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Conduta ilícita foi caracterizada como crime através da Lei nº 13.718, de 24 de setembro de 2018.
Não raras vezes, os veículos de comunicação noticiam sobre casos de importunação sexual. Na maior parte das situações, em comparação aos homens, as mulheres são vítimas com mais frequência.
Segundo o Código Penal Brasileiro (CP), a importunação sexual é definida como um ato de:
Art. 215-A – Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave.
(grifo nosso)
Conforme Bitencourt (2020, p. 80)[1], o crime abordado no artigo 215-A, do CP, está no rol “[…] de tipos penais de extraordinária importância, preenchendo importantes lacunas em nosso sistema penal, como deixaram claro os graves fatos ocorridos no interior dos meios de transportes públicos de São Paulo, com criminosos ejaculando, impunemente, em mulheres indefesas e comprimidas nesses locais, sem chance de defesa. […] Nessas hipóteses, a vítima ofendida fica impotente, sem qualquer possibilidade de reagir ou se defender pelo inesperado, pelo inusitado, pela surpresa da “agressão” sexual realizada pelo agente, para satisfazer a sua lascívia ou a de outrem”.
Observe, a seguir, os elementos constituintes e norteadores do tipo penal acima destacado:
Em vários processos que circulam pelas comarcas e tribunais do Brasil, nota-se a tentativa de desqualificar o crime de estupro de vulnerável para o de importunação sexual. Todavia, a diferenciação de cada um quanto ao dever jurídico impede essa manobra técnica. É o que aponta a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) através das três ementas abaixo:
HABEAS CORPUS – INSTÂNCIA – SUPRESSÃO. Revelando o habeas corpus parte única – o paciente, personificado pelo impetrante –, o instituto da supressão de instância há de ser tomado, no que visa beneficiá-la, com as cautelas próprias. ESTUPRO DE VULNERÁVEL – DESCLASSIFICAÇÃO – IMPORTUNAÇÃO SEXUAL – INADEQUAÇÃO. O tipo penal previsto no artigo 215-A do Código Penal, além de constituir crime subsidiário, insuscetível de afastar a configuração de delito mais grave, não alcança atos libidinosos cometidos contra vulneráveis, os quais não dispõem de capacidade para consentir a prática de condutas sexuais.
(HC 182075, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 08/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-155 DIVULG 19-06-2020 PUBLIC 22-06-2020)
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DO ART. 215-A DO CP. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO DECISUM. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A inexistência de argumentação apta a infirmar o julgamento monocrático conduz à manutenção da decisão recorrida. 2. As instâncias ordinárias, soberanas quanto à matéria fático-probatória, concluíram que a conduta praticada pelo paciente amolda-se ao tipo de estupro de vulnerável (art. 217-A do Código Penal), cuja previsão legal engloba tanto a prática de conjunção carnal quanto atos libidinosos com vítima menor de catorze anos. 3. Em se tratando de ato libidinoso praticado contra criança de dez anos de idade, incabível a desclassificação para o crime de importunação sexual (art. 215-A do CP). Precedentes. 4. Agravo regimental não provido.
(HC 172970 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 04/05/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-140 DIVULG 04-06-2020 PUBLIC 05-06-2020)
EMENTA AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. WRIT SUCEDÂNEO DE RECURSO OU REVISÃO CRIMINAL. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. INVIABILIDADE. CAUSA DE AUMENTO DA PENA PREVISTA NO ART. 226, II, DO CÓDIGO PENAL. AUTORIDADE DO AGRESSOR SOBRE A VÍTIMA VULNERÁVEL. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. 1. Inadmissível o emprego do habeas corpus como sucedâneo de recurso ou revisão criminal. Precedentes. 2. Para acolhimento da tese de desclassificação do delito, imprescindíveis o reexame e a valoração de fatos e provas, para o que não se presta a via eleita. Precedentes. 3. A Primeira Turma desta Suprema Corte, no julgamento do HC 134.591/SP, Redator para o acórdão Ministro Alexandre de Moraes, consignou que, sendo a vítima vulnerável, a conduta de manter conjunção carnal ou praticar qualquer ato libidinoso diverso configura o crime mais grave do artigo 217-A do Código Penal, independentemente da adesão da vítima ao ato. 4. A verificação da autoridade do agressor sobre a vítima para afastar a causa de aumento prevista no artigo 226, II, do Código Penal demanda necessário reexame de fatos, o que não se admite na via restrita do habeas corpus. Precedente. 5. Há relação de garante entre o agressor e a vítima vulnerável, na hipótese em que ele era responsável pelo transporte escolar que serviu de pretexto às agressões sexuais. 6. Agravo regimental conhecido e não provido.
(RHC 187445 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 08/03/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-068 DIVULG 09-04-2021 PUBLIC 12-04-2021)
As decisões supracitadas não acataram os pedidos das defesas, basicamente, por conta de ambos os crimes – estupro de vulnerável e importunação sexual – possuírem gradações de gravidade diversas, sendo entendido como mais grave o estupro de vulnerável. Além disso, as negativas dadas pelo STF às demandas ora em tela, se justificam em função da especificação de cada um dos delitos suscitados.
A importunação sexual é considerada um crime subsidiário. Isso quer dizer que, “[…] só se aplica se não houver a incidência de um tipo mais grave […]”.
A importunação sexual em números
Dados do Dossiê Mulher 2021 (ano-base 2020), elaborado pelo Instituto de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro (ISP-RJ), indicam que das 1.072 vítimas de importunação sexual no RJ, 92,5% (992) delas era mulher. Em comparação ao ano-base de 2019 – quando o número de vítimas mulheres chegou a 1.285 – houve uma diminuição de 22,8%.
