Resumo: O presente trabalho tem o escopo de analisar, investigar e trazer à tona a atual condição em que se encontra a classe laboral dos domésticos. Para isso, expõe como é tratada tal categoria frente à confecção de novas leis, que conseguiram trazer para a seara da legalidade seu ofício, e proporcionaram uma melhor condição de vida e de dignidade a todos os trabalhadores dessa classe. Detêm-se ainda na previsão, mesmo que discriminadora, da categoria na Carta Maior de 1988, sua relevância e importância nessa conquista histórica; analisa a lei n.º 5.859 de 1972, a primeira norma a regulamentar a classe laboral doméstica e a dispor sobre suas peculiaridades, o que podemos entender como suas minúcias que beiram a discriminação em vista da omissão dessa Lex acerca de outros direitos não imputados a essa categoria; esta pesquisa aborda também a discriminação à não obrigatoriedade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); analisa os direitos conquistados pelos domésticos com a disposição na CF/88 no artigo 7º, parágrafo único, das garantias antes não resguardadas a essa classe e que agora estão no arcabouço jurídico da Norma Hipotética Fundamental, sendo vedada sua revogação por meio de qualquer tipo de lei ordinária; finalmente, comenta-se a discriminação do não recolhimento obrigatório do FGTS e a possibilidade de mudança dos textos legais que discutem e tratam sobre este assunto, suas omissões, suas discriminações e a opção em cambiar suas redações conforme a atualidade socioeconômica das pessoas que compõem a presente categoria.
Palavras-chave: Discriminação do Empregado Doméstico quanto ao recolhimento do FGTS ser obrigatório ou facultativo; Discriminação Sociocultural.
Abstract: This work has the scope to analyze, investigate and bring to light the current condition it is in the class of domestic labor. To this point he says that category is treated as a front for the manufacture of new laws, which could bring the harvest of the legality of his craft, and provided abetter quality of life and dignity to all workers of this class. Hold is still in the forecast, even if discriminatory, the category in the Greater Charter of 1988, its relevance and importance of this historic achievement, analyzes the law No. 5859 of 1972, the first standard to regulate the working class home and provide for their peculiarities, which we can understand how their details that verge on discrimination in view of the omission of Lex about other rights notal located to that category, this research also addresses non-discrimination requirement of the Guarantee Fund for Length of Service (FGTS); analyzes the rights won by the home CF/88 with the provision in Article 7, paragraph, guarantees of non-safeguarded before this class and are now in the legal framework of the Standard Basic Hypothetical, being forbidden by its repeal of any common law and, finally, it is said the discrimination of non-payment mandatory FGTS and the possibility of change in the legal texts that discuss and deal with on this matter, their omissions, their discrimination and the option to change their current socioeconomiccompositions according to the people who make up this category.
Keywords: Breakdown of Domestic Employee on the collection of FGTS be mandatory or optional; sociocultural discrimination.
Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito de empregado doméstico. 3. Conceito e histórico do fundo de garantia de tempo de serviço. 4. Discriminação ao empregado. 5. Histórico e discriminação ao empregado doméstico. 6. Vetos da Lei 11.324/06. 7. Da obrigatoriedade do FGTS para o empregado doméstico. 8. Conclusão.
01. INTRODUÇÃO
O presente Trabalho tem o escopo de mostrar frente à promulgação de alguns direitos trabalhistas a discriminação aos empregados domésticos. É de salutar valia esclarecer que o empregado doméstico não se trata apenas da pessoa da empregada doméstica, ao contrário, a empregada doméstica é só mais umas das trabalhadoras que compõem a categoria laboral dos domésticos conforme será demonstrado no presente estudo e se houve, destarte, ou continuou a forma desigual de tratamento a tal classe perante o Estado brasileiro.
Sua origem (empregados domésticos) remonta ao comércio negreiro de escravos trazidos da África até o Brasil, naquela época sob domínio do império português e, portanto, sempre se firmou como uma classe sem prestígio algum, vez que adveio das esferas mais descriminalizadas da sociedade apesar de trabalhar dentro das residências de seus patrões, na época do império de seus “donos”. Afinal os escravos eram considerados produtos a serem comercializados, não possuíam um mínimo de respeito à sua dignidade, saúde, e, por muitas vezes, de sua honra, por violências que dilaceravam a incolumidade física e moral.
Tal linha de estirpe trouxe a esta categoria muita discriminação e sofrimento, pois apesar da evolução no tratamento aos direitos do ser humano, tal categoria sempre foi deixada à margem da sociedade, como que se sua situação fosse já determinada por sua história regressa. No intento de avaliar e expor quais foram os benefícios, garantias e direitos assegurados a tal grupo laboral por meio de legislação ordinária e até mesmo pela Constituição de 1988 é que serão adiante colocados de forma clara e nítida quais foram os benefícios auferidos à categoria doméstica, e se estes foram suficientes para preencher todo vazio social de desigualdade socioeconômica que se originou após todos esses anos de discriminação e marginalização dos domésticos no Brasil.
Para tanto, de forma prática e de fácil visualização, tais garantias serão dispostas na
forma de itens, sendo explicado um a um de forma sucinta, porém, a não deixar dúvidas sobre o teor e sua importância na constitucionalização de tais direitos aos empregados dessa classe trabalhadora. Também será feita uma exposição de todos os pontos importantes da Lei 5.859 de 1972, que foi a primeira legislação a tratar especificamente de tal grupo trabalhista.
Esta pesquisa relata sobre as inovações trazidas pela alteração da Lei 5.859/72 que no seu texto ratificando a redação da CLT no que tange a conceituação do empregado doméstico frente aos trabalhadores celetistas e as demais categorias trabalhistas, de cada direito e garantias conquistadas pelo doméstico na promulgação de tal lege mencionada alhures, demonstrando a discriminação sobre a não obrigatoriedade do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS para os domésticos..
