Resumo: No cenário mundial, inclusive no Brasil, tem ocorrido transformações nos conceitos de dano à pessoa, considerando uma valorização do princípio da dignidade da pessoa humana para alcançar uma tutela mais efetiva dos direitos. Com isso surgem novas espécies de dano extrapatrimonial. Ademais, é mister que a maior quantidade de danos traz maior complexidade à questão da quantificação da reparação. Isto posto, é mister traçar os parâmetros conceituais introdutórios, caracterizando os movimentos de constitucionalização do direito e indicando que os princípios constitucionais estão relacionados aos danos extrapatrimoniais e definir parâmetros balizadores da reparação desses danos. É evidente que a interpretação conforme a constituição não abarca mais a concentração de conceitos de dano a pessoa, dessa forma é necessária a compartimentalização para uma melhor análise da extensão do dano e as características balizadoras da reparação.
Palavras-chave: Constitucionalização; compartimentalização do Direito; Reparação Integral; Dano extrapatrimonial.
Abstract: On the world stage, including in Brazil, there has been changes in the concepts of damage to person considering an appreciation of the principle of human dignity to achieve a more effective protection of rights. Before that, tehre are new kinds of Non patrimonial damage. Furthermore, it is necessary that the largest amount of damage brings higher complexity of the issue repair quantification. That said, it is necessary to trace the introductory conceptual parameters, characterizing the constitutionalization of the right moves and indicating that the constitutional principles are related to off-balance sheet damage and set benchmarks parameters of compensation for such damage. It is evident that the interpretation according to the constitution not encompass the concentration of the individual concepts damage, thereby compartmentalization for better analysis of the extent of the damage and repair guide characteristics is required.
Keywords: Constitutionalisation; compartmentalization of law; Integral repair; Non patrimonial damage.
Sumário: Introdução. 1. A Constitucionalização Do Direito Civil e a Valorização da Pessoa Como Premissa Básica dos Danos Imateriais; 1.1 A Constituição e a Responsabilidade Civil Por Danos Extrapatrimoniais. 2. Princípios e os Danos à Esfera Pessoal Humana. 2.2 Os Princípios e a Elaboração De Interpretações Constitucionalizadas 3. A Necessidade de Desconcentração de Conceitos e o Problema da Quantificação dos Danos Extrapatrimoniais. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
Falar sobre as noções básicas de um determinado instituto é indicar os arcabouços legais e fáticos que deram origem ao conceito estudado.
No caso da responsabilidade civil é mister se falar no movimento de constitucionalização das normas infraconstitucionais, a partir desse momento temos que estas devem ter uma “interpretação conforme” as normas constitucionais.
Essa interpretação deve ter como base os princípios, enumerados ou não, traduzindo uma realidade de reparações mais próximas à conjuntura social.
A partir daí que surge a chamada compartimentalização do Direito, e consequentemente uma ramificação dos conceitos de danos a pessoa que antes de concentravam sob a noção de danos morais, que agora se mostra evidentemente insuficiente para reparar os anseios sociais modernos.
Todavia, as novas ideias acerca de danos extrapatrimoniais trazem consigo uma maior complexidade acerca da quantificação da reparação.
1. A COSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL E A VALORIZAÇÃO DA PESSOA COMO PREMISSA BÁSICA DOS DANOS IMATERIAIS
O estudo da responsabilidade civil sofreu diversas mudanças ao longo dos séculos. Nenhum Direito se encontrava tão distante dos enunciados constitucionais quanto o Direito Civil. Este era concebido como a Constituição do homem comum, um direito privado afastado do direito público, remetendo uma independência do direito civil, o qual seria capaz de resolver tudo da vida privada.
Com o passar dos anos, mais precisamente após as grandes guerras mundiais, o Estado passou a intervir mais na vida privada, movimento este que aproximou institutos como o Direito Civil da Constituição, levando ao que chamamos hoje de constitucionalização do Direito Civil.
