A aplicabilidade do princípio da razoável duração do processo: Uma análise sobre a morosidade processual nas varas estaduais cíveis comuns de Campina Grande – PB

Resumo: A mora em prestar a tutela jurisdicional efetiva proporciona graves danos àqueles que necessitam socorrer-se ao Estado-Juiz para vencer a pretensão resistida, principalmente às pessoas mais carentes de recursos financeiros e às detentoras de interesse legítimo. Em resposta a tal morosidade, a Emenda Constitucional de nº 45/04 inseriu o inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição Federal de 1988, dispositivo este que torna expresso o princípio da razoável duração processual. No entanto, a resolução do problema da morosidade não passaria apenas pela criação do princípio da razoável duração do processo, mas sim pela elaboração de mecanismos eficientes que sejam passíveis de tornar tal princípio efetivo, mecanismos estes cuja criação eficaz dependeria de prévios estudos científicos. Nesse diapasão, teve a presente pesquisa o objetivo de analisar a aplicabilidade do princípio da razoável duração processual nas varas estaduais cíveis comuns instaladas na cidade de Campina Grande. A metodologia, quanto aos objetivos, foi descritiva, quanto ao objeto, foi bibliográfica, documental e feita por levantamento de dados, e, por fim, o método utilizado foi o dedutivo. Ademais, a média de tempo encontrada para o julgamento do tipo de processo analisado (processos cujo término deu-se por julgamento antecipado, nos termos do art. 330, I, do Código de Processo Civil) foi de 11 meses e 19 dias. Levando-se em consideração a carência de aparelhos, de servidores e de magistrados em Campina Grande, tomando-se ainda por parâmetro o aumento da litigiosidade nesse município entre os anos de 2004 e 2008, infere-se que o tempo de 11 meses e 19 dias para julgamento do tipo de processo analisado, em 1ª instância, é um prazo que se coaduna com o princípio da razoável duração do processo. 


Palavras Chave: Razoável Duração Processual; Aplicabilidade; Campina Grande.


1 INTRODUÇÃO


Segundo autores e juristas, o Poder Judiciário Brasileiro enfrentaria hodiernamente a mais grave crise de sua história, motivada pela letargia em pacificar os conflitos de interesses. A mora em prestar a tutela jurisdicional efetiva estaria proporcionando graves danos àqueles que necessitam socorrer-se ao Judiciário, principalmente às pessoas mais carentes de recursos financeiros e às detentoras de interesse legítimo.


No intuito de minimizar os efeitos desse mal, a Emenda Constitucional de nº 45, aprovada no ano de 2004, provocou uma série de modificações na estrutura do Poder Judiciário. Entre elas, uma em especial viria para atender ao clamor da sociedade por uma prestação jurisdicional célere, numa típica adaptação das normas jurídicas aos anseios sociais. Trata-se da inserção do inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição Federal, que traz em seu bojo o princípio da razoável duração processual. Rege tal princípio que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 2010a).


No entanto, a resolução do problema da morosidade não passaria apenas pela criação do princípio da razoável duração do processo, mas sim pela elaboração de mecanismos eficientes passíveis de tornar tal princípio efetivo, a fim de que o mesmo cumpra a finalidade para a qual foi criado.


A criação eficiente desses mecanismos processuais, por sua vez, dependeria do conhecimento da existência, ou não, da lentidão da justiça em cada localidade por meio de pesquisas científicas, bem como da análise dos fatores que contribuem para o estrangulamento do sistema judicial local.


Apesar da importância para a efetivação do princípio da razoável duração do processo, tais estudos não estariam ocorrendo. Poucas pesquisas científicas e levantamentos estatísticos estariam sendo feitos para tentar averiguar o real tempo despendido na prestação jurisdicional, bem como analisar quais os principais fatores que influenciam na duração do processo.


A carência de pesquisas adequadas e dados estatísticos, somada a inexistência de diagnóstico dos fatores de estrangulamento do Judiciário, estariam impedindo que as mudanças legislativas e administrativas voltadas para a aplicabilidade do princípio da razoável duração processual sejam implementadas com proficiência.


Diante do problema da morosidade, da ineficiência do princípio da razoável duração do processo e da carência de pesquisas cientificas, o presente trabalho encontrou justificativa do ponto de vista social, jurídico e acadêmico.


