Thiago dos Santos Dias[1]
Resumo: Esta dissertação tem por objetivo geral estudar e reavivar os ensinamentos acerca da obra do Jusfilósofo e teólogo de Paris, Tomás de Aquino, e analisar como sua obra “Summa Theologiae”, além de ser uma obra religiosa, é, acima de tudo, um tratado extremamente importante para o estabelecimento do Direito Constitucional e dos Direitos Humanos, tendo influenciado o sistema político interno em vários países ocidentais e resultado na elaboração de análises na política internacional, através da sua influência na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que moldou o Direito Internacional por meio do estudo da história do desenvolvimento jurídico e filosófico do conceito de Direitos Humanos, assim como o Brasil, inicialmente nas organizações internacionais, posteriormente internalizou características daquela Declaração Universal em sua Constituição de 1988, bem como isso afetou a forma como veio a participar da Organização das Nações Unidas, São examinados os principais pontos assumidos pelos jusfilósofos na Idade Moderna e Contemporânea e como o resgate dos conceitos de Aquino foram reestabelecidos no Direito após os horrores da Segunda-Guerra, permitindo uma nova interpretação constitucional, sendo Direito Natural, mas este que apoia o Direito Positivo, afastando a retórica positivista mais agressiva de “dura lex, sed lex”. Do trabalho, conclui-se que o Direito Constitucional tem sob a influência dos conceitos de Tomás de Aquino base sólida para fundamentar a necessidade de proteção dos Direitos Humanos.
Palavras-chave: Tomás de Aquino. Direito Constitucional. Direitos Humanos. Direito Natural.
Abstract: This dissertation aims to study and revive the teachings about the work of jusphilosopher and theologian of Paris, Thomas Aquinas, and to analyze how his work “Summa Theologiae”, besides being a religious work, is, above all, a treatise extremely important for the establishment of Constitutional Law and Human Rights, having influenced the internal political system in several western countries and resulted in the analysis of international politics through its influence on the Universal Declaration of Human Rights, which shaped International Law by the study of the history of the juridical and philosophical development of the concept of Human Rights, just as Brazil, initially in international organizations, later internalized characteristics of that Universal Declaration in its Constitution of 1988, as well as this affected the way in which it came to participate in the Organization of the United Nations, are the main points assumed by the philosophers in the Modern and Contemporary Age and how the rescue of the concepts of Aquinas were reestablished in the Law after the horrors of the Second War, allowing a new constitutional interpretation, being Natural Law, but this one that supports the Positive Law, moving away from the more aggressive positivist rhetoric of “dura lex, sed lex”. From the work, it is concluded that Constitutional Law has under the influence of the concepts of Thomas Aquinas solid foundation to substantiate the need for protection of Human Rights.
Keywords: Thomas Aquinas. Constitutional Law. Human Rights. Natural Law.
Sumário: Introdução. 1. Tomás de Aquino. 2. O Direito e a Lei. 3. Direito Natural e Direito Positivo. 4. O Direito em Tomás de Aquino: Constitucionalidade e Direitos Humanos. 4.1 Direitos Humanos no ordenamento jurídico. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Esta brevíssima monografia é resultado de um trabalho mais amplo sobre o desenvolvimento dos organismos multilaterais mantenedores da Paz, atualmente a Organização das Nações Unidas (ONU), todavia, durante a pesquisa, necessitou-se buscar bases mais sólidas para a questão do respeito às leis e às Constituições nacionais, o que levou ao estudo das bases do Direito Constitucional do pós-guerra, qual seja, um Direito pátrio cuja preocupação com os Direitos Humanos está positivada. Doutor da Igreja, Tomás de Aquino é lido e relido nos cursos de Filosofia e Teologia no Ocidente, também o Direito há muito recordou o autor e a importância de sua obra para a compreensão de vários conceitos, ademais da influência grega, especialmente aristotélica, sobre seu trabalho.
Neste contexto filosófico e conceitual é que a Suma Teológica, principal obra do chamado Doutor Angélico, pode alcançar filósofos e juristas já na Idade Média e apreendido por autores iluministas, em que pese o combate a suas ideias naquele mesmo período, e resgatado no fim do século XIX por invocação do Papa Leão XIII na encíclica Aeterni Patris no ano de 1879 que exortava a leitura dos estudos do grande Teólogo da Igreja Católica. Resgatado previamente pela escolástica espanhola e, após a iniciativa de Leão XIII, estudado por acadêmicos no século XX, a filosofia tomista e sua teoria do Direito Natural será a pedra de toque para a elaboração de teses e a fundamentação dos Direitos Humanos realizada por Jacques Maritain, um dos autores da Declaração Universal dos Direitos Humanos, após a fundação da ONU.
A pesquisa aponta qual o papel de Tomás de Aquino e da Igreja, instituição da qual fazia parte, na preservação dos Direitos Humanos – a despeito dos excessos, crimes e abusos cometidos por membros da instituição religiosa portadora do monopólio da Fé no Ocidente até a Reforma Protestante – pelo seu trabalho os filósofos iluministas estenderam o debate sobre Moral, Dever e Direito. A terminologia e sua relevância foram alçadas novamente a um papel de importância no debate jurídico e filosófico após as consequências da Segunda Guerra Mundial e os crimes cometidos pelos regimes totalitários apoiados por interpretações extremamente positivistas acerca da lei.
O tema está primordialmente relacionado ao Direito Constitucional visto que direitos e garantias, além de qual papel o Estado pode assumir perante todos, é objeto da matéria que não raro se concentra na Magna Carta inglesa ou no desenvolvimento do Direito após as Revoluções Americana e Francesa. Esquecemos, muitas vezes, de trazer para o Direito Constitucional o debate realizado pela Filosofia do Direito, se considerarmos a divisão metodológica racionalizada do Direito, que é uno. Analisada pela perspectiva das dimensões ou gerações[2], os direitos fundamentais se originaram dos pleitos por liberdade, foram associados aos direitos de igualdade e, posteriormente, sendo relacionados aos direitos de fraternidade, contudo, os direitos humanos poderiam se enquadrar em todas essas chamadas dimensões, sob uma leitura tomista, o que é objeto desta monografia.
Destarte, também em razão das mudanças pelas quais passou o mundo após a Segunda Guerra, bem como, o Brasil, após o regime militar e a fase histórica da redemocratização, entendeu-se útil e necessário realizarmos trabalho de pesquisa sobre a influência que Tomás de Aquino teve para o desenvolvimento do Direito e o resgate de certos pilares que podem auxiliar na interpretação e fundamentação dos Direitos Fundamentais no século XXI.
Aquele que viria receber a alcunha de Doutor Angélico, Tomás de Aquino, foi um padre da Ordem de São Domingos, um Dominicano, o que em si já representa muito já que esta ordem fundada no começo do século XIII para combater doutrinas divergentes da teologia canônica e do pensamento filosófico como os cátaros. A Ordem recebeu a denominação de Ordem dos Pregadores em razão da sua missão apostólica de pregar, esclarecer e guiar os fieis na Fé Católica a partir da atuação do Papa Honório III, em 1216, que dá a Domingos de Gusmão o aval para a expansão de um empreendimento de reforma e fortalecimento da noção de cristandade.
Apoiados pela sua formação teológica, filosófica e jurídica de alto nível, os Dominicanos são selecionados para o trabalho que veio a lhes marcar profundamente de forma bastante negativa, qual seja, a Inquisição Romana, através do mandamento do Papa Gregório IX em 1234. O sistema repressor inquisitorial ficou profundamente marcado pelo auxilio e atuação dos Dominicanos neste regime de exceção, ao qual infelizmente um de seus membros se tornou símbolo, Frei Tomás de Torquemada (1420-1498), que ousava se comparar com o fundador da Ordem, São Domingos, como ensina o frei dominicano Carlos Josaphat[3].
Impossível, para o leitor, portanto, imaginar a origem de Tomás de Aquino dentro desta ordem religiosa, mas, sim, na segunda geração daquela importante instituição é que o Doutor Angélico realizará seus estudos e poderá desenvolver seu intelecto, como afirma Michel Villey (2005) informando sobre a formação do Doutor da Igreja, nascido em Roccasecca, próximo à Nápoles, Itália, possivelmente entre 1224 e 1226. Proveniente da Aristocracia italiana, já criança foi bem instruído e provido de alto nível intelectual nas ciências da época, como a gramática latina e a aritmética, vivendo próximo ao Mosteiro beneditino de Monte Cassino, fundado por São Bento no século VI.
Introduzido nos estudos filosóficos na Universidade de Nápoles, Tomás de Aquino pode conhecer as obras de Aristóteles, ainda pouco conhecido pela academia europeia medieval e resgatado pelos estudiosos árabes. Na mesma instituição toma conhecimento da ordem dominicana, conhecida como ordem mendicante, assim como a ordem de São Francisco de Assis, que observa o preceito evangélico da pobreza, à luz do exemplo de Jesus Cristo, impondo aos seus membros viverem de doações, em um contexto de restauração dos preceitos dos Evangelhos dentro da Igreja. Tomás de Aquino, ainda em Nápoles, se destaca nas matérias à época estudadas nas artes liberais, quais sejam, trivium (gramática, lógica e retórica) e quadrivium (aritmética, geometria, astronomia e música). Indo contra os intentos de sua família que planejava que se tornasse monge beneditino, eventualmente abade, de instrumental importância no cenário político à época, o Doutor Angélico buscou outro caminho, em que pese a resistência que teria resultado inclusive em sequestro segundo algumas biografias e fontes.[4]
Desejoso em ingressar na ordem religiosa recém-fundada nos preceitos da pregação e do ensino, Tomás de Aquino é logo aceito na Ordem Dominicana e enviado para ter lições com São Alberto Magno, então Professor da Universidade de Paris, com quem foi para a Universidade Colônia, na atual Alemanha, e apreendeu sobre Aristóteles à luz dos estudos de Ibn Sina (Avicena), mas não somente, como aponta Antônio Fernandes Nascimento Júnior (2003) em artigo:
Também influenciado pelo Aristóteles árabe-judeu foi Alberto Magno, profundamente interessado nos conhecimentos desses povos não cristãos. Alberto precedeu e preparou os trabalhos de Tomás de Aquino que também sofreu a influência de Averróis e Maimônides para, mais tarde, construir sua própria interpretação de Aristóteles e criticar o averroismo em seu Compêndio de Teologia (1260). Este recuperou a idéia de Aristóteles, sua física, sua metafísica e sua metodologia (p. 287).
