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A imprescindibilidade da atuação do Ministério Público para a efetivação de políticas públicas voltadas à criança e ao adolescente

Resumo: O presente trabalho propõe a estudar a imprescindibilidade da atuação do Ministério Público para a efetivação de políticas públicas voltadas à realização dos direitos das crianças e adolescentes frente à inércia dos administradores públicos responsáveis pela adoção dessas políticas, em especial o direito fundamental à educação.

Palavras-chave: Ministério Público; Efetivação de Políticas Públicas; Criança e Adolescente; Educação.

Resumen: Este trabajo tiene como objetivo examinar el papel crucial de los fiscales de la aplicación de políticas públicas destinadas a la realización de los derechos de los niños, niñas y adolescentes contra la inercia de los funcionarios públicos responsables de la adopción de estas políticas, en particular el derecho a la educación.

Palabras clave: Fiscales, Una política pública efectiva, La Niñez y la Adolescencia, Educación.

Sumário: 1. Introdução; 2. Conclusão; 3. Referências Bibliográficas

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho se propõe a estudar a importância e a imprescindibilidade da atuação efetiva do Ministério Público para a realização das políticas públicas voltadas para as crianças e adolescentes, frente à inércia dos gestores públicos. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu uma série de normas que ditaram comportamentos a serem adotados pelo Estado, tendentes a propiciar à população o usufruto de políticas capazes de suprir suas necessidades básicas, são as chamadas normas programáticas.  Cumpre ao gestor adotar medidas para efetivar os direitos garantidos por essas normas.

 Nesse particular, o art. 227 da Constituição Federal atribuiu ao Estado, juntamente com a família e a sociedade, o dever de assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

 Além disso, especificamente ao Estado, foi determinada a obrigatoriedade de promover programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil e criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.

 No âmbito infraconstitucional, e para reforçar o encargo do Estado, buscando dar concretude ao comando constitucional supra mencionado, foi editada a Lei 8.069/90, estatuto da criança e do adolescente, que dentre outras providências, estabeleceu de forma inequívoca, linhas de ação e diretrizes da política de atendimento à criança e ao adolescente. Assim, incumbe aos gestores públicos, e em especial ao gestor municipal, já que uma das principais diretrizes é a municipalização do atendimento, dentre outros, a promoção de políticas sociais básicas, o oferecimento de serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão; criação de conselhos dos direitos da criança e do adolescente; manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente e, principalmente, a criação e manutenção dos conselhos tutelares.

 Ocorre que o que se tem visto é uma quase completa negação dos direitos básicos das crianças e adolescentes, notadamente em municípios de menor porte. O gestor público municipal, seja por má-fé, desleixo ou simples negação de prioridade não tem se esforçado para promover as políticas, comportamentos e ações a que está obrigado, tendentes a favorecer a efetivação desses direitos. São constantes a falta de vagas em escolas ou a existência de salas de aula superlotadas, falta de escolas especializadas para portadores de necessidades especiais, ausência de atendimento especializado em postos de saúde ou hospitais, resistência para instalação e manutenção dos conselhos tutelares e conselhos da criança e adolescente, isso apenas para citar as omissões mais comuns.

 Muitas vezes fundado na equivocada justificativa de limitação orçamentária ou teoria da reserva do possível, os gestores têm perpetuado esse perverso quadro de negação dos direitos básicos das crianças e adolescentes.

 Nesse passo, o trabalho procura demonstrar que o Ministério Público, elevado pela Constituição Federal de 1988 como defensor da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis vem assumindo papel relevante ao ponto de se tornar imprescindível, para a tomada de providências no sentido de tornar realidade os direitos garantidos às crianças e adolescentes. É cada dia mais frequente a instauração de inquéritos civis, assinatura de termos de ajustamento de conduta ou a propositura, pelo Ministério Público, de ações civis públicas para a garantia de atendimento médico, matrícula em escola, criação e manutenção de conselhos tutelares e conselhos da criança e do adolescente, dentre outros.

 O que se vê é que as políticas públicas de responsabilidade, principalmente dos gestores públicos municipais, ficam relegadas a simples lembranças da lei até que o Ministério Público intervenha e adote providências contra o gestor omisso, inclusive, em alguns casos, com a concomitante responsabilização por improbidade administrativa. A constituição Federal determinou uma série de normas que veiculam a obrigatoriedade de adoção de comportamentos e ações pelos gestores públicos para possibilitar a efetivação de direitos sociais.

 Dentre esses direitos assumem especial relevância os direitos garantidos às crianças e adolescentes. Esse conjunto de ações, comportamentos e iniciativas de responsabilidade do Estado compõe o núcleo das chamadas políticas públicas, que devem ser compreendidas como “aquelas ações voltadas para a concretização da ordem social, que visam à realização dos objetivos da República, a partir da existência de leis decorrentes dos ditames constitucionais” (FRISCHEISEN. 2000, pág. 80), ou como destaca VERONESE:

“Política pública não é sinônimo de assistencialismo e, muito menos, de paternalismo, antes é conjunto de ações, formando uma rede complexa, endereçada sobre precisas questões de relevância social. São ações, enfim, que objetivam a promoção da cidadania” (1999, pág. 193).