02 – CONCEITO DE EMPREGADO DOMÉSTICO
A Lei 5.859/72 que conceitua o empregado doméstico estabelece três requisitos, sem os quais não estará evidenciada a relação de emprego doméstico, senão vejamos: Art. 1º Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa a pessoa ou família, no âmbito residencial destas, aplica-se o disposto nesta lei.
Assim, o primeiro deles é que os serviços prestados sejam de natureza contínua.
Desta forma, não se pode considerar como empregado doméstico aquele trabalhador que exerce sua atividade com intermitência ou eventualidade, como por exemplo, o diarista que presta seus serviços a terceiros durante alguns dias do mês, sem a responsabilidade de continuidade da atividade. É comum a contratação eventual de motoristas, faxineiros, lavadeiras, passadeiras, ou cozinheiras para realizar trabalho específico em época definida, ou até por um ou mais dias na semana, sem que efetivamente exista uma relação de emprego doméstico.
A natureza contínua deste requisito deve ser interpretada da forma mais simples possível. Se não há compromisso do trabalhador para comparecer em dia e horário certo e subordinar-se às ordens do Contratante, é certo que se trata de um trabalho eventual, ainda que a mesma prestação de serviços se prolongue por meses ou anos. Mas, se o Empregador exige a presença do Trabalhador, em dias certos e jornada de trabalho definida para sujeitar-se às suas ordens, mediante remuneração, ainda que em apenas alguns dias da semana, fica claro que a natureza do trabalho é contínua, embora tenha sido tratado que os serviços sejam prestados em dias alternados ou descontínuos.
A natureza contínua da prestação de serviços não pode ser confundida com trabalho contínuo. É que em alguns casos a natureza do trabalho é mesmo a prestação de serviços de forma descontínua, como por exemplo, uma Babá que trabalha em regime de revezamento com uma ou mais babás. O que o legislador buscou identificar é a diferença entre o trabalhador que presta serviços como verdadeiro autônomo, vendendo o produto de seu trabalho por preço que fixar, e aquele que se subordina às normas e ordens do contratante de forma objetiva prestando sua força de trabalho, mediante salário, ainda que de forma intermitente.
O segundo requisito é que o resultado do trabalho a ser prestado tenha finalidade não lucrativa. Como finalidade não lucrativa deve ser entendida o trabalho que é exercido fora da atividade econômica. Não há possibilidade de contratar um empregado doméstico para preparar salgados que serão vendidos ou outro produto de natureza lucrativa. Da mesma forma que a lavadeira que trabalha para terceiros em sua própria casa não poderá contratar uma ajudante como empregada doméstica vez que o resultado dos serviços prestados pela empregada terá finalidade lucrativa.
Um médico que trabalha em casa e tiver um motorista para levá-lo às suas visitas aos seus clientes como atividade preponderante, claro, estará usando o motorista para o exercício de atividade econômica, logo estará caracterizada uma relação de emprego comum, e não a relação de emprego doméstico.
Contudo, se o mesmo médico necessita do motorista para levar seus filhos ao colégio, sua mulher às compras, além de levá-lo ao consultório ou até a residência de um cliente, em caráter eventual, poderá contratá-lo como um empregado doméstico, porque a preponderância da atividade do seu empregado é servir como motorista da família e não como motorista de um profissional médico.
Da mesma forma é a situação do trabalhador em um sitio. Se o serviço destina-se a produzir frutas para venda, ainda que sem lucro efetivo, o trabalho desenvolvido destina-se a uma atividade econômica, logo não há de se cogitar em contrato de trabalho doméstico, a relação de emprego será comum nos termos da Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT.
Mas, se no mesmo sítio as frutas são para o consumo do proprietário e de seus familiares ou até amigos, não haverá atividade econômica, o trabalhador poderá ser contratado como empregado doméstico.
A terceira condicionante é mais objetiva, diz que o trabalho deve ser dirigido à pessoa ou à família, e mais, no âmbito residencial destas.
Portanto, uma empresa não poderá ter empregados domésticos, assim como nenhuma associação ou entidade, ainda que filantrópica.
Quando a lei estabelece que os serviços devam ser prestados no âmbito residencial das pessoas ou famílias, apenas registra a vedação de que o profissional liberal, por exemplo, tenha empregados domésticos a trabalho de seu escritório ou consultório. Contudo o âmbito residencial não é expressão que deva ser examinada sob excessivo rigor. O sítio, a casa de campo, a casa de praia, ou outro ambiente destinado meramente ao lazer da família, deve ser entendido como de âmbito residencial.
Ainda, o motorista que fica mais tempo fora do que dentro do âmbito residencial, também será empregado doméstico quando sua atividade destinar-se ao interesse da família.
03 – CONCEITO E HISTÓRICO DO FUNDO DE GARANTIA DE TEMPO DE SERVIÇO – FGTS
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é uma conta bancária vinculada a depósitos efetuados pelo empregador em um fundo social que o trabalhador pode utilizar nas situações tipificadas em lei. Consiste em uma reserva em favor do empregado, para que esse efetue o saque no momento de sua dispensa, ou diante de outras situações previstas em lei. Um dos propósitos do FGTS foi incrementar os investimentos governamentais nos programas de casa própria, por meio do Sistema Financeiro de Habitação (SFH).