Posteriormente às lições com Alberto Magno, São Tomás de Aquino pode voltar para a Universidade de Paris e se tornar Mestre de Teologia, ou seja, professor daquela instituição.
O jovem religioso ao lecionar em Paris elabora suas primeiras obras, previamente à Suma Teológica, dentre elas, De Veritate e Contra impugnantes Dei cultum et religionem. No contexto conflituoso de ideias e heresias[5] acerca dos cátaros ou de interpretações acerca das obras de Aristóteles, escreve sua Summa Contra Gentiles.
Importante observação deve ser feita sobre os estudos sobre Aristóteles já que se tornara desconhecido na Europa cristã por quase um milênio, porém reintroduzido graças ao intercâmbio com os árabes, mediante os comentários de Ibn Sina (Avicena) e Ibn Rushd (Averróis). Aquele autor, aliás, inspirou muito do trabalho de Tomás de Aquino, pelos comentários das obras de Aristóteles, o que, aliás, denota o quão multifacetada pode ser a contribuição intelectual de um povo, a despeito da negação de correntes ideológicas contrárias ao pensamento divergente. O grande medievalista e professor Carlos Arthur Ribeiro do Nascimento a isso diz:
Dentro do movimento da Escolástica, fenômeno iniciado no século IX, com os contatos entre árabes e cristãos, ocorre o renascimento da cultura europeia, especialmente dentro do contexto de convivência harmônica que existiu em determinados momentos na Península Ibérica muçulmana, permitindo intercâmbio pacífico de ideias e encontro de tradutores que puderam conhecer as obras gregas e do Oriente islâmico (Nascimento Junior, 2003). Sob esta perspectiva e iluminados pelo conhecimento grego reencontrado, o Ocidente europeu converte as ciências chamadas profanas em meios diversos para o conhecimento da natureza e da experiência natural de Deus.
No cenário de progressismo e intelectualidade, a estrutura das recém-fundadas universidades no século XIII reúne uma série de estudiosos, o que, sem o controle episcopal posterior, em razão da ascensão de corporações de ofício e da própria organização dos estudantes. Na natural e corrente disputa de poder entre monarcas e papas, Terezinha Oliveira dispõe:
No início do século XIII, o papa e os príncipes encaravam essas instituições como importantes pontos de apoio político e cultural. Em função disso, editaram leis e bulas com o objetivo de instituí-las, protegê-las e nelas intervir, tanto no ensino como nas relações entre estudantes e mestres e entre estes e a comunidade. As principais universidades do século XIII, Paris e Bolonha, foram criadas por essas autoridades. Dois grandes exemplos da influência desses poderes na organização da universidade medieval são a Authentica Habita, de Frederico Barba Roxa, de 1158, e a bula de Gregório IX intitulada Parens scientiarum universitas, de 1231. Ambas foram promulgadas para proteger a vida e os interesses dos estudantes e mestres e para organizar a vida acadêmica.[7]
Destarte, em uma compreensão do contexto de renascimento cultural e da Alta Escolástica[8], está formado o quadro para a apropriação de conceitos gregos, estudo da filosofia, inicialmente sob a influência de pensadores árabes como Avicena, e da expansão dos conhecimentos para outras áreas de estudo dentro das artes liberais, questionando-se a natureza do ser, formação do universo entre outros temas, não se furtando da questão teológica, que sempre permeava o cotidiano dos estudiosos daquele período, sendo que pelas obras neoplatônicas e aristotélicas, chega-se a novas interpretações acerca da formação e da teologia cristã, trabalho realizado séculos antes por Agostinho, todavia, à luz da obra de Platão, o que entrará em confronto séculos mais tarde na Reforma Protestante.
A filosofia grega reingressa ao Ocidente, pouco a pouco, influenciando o pensamento teológico, à época predominante, o que transborda para outras áreas do saber humano ocidental, dominando inicialmente o espaço dos debates acadêmicos jurídicos, mas que, graças ao trabalho árabe, permeia a incipiente medicina. É no Direito que esta monografia deseja focar, a despeito de toda esta introdução capitular bastante necessária para a compreensão histórica e do tempo, ao que Jacques Le Goff em magistério reconhecido ilustrava ser a composição da interpretação dos fenômenos da natureza e das comemorações das festas religiosas (2006, p. 531), evidente e memorável presença na Liturgia das Horas, orações cantadas ou rezadas durante determinadas horas do dia, hoje conhecida apenas pelos religiosos.
A intelectualidade agora ilustrada pela filosofia pré-cristã, de predominante viés aristotélico em oposição ao método platônico e sua interpretação por Agostinho de Hipona, de cunho mais místico e pelas leituras dos evangelhos, torna-se solo fértil para a mente de Tomás de Aquino, instruído por Alberto Magno. Em um jogo de palavras, a mente de Tomás de Aquino fora um grande campo onde floresceram várias ideias há muito esquecidas e que foram aceitas sob uma nova interpretação deveras mais tolerante e confluente com os ensinamentos cristãos.
Destarte, a Escolástica, como movimento medieval da intelectualidade filosófico-teológica e reparados da separação entre fé e razão, já que grande elo entre ambos na busca da conciliação, dentro da divisão que pode ser feita sobre suas fases, pode ser representada, em torno do conhecimento antes de Tomás de A quino, com Tomás e posteriormente ao jusfilósofo. Entre os séculos IX ao início da metade do XIII, em que vige uma corrente de pensamento platônica reinterpretada por Santo Agostinho, numa fase prévia a São Tomás de Aquino; em um segundo momento, (metade do século XII) com a presença e figura viva de Tomás de Aquino, é que se encontra em voga o debate filosófico de Aristóteles em reunião com a teologia cristã e o conceito de justiça; por fim, na terceira e última fase (séculos XIV e XV) que veio a ser conhecido como pós-tomismo, já no fim do movimento da escolástica e o retorno às ideias da metafísica agostiniana, formando a base do pensamento moderno e influenciador da Reforma Protestante.[9]
Ainda jovem, no ano de 1265, em um período em que atuou na Cúria Romana, sede administrativa da Igreja, Tomás de Aquino ampliou e redigiu seus Comentários a Aristóteles e, em razão da didática desafiante que era comentar o Livro das Sentenças de Pedro Lombardo para os alunos em Roma, o que fez com que redigisse um texto didático para o ensino teológico aos estudantes, qual seja, a Summa Theologiae, nesta sua obra é que vai reunir as bases da teologia católica até hoje e que tratamos como fundamento para a questão e natureza dos direitos humanos. Após problemas doutrinários na Universidade de Paris, recebe a missão de retornar ao centro escolástico e expor sobre o pensamento aristotélico sob sua perspectiva conciliadora dos princípios da cristandade, depois segue para um período na Universidade de Nápoles. No ano de 1274, após convocação para um concílio, é abatido por uma doença e encaminhado para a abadia cisterciense de Fossanova, vindo a falecer aos 49 anos no sétimo dia de março daquele ano[10].
Em 1323, 49 anos após a morte do Doutor Angélico, o papa João XXII o canoniza, e é no ano de 1567 que outro papa – este de origem dominicana, mesma ordem de São Tomás – Pio V, o declara Doutor da Igreja em reconhecimento ao trabalho teológico, filosófico e jurídico prestado por Tomás de Aquino ao Ocidente cristão, com vistas a incentivar uma interpretação condizente do cristianismo que pudesse combater a Reforma Protestante instalada.
Tomás de Aquino, seguindo as instruções de Alberto Magno, tratou da questão do direito e donde provinha, dissertando sobre o direito natural, tema debatido por gregos e romanos antes da era cristã.
Quando se estuda a obra de Tomás de Aquino e seu trabalho sobre o direito e a lei deve estar presente e necessário se apoiar em uma simples regra e uma única interpretação, qual seja, a de que a lei e o direito não se assemelham, em que pese serem complementares, ou seja, no estudo Tomista está, assim como já se discutiam em Roma, apartado uma interpretação de que direito e lei são iguais, pois, como leciona na Suma Teológica, o conhecimento e a aplicação da lei não são suficientes para resumir o conceito de direito.
Para que o entendimento do pensamento tomista seja completo será necessário realizar uma inversão estrutural na Suma Teológica, apresentando primeiramente a relação entre o direito e a justiça e, posteriormente, a relação destes conceitos com as diversas leis.
Tomás de Aquino separou os conceitos de lei e direito dentro da Suma Teológica, sendo que na Parte I da Suma, quanto às questões de Deus, a lei está debatida na Seção I da Parte II, cujo tema é o homem e as leis são instrumentos divinos para a educação e sua pedagogia, como diz Voegelin[11]. Quanto ao direito, sua análise é feita na Seção II, Parte II, quando o doutor angélico aborda as virtudes cardeais – prudência, justiça, fortaleza e temperança – sendo o direito um elemento hierarquicamente associado à justiça, mas que nos remete ao conceito de justiça, especialmente àquela ensinada pelos gregos, exposta por Aristóteles, dar a cada pessoa aquilo que lhe é devido[12].
Além da situação geográfica dentro da Suma Teológica ser notória, a própria desconexão entre lei e direito já ressalta aos olhos, estando o direito mais próximo à justiça, correspondendo a modelo diametralmente oposto à dogmática positivista atual, que associa direito à lei, sendo o direito a lei, como defende Bobbio[13] ou Kelsen em sua Teoria Pura do Direito[14]. Tomás de Aquino não inova a dicotomia, mas a renova, apoiado na concepção aristotélica, colocando direito (Ius) e justiça (Iustitiae)[15] em associação dada a discussão que realiza sobre o que é ou não justo.