 Tratando-se, no entanto, da efetivação dos direitos de crianças e adolescentes, essas políticas se tornaram absolutamente necessárias e prioritárias haja vista que o atendimento a esses direitos deve ocorrer com prioridade absoluta, especialmente porque o Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu que essa prioridade deve ser entendida como a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. Segundo Liberati:

Por absoluta prioridade, devemos entender que a criança e o adolescente deverão estar em primeiro lugar na escala de preocupação dos governantes; devemos entender que, primeiro devem ser atendidas todas as necessidades das crianças e dos adolescentes[…].

Por absoluta prioridade, entende-se que, na área administrativa, enquanto não existem creches, escolas, postos de saúde, atendimento preventivo e emergencial às gestantes, dignas moradias e trabalho, não se deveriam asfaltar ruas, construir praças, sambódromos, monumentos artísticos, etc., porque a vida, a saúde, o lar, a prevenção de doenças são mais importantes que as obras de concreto que ficam para demonstrar o poder do governante.” (1991, p. 45).

Contudo, a falta de vontade política dos gestores, a sobreposição de interesses político-pessoais, o despreparo técnico dos servidores municipais, direcionamento dos orçamentos para programas diversos, dentre outros fatores, têm se constituído um sério obstáculo à adoção de políticas públicas sérias voltadas à realização prática dos direitos das crianças e adolescentes.

Esse quadro indesejável abriu espaço para a atuação do Ministério Público, valendo-se da nobre missão que lhe atribuiu a Constituição Federal de defensor dos direitos sociais e individuais indisponíveis, categoria na qual estão inseridos os direitos garantidos à criança e ao adolescente. Além da dos artigos 127 a 129 da Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, nos artigos 200 a 205 atribuiu ao Ministério Público encargo especial na defesa desses direitos. Dentre as várias atribuições e formas de atuação poderá promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3º inciso II, da Constituição Federal. 

Cada vez mais se observa a utilização efetiva desses recursos, pelo Ministério Público, com o fim de coagir os gestores omissos a adorarem as políticas públicas a que estão responsáveis. Cite-se, por exemplo, as providências adotadas pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais ao propor a ação civil pública nº 2614949-07.2008.8.13.0105 tendente a forçar o prefeito municipal a cumprir obrigações fixadas em Compromisso de Ajustamento de Conduta, consistente na estruturação do Conselho Tutelar do Município de Alpercata/MG[1].

Iguais a essa, diuturnamente, o Ministério público é chamado a adotar providências contra a omissão dos gestores públicos. Assim, a realização de políticas públicas favoráveis à efetivação dos direitos das crianças e adolescentes fica cada vez mais dependente da atuação dos órgãos do Ministério Público. Evidentemente, não devia ser assim. Os gestores públicos deveriam, voluntariamente, desincumbir-se desse encargo cumprindo as funções que lhes cabem e que lhes foram impostas tanto pela Constituição como pela lei.

CONCLUSÃO

A imprescindibilidade da atuação ministerial torna-se patente posto que, não fosse assim, a conduta ímproba de administradores públicos descompromissados ou escondidos sob o manto da falácia da reserva do possível constituiria obstáculo intransponível para a realização dos direitos sociais das crianças e adolescentes. Os gestores públicos têm, equivocadamente, alegado a falta de recursos públicos para o provimento de políticas básicas de atendimento às crianças e adolescentes. A adoção ilegítima da teoria da reserva do possível somada à discricionariedade administrativa tem servido para justificar o direcionamento de recursos públicos para diversos outros fins, em detrimento das políticas de atendimento às crianças e adolescentes. Esse quadro tem forçado o Ministério Público a assumir o papel de órgão necessário para a adoção de providências tendentes a corrigir esses nefastos equívocos, inclusive, com a punição dos responsáveis.

 

Referências
ALVES, Roberto Barbosa. Direito a Idnfância e da Juventude. 3 ed. Saraiva. São Paulo: 2008.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil  de 05/10/1988.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n.º 8.069 de 13 de julho de 1990. Diário Oficial da República Federativa do Brasil  de 13/07/1990.
FRISCHEISEN, Luiza Cristina Fonseca. Políticas públicas – A responsabilidade do administrador e o Ministério Público. Max Limonad. São Paulo: 2000.
GARCIA, Emerson. Ministério Público: Organização, Atribuições e Regime Jurídico. 2 ed. Lumen Juris Editora. Rio de Janeiro: 2005.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12 ed. Saraiva. São Paulo: 2008.
LIBERATI. Wilson Donizeti. O Estatuto da Criança e do Adolescente. IBPS. Brasília: 1991.
MAZZILLI, Hugo Nilo. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. 21 ed. Saraiva. São Paulo: 2008.
MORAES, Voltaire de Lima. Ação Civil Pública: Alcance e Limites da Atividade Jurisdicional. Livraria do Advogado. Porto Alegre: 2007.
PAULO, Vicente. ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 5 ed. Forense. São Paulo: 2010.
VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos da Criança e do Adolescente. LTr. São Paulo: 1999.
www.tjmg.jus.br
 
Notas:


Informações Sobre o Autor

Elizangela Santos de Almeida

Mestranda em Educação pela Universidade de Uberaba – UNIUBE; Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes – UCAM; Pós-Graduanda em Ensino de Filosofia, bem como Coordenação Pedagógica e Planejamento pela Universidade Cândido Mendes – UCAM; Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES


Equipe Âmbito Jurídico

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