Do ponto de vista social, justificou-se ao se constatar que as pessoas que mais sofrem com a demora do Judiciário são aquelas cujos recursos econômicos são parcos, em contraposição àquelas cuja condição financeira é mais vultosa. Além disso, a morosidade causa problemas psicológicos as partes envolvidas no litígio, dá azo à evasão de investimentos estrangeiros da economia nacional, aumenta a litigiosidade social e a desconfiança nas instituições públicas.


Do ponto de vista jurídico, houve a necessidade de investigar se o problema da mora persiste nas varas cíveis comuns da Justiça Estadual instalada na cidade de Campina Grande.


Quanto à importância acadêmica, estar-se-á dando suporte à comunidade científica para o início de novas pesquisas de cunho explicativo, fomentando os estudos sobre a aplicabilidade do princípio da razoável duração processual, tão raros hodiernamente. Além disso, transformou-se as respostas, até então empíricas, em dados científicos concretos.


Ademais, ressalte-se que o tema em destaque é bastante atual, ao ponto de figurar como notícia nos mais diversos meios de comunicação (LINS, 2009), ser objeto de debates na jurisprudência pátria (MORAES, 2007)[1] e ensejar a preocupação de diversas nações mundiais (ASSIS, 2006; HOTE, 2007).


No que concerne ao objetivo geral, a pesquisa proposta buscou analisar a aplicabilidade do princípio da razoável duração processual nas oito varas estaduais cíveis comuns instaladas na cidade de Campina Grande.


Os objetivos específicos, de seu turno, foram de quatro ordens. O primeiro foi averiguar a média aritmética de tempo que 30 processos cognitivos ordinários – cujo término não se deu por uma das hipóteses previstas no art. 329 do CPC (extinção anômala), mas que tenha ocorrido julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 330, I, do mesmo código – levam para cominar em uma sentença de 1º grau em cada uma das oito varas estudadas (BRASIL, 2010b).


O segundo foi coletar dados – a exemplo do número de servidores, de computadores e aparelhos diversos – com escopo de analisar se existia divergência no quantitativo material entre as varas cíveis comuns da Justiça Estadual instalada em Campina Grande.


O terceiro cingiu em fazer o cotejo analítico entre a média de tempo que cada vara leva para julgar os processos, e o aparato material encontrado em cada uma delas.


O quarto objetivo específico visou investigar se a produção do magistrado foi fundamental para a diferença da média de julgamento entre as varas.


Por fim, de acordo com os resultados encontrados, pôde-se constatar que as varas cíveis comuns de Campina Grande estão dando aplicabilidade ao princípio da razoável duração do processo.


2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA


2.1 O PRINCÍPIO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO


O princípio da razoável duração do processo surge no ordenamento jurídico através da Emenda Constitucional de nº 45, aprovada no ano de 2004 pelo Poder Constituinte Derivado Reformador. A referida emenda provocou uma série de modificações na estrutura do Poder Judiciário, visando dar uma resposta à população que cobra pelo julgamento, segundo o Conselho Nacional de Justiça, de 86,6 milhões de processos, 50,5 milhões deles estancados nas justiças estaduais (BRANCO, COELHO e MENDES, 2007; BRASIL, 2010c).


Uma dessas modificações, materializando o princípio em exame, inseriu no art. 5° da Constituição Federal o inciso LXXVIII, que reza: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 2010a; MORAES, 2006, 2007).


O termo “razoável”, todavia, remonta uma abstratividade singular. Em consequência dessa abstratividade, a ponderação sobre o que é ou não razoável tem que ser feita subjetivamente, a partir da análise de cada caso concreto, uma vez que o prazo razoável para uma determinada causa pode não o ser para outra (SILVA, J., 2008).


Não se podem estabelecer limites fixos de tempo para o fim do litígio. Duração razoável, como a própria nomenclatura sugere, não significa a necessidade de se fixar prazo limitado para que o processo chegue ao seu fim, mas sim de se estabelecer um dever jurídico aos magistrados, a fim de que conduzam a marcha processual com a máxima presteza possível, sem que, para tanto, sejam desrespeitadas as demais garantias constitucionais. Acaso fosse fixado prazo de validade para o processo, ao invés de direito subjetivo a duração razoável, ter-se-ia o direito subjetivo à duração legal do processo (MARINONI, 2006).