Para Tomás de Aquino, aquilo que era o justo no caso concreto, conforme o pensamento da filosofia clássica, um direito objetivo, diverso do Positivismo jurídico posterior. O direito seria a res justa, a coisa justa, presente na realidade natural a que os homens estão expostos, ou seja, o seu aqui e agora, seu presente. A justiça, virtude, consistiria em dar a cada um o que lhe é devido, sendo seu objetivo fazer a coisa certa, conforme expõem Pinheiro e Souza:
Para proceder tal atribuição do justo é necessária, portanto, uma concepção de igualdade. Então, conclui Tomás de Aquino, o fundamento da igualdade caracteriza o direito. A igualdade pode ser em virtude da natureza da coisa ou pode ser uma igualdade convencional (por uma convenção pública ou particular). Quando o justo funda-se em uma igualdade que não depende da vontade humana (quer de um indivíduo, quer de um povo), trata-se do direito natural. Quando, por outro lado, o justo decorre de uma convenção, tem-se o direito positivo (AQUINO, 2015, II-II, q. 57).[16]
Vive na obra de Tomás de Aquino, portanto, a lógica de que não se confunde o fundamento do direito e da lei. Sendo, o direito a expressão do justo a se concretizar, mas onde estaria a lei? O direito, agora sabemos, é a separação de bens entre as pessoas, e a justiça habita ou se encontra em atribuir aquilo que pertence a cada um, e a lei é primordial poia é o instrumento dado aos homens para aplicar o método pelo qual seguiremos, que nos orientará para fazer o justo. O doutor angélico ainda leciona que a lei tem um objetivo ainda mais amplo que definir o direito, ela é um instrumento divino que move exteriormente o homem ao bem (AQUINO, 2015, I-II, q. 90).
Em obra sobre a natureza do direito, deve-se registrar a crítica de Hans Kelsen à ideia de justiça de Aristóteles, acolhida por Tomás de Aquino, que indaga se a justiça é o meio-termo, ou seja, se localiza em posição geográfica equidistante, em termos mensuráveis, seria, então, injusto uma das pontas desta reta, do que poderíamos chamar o outro extremo?[17]
Em determinado trecho da Summa, o Tratado da Justiça, como ficou conhecido, está presente na questão 59, da segunda seção da segunda parte da Suma Teológica, o Professor de Paris passa seu magistério em quatro artigos sobre justiça e injustiça. Didaticamente, como em toda a sua obra-prima, pergunta sobre a natureza da injustiça ser ou não um vício; se a possibilidade de cometer algum ato injusto seria próprio dos homens injustos ou passível de ser cometido por justos também; se é possível alguém se tornar vítima da injustiça de forma voluntária; e se a injustiça seria uma forma de manifestação do pecado mortal em si.
Para essas indagações, Tomás de Aquino há de responder que a injustiça pode ocorrer, se manifestar de duas formas, quais sejam, a primeira, de maneira ilegal, a qual se contrapõe à justiça legal; e a segunda, que não mais debate o papel da lei, mas da equidade, do proceder com equilíbrio e justeza, logo, quando há falta de equidade para com o outro. Por fim, afirma, que não importa como se manifestem ou quais sentidos possam ter, é sempre um vício a realização de uma injustiça.
Naquela manifestação de injustiça, qual seja, a injustiça legal, há evidente conduta de desprezo pelo bem comum, abrindo possibilidade de se tornar um vício geral, pois quando se nega, afasta o bem comum, o homem haveria a ser conduzido a outros pecados, na linguagem teológica. De outro lado, quanto à ausência de equidade, Tomás de Aquino trata da injustiça como uma prática individual, um vício particular que vai de encontro à justiça particular, exemplificando no indivíduo que almeja ter mais riquezas que os outros, porém sem o esforço necessário para aquela riqueza que tanto intenta, ou seja, sem o mérito necessário nos seus atos, em demérito aos outros indivíduos que labutam no seu trabalho.
Quando responde se seria possível que uma pessoa viesse a sofrer injustiça de forma voluntária, ou seja, buscasse se tornar vítima do ato injusto, seu magistério inicia apartando o que é ser vítima da injustiça daquilo que seria praticá-la para, consecutivamente, defender a impossibilidade de alguém praticar injustiça a não ser com vontade, com a real intenção de o fazê-lo, de outro lado, não seria possível alguém se tornar vítima de uma injustiça a não ser que fosse contrário ao seu intento. Destarte, não é capaz alguém se tornar vítima de injustiça querendo sê-lo, pois não seria injusto, e sim mero ato calculado, analisado por um juízo individual, prática racional; em outra perspectiva, não há como se praticar o injusto sem querê-lo, dependendo da sua voluntariedade, restando a tese de que a injustiça se opõe à vontade da pessoa. A relação, ademais, entre o direito, justiça e a lei, após explanarmos sobre o justo, foi sintetizada por Pinheiro e Souza nestes termos:
É nesse ponto que há a conexão entre o direito, a justiça e a lei. Sendo a justiça o hábito de realizar o justo, isto é, de aplicar o direito, é necessário um título e uma medida que definam o que é o direito. Retoma-se, assim, a questão da igualdade. Deve existir um padrão que defina a igualdade e, dessa forma, o direito que cabe a cada um. (…) A necessidade desse título é de caráter lógico. O direito positivo, como visto, pressupõe um critério de justiça. Portanto, o justo é anterior ao direito positivo. Por sua vez, a justiça dá a cada um o que é seu. Portanto, há um direito de outra ordem anterior à justiça, o direito natural. Contudo, esse direito pressupõe uma atribuição de cada coisa ao seu titular, uma divisão. Esse ato primeiro é realizado pela lei natural.[18]
De início expliquemos que, para o jusfilósofo dominicano, a lei é essencialmente uma manifestação da razão e não da vontade — ainda que se trate da lei humana (AQUINO, 2015, I-II, q. 90). Pertence à razão, pois a razão é “a regra e a medida dos atos humanos” e, por sua vez, “a lei é certa regra e medida dos atos, segundo a qual alguém é levado a agir, ou a apartar-se da ação” (AQUINO, 2015, I-II, q. 90, a. 1). O doutor angélico, ainda na questão 90, defende que a racionalidade da lei é direcionada à ordenação para o bem comum, não ignorando, todavia, fins privados (AQUINO, 2015, I-II, q. 90).
Conceitos rasos ou simples para um jurista de boa formação filosófica, mas que um dos autores do século XX, o filósofo Javier Hervada, foi instado a resgatar na obra tomista aplicada ao Direito, introduzindo seus leitores e alunos em sua obra de Filosofia do Direito dizendo:
O autor entende que o positivismo normativista – em suas variantes formalistas e sociologistas – é uma etapa mórbida da ciência jurídica em fase de superação; e é insensível às ciladas do pós-positivismo, que em sua opinião mais agrava do que cura a doença. Pelo contrário, o autor está convencido da necessidade de voltar ao pensamento jurídico clássico, a Aristóteles, aos juristas romanos e a Tomás de Aquino. E, é claro, à metafísica. Justamente ao pensamento pelo qual a modernidade mostrou um profundo e visceral desdém, acompanhado – é preciso dizer tudo – de uma não menos profunda ignorância sobre ele.[19]
Movimento, entretanto, que tinha o objetivo de combater as teses positivistas do século XIX e as ideias de que Direito é Lei e a Lei é o Direito, para alguns doutrinadores algo simplista e arriscado, o que acabou se comprovando com as práticas deturpadas de alguns sistemas jurídicos. Todavia, Norberto Bobbio vê na Lei a segurança necessária para a realização do Direito, sem apegos metafísicos ou a natureza política do aplicador do direito.
Em De Lege (STh Ia-IIae, questões 90 a 108), o jusfilósofo católico inicia um debate bastante pedagógico, falando com o aluno, interagindo com o leitor e, por óbvio e fruto de sua realidade, época e status, pregando aos fieis de forma que vem a impressionar mesmo os estudiosos contemporâneos pela didática em abordar temas e clarear conceitos nebulosos ou justificar uma metafísica desconectada de exemplos materiais, dada sua natureza, como aponta De Boni:
…julgo pertinente enunciar dois princípios hermenêuticos que considero quase de senso-comum, mas que nem sempre são levados na devida consideração. O primeiro deles: a leitura é uma espécie de diálogo e toma como pressuposto que há uma comunidade de compreensão ao tratarmos de determinado tema, isto é, meu interlocutor e eu supomos que as leituras diferentes que possamos fazer possuem algo em comum, graças ao qual nos podemos. comunicar; que compartilhamos de noções comuns, capazes de tornar nossa conversa algo mais do que um diálogo entre surdos. Em segundo lugar: não se pode esquecer que um texto, ao ser entregue ao público, cria vida própria, torna-se independente, permite níveis de leitura diferentes, cuja validade não pode ser apreciada tão somente a partir do que se poderia chamar de intenção do autor.[20]
Estão nas questões 90 a 97 o pilar estrutural, a pedra fundamental da ciência política e da teoria do direito tomasiana. Naquelas questões habitam o pensamento filosófico medieval cristão que ainda guiam a estrutura da Santa Sé – como pessoa jurídica de direito público internacional – e da Igreja Católica de Roma. Naquelas questões Tomás de Aquino leciona as distinções de lei, uma hierarquia de leis, como se pudéssemos analisar em uma inapropriada comparação com aquilo que veio a ser conhecido como “pirâmide de Kelsen”.
As leis são instrumentos dados aos homens para a realização do bem comum na terra, mediante a providência divina – aquilo que nos seria dado por Deus – e seriam, segundo algumas interpretações, seis as espécies de lei ou, digamos, níveis de leis, quais sejam, a lei eterna, a lei natural, a lei humana, a lei divina antiga, a lei divina nova e a lei do pecado; majoritariamente, porém, se estudam quatro espécies, a lei eterna, a lei natural, a lei humana e a lei divina. Esta classificação tomasiana está baseada na defesa de que inicialmente há uma ordem na criação universal e do mundo e que sua necessidade se dá para a finalidade do bem comum e a harmonia entre as criaturas, conforme o objetivo esperado pelo Criador e emanado dele. Esta ordem natural é resultado de um Logos Divino, uma razão que nos guia para a finalidade do bem comum que visa alcançar a plenitude humana e o máximo de nossas faculdades.
Se esta ordem provém do Logos Divino, da razão do Criador, estaria, portanto, na raiz a lei eterna cuja essência seria o governar do Logos acima do universo, atemporal, estando em tudo, sobre e sob, incondicionado a uma unidade de tempo, assim defende Tomás de Aquino na sua questão 91, avançando para o conceito de lei natural que seria a manifestação da razão para os homens, habilitando-nos a diferenciar e apreender o bem e o mal.