No Distrito Federal, o cenário é semelhante. De acordo com o documento técnico emitido pela Secretaria de Estado da Segurança Pública da localidade, de janeiro a setembro de 2020 foram registrados 303 casos de importunação sexual. No mesmo período em 2021, esse número foi de 347. As ocorrências envolveram vítimas do sexo feminino e do masculino (com prevalência das mulheres) na faixa etária – em sua maioria – dos 18 aos 30 anos (48,8%). O lugar em que mais se observou a incidência do crime de importunação sexual foi no interior de transporte público (ou 33,1% do total de 347 casos registrados que abarcaram 424 vítimas.
Nas palavras Bitencourt (2020, p 80)[3], antes do advento da Lei nº 13.718, de 24 de setembro de 2018, “essas ações de indivíduos inescrupulosos, […], ejaculando, furtivamente, nas vítimas no interior de coletivos (trens, metrôs, ônibus etc.), não encontravam adequação típica nas molduras penais em vigor, vagando no universo sociojurídico brasileiro à procura de um tipo penal até então inexistente”.
A REGRA É CLARA:
Qual a diferença entre assédio sexual, estupro e importunação sexual?
Inicialmente, é importante destacar que assédio sexual, estupro e importunação sexual são crimes que, no âmago de suas existências, atentam contra a dignidade sexual de uma pessoa. Logo, saber distingui-los pode ajudar o indivíduo a reconhecer o tipo de violação da qual foi vítima. Adiante, examine o quadro criado pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro:
Como já vimos no começo deste artigo, a importunação sexual prevê pena de reclusão de um a cinco anos. Quanto ao assédio sexual, fala-se em detenção de um a dois anos.
Dos três delitos, o estupro é o que prediz a maior punição: reclusão de seis a dez anos. Se ele for praticado dentro do preceituado de vulnerabilidade contido no artigo 217-A, a pena será oito a 15 anos de reclusão. Sobre o estupro de vulnerável, a Súmula 593 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) diz que
[…] se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.
(grifo nosso)
Logo, vale o alerta para homens e mulheres: em época de festividades (como as de fim de ano e de Carnaval) ou fora delas… no cotidiano puro e simples… NÃO É NÃO!
Parceria no combate à importunação sexual
Está no ar desde o dia 21 de setembro de 2020, uma página na Internet intitulada Lei de Importunação Sexual (LIS). O site é resultado de uma parceria entre a ONG Think Olga e o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3).
A ação fez parte da Jornada LIS – Lei de Importunação Sexual e resultou na elaboração (pela ONG Think Olga) de uma cartilha com informações relacionadas à Lei nº 13.718/2018 e números em torno da violência sexual cometida contra as mulheres.
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O Projeto de Lei nº 82/2021 e seu papel na oposição à importunação sexual
No dia 17 de novembro do ano passado, em reunião deliberativa na Câmara dos Deputados, a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (CMULHER) aprovou o Projeto de Lei nº 82/2021, de autoria do parlamentar Alexandre Frota (PSDB/SP). Desde dezembro, contudo, encontra-se em avaliação junto à Comissão de Viação e Transportes (CVT).
Em suma, dentre as medidas propostas no PL apresentado anteriormente estão: “criar campanhas educativas para estimular denúncias de violência contra a mulher” e “conscientizar a população sobre a importância de denunciar as práticas de violência contra a mulher à autoridade competente”.
Sofreu (ou presenciou) um ato de importunação sexual? Denuncie!
Nas circunstâncias em que o crime de importunação sexual ocorrer dentro de um ônibus, o (a) motorista deve ser informado (a) do fato para que o indivíduo importunador não fuja, as autoridades policiais sejam comunicadas acerca do crime e sejam tomadas as providências necessárias. Caso a conduta ilícita flagrada se dê em vagão de metrô, populares podem interceder, contatar os seguranças da estação e, estes, encaminharem o caso para polícia.
A criação da Lei nº 13.718/2018 (ou Lei de Importunação Sexual) propiciou que vítimas tocadas com a mão em pontos íntimos de seus corpos, encoxadas, ou, por exemplo, que tenham tido suas vestes manchadas pelo feito de ejacular do agressor – nas ruas ou em transportes públicos – não mais se silenciassem.
A tipificação da importunação sexual enquanto crime foi fundamental para coibir e punir todo e qualquer movimento que desrespeite a intimidade de alguém. Portanto, na observância de práticas delituosas que violem a liberdade sexual, é possível contatar os seguintes canais:
– Central de Atendimento à Mulher (180);
– Guarda Municipal (153);
– Polícia Militar (190);
– Disque-Denúncia (181);
– Disque Direitos Humanos (100).
– Nas delegacias civis gerais, de atendimento à mulher ou, ainda, nas especializadas em crimes cibernéticos de cada município.
Por fim, lembre-se: procure, sempre, a correta identificação da pessoa agressora (seja por meio de imagens de câmeras de segurança, vídeos ou fotos feitas com celular). Ela é crucial para o registro do Boletim de Ocorrência (BO) e sequencial indiciamento daquele (a) que cometeu o ato delituoso.
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[1] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal 4: crimes contra a dignidade sexual até crimes contra a fé pública. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
[2] A Internet também é terreno fértil para a ação de importunadores (as) sexuais. Mídias digitais – tais como o Facebook, Instagram e WhatsApp – são usadas para envio de fotos e vídeos de cunho erótico sem que sejam solicitadas.
[3] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal 4: crimes contra a dignidade sexual até crimes contra a fé pública. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
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