, faz-se imperioso avultar que a Lei Nº. 11.101[7], de 09 de fevereiro de 2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, trouxe consigo um sucedâneo de novos institutos na ramificação empresarial do Direito Civil. Desta feita, há que se reconhecer que a legislação falimentar, a partir da lei ora mencionada inovou, de modo determinante, ao introduzir no Direito Pátrio a possibilidade da empresa, em crise, postular sua recuperação judicial. De igual modo, bem andou a Lei de Recuperação Empresarial ao desenvolver mecanismos que possibilitem a estruturação da recuperação de maneira extrajudicial, sem que haja a interferência do ente estatal, por meio do Poder Judiciário.
Vislumbra-se, a partir do exame da legislação em apreço, a construção de mecanismos aptos à permitir a tentativa da empresa ajustar com seus credores formas alternativas de pagamento dos créditos, evitando-se, com isso, o fechamento do estabelecimento, sua falência, com todos os efeitos perniciosos daí advindos. Há que se ponderar, neste tímido contato, a valoração, maciça e substancial, de preceitos que estão intrinsecamente associados, não somente, à essência privada do devedor empresarial, mas também as consequências que o término pode acarretar para a comunidade que mantém dependência da atividade desenvolvida. Trata-se de afirmação da função social desempenhada pelo devedor empresarial que, além de ambicionar o lucro, proporciona à sua mão-de-obra a promoção da dignidade da pessoa humana.
Nessa toada, a recuperação empresarial, de acordo com o que dispõe o art. 47[8] da lei supramencionada, tem por escopo primevo proporcionar que haja, por parte do devedor – compreendendo em aludido vocábulo tanto a pessoa jurídica como a natural – superação de situação considerada como de crise. Desta sorte, a recuperação judicial tem a finalidade assegurar a possibilidade de superação da situação de crise econômico-financeira da empresa, permitindo a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a sua preservação, função social e o estímulo à atividade econômica. Corroborando com o apontado, Maria Helena Diniz leciona:
“Pela Lei n. 11.101/2005, há possibilidade de recuperação de devedor empresário (pessoa natural ou jurídica) em crise econômico-financeira, restabelecendo a sua saúde financeira e a regularidade de sua atividade econômica e maximizando o seu ativo para uma eficaz satisfação do seu passivo, evitando, assim, a ocorrência da falência”[9].
A oportunidade trazida à baila pela Lei de Recuperação Empresarial poderá ser feita de maneira direta aos credores, de modo extrajudicial, devendo-se instaurar “o concurso de observação, definido o plano de recuperação que, sendo aprovado pelos credores, será homologado pelo juiz”[10]. Insta destacar que o plano de recuperação detém como escopo o restabelecimento do empresário devedor em situação dita temporária, com o intuito da superação através de um planejamento das atividades e operações desenvolvidas pelo empresário devedor. De igual maneira, estão compreendidas a negociação das dívidas com os credores existentes, propiciando o aumento da rentabilidade auferida pelo devedor e, por consequência, o prosseguimento de suas atividades. “Deverá, ainda, o plano voltar-se à qualidade da gestão, à governança corporativa, à ampliação ou redução da área de atuação empresarial, à projeção ou redução de gastos”[11], como também à previsão de investimentos.
Tal legislação busca oportunizar a preservação da empresa como princípio preponderante, desde que preenchidos os requisitos nela previstos, reconhecendo a função social da empresa e os grandes problemas econômicos e sociais que normalmente surgem com a quebra. Assim, a recuperação judicial passa a figurar, no cenário jurídico, como um instrumento destinado à superação da crise pela qual passa a empresa, preenchidos os requisitos legais, com a participação dos credores, que deliberam sobre o plano de recuperação judicial apresentado (seja em assembleia, seja não apresentando qualquer objeção).
Denota-se, neste primeiro contato, a valorização do princípio da preservação da empresa[12] pelo legislador, ao dispor, expressamente, de mecanismos a serem utilizados para ofertar a restruturação da situação econômica do devedor empresário. Trata-se de instrumento legalmente estruturado, a fim de “manter em funcionamento as empresas em dificuldades econômicas temporárias e, por meio desta medida, assegurar os empregos existentes e os interesses de terceiros como credores, consumidores e o próprio Fisco”[13].