Se fosse possível analisarmos a classificação tomasiana sob uma perspectiva “a-teológica”, ou seja, apartada do embasamento teológico, ainda assim poderíamos entender que a ordem é o que permite uma convivência menos conflituosa entre os humanos, seres gregários, que teriam se unido por uma série de fatores para a melhor cooperação, estabelecendo regras para sua coabitação, evitando arriscar seu fim como espécie através de um quadro de regras estabelecidas a partir da necessidade e da prevenção de atos, conforme a experiência adquirida, sob uma hipótese empírica, como argumentam vários juristas da Escola Positiva.
Entretanto, um problema surge nesta afirmação, como os homens reconhecem desde tenra idade que determinados limites não podem ser ultrapassados e que são atos extremos, como o homicídio ou não ser justo para com os outros, independente das leis positivas? O doutor angélico aponta que seria esta ordem preexistente ao indivíduo que já obstaculiza a criatividade do homem na elaboração do direito, em razão de não ser necessário prever algumas regras para que os homens pudessem saber o que ou não fazer quanto a determinados comportamentos, pois habita no homem ab initio a busca do bem comum e da sua finalidade de plenitude (AQUINO, 2015, I-II, q.91), bem como explica o Professor Luís De Boni sobre a obra tomasiana:
Quanto ao modo como o homem chega ao conhecimento da lei natural assemelha-se àquele pelo qual chega ao conhecimento dos primeiros princípios da razão especulativa. Não se trata de um conhecimento infuso, no sentido de inato, ou de dado ao homem por uma graça especial – algo que contraria toda a teoria tomasiana do conhecimento -, nem de um conhecimento dedutivo, o qual, a partir de umas verdades conhecidas, vai descobrindo outras. Trata-se de princípiosevidentes, cuja retidão a inteligência percebe de modo imediato. Assim como a razão especulativa apreende de forma imediata que o todo é maior que a parte, ou que uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto, assim também a razão prática apreende que se deve fazer o bem e evitar o mal. Este é o enunciado supremo da lei natural. A ele unem-se certos preceitos, que a razão prática percebe também de modo imediato e que, usando a linguagem dos transcendentais, poder-se-ia dizer que se convertem com ele; e tais são, por exemplo, os preceitos do decálogo, pois a todos é de evidência indemonstrável que se deve cultuar a Deus, amar os pais, não matar etc.[21]
A visão de Tomás de Aquino, sua formação católica medieval e dominicana, não ignora a lei positiva, como podem pensar alguns positivistas. Aquilo que não está abarcado pela lei natural será positivado, bem como também o que a lei natural prevê será ratificado pelos homens. A formação histórica e apreensão empírica do homem o leva a criar normas, além daquelas provenientes da lei natural, regendo a sociedade em suas vicissitudes. A lei positiva tem seu espaço útil e necessário para a convivência gregária, ao que o Bobbio tenta defender e expor em sua análise histórica acerca do debate histórico sobre a prevalência do direito natural ou do direito positivo:
“O exame das diversas concepções sobre a diversidade de planos em que se colocam o direito natural e o direito positivo nos levaria muito longe. Limitando-nos a algumas indicações a respeito, diremos que na época clássica o direito natural não era considerado superior ao positivo: de fato o direito natural era concebido como “direito comum” (koinós nomos conforme o designa Aristóteles) e o positivo como direito especial ou particular de uma data civitas; assim, baseando-se no princípio pelo qual o direito particular prevalece sobre o geral (lex specialis derogat generali), o direito positivo prevalecia sobre o natural sempre que entre ambos ocorresse um conflito (basta lembrar o caso da Antígona, em que o direito positivo – o decreto de Creonte – prevalece sobre o direito natural – o “direito não escrito” posto pelos próprios deuses, a quem a protagonista da tragédia apela).
Na idade média, ao contrário, a relação entre as duas espécies de direito se inverte; o direito natural é considerado superior ao positivo, posto seja o primeiro visto não mais como um simples direito comum, mas como norma fundada na própria vontade de Deus e por este participada à razão humana, ou como diz São Paulo, como a lei escrita por Deus no coração dos homens. Esta concepção do direito natural encontra sua consagração oficial na definição que lhe é dada no Decretum Gratiani (que é a primeira grande recensão do direito canônico, o que constituirá posteriormentea primeira parte do Corpus Juris Canonici).”[22]
A lei positiva tem espaço e razão de ser no que tange a características muito únicas de necessidade para a prevenção de atos, cominando ou não em sanção, assim seriam normas contingentes que complementariam o direito natural, não de menor importância, como defendido por alguns jusnaturalistas. Para Tomás de Aquino a lei positiva nada mais é que a concretização, a aplicação prática do justo em nosso tempo e sítio, em outros termos, a lei positiva é a materialização dos mandamentos de algumas das leis naturais, estando esta em patamar superior àquela, ao analisarmos sob uma perspectiva constitucional de hierarquia das leis.
Ademais, o jurista italiana de orientação positivista, Norberto Bobbio, defende como o Direito, em si, por muito tempo foi também permeado por um desenvolvimento jurídico consuetudinário, como era de se esperar em uma Europa fragmentada em que o centro do poder poderia, mas nem sempre ou certamente, emanar do Poder Religioso em Roma, através da Igreja, tendo, portanto, uma origem predominantemente social:
“A sociedade medieval era uma sociedade pluralista, posto ser constituída por uma pluralidade de agrupamentos sociais cada um dos quais dispondo de um ordenamento jurídico próprio: o direito aí se apresentava como um fenômeno social, produzido não pelo Estado, mas pela sociedade civil. Com a formação do Estado moderno, ao contrário, a sociedade assume uma estrutura monista, no sentido de que o Estado concentra em si todos os poderes, em primeiro lugar aquele de criar o direito: não se contenta em concorrer para esta criação, mas quer ser o único, ou diretamente através da lei, ou indiretamente, através do reconhecimento e controle das normas de formação consuetudinária. Assiste-se, assim, àquilo que em outro curso chamamos de processo de monopolização da produção jurídica por parte do Estado.
A esta passagem no modo de formação do direito corresponde uma mudança no modo de conceber as categorias do próprio direito. Estamos atualmente tão habituados a considerar Direito e Estado como a mesma coisa que temos certa dificuldade em conceber o direito posto não pelo Estado, mas pela sociedade civil. E, contudo, originariamente e por um longo tempo, o direito não era posto pelo Estado: bastava pensar nas normas consuetudinárias, e em seu modo de formação, devido a um tipo de consenso manifestado pelo povo através de um certo comportamento e uniforme acompanhado da assim chamada opinio juris ac necessitatis“.[23]
Aquino, em perspectiva diversa, faz algumas explanações que se opõem ao vínculo e derivação completa do direito positivo ao direito natural, ao dizer que nem todo o direito positivo, a lei humana, provém da lei natural e que o direito positivo difere do direito natural, sendo que o que resulta dos princípios comuns da lei natural, como conclusão, pertence ao direito natural, e o que é de lei humana não deriva da lei natural (AQUINO, 2015, I-II, q.95).
Sob a racionalização do Direito realizada pelos positivistas séculos à frente, pode-se questionar quanto à reunião do direito natural e do direito positivo em um sistema uno e se o havia realmente. A isso, Bobbio, mais uma vez, explana que a integração de normas positivas e naturais se tornou realidade em determinado momento da história, o conceituando como “método de heterointegração mediante recurso a outros ordenamentos consistia, no que se refere ao juiz, na obrigação de recorrer, em caso de lacuna do Direito positivo, ao Direito natural” (BOBBIO, 1999, p. 147).