Na Alemanha, sob o regime da Lei Fundamental de 1949, o processo de constitucionalização do direito tomou contornos expressivos a partir do caso Luth[1] no ano de 1958. Na Itália, sob o regime da constituição de 1948 e com o estabelecimento da corte constitucional no ano de 1956, a constituição e seus direitos passaram a repercutir na legislação infraconstitucional.
Segundo Luís Roberto Barroso, a constitucionalização do direito acontece em duas vertentes: a primeira seria um movimento de inclusão na constituição de normas afetas ao direito infraconstitucional, como ocorre nas constituições portuguesa (1976), espanhola (1978) e brasileira (1988). A segunda seria uma expansão dos efeitos das normas constitucionais para todos os outros ramos do direito infraconstitucional, por exemplo o direito civil e as relações entre particulares.
“Os valores, os fins públicos e os comportamentos contemplados nos princípios e regras da Constituição passam a condicionar a validade e o sentido de todas as normas do direito infraconstitucional. Como intuitivo, a constitucionalização repercute sobre a atuação dos três Poderes, inclusive e notadamente nas suas relações com os particulares. ” [2]
No Brasil, o processo começou mais tardiamente. Na época de sua promulgação, o Código Civil de 1916 passou a ocupar papel central no ordenamento jurídico brasileiro. Entretanto, com o passar dos anos, ocorreu um processo de descodificação do Código Civil[3], surgindo então diversas leis específicas para tutelar direitos como da criança, ambiental, alimentos, família e outros. Com a Constituição de 1988, o Código Civil perdeu a posição central, dando lugar ao novo diploma. As normas jurídicas anteriores e incompatíveis foram revogadas[4], agora as normas passam a vigorar sob a ótica constitucional.
Sob esse aspecto, merece destaque o princípio da dignidade da pessoa humana. Como já dito, após a segunda guerra mundial ocorreu um movimento de reestruturação dos direitos humanos. A constituição brasileira dá especial ênfase à dignidade da pessoa humana, sendo este um dos fundamentos da república.
Tal princípio passa a nortear a interpretação normativa do direito privado no novo cenário jurídico. O patrimonialismo existente até então passa a ser mitigado. O valor humano passa a ser o centro dos direitos fundamentais, inclusive do direito privado. O patrimônio deixa de ser essencial para fazer papel secundário. Este faz parte do ser humano e não o contrário, como antes parecia ser. Nesse sentido o Ministro Marco Aurélio[5]:
“O Direito Civil, na expressão empregada por Luiz Edson Fachin, sofreu uma “virada de Copérnico”, foi constitucionalizado e, por consequência, desvinculado do patrimônio e socializado. A propriedade e o proprietário perderam o papel de centralidade nesse ramo da ciência jurídica, dando lugar principal à pessoa. É o direito do “ser”, da personalidade, da existência. ”
O sujeito de direito passa a ser mais do que titular de bens. Esse é o primeiro passo para se interpretar o Direito Civil à luz dos direitos fundamentais, como o princípio da dignidade da pessoa humana. Nessa perspectiva, a constitucionalização ocorre dando importância maior a pessoa humana e ao social, a existência passa a superar as relações patrimoniais.
Para Miguel Reale[6], tal mudança do patrimonialismo para privilegiar as relações existenciais e sociais fica clara logo nos primeiros artigos no Código Civil de 2002:
“Reflexo dessa mudança de perspectiva, é o que se dá nos artigos de abertura do novo Código Civil, onde – ao contrário do código revogado, que declarava “todo homem” capaz de direitos e obrigações na ordem civil, o ora em vigor prefere se referir a “toda pessoa”, acrescentando que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida”.
Pequena diferença aparentemente, mas que representa profunda mudança na colocação inicial da vida jurídica, uma vez que a palavra homem tem o sentido genérico e abstrato de indivíduo, ao passo que a apalavra pessoa já indica o ser humano enquanto situado perante os demais componentes da coletividade. Efetivamente, o conceito de pessoa resulta da relação do eu com outros eus, o que distingue o ser humano de todos os outros animais. ”
É evidente a mudança de paradigma vista antes e depois da Constituição de 1988, corroborada esta pelo advento do Código Civil de 2002. Este por sua vez chega a dedicar capítulo exclusivo aos “direitos da personalidade”. Estes direitos se remetem ao direito fundamental da dignidade humana, e a este estão subordinados.