Todavia, não obstante ser incoerente estabelecer-se a duração legal do processo, a fixação da duração razoável do processo pode ser auferida e quantificada. Dar-se isto a partir da subsunção dos seguintes critérios – cuja criação deu-se pela Corte Européia dos Direitos do Homem – a cada caso concreto: i) a complexidade do assunto; ii) o comportamento das partes e de seus procuradores; e iii) a estrutura do Poder Judiciário, aqui compreendida a atuação do órgão jurisdicional (DIDIER JÚNIOR, 2009; SILVA, I., 2008).


A criação dos referidos paradigmas é bastante oportuna e pragmática, vez que o processo, para alcançar seu fim com brevidade, não depende apenas da dificuldade envolvida na causa, da atuação do juízo ou do comportamento das partes, mas sim da conjunção desses fatores (ZARIF, 2006).


Originária do sistema commom law, a complexidade da causa, dentre os três fatores que delimitam a razoável duração do processo, é o que primeiro é acionado para inferir se a marcha processual transcorreu em prazo superior ao que seria razoável. Trata-se de um critério objetivo cujo manuseio permite, de pronto, valorar o processo de acordo com a complexidade do objeto nele discutido e das normas processuais que o regem. A partir dessa análise, tem-se uma básica noção de como a resolução do litígio irá ocorrer: se num maior ou menor espaço de tempo (ANNONI, 2006).


A análise da duração de um processo passa, também, pelo estudo do comportamento das partes. Segundo Zarif:


“A atuação das partes está intimamente ligada à duração do processo, sendo um de seus princípios orientadores a lealdade e a boa-fé dos litigantes. O que se espera das partes envolvidas numa demanda judicial é exatamente que atuem em respeito a esses princípios, o que facilitará que o processo tenha sua duração reduzida, atingindo de forma mais ágil e rápida sua finalidade, que é a decisão atribuindo razão àquele que tem direito” (2006, p. 142).


O paradigma da atuação das partes leva em consideração os atos de diligência dos figurantes na relação processual, praticados com escopo de acelerar, ou não, o trâmite do processo. Como exemplo dos atos aceleratórios, cite-se a antecipação das partes ao prazo estipulado em lei ou pelo juiz para a prática de certo ato processual, ou a renúncia do prazo recursal quando não se pretende fazer uso de recursos. Verificadas essas atitudes, não de poderá imputar às partes a responsabilidade pela demora na resolução da lide (ANNONI, 2006).


A estrutura física do Judiciário refere-se à quantidade de magistrados por número de pessoas para cada localidade, a quantidade de servidores disponíveis, o número de aparelhos em cada vara, o número de varas, dentre outros. Quanto melhor for a qualidade e a quantidade desses fatores, mais rápida será a resolução da lide (ANNONI, 2006).


A atuação dos órgãos jurisdicionais (ramificação da “estrutura do Poder Judiciário”, segundo a classificação utilizada na presente pesquisa), de seu turno, cinge no comprometimento dos aplicadores do Direito na busca da razoável duração do processo. Quanto ao comportamento dos magistrados, segundo Anonni, quatro de suas condutas representam, de forma mais contundente, parcela de contribuição para com a morosidade do processo. São elas: autorização para suspender o processo, especialmente nos feitos de execução; omissão do magistrado frente às condutas protelatórias das partes; o atraso do processo devido a exigências desnecessárias de produção de prova, especialmente a testemunhal; inércia ou ineficácia do magistrado em resolver a contenda (2006, p. 225).


Gajardoni entende, por sua vez, que a contribuição do arcabouço material do Judiciário para a lentidão do processo ocorre por intermédio da desorganização judiciária local, a exemplo do aproveitamento incorreto de servidores e juízes, do investimento tecnológico e material mínimo e da ausência de divisão das matérias por especialidade (2003, p. 81-83).


2.2 DA AUSÊNCIA DE PESQUISAS CIENTÍFICAS FATOR DE INFLUENCIA PARA A MOROSIDADE DA JUSTIÇA


O Poder Legislativo, quando se presta a promover mudanças legislativas de cunho processual, deve se ater a três principais precauções, quais sejam: i) adequar a norma vindoura ao ordenamento jurídico em vigor; ii) criar uma comissão de juristas que balizem teoricamente a construção da nova norma; iii) e promover a elaboração de pesquisas científicas, no intento de trazer à lume o funcionamento, os reflexos das mudanças e, após a entrada em vigor da norma positiva, analisar a sua efetividade no meio social (NUNES, 2010).