Por outro lado, quanto à defesa do emprego do Direito Natural, Aquino, o jusfilósofo e teólogo defende que a lei natural está presente universalmente, enquanto a lei humana decorre de experiências sociais; a lei natural é justa, pois possui uma razão, porém não são todas as leis positivas que são possuidoras da razão, desta maneira nem todas as leis humanas são decorrentes da lei natural e cita Agostinho de Hipona, doutor da Igreja predecessor de Tomás de Aquino:
Como diz Agostinho, não é considerado lei o que não for justo. Por onde, uma disposição é justa na medida em que tem a virtude da lei. Ora, na ordem das coisas humanas, chama-se justo ao que é reto segundo a regra da razão. E como da razão a primeira regra é a lei da natureza, conforme do sobredito resulta (q. 91, a. 2 ad 2), toda lei estabelecida pelo homem tem natureza de lei na medida em que deriva da lei da natureza. Se, pois, discordar em alguma coisa, da lei natural, já não será lei, mas corrupção dela. Deve-se, porém, saber que, de dois modos pode ser a derivação da lei natural; como conclusões derivadas dos princípios, ou como determinações de certos princípios gerais. (…) assim, o dever de não matar pode derivar, como conclusão, do princípio que a ninguém se deve fazer mal. Outras disposições derivam por determinação; assim, a lei da natureza estatui que quem peca seja punido; mas a pena com que deve sê-lo é uma determinação da lei da natureza. Ora, ambos estes modos se encontram nas leis estabelecidas pelo homem. Porém, as disposições pertencentes ao primeiro modo estão contidas na lei humana, não só como estabelecidas por ela, mas também por elas receberem, da lei natural, algo do seu vigor. Ao passo que as disposições pertencentes ao segundo modo haurem o seu vigor só na lei humana.[24]
Assim, dispõe sobre a natureza da lei humana em comparação à lei natural, entretanto, começa-se a haver um parâmetro de validade de uma lei humana quando analisada pelo aspecto de sua constitucionalidade, se assim pudéssemos falar. Onde estaria a norma-fonte donde decorrem as leis humanas? Se Deus tem um conjunto desígnios expostos na lei eterna e os entrega à humanidade, como gênero, e aos indivíduos se utilizando da lei natural, que é a justiça no caso em tela, Tomás de Aquino explicita que a aplicação da vontade de Deus será feita com auxílio da lei positiva, lei humana, todavia, para a plenitude do Logos Divino entre a humanidade, faz-se necessário a lei divina. A isso, Pinheiro e Souza afirmam:
Em sua visão, quatro motivos tornam necessária a lei divina. Em primeiro lugar, porque o homem não está ordenado apenas a um fim finito, mas à bem-aventurança eterna. Em segundo lugar, para evitar a incerteza do juízo humano, que produz leis contrárias. Em terceiro lugar, apesar de a lei humana não poder coibir e ordenar atos interiores, a virtude exige sua adequação. Por fim, não é adequado ao bem comum que a lei humana puna ou proíba todos os males, pelo que a proibição e punição dos que lhe escapam são de atribuição da lei divina (AQUINO, 2015, I-II, q. 91). Esse conceito de lei divina subsiste na História de duas formas: a lei antiga e a lei nova. Não se tratam de leis diversas, e sim de formas distintas de como a lei divina se deu aos homens — mantendo a mesma espécie (AQUINO, 2015, I-II, q. 91). Diferentemente da lei natural, ligada à criação — e, por conseguinte, à estrutura natural das coisas —, a lei divina relaciona-se com o plano de redenção — dividindo-se entre a fase anterior e posterior a Cristo.[25]
Porquanto toda a conceituação de cunho religioso, Bobbio, citando Aristóteles, mas inserido em um contexto social do século XX, permeado pelo trabalho da Filosofia Política e das transformações advindas da Reforma Protestante, do Iluminismo e da Revolução Francesa, objetivamente, inspirado pelo seu estudo em Hobbes, define Direito Natural e Direito Positivo diversamente ao mestre escolástico:
O Direito Natural prescreve ações cujo valor não depende do juízo que sobre elas tenha o sujeito, mas existe independentemente do fato de parecerem boas a alguns e má a outros. Prescreve, pois, ações, cuja bondade é objetiva (ações que são boas em si mesmas, diriam os escolásticos medievais). O direito positivo, ao contrário, é aquele que estabelece ações que, antes de serem reguladas, podem ser cumpridas indiferentemente de um modo ou de outro, mas, uma vez reguladas pela lei, importa (isto é: é correio e necessário) que sejam desempenhadas do modo prescrito pela lei.[26]
Destarte, há leis naturais, divina e humana, sendo a primeira a base da Criação e forma prática de justiça na aplicação da lei; a lei divina, a razão do plano divino para a humanidade; e a lei humana, a ferramenta humana para a realização do plano divino para os homens. A lei positiva, humana, portanto, se submeteria ao crivo de “constitucionalidade” à análise da vontade de Deus manifestada na lei divina. Sendo que a lei divina, deste modo, independe de qualquer atuação humana, pois é inerte aos atos terrenos, já que elaborada pelo Criador, segundo Tomás de Aquino.
É na lei positiva que habitarão eventuais vícios ou “inconstitucionalidades” em razão de serem ou não compatíveis ao plano divino, manifestado na lei eterna. Desta construção, ademais do trabalho de Agostinho de Hipona em sua A Cidade de Deus, é que a Idade Média se caracterizou como um seio monárquico fundado na existência da autoridade papal, guardião da lei divina, e que poderia decidir se as leis positivas condiziam ou não com a lei eterna, um verdadeiro intérprete e julgador por excelência do que era a vontade de Deus e o que seria um pecado ou transgressão, estando na condição de vigia do poder temporal sob a custódia do poder celeste, ao que o professor Luis De Boni ensina:
Ao enquadrar a lei divina dentro dos parâmetros gerais da lei, Tomás é levado a transpor, sem ignorar, o plano individual da relação de cada pessoa com Deus, elevando-se ao da comunidade. Há um paralelo entre a lei humana e a divina, distinguindo-se elas entre si por possuírem fins diferentes, pois enquanto aquela visa a ordenar os homens entre si, esta os ordena para Deus. Ele insiste mesmo em dizer que “o fim da lei humana é a tranquilidade da cidade”, enquanto o da lei divina, em sua perfeição, é o de tornar “o homem totalmente capaz de participar da felicidade eterna”. Mas para que tanto uma como outra possam ser chamadas de lei, requer-se um substrato que as possa receber: que haja um povo ao qual se apliquem. Elas possuem em comum o fato de existirem porque os homens podem comunicar-se. Ambas ordenam indivíduos, enquanto membros de uma coletividade. A lei humana destina-se à vida presente, na qual quer não apenas que a comunidade dos homens viva, mas que viva bem, e em função deste bem-viver promulga seus preceitos.[27]
A lei positiva, destarte, visa à convivência entre iguais, buscando o bem comum, contudo, também rege as relações dos indivíduos para com seu Criador cujos mandamentos são sua lei. Por esta razão, aliás, Moisés é o chefe do povo de Deus, limitado a Deus, tendo de observar suas normas e fazendo com que seu povo obedeça às leis divinas, como servo do soberano divino, não o detentor do poder absoluto, mas aquele que recebeu a lei divina e deve aplica-la, legislando leis suas, o direito positivo[28]. Aqui resta que o governante e seu povo vivem para obedecer a lei divina, o plano da criação, e que o que fora deste escopo age, injusto e ilegal está, como se houvesse uma inconstitucionalidade material na norma.
No pensamento tomasiano, a lei faz parte de um ordenamento jurídico, institucional, maior, a que todas as leis de cunho privado devem estar apoiadas, abrangidas, pelo arcabouço reunido de normas, daí retirará sua validade. Deve a lei particular ser vista dentro do quadro maior em reunião com todas as outras normas. Somente desta forma poderá ser analisada em menor ou maior caso dentro de uma lógica racional e se se enquadra corretamente naquele cabedal de normas, ou seja, se há uma constitucionalidade.
Em Tomás de Aquino habitam uma série de conhecimentos acumulados da escola greco-romana, todavia adaptada à teologia cristã – haja vista a obra de Sófocles, Antígona, em que a personagem título da obra destaca que não importavam quais fossem as leis humanas se houvesse infração à lei dos deuses -, com suas primeiras formulações elaboradas por vários intelectuais do primeiro milênio, mas quem mais contribuiu para o estudo dos conceitos de direito, política e fé foi Agostinho de Hipona haja vista o trabalho realizado em A Cidade de Deus. Entretanto, a evolução do debate político-filosófico e uma série de alterações positivas como o fim da autoridade papal suprema, em razão da contestação iniciada e bem-sucedida através da Reforma Protestante e a Contrarreforma, com o Concílio de Trento, depois seguida pelo Iluminismo e, enfim, à Era das Revoluções resultou em transformações políticas que talvez nem o Abade de Sieyès estivesse a imaginar quando elaborou sua teoria política em “Qu’est-ce que le tiers état ?”[29].
A Teoria do Poder Constituinte, se pudéssemos argumentar que a Suma Teológica de Tomás de Aquino apresenta alguns dos argumentos sobre controle estatal, autoridade e legitimidade de poder, foi alçada ao contexto jurídico atual por trabalho, coincidentemente ou não, de um clérigo francês, o Abade de Sieyès. O Direito Contitucional atual prevê que o exercício do Poder Constituinte tem como características ser ilimitado, inicial e incondicionado e se apresenta em momentos de alteração profunda na sociedade, basta analisarmos a divisão e ruptura constitucional na França através da construção social e política em sua histórica constitucional desde a Revolução Francesa, a partir de uma perspectiva das chamadas repúblicas francesas – atualmente Quinta República – até encararmos determinadas alterações no contexto político que colocam em crise aqueles valores, se aproveitando de situações sociais bastante extroversas e a desordem do cenário político.
Uma Constituição, ex “Qu’est-ce que le tiers état”, busca organizar as instituições políticas, limitar poderes e proteger o povo de uma nação, primordialmente, se analisarmos a primeira dimensão de direitos iniciada na Era das Revoluções, como se referia Eric Hobsbawn, tratando de assegurar a liberdade aos súditos do Estado, de forma a prevenir e assegurar aos seus cidadãos – na França revolucionária, os burgueses, especialmente – que o Estado estaria limitado em suas ações de maneira a evitar abusos ou autoritarismos.
Os termos, qualificações e sinais inseridos no papel, formando o texto constitucional não preveem expiração, ou seja, não há data de validade e não há outra saída que não seja sua vinculação, pensar o oposto é abrir as portas para a instabilidade política e a irracionalidade estatal, de forma que não há outro caminho[30], sob pena de iniciarmos processo revolucionário que venha a desencadear nova constituição ou carta política, o que pode ser altamente arriscado, como a própria história francesa demonstra com a crise revolucionária encadeada e a ascensão napoleônica. Desta forma, não há se mostra aceitável pensamentos que busquem violar suas previsões insertas em razão de uma vontade simples, em razão de estarmos a par de uma inconstitucionalidade.
Em comparação a nosso sistema constitucional atual, as leis chamadas divinas – na Suma Teológica – seriam nossa Constituição, as leis naturais seriam os princípios dispostos para nos guiarmos e as leis positivas todo nosso sistema constitucionalmente formal e leis infraconstitucionais, ou seja, as normas não materialmente constitucionais. Conceituando o que vem a ser constitucionalidade, Gilmar Ferreira Mendes define:
“os conceitos de constitucionalidade e inconstitucionalidade não traduzem, tão-somente, a ideia de conformidade ou inconformidade com a Constituição. Assim, tomando de empréstimo a expressão de Bittar, dir-se-á que constitucional será o ato que não incorrer em sanção, por ter sido criado por autoridade constitucionalmente competente e sob a forma que a Constituição prescreve para sua perfeita integração; inconstitucional será o ato que incorrer em sanção – de nulidade ou de anulabilidade – por desconformidade com o ordenamento constitucional”[31]
Assim o controle de constitucionalidade consiste no exame da adequação de uma norma infraconstitucional à Carta Magna de um país, que deve ser analisado e avaliado seja no aspecto formal, qual seja, o modo e condições de elaboração, e quanto ao aspecto material, o conteúdo da norma frente à Constituição. Este fenômeno também é denominado pelos doutrinadores de compatibilidade vertical.
O controle de constitucionalidade como apresentado neste texto busca como objetivo assegurar, garantir, o respeito e a supremacia das normas constitucionais, sendo utilizado quando falamos em constituições rígidas, que são aquelas com maior dificuldade de alteração por parte dos legisladores, após sua promulgação, já que somente assim é que se encontrar a hierarquia constitucional em relação a normas infraconstitucionais, demonstrando a superioridade das normas constitucionais.