A indenização por tempo de serviço era uma garantia prevista no antigo texto da Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT de 1943. Ela funcionava da seguinte maneira: o empregado que era contratado por prazo indeterminado, após o cômputo do primeiro ano contratual, ao completar dez anos de serviço junto ao mesmo empregador adquiria estabilidade decenal, que consistia em uma proteção jurídica de seu emprego. Se o empregado celetista fosse demitido sem justa causa, recebia uma indenização referente ao valor de um mês de sua maior remuneração por ano ou fração igual ou superior a seis meses de serviço. Dessa forma, caso o empregado recebesse salário equivalente a R$ 1.000,00 [hum mil reais] à época e contasse com 12 anos e 10 meses de serviço no momento da rescisão contratual, para a qual não deu causa, receberia o correspondente a R$ 13.000,00 [treze mil reais]. Os empresários eram claramente contra a estabilidade decenal por demais onerosa, alegando, inclusive, que se tratava de uma medida contra-produtiva. No contexto político econômico de cunho neoliberal trazido pelo regime autoritário instaurado no Brasil em 1964, é criado o FGTS em 1966 pela Lei 5.107, hoje regulado pela Lei 8.036 de 1990.
O FGTS foi uma alternativa ao regime celetista, o qual dependia de uma opção expressa, por escrito, no momento da celebração do contrato de trabalho. O empregado teria direito a depósitos mensais em sua conta vinculada ao correspondente a 8% sobre o salário mensal. Assim, o obreiro tinha o direito de optar pelo regime do FGTS ou pela estabilidade decenal. Ao optar pelo FGTS, ele perdia a estabilidade adquirida após dez anos no serviço, porém, adquiria o direito de receber o montante depositado em sua conta do FGTS e mais um acréscimo de 10% sobre este valor que a partir da Constituição Federal de 1988 – CF/88 passou para 40%.
Na prática, após a sua instituição, as empresas não mais admitiam empregadas se ele não optasse pelo FGTS. O que se passou foi que o FGTS foi amplamente generalizado em contraponto ao desuso da estabilidade decenal, principalmente porque existia a possibilidade de opção retroativa pelo sistema do FGTS. Além disso, o empregado e o empregador podiam negociar o período anterior à opção, desde que a indenização paga pelo empregador não fosse inferior a 60% da verba prevista. A Lei permitiu que os trabalhadores optassem pelo FGTS a qualquer tempo, com efeito retroativo até 01/01/1967, que corresponde ao início da vigência do FGTS. Importante ressaltar que os rurais, como não tinham direito ao FGTS antes da CF/88 não puderam fazer essa opção.
A Constituição Federal de 1988 unificou a anterior dualidade de regimes de garantias de tempo de serviço. O FGTS foi universalizado e deixou de existir a possibilidade de opção pelo sistema de estabilidade e indenização até então existente. Dessa forma, a CF/88 eliminou a necessidade de opção expressa pelo regime fundiário, tornando o sistema único e obrigatório tanto para os empregados urbanos como para os rurais. Os empregados domésticos ficaram de fora do referido sistema. Somente foi incluída a possibilidade de inserção do doméstico no FGTS anos depois por meio da Medida Provisória 1986 – MP/86, de 13/12/1999, e Lei de Conversão 10.208, de 23/03/2001.
Assim ficam aqui demonstradas as particularidades do FGTS e sua gradual aceitação no contexto das normas trabalhistas e sua inclusão como facultativo para os empregados domésticos em 2001, demonstrando e apontando a maior discriminação a uma classe trabalhadora dos tempos atuais.
04 – DISCRIMINAÇÃO AO EMPREGADO
O Direito tem como principal função regulamentar a vida em sociedade atuando de duas formas: positivamente quando produz regras que imputam vantagens ou direitos em favor de seus titulares, e negativamente por meio de normas que possam inviabilizar práticas ou condutas agressoras ao patrimônio material e moral dos indivíduos.
No conjunto das regras de caráter negativo, anota Maurício Godinho Delgado (2010, p.363): “talvez as mais significativas sejam as dirigidas ao combate à discriminação no contexto social”.
Conforme a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948 diz no seu artigo 1º: “todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidas nesta Declaração”
“Sem qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica, que tenha o propósito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade dos direitos humanos e liberdades fundamentais.”
O art. 1o da mesma Declaração relata sobre Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher e conceitua a discriminação contra a mulher como
“toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo, exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campo político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo” (Declaração Universal dos Direitos Humanos de1948).
Com base nessas Declarações, que foram ratificadas pelo Brasil, pode-se afirmar que discriminação significa toda distinção, exclusão, restrição ou preferência que tenha por objetivo prejudicar ou anular o reconhecimento, o gozo ou o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, nos campos político, econômico, social, cultural ou civil em qualquer outro campo. Portanto, desigualdade.
As causas da discriminação residem, muitas vezes, no puro e cru preconceito: um juízo sedimentado desqualificador de uma pessoa em virtude de uma característica sua, determinada externamente, e identificadora de um grupo ou segmento mais amplo de indivíduos, como a cor, o sexo, a nacionalidade, a riqueza, etc. Mas pode, também, derivar de outros fatores relativos a um determinado caso concreto ou específico.
Daí a importância em se erradicar todas as formas de discriminação ou desigualdade, baseadas em gênero, raça, cor, etnia, idade, nacionalidade, religião e demais critérios. A eliminação e o combate a todas as formas de discriminação são medidas fundamentais para que possa ser garantido o pleno exercício dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais. Deste modo, para se assegurar o pleno exercício da cidadania, próprio dos regimes democráticos de direito, um país que se diz ser democrático não pode conviver com a discriminação e o preconceito.
Na medida em que os Estados ratificam as Convenções Internacionais sobre esta matéria, assumem a obrigação internacional de, progressivamente, eliminar todas as formas de discriminação, assegurando assim, o pleno e efetivo exercício da igualdade.
No Direito brasileiro temos todo um arcabouço normativo de combate à discriminação.
A Constituição Brasileira estabelece o art. 3o como um dos objetivos da República Federativa do Brasil, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”; nos incisos XLI e XLII do artigo 5o promete punir “qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” acrescentando que a “prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”.