Das três preocupações citadas ao norte, uma delas tem sido objeto de esquecimento quando da construção de normas processuais, a saber: a elaboração de pesquisas científicas. Com efeito, inúmeras mudanças processuais foram levadas a cabo desde os anos 90. Entretanto, todas foram implementadas sem um prévio levantamento científico, além do que inexistem dados concretos acerca de eventuais melhorias trazidas aos brasileiros através dessas modificações (NUNES, 2010).


Em virtude disso, a carência das mencionadas pesquisas tem sido apontada, por alguns autores, como a causa para a ineficiência do princípio da razoável duração do processo. Essa é a opinião de Araken de Assis, que explicita:


“cumpriria investigar na realidade concreta, mediante métodos empíricos, o êxito real dessas copiosas alterações legislativas. Nada aponta a implementação do ambicioso e utópico objetivo. A coleta de dados permitiria avaliar em que medida a lei infraconstitucional favorece e concede aos litigantes os “meios” referidos na Constituição para obter a “duração razoável” do processo. Entre nós, porém, poucos de entregam a semelhantes pesquisas” (2006, p. 196).


A importância dessas pesquisas estaria ainda no fato de as mesmas serem imprescindíveis para a resolução de outros problemas ensejadores da morosidade, tais como a ineficiência administrativa e legislativa. Nessa senda, a resolução da desordem administrativa do Judiciário exigiria a elaboração de pesquisas que indicassem onde estão as principais carências, a fim de se estabelecer prioridades de gestão administrativa. Igualmente, as modificações legislativas implementadas no fito de dar maior efetividade ao princípio da razoável duração do processo passariam pelo conhecimento da existência, ou não, da lentidão da justiça em cada localidade, assim como dependeria da análise dos fatores que contribuem para o estrangulamento do sistema judicial local (GAJARDONI, 2003).


Em suma, com a realização de pesquisas científicas poder-se-ia diagnosticar as principais carências de cada localidade, bem como os fatores que influenciam na duração da marcha processual. Com isso, as medidas aceleradoras do processo promovidas por mudanças legislativas seriam criadas com mais eficiência, uma vez que não seriam mais implementadas as escuras, sem um mínimo de ciência de suas prioridades e de suas consequências na vida prática. O mesmo aconteceria com as soluções de gestão administrativa, as quais, balizadas em pesquisas científicas, seriam promovidas com mais qualidade (SILVA, I., 2008).


Assim, diante da importância das pesquisas científicas para a aplicabilidade do princípio da razoável duração processual é que se fez o presente trabalho, o qual, balizado na fundamentação teórica alinhada acima, diagnosticou o problema e apontará soluções para a morosidade da justiça nas varas cíveis comuns instaladas na cidade de Campina Grande, Estado da Paraíba.


3 METODOLOGIA


Quanto à metodologia, pode-se dividi-la em três pontos: tipo de pesquisa quanto aos objetivos, tipo de pesquisa quanto ao objeto e método aplicado (GIL, 2009).


Quanto aos objetivos, o tipo de pesquisa foi descritivo, tomando-se por base as relações entre Estado e indivíduo. Buscou-se descrever, dentro dessa relação: i) quanto tempo as 8 varas cíveis comuns instaladas em Campina Grande levam, em média, para julgar os processos; ii) como está constituído o arcabouço material dessas mesmas varas; iii) se existe relação entre a variabilidade do arcabouço material e a demora dos processos; e iv) a influência do comportamento do magistrado na duração do processo (GIL, 2009).


Imprescindível ressaltar que a numeração das varas ficará sob sigilo, em respeito aos profissionais que nelas labutam e em razão do compromisso firmado no requerimento de vista dos processos. No intuito de manter tal sigilo sem prejudicar o resultado da pesquisa, cada vara será representada, de forma aleatória, pelas letras A, B, C, D, E, F, G e H.


Quanto ao objeto, os tipos de pesquisa utilizados foram: pesquisa bibliográfica, pesquisa documental e levantamento de dados (REALE, 1998; GIL, 2009).


A pesquisa bibliográfica abrangeu o estudo de diversas fontes, tais como: doutrinas; artigos; jurisprudencias; textos publicados na internet; e normas jurídicas federais e estaduais. A utilização do levantamento bibliográfico foi imprescindível, ante o embasamento teórico que o trabalho exigiu, sobretudo na parte concernente ao princípio da razoável duração do processo.