Os direitos da personalidade não são patrimoniais, são subjetivos. Para Limongi França, compreendem o direito à integridade física, à moral e à intelectual.[7] Data vênia, porém, tal classificação se mostra redundante, visto que os campos morais e intelectuais se confundem diversas vezes. Logo, se mostra mais adequada a divisão dos direitos da personalidade em físicos e psíquicos.[8] Assim, são direitos das pessoas os que as compõem, garantindo a integridade de suas características físicas e de comportamento. São aqueles atributos que compõem as pessoas.[9]
O que se atentou foi o fato que tais direitos poderiam ser alvo de lesões provocadas por terceiros. Dessa forma, as pessoas lesadas deveriam ser protegidas pelo instituto da responsabilidade civil, que agora passa a tutelar os direitos fundamentais das pessoas e consequentemente os direitos da personalidade, prevenindo e punindo ofensas ao equilíbrio desses.
Os danos extrapatrimoniais já eram reconhecidos antes da Constituição de 1988. Todavia, a indenização sobre essa modalidade de dano não era eficaz, apenas com a superação da teoria da diferença[10] e o advento na atual Constituição que os direitos fundamentais receberam uma atenção mais profunda. Resultado de uma alteração de mentalidade cultural e histórica das pessoas.
Essa alteração traz hoje diversas implicações ao ordenamento jurídico. A sociedade tem sofrido mudanças em uma velocidade avassaladora e inevitavelmente o direito deve seguir acompanhando tais modificações. As relações sociais vão se tornando mais complicadas, difíceis e próximas. Chega a ser inevitável que as relações interpessoais se intensifiquem e as pessoas se aproximem tanto de outros indivíduos, e que o risco de lhes causar qualquer dano cresce proporcionalmente à complexidade dessas relações[11]. Daí surgem novas modalidades de dano, dentre elas o dano estético e o dano existencial.
Nesse sentido, atentando às transformações sociais e à maior preocupação na tutela de interesses imateriais das pessoas, as principais preocupações da sociedade atual se tornaram o bem-estar social e a qualidade de vida das pessoas. Esses são elementos caracterizadores da personalidade do ser humano. Este que é destinado a atingir a felicidade e realização pessoal. Premissas básicas de uma existência digna.
As “novas” modalidades de danos[12] têm surgido como reflexo dessa nova identidade social constitucionalizada. Nesse sentido apresentam-se os danos existenciais, os danos estéticos e outras espécies de reparação. O conceito de dano moral não abraça mais os interesses não patrimoniais dos indivíduos como acontecia anteriormente. Hoje se mostra razoável a tutela de todo e qualquer dano juridicamente relevante, e em atenção ao princípio da especialidade, devemos realizar um desmembramento do conceito de dano moral para chegar uma eficácia jurídica satisfatória que antes não seria possível.
Atualmente, apesar de mais aceitas, essas ideias ainda encontram resistência na doutrina e jurisprudência pátrias. Talvez por interesses que não sejam jurídicos, a Constituição e o Código Civil insistem em reduzir o conceito de dano não patrimonial como sinônimo de dano moral. Felizmente a jurisprudência tem aberto precedentes contrariando esta ideia.
1.1 A CONSTITUIÇÃO E A RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS
A Constituição de 1988 muito inovou e contribuiu para a constitucionalização do direito civil. Atentando para isso podemos destacar algumas normas norteadoras para o instituto jurídico da responsabilidade civil.
O diploma constitucional não modificou a forma como o dano era tratado anteriormente. A princípio todo dano deve ser indenizado. É matéria pertinente e prioritária quando se remete aos conceitos de justiça, paz, ordem e segurança. Hoje julgamos a conduta e não o agente.