Visando resolver esta situação em 13 de maio de 1997 foi aprovada a Lei 9.459/97 estabelecendo a punição dos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou precedência nacional, alterando assim, a Lei 7.716/89 de tal forma que ampliou o seu objeto que inicialmente estava restrito ao combate dos atos resultantes de preconceito de raça ou cor.
É claro que essas leis ainda não conseguiram alcançar o necessário efeito prático porque o preconceito racial, ainda que não queiramos admitir, infelizmente encontra-se incutido na cultura brasileira. Daí a grande dificuldade de aplicação prática da lei, especialmente pelas deficiências na produção da prova. A prática do preceito racial apresenta-se de forma bastante sutil e quase sempre disfarçada com outras práticas igualmente criminosas, mas de muito difícil comprovação.
No âmbito do Direito do Trabalho – que é o objetivo deste trabalho – as Leis 9.029, de 13 de abril de 1995 e 9.799, de 26 de maio de 1999 vieram acentuar o combate às práticas discriminatórias contra a mulher trabalhadora.
Percebe-se, pois, uma busca constante da proibição de todas as formas e práticas discriminatórias em que pese as enormes dificuldades de implementação prática das medidas de combate previstas na legislação nacional. Por isso, o alcance dessas metas estabelecidas pela legislação ainda está bastante longe, pois continuam a persistir muitas lacunas na própria legislação nacional, especialmente no que se refere à discriminação contra as empregadas domesticas.
Há, pois, imperiosa necessidade de avanço no campo legislativo e um maior envolvimento e conscientização da sociedade para que todas as formas de discriminação sejam efetivamente banidas, com a punição exemplar daqueles que ainda não se acostumaram à convivência democrática em que se deve respeitar e conviver com as diferenças.
Visando coibir as várias espécies de discriminação nas relações de trabalho, foi aprovada pela da Conferência Internacional do Trabalho – OIT, a Convenção 111, na 42a reunião (Genebra – 1958), que entrou em vigor em 15/06/60.
No Brasil essa Convenção de enorme valia para o combate às práticas discriminatórias no âmbito das relações de trabalho, foi aprovada pelo Decreto Legislativo n. 104, de 24/11/64, ratificado em 26/11/65, com promulgação através do Decreto n. 62.150, de 19/01/68, estando em vigência desde 26 de novembro de 1966.
De acordo com a Convenção 111, no conceito de emprego ou profissão se inclui o acesso aos meios de formação profissional, ao emprego, às diferentes profissões e às condições de trabalho (art. 3o), ressalvadas as exclusões ou preferências baseadas nas qualificações exigidas para um emprego determinado, bem como aquelas que possam ser justificadas em função da segurança do Estado, ou ainda, as que tenham caráter de medidas de proteção e assistência especial reconhecida como necessárias por motivos de sexo, a invalidez, os encargos de família ou nível social ou cultural (art. 1o, 2, art. 4o e art. 5o, 2, da Convenção 111, 1958).
Refletindo a orientação do aludido pacto a Constituição de 88 alargou, sobremaneira, as medidas proibitivas de práticas discriminatórias no âmbito do direito laboral.
Essas medidas encontram-se previstas – na grande maioria – nos arts. 5o e 7o da Constituição e foram idealizadas objetivando diretamente a relação de emprego, como aquelas constantes do art. 7o, e outras, que, embora não tenham diretamente essa finalidade, em face da sua generalidade, terminam por abarcar situações próprias da relação de emprego, como aquelas constantes do art. 5o.
Infelizmente quanto aos empregados domésticos a própria Constituição Federal de 1988 fez uma enorme discriminação ao negar aos domésticos direitos de igualdade para todos, determinando diferenciações discriminatórias em seu próprio bojo.
05 – HISTÓRICO E DISCRIMINAÇÃO DO EMPREGADO DOMÉSTICO
O trabalho doméstico, no Brasil, confunde-se com a própria história da escravidão[1]. No início, existiam apenas os nativos e os colonizadores, que subsistiam através da caça, pesca e plantio de algumas roças, que eram colhidas no trajeto de volta do interior para o litoral. Com o passar do tempo, os colonizadores foram formando suas famílias, habitando a colônia e aqui fixando suas residências.
Num contexto de exploração comercial da colônia e acúmulo de capital na metrópole, colonos e colonizadores eram oprimidos por uma sensação intensa de instabilidade, precariedade e provisoriedade, que se expressava, principalmente, na intensa mobilidade demográfica.
Os atuais estudos sobre a construção histórica e social do período colonial revelam que o dogmático modelo da opulenta casa-grande, da vasta miríade de escravos e da família patriarcal deve ser revisto.
Esse modelo se aplica apenas ao nordeste açucareiro dos séculos XVI e XVII, cuja formação social adquire certa estabilidade, com uma economia rural, latifundiária, patriarcal e voltada ao exterior. Ao contrário dela, a maior parte da colônia foi marcada por um contexto de extrema mobilidade, de configuração urbana e voltada ao interior do país, tais como as Bandeiras e as Minas Gerais do século XVIII.
É mister ressaltar que a historiografia moderna reconhece a ampla penetração dos escravos no interior dos domicílios. A popular imagem do negro açoitado, trabalhando nas lavouras e dormindo em senzalas representa apenas uma faceta dessa intrincada relação. Trabalho e lazer muitas vezes se confundiam no ambiente doméstico, pois as pessoas podiam passar horas a fio juntas, entretidas, cada uma em sua atividade, nem sempre se estabelecendo uma divisão nítida entre elas. Aqui era a escrava que socava o milho, ali a senhora que costura ou se divertia com as crianças, acolá o senhor consertando algum utensílio, afiando seus apetrechos de trabalho.