A pesquisa documental, realizada no arquivo morto do Fórum Afonso Campos entre os dias 06 de julho e 13 de outubro de 2010, tomou por base ações judiciais manejadas entre as datas de 19 de fevereiro de 2004 e 1º de abril de 2009. A amostra foi balizada em 30 (trinta) processos cognitivos de cada uma das oito varas estudadas, perfazendo-se assim um total de 240 (duzentos e quarenta) processos analisados.


Todos eles passaram pelas mesmas fases até a sentença – processos cognitivos ordinários cujo término não se deu por uma das hipóteses previstas no art. 329 do CPC (extinção anômala), tendo ocorrido em cada um deles julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 330, I, do mesmo Código -, possuíam complexidade similar, não foram influenciados por incidentes provocados pelas partes e neles não existia litisconsórcio ativo ou passivo[2]. O intuito foi constatar a média temporal de julgamento nas oito varas cíveis comuns da Justiça Estadual instalada em Campina Grande, sem a influência do comportamento das partes e da complexidade da causa na demora da marcha processual.


Para tanto, examinou-se, em cada processo, o tempo transcorrido entre a data da propositura da ação (aqui considerado como marco a data do protocolo constante na inicial) e a data da sentença (aqui considerada a data constante na parte final de cada sentença), fazendo-se, ao fim, a soma do tempo de todos processos por vara. Após, fez-se a média aritmética entre a soma total de tempo – representada em meses – e o número de processos. Para melhor elucidar o cálculo utilizado, pode-se representá-lo na seguinte fórmula:


 

ST representa a soma de tempo, em meses, de todos os processos analisados por vara; 30 corresponde ao número de processos analisados em cada vara, sendo, portanto, fixo; e MT o quociente da média de tempo alcançada com a divisão entre ST (somatório de tempo entre a data do ajuizamento da ação e a data da sentença, de cada vara, transformado em meses) e número de processos avaliados (30).


Exemplificando. Suponha-se que em uma determinada vara a soma de tempo de todos os processos tenha sido de 14 anos, 203 meses e 435 dias. Tranformando-se esse período em meses, encontrou-se o número de 385,5 (ST). Dividindo-se esse valor pelo número de processos (30), encontrar-se-ia como média geral (MT) o tempo de 12,85 meses. Em suma, fazendo-se uso da fórmula citada ao norte, pôde-se descrever quanto tempo cada vara leva, em média, para prolatar uma sentença judicial.


O levantamento de dados, por sua vez, procedido forma direta, foi operacionalizado no intento de se vislumbrar se todas as varas cíveis estavam montadas com o mesmo aparato material, a exemplo do número de aparelhos e de servidores. Quanto ao número de servidores, os dados encontrados foram obtidos junto aos registros funcionais arquivados no setor de pessoal do Fórum. No que tange ao número de aparelhos, o levantamento foi realizado na própria vara.


A partir da média de duração dos processos e da estatística estrutural, pôde-se analisar se existe relação na diferença material entre as varas e a duração dos julgamentos. Pôde-se ainda, com esteio no critério tripartite construído pela Corte Européia de Direitos Humanos (complexidade da causa, comportamento das partes e estrutura do Poder Judiciário), elucidar o quanto a produtividade do magistrado influencia na diferença de tempo de julgamento entre as varas (SILVA, I., 2008).


Finalmente, o método aplicado na pesquisa foi o dedutivo, porque se partiu das leis e teorias para os casos particulares. Assim, partiu-se do princípio da razoável duração do processo, em paralelo com o contexto do Judiciário como um todo, para realidade da Justiça Estadual instalada em Campina Grande.


4 RESULTADOS E DISCUSSÃO


O presente tópico trará, concomitantemente, os resultados alcançados na pesquisa e a discussão sobre eles, comparando-os com estatísticas do Conselho Nacional de Justiça, com outros dados estatísticos e com opiniões de doutrinadores.


 


A tabela 1 demonstra a diferença de estrutura das varas. Inicialmente, cumpre ressaltar que em nenhuma delas foram encontrados aparelhos de fax, fotocopiadoras ou scanners. Tal carência, indubitavelmente, dificulta a atividade forense, vez que os servidores e magistrados, quando necessário se fizer o uso desses equipamentos, ficam obrigados a se deslocar do seu ambiente de trabalho para outras instalações do fórum em que os aparelhos em questão estejam presentes.