Em breve explanação, o controle constitucional brasileiro se dá de determinadas formas, por exemplo, a partir do órgão que realiza o controle, pode ser chamado de político, jurisdicional ou misto, sendo que:
Ademais, há o momento em que o controle deve ser realizado. No Brasil, o controle preventivo é exercido pelos três Poderes: Legislativo (no debate aos projetos de lei), Executivo (quando o chefe do Executivo decide se sancionará ou vetará o projeto de lei) e Judiciário (o STF, e.g. entende constitucional a impetração de Mandado de Segurança de parlamentar com vistas a impedir a votação de lei inconstitucional). Por outro lado, o controle repressivo, em regra, é exercido pelo Judiciário; todavia, excepcionalmente pode vir a ser exercido pelo Legislativo, conforme previsão da Constituição em seu artigo 49, V, da CF, quando há Decreto Legislativo expedido pelo Congresso com vistas a sustar ou regular ato, como também o art. 62 da CF, em que Medida Provisória do Chefe do Executivo após sua edição pode ser convertida em lei pelo Congresso ou não, realizando, destarte, o controle repressivo da norma.
A constitucionalidade pode ser resumida pelo enfrentamento feito em decisão do Supremo Tribunal Federal que, no caso a seguir em tela, foi incitado a se manifestar sobre a recepção de leis prévias ao ordenamento constitucional de 1988 e se tais leis estariam ou não abarcadas pelo critério de constitucionalidade adotado jurisprudencialmente e doutrinariamente, a isso vejamos:
A questão referente ao controle de constitucionalidade de atos normativos anteriores à Constituição foi exaustivamente debatida por esta Corte no julgamento da ADI 2. Naquela oportunidade, o ministro Paulo Brossard, relator, sustentou que: “A teoria da inconstitucionalidade supõe, sempre e necessariamente, que a legislação, sobre cuja constitucionalidade se questiona, seja posterior à Constituição. Porque tudo estará em saber se o legislador ordinário agiu dentro de sua esfera de competência ou fora dela, se era competente ou incompetente para editar a lei que tenha editado. Quando se trata de antagonismo existente entre Constituição e lei a ela anterior, a questão é de distinta natureza; obviamente não é de hierarquia de leis; não é, nem pode ser, exatamente porque a lei maior é posterior à lei menor e, por conseguinte, não poderia limitar a competência do Poder Legislativo, que a editou. Num caso, o problema será de direito constitucional, noutro, de direito intertemporal. Se a lei anterior é contrariada pela lei posterior, tratar-se-á de revogação, pouco importando que a lei posterior seja ordinária, complementar ou constitucional. Em síntese, a lei posterior à Constituição, se a contrariar, será inconstitucional; a lei anterior à Constituição, se a contrariar, será por ela revogada, como aconteceria com qualquer lei que a sucedesse. Como ficou dito e vale ser repetido, num caso, o problema é de direito constitucional, noutro, é de direito intertemporal”. O vício da inconstitucionalidade é congênito à lei e há de ser apurado em face da Constituição vigente ao tempo de sua elaboração. Lei anterior não pode ser inconstitucional em relação à Constituição superveniente; nem o legislador poderia infringir Constituição futura. A Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais leis anteriores com ela conflitantes: revoga-as. Pelo fato de ser superior, a Constituição não deixa de produzir efeitos revogatórios. Seria ilógico que a lei fundamental, por ser suprema, não revogasse, ao ser promulgada, leis ordinárias. A lei maior valeria menos que a lei ordinária. (…) Nestes termos, ficou assentado que não cabe a ação direta quando a norma atacada for anterior à Constituição, já que, se for com ela incompatível, é tida como revogada e, caso contrário, como recebida. E o mesmo raciocínio há de ser aplicado em relação às emendas constitucionais, que passam a integrar a ordem jurídica com o mesmo status dos preceitos originários. Vale dizer, todo ato legislativo que contenha disposição incompatível com a ordem instaurada pela emenda à Constituição deve ser considerado revogado. Nesse sentido, a observação do ministro Celso de Mello, ao dispor que: “Torna-se necessário enfatizar, no entanto, que a jurisprudência firmada pelo STF – tratando-se de fiscalização abstrata de constitucionalidade – apenas admite como objeto idôneo de controle concentrado as leis e os atos normativos, que, emanados da União, dos estados-membros e do Distrito Federal, tenham sido editados sob a égide de texto constitucional ainda vigente” (ADI 2.971, DJ de 18-5-2004). A respeito do tema, esta Corte tem decidido que, nos casos em que o texto da Constituição do Brasil foi substancialmente modificado em decorrência de emenda superveniente, a ação direta de inconstitucionalidade fica prejudicada, visto que o controle concentrado de constitucionalidade é feito com base no texto constitucional em vigor, e não do que vigorava anteriormente (ADI 1.717 MC, DJ de 25-2-2000; ADI 2.197, DJ de 2-4-2004; ADI 2.531 AgR, DJ de 12-9-2003; ADI 1.691, DJ de 4-4-2003; ADI 1.143, DJ de 6-9-2001; e ADI 799, DJ de 17-9-2002). [ADI 888, rel. min. Eros Grau, j. 6-6-2005, dec. monocrática, DJ de 10-6-2005.][32]
Dado tudo acima exposto, ainda assim é necessário compreender a importância da exegese em Tomás de Aquino e o tamanho de sua obra e relevância para a formação e a conceituação do justo e os limites do que é direito e o que é lei, todavia pudemos avaliar que para o direito natural, há que se considerar valores, enquanto que o direito positivo concerne ao seu cumprimento, sob critérios objetivos. Por outro lado, em razão desta monografia tratar da importância do Direito Natural para a formação do Direito Constitucional, precisou-se narrar tais conceituações.
4.1. Direitos Humanos no ordenamento jurídico
Em razão da complexa diversidade conceitual em relação ao Direito, seus conceitos e uma discussão entre Direito Natural e Direito Positivo e qual poderia ou deveria predominar sobre o outro, é imprescindível passar por um rápido detalhamento temporal que poderíamos considerar desde a filosofia grega à elaboração do Direito Romano com a substituição de um direito religioso por um direito dos povos; direito consuetudinário da Alta Idade Média; fortalecimento do direito natural e direito canônico; formação incipiente dos Estados e Reforma Protestante; Iluminismo e Revolução Francesa; Revolução Industrial e Positivismo e, por fim, as duas grandes guerras e a mudança de poder europeia para os EUA.
Com as diferenças de pensamento na própria escola positivista, representadas por Kelsen ou Hart, por exemplo, e sua insuficiência doutrinária e conceitual para fundamentar ou justificar o Direito que foge ao justo, ou seja, explicar o que é Direito justo ou não, dado que pudemos apreender que, conforme os positivistas, Direito é fato, não é um valor (BOBBIO, 1995a, p. 131). Sendo o Direito uma ciência, o que lhe impõe métodos científicos, cartesianos, de análise e comprovação fática, não podendo se basear em suposições ou ficções das mais variadas sem a objetividade necessária (KELSEN, 2009, p. 85), assim se afastaria o direito natural apoiado em argumentos científicos, bem como está a se considerar que somente é Direito aquela norma jurídica posta, direito posto pelo poder soberano, o titular da autoridade competente detentora de força, como afirma Bobbio, baseado em uma visão hobbesiana de poder (BOBBIO, 2001, p. 150).
O Direito Positivo, portanto, para seus defensores mais ávidos tem como fonte o direito elaborado pelo possuidor do monopólio da força estatal, soberano, não cabendo a terceiros elaborarem o direito; argumento que tem a intenção de demonstrar que só o Estado é titular do direito, buscando demonstrar uma segurança jurídica, a isso os estudos de Pinheiro e Souza apontam:
Por consequência, para um positivismo clássico a estrutura do ordenamento jurídico firma-se nas ideias de unidade, sistematicidade e completude. Portanto, são rejeitados problemas hierárquicos, de antinomia e de lacunas. Mesmo as dificuldades decorrentes da diversidade de ordenamentos encontram soluções (formais) — o que asseguraria segurança jurídica (BOBBIO, 1995b, p. 34-35). No entanto, a solução para todos os problemas identificados, ao final, encontra a mesma resposta: a soberania estatal. Sobre a pedra fundamental do Estado está assentada a unidade, a sistematicidade e a completude do ordenamento jurídico. Todas as normas, mesmo as particulares, retiram sua validade do Estado-Soberano, que se caracteriza como a fonte das fontes (BOBBIO, 1995b, p. 41) — ideia diametralmente oposta à de Tomás de Aquino.[33]
Da autoridade competente e da estrutura das normas jurídicas, surge o conceito de unidade, que é dependente de uma norma fundamental, donde provém todas as normas, e que gera a Constituição. Esta norma fundamental tem como objetivo controlar o uso da força, assim como apresentar o direito com a face de uma norma fundamental que não é a mera detenção do poder que o justifica, mas sim a tal norma definidora originária. Sob perspectiva diversa se percebe que a norma fundamental não pode, em si, ser considerada como justa ou não, pois o Direito Positivo é e não se analisa como deve ser, buscando justiça e Bobbio, quanto a isso, diz ainda que o Direito é a expressão dos fortes, não dos justos (BOBBIO, 1995b, p. 67), assim se desampara qualquer argumento quanto aos direitos humanos, afastando as ideias defendidas por Tomás de Aquino e sua visão de dignidade da pessoa humana.
Destarte, sob esta argumentação, qualquer ato da autoridade estatal que elabora uma lei ou a executa tem o poder jurídico de validade e juridicidade, sendo direito sim, desde que esteja apoiado pela norma fundamental, fonte das fontes. É em razão desses argumentos que uma lei, ou ainda pior, uma constituição ou carta constitucional seria juridicamente válida e deveriam seus subordinados a respeitar já que são o direito puro, não cabendo qualquer questionamento sobre seus valores, pois são fruto de fato constatado pela autoridade estatal e devem ser obedecidos se previstos na norma fundamental. Portanto, imaginemos que as violações de direitos humanos fossem constitucionalizadas ou toleradas – como em vários episódios da vida política internacional -, ainda assim seria um Estado de Direito, não cabendo qualquer punição interna ou externa, visto que jurídico pelos critérios positivistas.