Nesse sentido a Constituição estabelece direitos invioláveis, sob pena de dever de indenizar. No caso dos direitos fundamentais, esse dever não está explícito na norma, mas é implícito e indiscutível sua aplicação.
Dessa forma, a Constituição não exclui quaisquer direitos “decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados […]”, abrindo margem para a adaptação jurídica no que concerne as mudanças sócio culturais que refletem no Direito. A Constituição abarcará quaisquer direitos que sejam decorrentes da interpretação social das normais que nela estão contidas[13]. Como essas normas contém conceitos abertos, são vagas e indeterminadas, os institutos protegidos também são, podendo surgir ou desaparecer hipóteses de indenização à medida que carecem de “mediações concretizadoras” do Estado para que possam aplicá-las de forma concreta[14].
Assim, o texto constitucional não utilizou a expressão mais adequada ao caso concreto. Não podendo restringir a aplicação da indenização por danos extrapatrimoniais pelos tribunais brasileiros.
2. PRINCÍPIOS E OS DANOS À ESFERA PESSOAL HUMANA
A palavra princípio pode ser definida como o início, a base ou a origem de algo. No Direito não é diferente. Os princípios estão dispostos na Constituição, são normas descritivas que indicam direitos fundamentais. Estes direitos nada mais são que um estado ideal das coisas, no qual a norma principiológica pretende na sua aplicação indicar uma correlação entre estes bens protegidos e a conduta necessária para sua proteção[15].
Os princípios da responsabilidade civil visam comportamentos capazes de promover um determinado estado das coisas necessário para quem sofreu um dano ou está em risco de sofrer. Nesse sentido, podemos indicar que o estado ideal para a responsabilidade civil seria situação garantida por uma conduta repressiva e outra preventiva, onde ambas objetivam uma ordem em que as pessoas devem agir para preservar o direito alheio, estabelecendo assim condutas aceitáveis e punindo as reprováveis.
Nos danos a pessoa não poderia ser diferente. Como o próprio nome já diz – e sem querer antecipar a discussão – a existência da pessoa humana é o bem mais valioso dentre todos. Pode-se citar diversos princípios que garantem a proteção. Mas o princípio da dignidade da pessoa humana se mostra nevrálgico para a acepção das novas modalidades de dano.
2.1 OS PRINCÍPIOS E A ELABORAÇAO DE INTERPRETAÇÕES CONSTITUCIONALIZADAS
A concepção de danos a pessoa, como em qualquer parte do direito, vem acompanhada de uma vasta carga social, ou seja, de uma percepção histórica na qual estão inseridos.
A constituição brasileira é clara quanto ao seu caráter não taxativo das normas principiológica e dos danos à pessoa. O § 2º do artigo 5º de nossa Constituição Federal aponta que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.
Essa não taxatividade dá uma abertura à atuação dos princípios, de modo que balizem e inovem as relações jurídicas de acordo com a conjuntura temporal-sociológica na qual estão inseridos.
Pode-se coadunar essas ideias na percepção de que decisões principiológica não são mais ou menos legítimas do que aquelas que tomam por base normas jurídicas ou outras fontes do direito.
Assim, tem-se a ideia de criação do direito a partir da função interpretativa do poder Judiciário. A diferença reside na necessidade deste justificar a interpretação com base em alguma ideia, daí serem imprescindíveis os princípios nessa função.
Os poderes públicos só podem tomar decisões a partir de uma interpretação conforme a constituição. Mas na criação de interpretações, especialmente o poder judiciário não deve levar apenas em conta normas jurídicas.
Perceba-se que o legislativo tem o condão de observar a conjuntura social e determinar mudanças nas normas para a adaptação destas ao novo cenário. Isso pode ocorrer inclusive com normas constitucionais. Por isso são decisões essencialmente políticas.