Cuida arrazoar que tal corolário dicciona que “a quebra da empresa não é um fenômeno econômico que interessa apenas aos credores, mas sim, uma manifestação jurídico-econômica na qual o Estado tem interesse preponderante”[14]. Realce-se, neste cenário, que o ente estatal passa a conceder robusta importância a iniciativa empresarial, porquanto figura como instrumento importante para a saúde econômica de um país. Nada mais certo, na medida em que quanto maior a iniciativa privada em determinada localidade, maior o progresso econômico, diante do aquecimento da economia causado a partir da geração de empregos. “Motivo pelo qual, sempre que possível, deve-se manter o ativo da empresa livre de constrição judicial em processos individuais”[15].
Com singular propriedade, há que se trazer a lume o escol de Diniz, que, ao abordar o fito primevo da recuperação empresarial, expõe que:
“A recuperação é um instrumento legal para soerguer o empresário devedor em benefício dos credores, da economia e do empreendimento, como fonte de produção e de remoção das causas da crise econômico-financeira, conducente ao pagamento das dívidas, e, por isso, a LRE a privilegia em seus artigos, visto que a falência seria o último recurso legal para a solução da relação entre devedor e credores”[16].
À luz de tais valores, impende destacar que a Lei Nº. 11.101/2005[17] adotou, como opção prioritária, a preservação da empresa, cingindo sua análise como unidade produtiva, que alberga um sucedâneo heterogêneo de interesses, a saber: os interesses dos credores que ambicionam a realização de seus haveres; os dos prestadores que objetivam retorno dos investimentos; os da mão-de-obra que depende do emprego que possui; os dos sócios que possuem interesse na manutenção de suas quotas ou ações; os dos fornecedores que tem o interesse de receber seus créditos, mas que, concomitante, não querem perder o cliente; e, os da comunidade, que compreende a síntese de todos os demais interesses.
3 Recuperação Empresarial Judicial: Definição e Requisitos.
Em uma abordagem inaugural, calha pontuar que a recuperação judicial dá corpo à “possibilidade de superação da crise econômico-financeira do empresário, permitindo-lhe a continuidade de seu empreendimento, por meio de uma ação judicial”[18]. Trata-se, ergo, de uma ação judicial aforada com o escopo de sanear uma situação de crise, assim como ofertar garantia da sobrevivência da fonte produtora de bens e serviços, desde que reste consubstanciada a viabilidade econômica do empresário devedor.
Como bem pondera Lobato, a recuperação empresarial tem como almejo a harmonização dos interesses que são intrinsecamente conflituosos, “titularizados pelos credores, pelos empregados e pelo próprio devedor. Evitou o legislador, de modo deliberado, eleger os credores como os principais destinatários da recuperação judicial”[19]. A preferência privilegiada cinge-se à difícil tentativa de composição dos interesses econômicos das figuras envolvidas, subsistindo o estímulo à atividade econômica e o prestígio da função social da propriedade como paradigmas da recuperação judicial[20].
Impõe ponderar que a recuperação judicial ambiciona a manutenção da “unidade produtiva, restabelecendo as condições financeiras e comerciais da empresa, ou seja, é o princípio da preservação da empresa e dos empregos. O art. 47 da LRF impõe esse princípio como norteador da interpretação da lei”[21]. Assim, há que se frisar que a recuperação judicial busca a preservação da empresa que se revele economicamente viável, mesmo tendo em conta as dificuldades em que se encontra, mediante participação dos credores. Avulta ponderar, ainda, que haverá a interferência do Poder Judiciário e, em casos específicos, do órgão do Ministério Público. Impõe salientar que a empresa que não se encontre regularmente registrada na Junta Comercial não será considerada hábil ao pedido de homologação judicial do plano de recuperação. Em ocorrendo tal situação, “o juiz concederá ao requerente o prazo de dez dias para o suprimento de tal irregularidade, nos moldes do artigo 284 do Código de Processo Civil, sob pena de indeferimento do pedido”[22].