Em oposição ao pensamento tomista sobre a valorização humana e sua juridicidade a partir dos desígnios expostos no Direito Natural, Bobbio argumenta que os direitos humanos não passam de uma obrigação moral se, em que pese a previsão legal, não haverá aplicação, efetivação desta lei, não tendo os requisitos completos de lei. Desta forma, os direitos humanos como uma obrigação moral teriam apenas intenções políticas, argumenta Bobbio:
Partilho a preocupação dos que pensam que chamar de “direitos” exigências (na melhor das hipóteses) de direitos futuros significa criar expectativas, que podem não ser jamais satisfeitas, em todos os que usam a palavra “direito” segundo a linguagem corrente, ou seja, no significado de expectativas que podem ser satisfeitas porque são protegidas. Por prudência, sempre usei, no transcorrer desta minha comunicação, a palavra “exigências” em vez de “direitos”, sempre que me referi a direitos não constitucionalizados, ou seja, a meras aspirações, ainda que justificadas com argumentos plausíveis, no sentido de direitos (positivos) futuros.[34]
De outro lado, os direitos humanos não podem unicamente ser pontuados e elaborados pelo Estado, cabendo ao cidadão aceitar tal situação, porém imaginemos que os cidadãos se levantassem contra os atos estatais, correndo o risco de agirem à margem da lei e serem sancionados por isso, em razão do desamparo constitucional. Em apontamento, Pinheiro e Souza levam a indagação:
Não obstante, quem mais necessita da proteção dos direitos humanos em face do Poder Público é o povo de um Estado de não direito, no entanto são exatamente esses que se recusam a aceitar limites ao seu poder. E mais, são esses Estados que rejeitam as normas internacionais. No entanto, existe uma questão ainda mais profunda não respondida: e se a luta por esses direitos não for vitoriosa circunstancialmente, as pretensões de direitos nada significaram? Antes da II Guerra Mundial a proibição da tortura, dos tratamentos cruéis e do genocídio era despida de caráter jurídico? Antes do reconhecimento dos direitos civis dos negros americanos não existiam direitos?[35]
Estas indagações, o movimento racionalista e filosófico originado séculos antes, bem como as violações de direitos humanos gravíssimas ocorridas nas duas grandes guerras, mas especialmente na segunda guerra, resultaram em um movimento acadêmico, político e social bastante rápido. Ademais, uma reação a tudo o que ocorrera e, acima de tudo, a busca pelo reconhecimento de novas teses para a proteção dos direitos humanos e a proteção dos povos, à luz dos genocídios ocorridos, assim como a confluência de interesses dos EUA e dos países vencedores na guerra de criar novos instrumentos de controle político internacional e a manutenção da paz.
Numa busca por fundamentação teórica, a obra de Tomás de Aquino serviu aos jusfilósofos e diplomatas como o material necessário, mas perdido nos séculos, porém resgatado já no século XIX pelo movimento de pensadores católicos inspirados na encíclica Aeterni Patris, do papa Leão XIII – mesma autoridade autora da Rerum Novarum -, que em 1879 estimulou os estudos teológicos tomasianos. Entre os autores que iniciaram uma série de pesquisas e divulgação do trabalho de Tomás de Aquino podemos destacar Michel Villey, Javier Hervada e Jacques Maritain, especialmente este último, autor de Humanismo Integral.
A elaboração do humanismo integral e a publicação da obra homônima em 1936 repercutiram pela Europa, EUA e na América do Sul, o que incluiu palestras do autor no Brasil. Na obra, Maritain defende o papel do homem, o transcendendo a mais que sua natureza individual:
O humanismo tende essencialmente a tornar o homem mais verdadeiramente humano e a manifestar sua grandeza fazendo-o participar de tudo o que pode enriquecer na natureza e na história (…); ele exige ao mesmo tempo que o homem desenvolva as virtualidades nele contidas, suas forças criadoras e a vida da razão, e trabalhe por fazer das forças do mundo físico instrumento de sua liberdade.[36]
Fundamental para o desenvolvimento dos direitos humanos foi o papel de Jacques Maritain na incipiente Organização das Nações Unidas e a elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, em que o filósofo francês participou da redação do texto e, tempos depois bem explicou a importância de ressaltar o Direito Natural e afastar a visão positivista insuficiente (1966, p. 83):
O fundamento filosófico dos Direitos do Homem é a Lei Natural. Lamento não podermos encontrar outra palavra! […]. Eles [os críticos] deveriam, entretanto, lembrar-se de que a história dos direitos do homem está ligada à história da Lei Natural, e que o descrédito em que, por certo tempo, o positivismo lançou a ideia da Lei Natural, provocou inevitavelmente um descrédito semelhante para a ideia dos direitos do homem.
A redação de um texto como a Declaração Universal dos Direitos Humanos resultou na percepção da importância daqueles direitos não apenas em suas liberdades negativas, como na primeira dimensão dos direitos, mas assegurou a proteção humana contra o Estado e proveniente do Estado, atuando para sua proteção, e também dos organismos internacionais, abrindo as portas para uma série de tratados internacionais de proteção humanitária e a constitucionalização desses direitos nos Estados, como o ocorrido na Lei Fundamental a qual citamos em seu artigo 1:
(1) A dignidade da pessoa humana é intangível. Respeitá-la e protegê-la é obrigação de todo o poder público.
(2) O povo alemão reconhece, por isto, os direitos invioláveis e inalienáveis da pessoa humana como fundamento de toda comunidade humana, da paz e da justiça no mundo.
(3) Os direitos fundamentais, discriminados a seguir, constituem direitos diretamente aplicáveis e vinculam os poderes legislativo, executivo e judiciário.[37]
Neste septuagésimo primeiro aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos nos deve vir à mente, como ressaltamos, o papel de Tomás de Aquino reverberado pela academia e diplomacia. A aprovação da declaração denota a importância maior ou menor ou o contexto político em que os países membros da ONU à época se encontravam, visto que a aprovação se deu em sede da 3ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, com 48 votos favoráveis[38], nenhum voto contrário e 8 abstenções[39].
O temor dos efeitos da Declaração Universal pode justificar porque as abstenções vieram dos países membros da União das Repúblicas Socialistas ou da área de sua influência, bem como do regime da Arábia Saudita. Todavia, veio da presidente da Comissão de Direitos Humanos, Eleanor Roosevelt naquele momento, o parecer de que a Declaração “não é um tratado, não é um acordo internacional. Não é e nem pretende ser um instrumento legal ou que contenha obrigação legal. É uma declaração de princípios básicos de direitos humanos e liberdades que será selada com aprovação dos povos de todas as Nações”[40].
Com uma recomendação das Nações Unidas, em que pese a ausência de natureza jurídica de tratado internacional, a dignidade da pessoa humana, como afirmamos em relação ao ordenamento jurídico alemão, começa a ser internalizada nos ordenamentos jurídicos, demonstrando a importância também de uma filosofia que observa a metafísica, o além do material e visível aos seres humanos. Foi em razão da real importância de preservar minorias, etnias todas, povos e religiões que o respeito à dignidade a seus cidadãos necessitou de acentuação legislativa internacional, os direitos humanos universais, conforme defesa argumentativa feita pelos membros da Comissão de Direitos Humanos, foram reconhecidos por vasta coletânea de ordenamentos jurídicos dos países, recebendo a denominação de direitos fundamentais.
A dignidade da pessoa humana, termo cunhado por Tomás de Aquino, é dito por Ingo Wolfgang Sarlet[41] como:
Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos.
Há doutrinadores que classificam os direitos humanos como pertencentes às dimensões do Direito, especialmente a primeira, segunda e terceira, porém há autores que os incluem como quarta e quinta geração, como os direitos relacionados à bioética segundo a concepção de Bobbio, a última dimensão de acordo com o entendimento de Paulo Bonavides o direito à paz permanente dos povos. (BOBBIO, 1992, p.6) (FURTADO; MENDES, 2009).
Assim, em razão de todo o histórico e desenvolvimento dos Direitos Humanos, não sob a inspiração racionalista, materialista ou positivista dos últimos séculos, mas através de um longo percurso pela história da Filosofia e do Direito nos foi possível legislar, organizar, sistematizar meios de proteção à nossa existência, assegurando ou na busca programática de garantir que o Estado não viole os direitos dos seus cidadãos ou que outros cidadãos não o violem, conforme o desenvolvimento da eficácia horizontal dos Direitos fundamentais.
Por fim, a República Federativa do Brasil, no ano de 1988, em sua sétima constituição, em um cenário de esperança e tentativa de reparar ou evitar vícios e graves violações aos direitos humanos – rotina na formação do Brasil, desde a chegada dos europeus aos dias atuais – insere a dignidade da pessoa humana como princípio fulcral de nosso ordenamento jurídico e a cabeça de um mote constitucional mais avançado disposto no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal, a elevando a um dos princípios fundamentais do país.
CONCLUSÃO
Pela pesquisa aqui elaborada, do histórico sobre São Tomás de Aquino, à luz de todo o trabalho realizado pelos gregos e romanos e o início da Escolástica, chegamos ao ponto de curva em que o direito positivo se encontrou com o direito natural, indo de encontro aos valores expositivos sobre justiça e direito. Foi possível apreender a distinção de direito natural e direito posto, positivado, e como instituições como a Igreja Católica puderam adaptar conceitos greco-romanos e renová-los sob uma perspectiva condizente com seus valores judaico-cristãos.
A vida de Tomás de Aquino foi utilizada com vistas a demonstrar o percurso traçado pelo filósofo e teólogo medieval em sua jornada pela ampliação de conceitos teologais e as repercussões no cenário medieval e no Direito Canônico do período, porém sob uma perspectiva do Direito Constitucional e do Direito Internacional mais moderno, podemos afirmar que é, sim, uma conceituação do direito natural e fruto de um trabalho filosófico, por vezes religioso, de metafísica, mas que repercute nos mais diversos âmbitos, como pode se dar no estuda da Ciência Política e do Direito, tendo a história demonstrado como pode se dar a evolução dos direitos humanos, desde sua primeira conceituação e citação na Suma Teológica à formação dos Direitos Humanos.