A vida privada no Brasil nasce marcada pelo escravismo moderno, ou seja, no dualismo público (Estado escravista) versus privado (família escravista). A escravidão é uma instituição que permite uma permeabilidade entre as duas ordens. No decorrer da organização política e jurídica nacional, a vida privada escravista desdobra-se numa ordem privada repleta de incoerências com a ordem pública. Esse dualismo se prorroga por todo o Império, uma vez que o escravo é uma propriedade particular, cuja posse e administração demandam o consentimento da autoridade pública.
Essa permeabilidade entre as ordens pública e privada em função da escravidão, sobretudo da escravidão doméstica, oferece certas pistas das contradições que também estarão presentes no atual mundo do emprego doméstico. Isto porque a contradição é quase a mesma. É o Estado (ordem pública) que regulamenta o trabalho doméstico, mas quem o usufrui é a família (ordem privada).
O trabalho doméstico é regido por uma convenção de regras inerentes ao lar familiar; um universo avesso às normas externas e cerrado à fiscalização da autoridade pública. Assim, por mais que o serviço doméstico seja disciplinado pelas leis da República Federativa do Brasil, o seu exercício, no âmbito familiar, o torna mais suscetível às regras do lar do que àquelas que imperam no mundo público da rua, da empresa. Vejamos os ensinamentos do mestre Russomano (1990, p. 32):
“Hoje, sente-se contra isso uma reação, que se deve, entretanto, exercer cautelosamente. E isso porque a legislação regulamentadora do trabalho só produz bons efeitos quando amparada, eficientemente, pela fiscalização administrativa, fiscalização essa que esbarra, no caso dos domésticos, no princípio constitucional da inviolabilidade do domicílio.”
No século XIX, quando trabalho escravo e assalariado se mesclavam, Von Binzer (apud KOFES, 2001, p.34) fez o seguinte comentário:
“Todo o serviço doméstico é feito por pretos: é um cocheiro preto quem nos conduz, uma preta que nos serve, junto ao fogão, o cozinheiro é preto e a escrava amamenta a criança branca; gostaria de saber o que fará essa gente quando for decretada a completa emancipação dos escravos.”
Notamos as marcas indeléveis que a escravidão deixa no mercado de trabalho, principalmente no trabalho doméstico. O trabalho manual e doméstico, percebido como desabonador como “serviço de preto”, é impensável de ser realizado pelos seus antigos senhores, daí serem as empregadas ex-escravas que o realizavam.
Completamente desamparado e à margem do seio social, a alforriada (empregado doméstico) não conseguiu tesourar o cordão umbilical que o ligava aos senhores. Assim como pássaros que se tornam incapazes de voar após anos de prisão em gaiolas, muitos “libertos” sequer deixaram suas atividades domésticas.
Era preferível suportar a opressora exploração senhorial em troca de subsistência e condições mínimas de trabalho do que encarar uma sociedade malfazeja que enxergava no negro uma vil anomalia da natureza. Conforme ensina Martins (2002, p.18), “com a abolição da escravatura, muitas pessoas que eram escravas continuaram nas fazendas, em troca de local para dormir e comida, porém na condição de empregados domésticos”.
Mesmo no Ceará, a Terra da Luz, que se regozija por “libertar” seus escravos anos antes da Lei Áurea, o processo abolicionista foi idêntico ao restante do país. Ao negro alforriado não restava alternativa a não ser agregar-se ao seu senhor. Para o historiador Funes (2000, p.132), com a alforria dos negros, “no Ceará, em particular na cidade de Fortaleza, há um aumento considerável daqueles indivíduos sujeitos à condição de agregados e empregados domésticos”.
A abolição da escravatura no Ceará é um dos marcos fundamentais de sua história e talvez o último grande feito de seus heróis, cantados em versos e prosas, presença incondicional na historiografia cearense. Todavia, “o processo abolicionista, não só no Ceará, permite ao cativo recuperar a sua liberdade, ser homem livre”; mas vem acompanhado de uma série de “medidas controladoras, que colocam esse indivíduo no seu (in) devido lugar, fecha-lhe todas as possibilidades de ascensão social e direitos à cidadania”. É então colocado à margem da sociedade, “reforçando o distanciamento social, político e econômico entre a população negra (morena) e branca (galega)”. Termos que nos fazem refletir sobre a “construção de uma ideologia racista, que faz desaparecer de nosso processo histórico outras etnias, negros e indígenas, e outras histórias” (FUNES, 2000, p.131-132).
O escravismo não é um triste fato enterrado num distante passado imperial. O ferrete estigmatizante de sua face se projeta na atualidade. Um século após a Lei Áurea, mesmo a conjuntura social e democrática da Constituição Federal de 1988 não foi suficiente para superar totalmente o ignominioso passado de nossa História e, por conseguinte, o empregado doméstico não auferiu o pleno reconhecimento que o equiparasse ao empregado celetista. Consoante aduz Felipe de Alencastro (2004, p.17):
“O escravismo não se apresenta como uma herança colonial, como um vínculo com o passado que o presente oitocentista se encarregaria de dissolver. Apresenta-se, isto sim, com um compromisso para o futuro: o Império retorna e reconstrói a escravidão no quadro do direito moderno, dentro de um país independente, projetando-o sobre a contemporaneidade.”
Ressalte-se que a atividade doméstica, em variados tempos e civilizações, sempre esteve ligada à figura feminina. Mesmo os costumes indígenas no período pré-colonial apontam para essa assertiva. Por conseguinte, a construção sociohistórica do trabalho doméstico no Brasil também se deu em torno da mulher:
Se a mulher desempenhou em todas as civilizações o papel de provedora da confecção de alimentos da família e de responsável pela organização doméstica, nos primeiros tempos da colonização, em virtude da falta de mulheres brancas, as índias assumiram seu lugar, ensinando a socar o milho, a preparar a mandioca, a trançar as fibras, a fazer redes e a moldar o barro.