Insta pontuar, ainda, que a recuperação judicial deverá observar os requisitos enumerados no art. 48[23] da Lei de Recuperação Empresarial. O inciso primeiro do dispositivo supramencionado fixa como requisito a ser observado a condição de “não falido”. “A lei, nesse ato, faz menção ao empresário individual e aos sócios de responsabilidade ilimitada que se viram atingidos em seus bens pessoais com a execução concursal”[24]. Entretanto, há que se gizar que, caso esteja o empresário falido, não subsistirá tal óbice, desde que, por meio de sentença transitada em julgado, as obrigações decorrentes de tal ato tenham sido declaradas extintas.
Os incisos segundo e terceiro estabelecem, ainda, que para se utilizar da recuperação judicial há que se observar requisitos temporais. É erigido pelo inciso IV como exigência à concessão da homologação, não ter a empresa como sócio controlador ou administrador pessoa condenada por crime falimentar. “Caso o sócio ou administrador se vislumbre nessa hipótese, não será apreciada a viabilidade da recuperação da empresa em crise”[25].
Traz à baila o parágrafo único do dispositivo em destaque os legitimados para o pedido de recuperação judicial, sendo, inclusive, abrangido em tal dicção “não só o cônjuge supérstite e o herdeiro do falecido devedor, como também o inventariante ou o sócio remanescente”[26]. A justificativa plausível para o legislador incluir no rol ora mencionado tais figuras tem como ponto de arrimo o fato de tais entes, corriqueiramente, possuírem interesses colidente com os do empresário. “Para o respaldo desses interesses de modo célere e econômico é que se vislumbrou a legitimidade desses sujeitos de direito”[27].
4 Recuperação Empresarial Extrajudicial: Definição e Requisitos.
Em linhas inaugurais, faz-se cogente pontuar, a partir do substrato aduzido alhures, que a recuperação empresarial, em sua modalidade extrajudicial, é o instrumento criado pela legislação em exposição, por meio do qual o empresário devedor, que se encontra em situação de crise ou ainda que financeiramente esteja incapacitado, pactua um acordo, de modo direto, com alguns ou todos os seus credores[28]. Verifica-se, nesta senda, que o escopo a que se destina a recuperação extrajudicial junge-se na possibilidade do devedor alcançar a continuidade de sua atividade empresarial, como também o restabelecimento econômico-financeiro. Ao lado disso, há que se colacionar as lições estruturadas por Felsberg:
“Com a aprovação da nova lei, o devedor passa a ter condições especiais para pagar suas dívidas, além de poder convocar seus credores para negociações e elaboração do plano de reestruturação. A mudança representa um enorme avanço, propiciando condições adequadas à recuperação de empresas. A recuperação extrajudicial é um acordo celebrado entre o devedor e seus credores no âmbito privado, que deve ser homologado judicialmente quando da adesão de todos os credores ao plano ou de pelo menos três quintos de cada classe de credores sujeitos ao plano”[29].
Nessa trilha de exposição, o art. 161 da Lei Nº. 11.101/2005[30] introduziu no Ordenamento Jurídico Brasileiro um mecanismo que concede ao devedor empresário a possibilidade de convocar os credores que possui, com o intuito de ofertar uma maneira de composição de pagamento dos valores. Todavia, faz-se necessário pontuar que, para que o instrumento tenha assento, se deve preencher os requisitos enumerados na Lei de Recuperação Empresarial (LRE). Trata-se de “um instituto simples que pressupõe uma proposta prévia elaborada com o fim de dar transparência e segurança às negociações”[31].
Quadra realçar que, em um universo tão burocrático como o que o Direito encontra-se inserto, o instituto em tela revela-se como um mecanismo despido das formalidades de praxe ao devedor em crise. Valora-se, neste cenário, o resultado que se apresenta mais satisfatório às partes alcançadas pela avença, de modo que a empresa mantenha-se no mercado e que os créditos existentes estejam garantidos. “Tem-se por escopo impedir que haja falência”[32].