Nos tempos conturbados em que vivemos, decorrência lógica daquilo que Zygmont Baumann definiu como modernidade líquida, as pessoas, inseguras quanto aos seus destinos, e os Estados e instituições privadas se tornam poços ou oásis de esperança ou mesmo as organizações internacionais o fazem como meio de preservar a segurança e estabilidade, mas não somente mantendo a paz social, como também uma ordem econômica e política os Estados, portadores de hercúlea responsabilidade, o que pode resultar em grandes asseguradores de proteção dos direitos humanos ou grandes perpretadores das violações de direitos humanos mais cruéis e sanguinárias.
Pela lição da história, a humanidade passou por momentos de luz, bem como trevas. A mesma instituição que pode permitir que um teólogo desenvolvesse grande obra de cunho jusfilosófico e de proteção à vida, também foi a organizadora de atos violentos que afligiram a vida das pessoas por séculos, na busca de valores religiosos incertos ou, acima de tudo, conquista de poder. Posteriormente, com a Reforma Protestante e a perda parcial de poder da Sé Romana, ademais do desenvolvimento da imprensa, a disseminação de ideias se torna incontrolável, o que levou a novos avanços, em que pesem certos radicalismos, o que gerou novas demandas e perda de garantias e de sensação de paz real, ideológica e social.
A evolução de ideias, a liberdade ao pensar e de pensar, a elevação econômica de determinadas categorias sociais e o fim do Absolutismo trouxe a ideia de superioridade do Direito Positivo, escrito e elaborado pela autoridade competente, cientificamente categorizado conforme preceitos cartesianos, transformando uma das formas de Direito em a única certeza quanto ao Direito. Sucumbe a subjetividade do Direito Natural; ascende o Direito Positivo.
O Direito Positivo passa a ser a principal fonte, posteriormente a única, de dizer o Direito, assegurando o controle estatal sobre os territórios, a unidade nacional, a formação das burocracias e a segurança jurídica das burguesias. A positivação desperta sensações de controle e supremacia da lei; aquilo que veio para afastar a subjetividade de autocratas de outrora, torna-se instrumento útil e necessário aos autocratas de tempos posteriores. Sua manuseabilidade, resultado da crença de que a razão faria o melhor Direito, permite ao Estado dizer a lei, não cabendo afastá-lo por razões de discordância moral simplesmente, mas pela autoridade do detentor da lei. O Direito não é justo ou injusto. A lei é o Direito.
Destarte, com as medidas praticadas por burocratas estatais a mando de teses, ideias acerca da autoridade do direito posto, a primeira metade do século ficou indelevelmente impregnada com as marcas da autoridade da Lei, porém preenchida de injustiças, basta lembrarmos as Leis de Nuremberg de 1935, em que um compilado de leis antissemitas foram criadas pelo Reichstag da época. Restando, portanto, evidente que uma equilibrada formação jurídica e filósofica diversa deveria ser trazida à lume para a conceituação dos direitos humanos, direitos fundamentais para a proteção humana, ao que autores buscaram no idealismo jurídico de Hugo Grotius que, todavia, bebia da fonte originária europeia, Tomás de Aquino.
Assim, iniciamos uma nova mudança de pivot em que o Direito Positivo deve ser temperado pelo Direito Natural, recordando ser este a pedra fundamental para a positivação jurídica, seu pilar de validade, o ápice de uma pirâmide kelseniana, e não a norma fundamental hipotética e abstrata positivada ou racionalizada pelos constituintes simplesmente, mas preenchida de valores quanto à preservação humana, enriquecidos pela experiência histórica, privilegiando a noção da essência do ser. É deixar o positivismo mais radical e acolher um direito positivo como defendido por Tomás de Aquino.
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[1] Advogado e palestrante, graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2014). Conciliador e mediador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Especialista em Direito Ambiental, é pós-graduado em Direito Constitucional e Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes. Teve formação religiosa em instituições de formação católica onde exerceu funções de Cerimonial. Tem experiência na área de Direito Público, especialmente Direito Internacional Público e Direito Constitucional. Professor Convidado em instituições de ensino. É autor do livro “O G-4 e a Reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas: o Brasil na ONU”.
[2] Debate realizado pela doutrina sobre a nomenclatura a ser utilizada, adotamos a nomenclatura apontada por Ingo W. Sarlet, qual seja, dimensão. Para isso, ver SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8ª Edição, Porto Alegre : Livraria do Advogado Ed., 2007, p. 55.
[3] Frei Carlos JOSAPHAT, OP, Os 800 Anos de Presença da Ordem Dominicana. Instituto Humaninas UNISINOS, São Leopoldo, 9 set. 2016. Notícias. Disponível em http://www.ihu.unisinos.br/185-noticias/noticias-2016/559861-frei-carlos-josaphat-com-seus-95-anos-patriarca-dos-dominicanos-no-brasil-fala-dos-800-anos-de-presenca-da-ordem-dominicanai . Acessado em 20 mai. 2019.
[4] Jean-Pierre TORRELL. Saint Thomas Aquinas: The Person and His Work. Trans. Robert Royal. Revised Edition. Washington, DC: The Catholic University of America Press, 2005.
[5] Ver Georges DUBY, Heresias e Sociedades na Europa Pré-Industrial, séculos XI-XVIII in Idade Média – Idade dos Homens. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
[6] Carlos Arthur Ribeiro do NASCIMENTO. Avicena, Tomás de Aquino e Duns Scot. Cognitio: Revista de Filosofia, [S.l.], v. 6, n. 1, p. 57.
[7] Terezinha OLIVEIRA. Origem e memória das universidades medievais a preservação de uma instituição educacional. Varia hist., Belo Horizonte , v. 23, n. 37, p. 120.
[8] Ibid., p. 123.
[9] Ana Rita Nascimento CABRAL, A Justiça em Tomás de Aquino.
[10] Luis Alberto DE BONI, Estudos sobre Tomás de Aquino.
[11] Eric Voegelin. História das ideias políticas: Idade Média até Tomás de
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[12] Josef Pieper. As virtudes cardeais revisitadas. International Studies on Law and Education. IJI-Univ. do Porto: 11. Mai-Ago 2012.
[13] Norberto Bobbio. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1995.
[14] Hans KELSEN. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
[15] Tomás de AQUINO, Suma Teológica. Vol. 4 e 6. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2015, II-II, q. 57
[16] Victor Sales PINHEIRO e Elden Borges SOUZA. Tomás De Aquino e a Razão Natural dos Direitos Humanos: Pessoa e Bem Comum. Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFC, v. 36.2, jul-dez. 2016, p. 122.
[17] Ver Hans KELSEN. O problema da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 29-34.
[18] Victor Sales PINHEIRO e Elden Borges SOUZA. op. cit., p. 122-123.
[19] Javier HERVADA. Lições propedêuticas de filosofia do direito. Belo Horizonte: Martins Fontes, 2008, p. 23.
[20] Luis Alberto DE BONI, op. cit., p. 55.
[21] Ibid., p. 74.
[22] Norberto BOBBIO, Positivismo jurídico: lições de filosofia do direito, p. 16-27.
[23] Ibid., p. 16-27.
[24] Ver Tomás de AQUINO. Suma Teológica. Ver IIa IIae, q. 91.
[25] Victor Sales PINHEIRO e Elden Borges SOUZA. op. cit., p. 125.
[26] BOBBIO, op. cit., p. 17.
[27] Luis Alberto DE BONI, op. cit., p. 61.
[28] Ibid., p. 62.
[29] Emmanuel Joseph, SIEYÈS. A constituinte burguesa. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.
[30] Existe uma anedota bastante replicada que conta que em determinado dia na Grécia Antiga, Ptolomeu I, bastante interessado em saber o que que era aquela tal da Geometria que todos falavam, decidiu, então, convocar Euclides de Alexandria, conhecido por nós como “Pai da Geometria”, e perguntou ao matemático como fazer para aprender e a tal ciência, ao que Euclides lhe apresentou toda sua série de estudos organizados em “Os Elementos”, porém Ptolomeu I parece não ter gostado da solução já que muito trabalhosa, de forma que perguntou se não havia caminho mais curto para a Geometria. Euclides não deve ter gostado da forma com que Ptolomeu quis de forma breve aprender rapidamente aquela ciência, então limitou-se a dizer-lhe secamente que não havia estrada real para a Geometria, não havendo outro caminho que não fosse aquele a ser seguido, não havendo atalhos.
[31] Gilmar Ferreira MENDES; Inocêncio Mártires COELHO; Paulo Gustavo Gonet BRANCO. Curso de Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1054.
[32] ADI 4.222 MC, rel. min. Celso de Mello, j. 8-2-2011, dec. monocrática, DJE de 14-2-2011.
[33] Victor Sales PINHEIRO e Elden Borges SOUZA. op. cit., p. 126-127.
[34] BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos, p. 72.
[35] Victor Sales PINHEIRO e Elden Borges SOUZA. op. cit., p. 129-130.
[36] Jacques MARITAIN, Man and the State, p. 4.
[37] Ver Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, disponível em https://www.btg bestellservice.de/pdf/80208000.pdf. Acesso em 24 de agosto de 2019.
[38] Votaram: Birmânia, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Dinamarca, República Dominicana, Equador, Egito, El Salvador, Etiópia, França, Grécia, Guatemala, Haiti, Islândia, Índia, Irã, Iraque, Líbano, Libéria, Luxemburgo, México, Países Baixos, Nova Zelândia, Nicarágua, Noruega, Paquistão, Panamá, Paraguai, Peru, Filipinas, Tailândia, Suécia, Síria, Turquia, Reino Unido, Estados Unidos da América, Uruguai, Venezuela, Afeganistão, Argentina, Austrália, Bélgica, Bolívia, Brasil.
[39] Abstiveram-se: a República Socialista Soviética da Bielorússia, a Tchecoeslosváquia, a Polônia, a Arábia Saudita, a República Socialista Soviética da Ucrânia, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e a Iuguslávia. Ausentes à sessão: Honduras e Iêmen.
[40] Flávia PIOVESAN. Direitos humanos e o direito constitucional internacional, p.146.
[41] Ingo Wolfgang SARLET. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais, p. 60.
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