Figuras indispensáveis no interior dos domicílios, nem “os curas e párocos prescindiam das mulheres na administração das suas casas e, protegidos pelas milenares atribuições femininas, ocultaram suas amásias sob o título de afilhadas e escravas” (ALGRANTI, 2004, p. 120-121).
Conduzindo recente pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a pesquisadora Hildete Melo (1998) constatou por meio dos dados estatísticos categorizados na Tabela 1 do IBGE/ PNAD (In: Melo, 1998, p.08), “que a imensa participação feminina no mercado de trabalho doméstico não sofreu muita alteração entre as décadas de 80 e 90 do século passado”. Em 1985 “havia cerca de 3,5 milhões (93,57%) de mulheres para apenas cerca de 250 mil (6,43%) homens e em 1995 são 4,8 milhões (93,16%) mulheres para 350 mil (6,84%) homens”.
A introdução da variável cor nos anos 90, particularmente no ano 1995, estudado nessa pesquisa, mostra que esses trabalhadores são 56% não-brancos, para uma taxa de participação de 44% de brancos. Analisando esses dados pelas macrorregiões, nota-se que no Norte e no Nordeste há quase 80% de não-brancos e o Sul apresenta a mais baixa taxa de participação, cerca de 28,12% de não-brancos.
A verdade é que os empregados domésticos, no Brasil, além de herdarem o anátema da escravidão, em sua maioria, compunham-se de mulheres, o que inelutavelmente contribuiu para o seu esquecimento. Os seletivos direitos arduamente obtidos na promulgação da Carta Magna em 1988 estão intimamente ligados à emancipação feminina ocorrida nas décadas anteriores, conforme nos ensina Célio da Costa (apud FRÓES, 2004,on line).
Decerto concorria para o esquecimento quanto à proteção legal aos empregados domésticos o fato de seu enorme contingente ser quase inteiramente composto de mulheres. Se as mulheres sempre foram discriminadas por uma sociedade eminentemente machista, lusitanamente, muito mais facilmente se discriminaria contra as empregadas domésticas. Somente quando as mulheres foram ganhando seu espaço na sociedade, por força dos movimentos feministas, é que as empregadas domésticas veriam sufragados seus anseios de alforria.
A mulher negra, advinda desse contexto, só saberia fazer serviço doméstico como forma de sobrevivência. E não lhe restava senão engajar-se na casa da patroa. Tinha uma cama. A sobra de comida. Roupa indispensável, segundo as conveniências da própria patroa. Só. Dinheiro, apenas uns “trocados”. Folga, raramente. Não, não podia ficar doente. Haveria de ter saúde de ferro. Além de haver serviço doméstico para fazer todo santo dia, porque a casa-de-família é uma empresa em permanente funcionamento, não concebia a patroa a idéia de deparar sua serviçal de cama, com o sol a pino e com tanto serviço por fazer.
Portanto, a dinâmica sócio-histórica da sociedade brasileira é vital para a compreensão do trabalho doméstico atual, visto que este é uma das funestas projeções do escravismo na atualidade.
06 – OS VETOS DA LEI Nº 11.324 – DE 19 DE JULHO DE 2006
Este tópico se reserva a demonstrar a fraca tentativa em equiparar os direitos dos trabalhadores domésticos ao patamar do trabalhador urbano e que foi vetado pelo atual Presidente.
Alterações introduzidas nos arts. 6o-A e 6o-B na Lei no 5.859, de 1972, mencionados no art. 4o do projeto de lei tentaram implementar a obrigatoriedade do FGTS ao empregado domestico, sendo vetado pelo Presidente da Republica.
“Art. 6o-A.
§ 1o O benefício será concedido ao empregado que tiver trabalhado como doméstico por um período mínimo de 15 (quinze) meses nos últimos 24 (vinte e quatro) meses contados da dispensa sem justa causa.
“Art. 6o-B.
III – comprovantes do recolhimento da contribuição previdenciária durante o período referido no inciso I do caput deste artigo, na condição de empregado doméstico;
Razão dos vetos
“No que pertine ao seguro-desemprego a medida aprovada é inadequada, pois ao mesmo tempo em que institui obrigatoriedade de depósito do FGTS, retira a necessidade de comprovação da sua efetivação. Atualmente o depósito é facultativo e o direito ao benefício é condicionado à comprovação do depósito ao FGTS e a medida, que o torna obrigatório, exclui a exigência de comprovação do depósito.” (Grifo nosso).
Os Ministérios do Trabalho e Emprego e da Previdência Social manifestaram-se, também, pelo seguinte veto:
Art. 3o-A da Lei no 5.859, de 1972, alterado pelo art. 4o do projeto de lei de conversão
“Art. 3o-A. A inclusão do empregado doméstico no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, de que trata a Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990, se dará mediante requerimento do empregador, na forma do regulamento.”
Razões dos vetos
“A alteração do art. 3o-A da Lei no 5.859, de 1972, torna obrigatória a inclusão do empregado doméstico no sistema da Lei no 8.036, de 1990. Com isso, tem-se não apenas a obrigatoriedade do FGTS como a da multa rescisória de quarenta por cento sobre os depósitos do FGTS, o que acaba por onerar de forma demasiada o vínculo de trabalho do doméstico, contribuindo para a informalidade e o desemprego, maculando, portanto, a pretensão constitucional de garantia do pleno emprego. Neste sentido, é necessário realçar que o caráter de prestação de serviços eminentemente familiar, próprio do trabalho doméstico, não se coaduna com a imposição da multa relativa à despedida sem justa causa. De fato, o empregado doméstico é legalmente conceituado ‘como aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas’ (art. 1o da Lei no 5.859, de 1972). Desta feita, entende-se que o trabalho doméstico, por sua própria natureza, exige um nível de fidúcia e pessoalidade das partes contratantes muito superior àqueles encerrados nos contratos de trabalho em geral. Desta feita, qualquer abalo de confiança e respeito entre as partes contratuais, por mais superficial que pareça, pode tornar insustentável a manutenção do vínculo laboral. Assim, parece que a extensão da multa em tela a tal categoria de trabalhadores acaba por não se coadunar com a natureza jurídica e sociológica do vínculo de trabalho doméstico.”