Dessarte, poderá o devedor convocar os credores, com o intuito de evitar o procedimento falimentar, ocasião em poderá apresentar um plano de renegociação, com o qual aqueles poderão manifestar sua concordância ou não. Ao lado disso, vale salientar que se denota a interferência estatal, no que pertine à recuperação extrajudicial, tão somente quando o acordo proposto pelo devedor é submetido ao âmbito judicial, com o escopo de ser homologado. “O Estado, como garantidor do bem comum, não deixa de zelar pela segurança e pela certeza das relações jurídicas, assim, o acordo homologado constitui-se título executivo judicial”[33]. Insta pontuar, também, que não subsiste qualquer vedação que a avença entabulada extrajudicialmente permaneça além dos limites judiciais, e seja de igual forma, devidamente cumprida.
Há que se rememorar, ainda, que, por expressa dicção da lei, o plano de recuperação supramencionado a iniciativa será do devedor. Todavia, tal acepção não resta coberta de caráter absoluto, vez que, em sendo recuperação extrajudicial, tal disposição não se apresenta como requisito indispensável, logo, não subsiste qualquer óbice que a iniciativa também advenha dos credores. Neste sedimento, cuida trazer à baila que, em decorrência da natureza simples que alicerça o instituto em comento, devido à flexibilidade das propostas estruturadas pelos particulares, o legislador estabeleceu certas restrições com o fito de dispensar proteção ao interesses do credores, evitando, de outra, a utilização indevida do instituto.
Nesse sentido, mister se revela a redação do §2º do art. 161 da Lei nº. 11.101/2005[34] que desfralda, como flâmula, a vedação de tratamento desigual aos credores não sujeitos ao plano, como também ao pagamento antecipado das dívidas. “O devedor não pode lançar mão da recuperação extrajudicial para dilapidar seu patrimônio, nem para beneficiar os credores mais poderosos em detrimento dos demais”[35]. Deste modo, a Legislação Falimentar traz à tona instrumentos que vedam a utilização da recuperação extrajudicial com o escopo de promover a dilapidação do patrimônio, nem mesmo para ofertar benefícios ao credores que detém maiores condições, prejudicando, por conseguintes, os demais.
Prima grifar, entrementes, que o tratamento diferenciado aos credores não se encontra vedado no texto legal. Ao contrário, vislumbra-se, a partir do exame dos dispositivos, “uma mitigação do princípio da par conditio creditorium, já que o plano pode ser confeccionado e negociado de forma livre entre as partes, sem que seja necessária a igualdade entre os acordos firmados”[36].
Conforme os artigos 162 e 163, parágrafo 6º, para o pleito da homologação é necessário que o devedor cumpra determinados pressupostos. A homologação do plano em juízo deve ser realizada através de instrumento próprio. A validade do instrumento vincula-se ao agente capaz, ao objeto lícito e à forma não defesa em lei. Assim, é necessária a apresentação do documento firmado pelas partes, com as respectivas assinaturas dos credores aderentes. O instrumento fixará o limite do acordo ao qual o credor se sujeitou, bem como as obrigações a serem prestadas pelo devedor. A lei exige, ainda, por parte do devedor, uma justificativa para o pedido7.
5 Comentário Final
Em uma ponderação final, no que pertine ao assunto em comento, pode-se destacar que o legislador, ao entalhar a Lei Nº. 11.101/2005, ambicionou promover a função social da empresa. Trata-se de mecanismo que refoge aos anseios e objetivos privados, arrimando-se, notadamente, no escopo de propiciar a mão-de-obra mecanismos aptos a assegurar a dignidade da pessoa humana.
Ao lado disso, a novel legislação de recuperação empresarial, consagrado pela legislação examinada no presente, traz consigo maciças contribuições para uma melhor organização da Ciência Jurídica, vez que estrutura mecanismos que fomentam a economia do país, ao tempo em que resguardam a empresa como núcleo de valoração da dignidade da pessoa humana dos trabalhadores e daqueles que mantêm relação de dependência. O que se observa com a promulgação da Lei Nº. 11.101/2005, é o atendimento de uma necessidade há muito existente, a saber: a manutenção da empresa como alicerce de promoção da dignidade da pessoa humana e instrumento apto a manutenção da saúde da economia.
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
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