A ausência desses equipamentos torna-se ainda mais grave ante a nova conjuntura inaugurada pela Lei n.º 11.419/06, que dispõe sobre a informatização do processo judicial e exige, o mais breve possível, a modernização do Judiciário. A carência de equipamentos tão básicos como scanner e aparelhos de fax comprova o atraso do Judiário Paraibano na buscar de alcançar os fins colimados pela Lei n.º 11.419/06 (BRASIL, 2010d).


Gajardoni, no mesmo sentido, ressalta em sua obra a importância da modernização do Judiciário para a rapidez na tramitação dos processos:


“A falta de substrato tecnológico e material do Judiciário, como obstáculo ao normal andamento dos feitos, é notória, notadamente nos países periféricos, e é apontada como um dos principais fatores de letargia da tutela jurisdicional” (2003, p. 83).


Não obstante, a falta de aparelhos pontuais nas varas analisadas destoam  dos dados apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça, os quais apontam um crescimento de 162,4%, entre os anos de 2004 e 2008, nos investimento do Judiciário Paraibano em equipamentos tecnológicos e de informática (BRASIL, [2009?]).


Diante dos dados obtidos, tem-se que entre as varas pesquisadas existe homogeneidade na estrutura material, havendo entre elas apenas diferenças pontuais não capazes de influenciar, consideravelmente, na variabilidade de duração dos processos. Prova disso é que não há relação entre as diferenças materiais encontradas e a demora nos processos, uma vez que a vara cuja média de julgamento foi mais rápida não era a mais bem equipada, ao passo em que a vara mais demorada detinha uma das melhores estruturas. Assim, infere-se que a estrutura material das varas cíveis comuns de Campina Grande não influiu, consideravelmente, na variabilidade da duração dos prosessos analisados.


Ademais, constatada a homogeneidade material (tabela 1), levando-se ainda em consideração que os processos examinados possuiam a mesma complexidade e que, na sua duração, não houve influência do comportamento das partes – haja vista a exclusão, na pesquisa, dos feitos que estivessem fora dos padrões previamente fixados[3] -, chega-se a conclusão de que a variabilidade de tempo dos processos em 1ª instância sofreu influência, quase que exclusivamente, da produtividade dos magistrados.


 


O gráfico 1 elucida a diferença da média de tempo no parâmetro “meses”. De pronto, percebe-se que a Vara “A” obteve o melhor desempenho, com sentenças proferidas em 6,08 meses (6 meses e 2 dias), apresentando-se como a mais célere dentre as que foram estudadas.


O pior resultado foi encontrado na Vara “D”, a qual teve média de apenas 17,73 meses (1 ano, 5 meses e 22 dias), sendo, portanto, quase três vezes mais lenta do que a Vara “A”. Proporcionalmente, enquanto a Vara “A” julga 30 processos, a Vara “D”, no mesmo período, julga aproximadamente 10. Em outros termos, a depender da produtividade do magistrado, o processo poderá ser, em 1ª instância, quase três vezes mais lento do que se tivesse sido processado por outro magistrado.


Imprescindível ressaltar que a diferença encontrada entre as Varas “A” e “D” foi influenciada quase que exclusivamente pela produtividade do juiz, haja vista que os processos analisados possuiam a mesma complexidade, o comportamento das partes não influenciou na demora da lide (processos com incidentes outros que não fossem promovidos pelo impulso oficial foram excluídos da pesquisa) e as varas possuiam quase que a mesma estrutura material (a Vara “D”, inclusive, apresentou melhor estrutura do que a Vara “A”).


Tais dados são de suma importância, pois demonstram a influência da produtividade do juiz na aplicabilidade do princípio da razoável duração do processo, vez que, a depender apenas da assiduidade do julgador, a resolução da lide poderá ser quase três vezes mais rápida.


5 CONCLUSÃO


Diante do que foi analisado e dos resultados obtidos, apesar da deficitária estrutura dos cartórios e do reduzido número de juízes e servidores, pode-se afirmar que as varas estaduais cíveis comuns de Campina Grande, consideradas como um todo, estão dando aplicabilidade ao princípio da razoável duração do processo. Com efeito, a média de julgamento de 11 meses e 19 dias para o julgamento, em 1° instância, do tipo de processo pesquisado, tendo em vista os percalços que a justiça paraibana enfrenta, é uma média consentânea com o referido princípio.