07 – DA OBRIGATORIEDADE DO FGTS PARA O EMPREGADO DOMÉSTICO
Como já referido, este trabalho pretende demonstrar a tese da obrigatoriedade do recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, quando o vínculo empregatício do trabalhador doméstico for reconhecido por decisão judicial, a despeito de o art. 3º-A, da Lei 5.859/72, instituído pela Lei 10.208/01, outorgar faculdade ao empregador quanto ao recolhimento do FGTS.
Este artigo 3°-A, que tornou possível o acesso dessa categoria ao FGTS, é norma dispositiva, escassa no Direito do Trabalho. Mesmo sendo regra dessa espécie, pensamos haver um momento próprio para o empregador fazer uso da alternativa de pagar ou não os fundiários. Isto porque essa disposição legal está impregnada de injustiça e discriminação a esta classe trabalhadora, devendo ser interpretada de modo a encontrar uma solução que atenda aos fins sociais que toda lei deve ter em foco (art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil).
Ainda se detendo no referido artigo 3°-A, afirmamos que não está ainda em sintonia com o Estado Democrático de Direito, tanto que a nossa Carta Maior “consagra uma ordem social calcada no primado do trabalho e na dignidade da pessoa humana e cujo objetivo repousa na promoção do bem estar e da justiça sociais” (CF, art. 193; IN: LEITE, 2004, p. 34).
A Lei Fundamental (CF/88) deu aos direitos sociais status significativo como traduz a doutrinadora constitucional, ou seja, é “capaz de vincular a interpretação das normas hierarquicamente inferiores e até mesmo interpretação das próprias normas constitucionais ao crivo da função social” (WAMBIER, 2005, p. 37).
Os direitos sociais são verdadeiros direitos fundamentais, o que importa dizer que a sua aplicação prevalece sobre a lei que os contrarie. Por óbvio que a Lei 10.208/01, de forma incompatível com a letra e o espírito da Constituição, ao conferir o direito de opção ao empregador, desviou-se dos fins traçados pela Carta, os quais exaltam a dignidade da pessoa humana em face dos valores patrimoniais. Lei desta natureza, como a primeira referida, deve ser expurgada do sistema jurídico, ante a sua incoerência com os objetivos sociais da Constituição e incompatibilidade com a atual filosofia do Direito Civil, em que a “socialidade” tem preeminência.
A Lei 5.859/72 regulamentou a profissão do trabalhador doméstico, garantindo-lhe direitos tais como: registro em carteira de trabalho, benefícios previdenciários, etc. A possibilidade de se conceder o direito ao FGTS aos domésticos somente foi vislumbrada com a edição da Lei 8.036/90 a qual, no §3º do seu artigo 15 estabeleceu que “Os trabalhadores domésticos poderão ter acesso ao regime do FGTS, na forma que vier a ser prevista em lei”.
Com a edição da Lei 10.208/01, que incluiu o artigo 3º-A na Lei 5.859/72, aquela possibilidade tornou-se factível, deixando-se, entretanto, ao empregador a faculdade de inserir o trabalhador doméstico no regime FGTS, nos seguintes termos: “É facultada a inclusão do empregado doméstico no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, de que trata a Lei n. 8.036, de 11 de maio de 1990, mediante requerimento do empregador, na forma do regulamento”.
Na letra da lei, tal direito ficou ao arbítrio do empregador. Ou seja, o trabalhador doméstico somente usufruirá dos fundiários se o empregador assim desejar. Nesse particular, o Direito do Trabalho funciona como opção do empregador. Ressalte-se que tanto a Lei 5.859/72 quanto a Lei 10.208/01, foram editadas sob a influência do momento histórico em que a filosofia do direito privado era voltada para o individualismo simbolizado pelo direito de propriedade. Esse último, juntamente com a instituição da família, constituía as duas maiores forças de sustentação das teorias do Direito Civil, como ramo do direito privado, que se funda, essencialmente, no egoísmo, sobretudo como base do liberalismo e reminiscência das desigualdades existentes entre patrícios e plebeus, na antiga Roma.
O paradigma do direito privado até a edição do Código Civil de 2002 foi abolido, surgindo em seu lugar o modelo do social, do equilíbrio, do justo e não da lei, ou seja, hoje em dia o Direito vem insculpido numa função social, passando a encarar as pessoas numa relação de igualdade, com normas que permitem soluções diferenciadas. O mais importante é aplicar a norma a fim de dar uma solução justa ao caso concreto. O instrumento utilizado pelo legislador para atingir o justo foi produzir norma de conteúdo abstrato, as chamadas cláusulas gerais, que, para serem aplicadas necessitam de valoração.
O Prof. Miguel Reale ao anunciar o enfoque do novo Código Civil, assinalou que o sentido social é umas das características mais marcantes do projeto, em contraste com o sentido individualista que condicionava o Código de 1916, aduzindo que “se não houve a vitória do socialismo, houve o triunfo da ‘socialidade’, fazendo prevalecer os valores coletivos sobre os individuais, sem perda, do valor fundante da pessoa humana” (in: GONÇALVES, 2002, p. 40).