De outro lado, no poder judiciário, a criação de novos direitos deve vir de uma inovação da interpretação de normas anteriormente existentes. Para isso deve se levar em conta princípios que balizem o novo entendimento. Afinal, o judiciário não cria leis, mas sim interpretações conforme a Constituição.
A abertura constitucional do § 2º do artigo 5º de nossa Constituição Federal aponta para a possibilidade de novas interpretações dos danos a pessoa. Essas novas interpretações devem prestigiar princípios.
Ressalte-se que os princípios aqui falados não são só aqueles enumerados na constituição, mas também aqueles não enumerados. Desses que se pode tirar as novas interpretações conforme.
Diante disso, as novas espécies de danos provenientes de interpretações do poder judiciário, não podem ser entendidas como regras criadas por um legislador delegado. Mas sim novas interpretações nas quais são incluídas ideias trazidas por princípios enumerados ou não, ou seja, a ideia trazida por norma que já existia, o que se promove é uma especialização dos danos a pessoa.
Exemplo disto é o ocorrido com os danos morais e o surgimento dos danos existenciais aplicados atualmente na Justiça do Trabalho. A noção trazida nesses danos é o da violação da autonomia privada com reflexos em sua vida em relação e nos projetos de vida. Ora, o instituto da autonomia privada já é protegido pelo princípio da Dignidade da Pessoa Humana, porém, é mister perceber que apenas recentemente os tribunais têm entendido pela aplicação da proteção sob um conceito autônomo. É a adequação da interpretação dada a um bem antes protegido sobre o conceito de danos morais. Para isso se leva em conta o favorecimento de princípios.
Esse movimento de adequação das interpretações, é um viés da constitucionalização do direito civil.
A existencia de princípios, enumerados ou não, que dão prioridade à proteção do âmbito pessoal humano, cria uma ideia de necessidade de proteção oriunda deles. Daí a necessidade de reconstrução de um conceito clássico do dano moral, com necessário desmembramento e separação dos conceitos, para promover assim uma especialização e, consequentemente, proteção integral.
Esse movimento interpretativo conforme a constituição deve estar aliado às mudanças sociais, evitando-se sempre o engessamento do Direito, que tem o dever de estar sempre se reinventando, para que se aproxime ao máximo de ideal de justiça.
Portanto, no caso de mudanças socioculturais, deve-se fazer o uso da abertura promovida pela Constituição Federal para se readequar a interpretação das normas com base nos princípios existentes, favorecendo um e desfavorecendo outro.
3. A NECESSIDADE DE DESCONCENTRAÇÃO DE CONCEITOS E O PROBLEMA DA QUANTIFICAÇÃO DOS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS
O surgimento de novas espécies de danos traz consigo novas problemáticas para o Direito contemporâneo. Antes da chamada ramificação do Direito, os conceitos eram abarcados em um só, qual seja, os danos morais.
Dessa concentração se extrai a ideia de que a análise era feita de forma integral, atribuindo de uma só vez a quantificação da reparação pertinente ao caso.
Fernanda Muraro Bonatto, em sua obra intitulada “A quantificação da indenização por dano extrapatrimonial: análise dos critérios jurisprudenciais na determinação do quantum debeatur”[16], diz que o Judiciário possui critérios definidos para obtenção do quatum reparatório: o grau de culpa das partes envolvidas; a condição socioeconômica das partes envolvidas; a extensão do dano; e a intensidade do sofrimento da vítima.
Para que os critérios sejam aplicados de forma satisfatória é mister que se considere todos os conceitos de forma autônoma, porém não independentes entre si, ou seja, deve-se identificar cada conceito e sua caracterização para após medir a extensão do dano. Afinal, todos os danos extrapatrimoniais são derivações do princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
“Rejeita-se a concepção de que o elemento diferenciador entre o dano patrimonial e extrapatrimonial se encontra na patrimonialidade ou não do dano causado. O conceito do dano será dado segundo o efeito produzido no sujeito lesado, ou seja, sempre que o efeito do dano repercutir sobre valores ligados à própria pessoa do lesado, mesmo que não se possa caracterizar uma lesão à direito de personalidade, tem lugar o dano extrapatrimonial”[17].