Outrossim, não há uma grande diferença estruturante entre as varas. Por isso, inexiste correlação entre a diferença de arcabouço material e a duração dos processos, eis que a Vara “D”, apesar de ser uma das mais bem equipadas, apresentou o pior resultado dentre as pesquisadas (1 ano, 5 meses e 22 dias). Ao revés, a Vara “A” foi a mais célere de todas (6 meses e 2 dias), embora possuísse uma pior estrutura do que a Vara “D”.


No que tange à variabilidade da média de julgamento, tal diferença deveu-se à produtividade dos magistrados. Partindo-se do pressuposto de que todos os outros fatores do princípio da razoável duração do processo foram anulados (complexidade da causa, comportamento das partes e estrutura do Poder Judiciário), o único que influenciou na diferença de média entre as varas foi a produção dos julgadores.


Levando-se em consideração que a variabilidade entre as Varas chegou quase ao triplo de tempo, infere-se que a produtividade do magistrado pode, por si só, reduzir em três vezes a lentidão da justiça. Em outros termos, o simples aumento da produtividade do julgador pode, sem qualquer melhoramento da estrutura das varas ou aumento do número de magistrados, reduzir em até três vezes a duração dos processos.


Comprovada a importante influência que a produtividade do juiz exerce sobre a demora do processo, as políticas públicas voltadas para minorar os efeitos da lentidão da justiça devem priorizar o aumento da assiduidade dos magistrados, sem prejuízo das demais políticas já conhecidas como melhoramento da estrutura judiciária, aumento do número de servidores e de juízes, bem como as mudanças legislativas.


Na busca desse incentivo, seria imprescindível a criação de uma verba salarial, a ser acrescida aos salários já existentes, cujo seu adimplemento fosse condicionado à produtividade. Tal produtividade, por sua vez, seria auferida por critérios objetivos ligados à celeridade, como, por exemplo, o número de sentenças prolatadas anualmente, ou o número de audiências feitas em um determinado período.


Medida outra que traria bons resultados sem grandes gastos, trata da realização de reuniões periódicas entre os magistrados. De fato, durante a pesquisa, constatou-se que determinadas varas faziam uso de um procedimento menos formal, objetivando a celeridade dos feitos sem fustigar as demais garantias processuais. Outras, contudo, utilizavam-se de um formalismo exacerbado e retrógrado. Reuniões procedidas no fito de unificar os procedimentos, além de servir como uma forma de atualização, fariam com que os juízes, até então formalistas, fizessem uso dos procedimentos mais céleres adotados por outros magistrados, diminuindo assim o tempo de duração dos processos em suas respectivas varas.


Além do incentivo aos magistrados, a redução do tempo de duração dos processos exige um maior investimento econômico-material passível de fomentar a estrutura judiciária. Quanto maior for o número de servidores, de magistrados e de cartórios judiciários, mais rápidas serão as resoluções de conflitos.


Ademais, não se pode olvidar que sem efetividade não há processo justo. Igualmente, em sendo lenta a prestação jurisdicional, não há tutela efetiva, e mesmo que a pacificação de interesses venha com demora, o transcurso do tempo – sem razão plausível – em que o titular do direito subjetivo esteve a espera do Judiciário já se configura, por si só, uma injustiça.


Por isso, a aplicabilidade do princípio da razoável duração do processo é um desejo que tem que ser perseguido e incentivado cotidianamento no meio forense. Do contrário, a eficácia dessa norma reduzir-se-á a mera formalidade legal de existência jurídica, sem eficácia material no mundo concreto.


 


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Notas:

[1] Como se observa nas decisões emanadas no Mandado de Injunção nº 715/DF e Habeas Corpus n° 83.773-5/SP, ambos julgados pelo Supremo Tribunal Federal.

[2] A amostra foi, portanto, sistemática.

[3] O trâmite padrão da pesquisa foi: petição inicial, contestação, impugnação, audiência de conciliação quando, determinada de ofício pelo juiz e, por fim, sentença. Todas as fases processuais foram iniciadas por impulso oficial, não havendo incidentes provocados pelas partes.

Informações Sobre os Autores

Aécio de Souza Melo Filho

Advogado Militante. Professor Universitário de Teoria Geral do Processo. Mestre pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

Brunno Kléberson de Siqueira Ferreira

Bacharel em Direito

Tércio de Sousa Mota

Advogado, Professor da Unesc Faculdades, Mestrando do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Estadual da Paraíba


Equipe Âmbito Jurídico

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