Dessa forma, não cabe ao julgador analisar uma forma de dano sem analisar os demais, de outra forma não é possível chegar satisfatoriamente a medição da extensão do dano, pois, dentre outras situações, um pode ser reflexo do outro, fazendo-se mister rejeitar a analise independente de todos.
Após a determinação da extensão do dano, deve-se analisar a condição socioeconômica das partes envolvidas. Afinal, não é viável a condenação excessivamente exagerada que torne impossível a reparação[18]. Do contrário importaria em um desvio de finalidade da própria reparação. No mesmo viés é preciso ser cauteloso quanto ao enriquecimento ilícito.
Portanto, o estabelecimento do quantum indenizatório não poderá fugir da incidência de determinado grau de subjetivismo. Assim, o julgador deve analisar a vítima e o ofensor, suas condições financeiras, como também todas as informações relevantes para se chegar com razoabilidade a um quantum favorável e justo no caráter punitivo e preventivo que a reparação deve ter.
A compartimentalização do Direito contribui para a análise mais precisa da reparação. Todavia, os danos à pessoa devem ser apreciados de forma conjunta, devendo ser considerados reciprocamente, para que melhor se identifique a sua extensão e evitar o bis in idem.
Ademais, é imprescindível diferenciar e afastar a hipótese de reparação integral do dano nos casos de lesões extrapatrimoniais. Pois é inviável o retorno do status quo ante a esses danos. A ideia que se mostra mais adequada para trabalho é a de compensação dos danos.
“Enquanto que os danos patrimoniais são passíveis de ressarcimento (mediante restituição in natura ou indenização stricto sensu) o mesmo não ocorre com os danos extrapatrimoniais, pois estes não são “ressarcíveis”, mas “compensáveis”. O pagamento do quantum indenizatório não é capaz de eliminar o prejuízo causado pela chamada dor moral, sendo que a indenização desse tipo de dano possui natureza apenas satisfatória ou compensatória. [19]”
Dessa forma, a medição da extensão do dano deve levar em conta os conceitos de dano de forma independente. Todavia, sua acepção diante de cada fato danoso deve ser recíproca, ou seja, um fato pode gerar diversos danos e o mesmo dano pode ser proveniente de fatos diferentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao fim, faz-se necessária uma análise e reflexão sobre o tema da pesquisa realizada.
A reconstrução do conceito de danos morais, afastando a hipótese de sinonímia entre o termo e a definição de danos extrapatrimoniais, se faz necessária para abranger os demais danos à pessoa.
É mister que o Direito como Ciência deve estar em constante processo de adaptação ao meio social. Portanto, a partir de novos casos concretos o Direito deve reconstruir o seu olhar e adaptar-se à nova realidade fática.
A interpretação conforme a Constituição leva a uma ideia de constitucionalização do direito infraconstitucional, a qual implica em uma tutela mais específica dos direitos da pessoa humana.
Todavia, com o surgimento de novas interpretações acerca dos danos a pessoa, surgem também novas necessidades. Dessa forma, é importante que as definições de dano à pessoa como dano moral, estético, existencial e outros estejam sempre bem definidas no caso concreto. Assim, evita-se o bis in idem ou a impunidade quanto à reparação dos danos causados.
Advogado e Bacharel em Direito na Universidade Federal da Paraíba
Acidentes de trânsito podem resultar em diversos tipos de prejuízos, desde danos materiais até traumas…
Bloqueios de óbitos em veículos são uma medida administrativa aplicada quando o proprietário de um…
Acidentes de trânsito são situações que podem gerar consequências graves para os envolvidos, tanto no…
O Registro Nacional de Veículos Automotores Judicial (RENAJUD) é um sistema eletrônico que conecta o…
Manter o veículo em conformidade com as exigências legais é essencial para garantir a sua…
Os bloqueios veiculares são medidas administrativas ou judiciais aplicadas a veículos para restringir ou impedir…