Concretizando essa principiologia, o art. 421 do novo Código Civil, introduz no Direito das Obrigações, o princípio da função social dos contratos, de maneira que somente se enquadra nesse princípio o pacto que assegurar “trocas úteis e justas”, pois as convenções não têm mais aquele caráter individualista e sim fins sociais.
Constata-se, pois, que a Lei 10.208/01, instituindo a faculdade de o empregador depositar ou não o FGTS do empregado doméstico, está em desacordo com a tendência atual de socialização do direito, encampada principalmente pela Carta da República, pelo Código de Defesa do Consumidor e pelo atual Código Civil que visam a concretização da igualdade real entre as pessoas, um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito.
Prevaleceu naquelas leis o interesse patronal em detrimento do trabalhador doméstico, pois norma que outorga poder de escolha ao seu destinatário de cumpri-la ou não, em geral se faz letra morta no ordenamento jurídico. A lei dos empregados domésticos, como dito, assegura, entre outros direitos da categoria, a anotação do contrato de trabalho em CTPS – Carteira de Trabalho e Previdência Social. Entretanto esta norma não cuida do momento em que o registro deve ser realizado. Por analogia, invocamos o que diz a CLT referente ao momento do registro. Seu artigo 29 estabelece que a carteira profissional será, obrigatoriamente, apresentada pelo trabalhador ao empregador que o admitir, o qual terá o prazo de 48 horas para nela anotar o contrato laboral.
A interpretação da Lei 5.859/72 combinada com as disposições da CLT no que pertine à anotação do contrato de trabalho, inexoravelmente leva à conclusão de que a CTPS do empregado doméstico tem de ser assinada naquele prazo. No referente à opção pela inclusão ou não do empregado doméstico no FGTS, esta opção deve ser exercida pelo empregador no momento da contratação, ocasião em que o contrato de trabalho obrigatoriamente deve ser anotado em CTPS.
Se o empregador efetuou o registro no prazo legal e não requereu junto à CEF – Caixa Econômica Federal, a inclusão do doméstico no sistema do FGTS, mediante apresentação da guia de recolhimento e efetivação do primeiro depósito na conta vinculada, sua omissão significa que optou em não recolher os fundiários.
Entretanto, se o patrão não anotou o contrato de trabalho na CTPS do empregado naquele prazo, consequentemente deixou de manifestar-se acerca da opção conferida pelo legislador sobre depositar ou não o FGTS, haja vista que esta depende do registro. Logo não poderá mais fazê-lo porque passado o momento em que gozava de liberdade de escolha.
No sistema jurídico brasileiro, encontramos no artigo 571, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil, hipótese que serve de supedâneo para a tese aqui defendida, se interpretada a contrario sensu. Referido diploma processual proclama: “Nas obrigações alternativas, quando a escolha couber ao devedor, este será citado para exercer a opção e realizar a prestação dentro em 10 (dez) dias, se outro prazo não lhe foi determinado em lei, no contrato, ou na sentença”. E seu §1º estabelece que: “Devolver-se-á ao credor a opção, se o devedor não a exercitou no prazo marcado”.
Quem tem direito à opção de pagar ou não o FGTS é o empregador. Vamos dizer então que ele é o credor do direito de optar. Sendo credor, deve exercer seu direito no momento em que a lei determina (prazo para anotação do contrato de trabalho). Se não registrou o trabalhador em 48 horas (termo legal), não mais poderá optar pelo não recolhimento das verbas fundiárias, posto que precluso seu direito.
Portanto, se o trabalhador tiver de buscar na Justiça do Trabalho o reconhecimento de seu vínculo empregatício e sua demanda for procedente, a sentença obrigará o empregador a efetuar a anotação na CTPS e não poderá devolver-lhe a faculdade de incluir o empregado doméstico no regime do FGTS, pois não seria razoável obrigá-lo a registrar o contrato de trabalho e ao mesmo tempo autorizá-lo a optar por pagar ou não os fundiários. O deferimento de opção ao empregador doméstico não atende ao fim social que toda lei deve conter no sentido de produzir na realidade social determinados efeitos que são desejados por serem valiosos, justos, convenientes, adequados à subsistência de uma sociedade, oportunos, etc. A busca desse fim social será a meta de todo o aplicador do direito. Com isso a teleologia social terá um papel dinâmico e de impulsão normativa. Se assim não fosse, a norma jurídica seria, na bela e exata expressão de Rudolf Vom Lhering (2002, p 137), um ‘fantasma de direito’, uma reunião de palavras vazias.
Anote-se que se o empregador não registrar o empregado, o ordenamento jurídico lhe impõe punições administrativas (art. 47, da CLT), criminal (art. 297, § 4º, do CP) e civil (arts. 186 e 927, do Código Civil – CC. A penalidade civil consiste em condenar o patrão por danos morais, pois a ausência de anotação na CTPS representa falta grave do empregador e causa ao empregado significativos prejuízos, uma vez que dificulta a comprovação de tempo de serviço para fins de aposentadoria e para usufruir de quaisquer outros benefícios sociais, tais como seguro-desemprego, auxílio-doença, etc. Nesse sentido já decidiu o Egrégio TRT da 15ª Região:
“REPARAÇÃO DO DANO MORAL DECORRENTE DE ATO ILÍCITO PRATICADO PELO EMPREGADOR. DEVIDO. A desobediência a normas de ordem pública, a saber, anotação do contrato em inserção do trabalhador no sistema de previdência social, certamente se constitui em desrespeito à lei que causam danos morais ao trabalhador, presumíveis, inclusive, porque o obreiro não registrado está alheio ao sistema de proteção já indicado” (TARGA, TRT, 2003, p. 55).
Diante dessas sanções previstas no ordenamento jurídico ao mau empregador, conceder-lhe a benesse de optar entre pagar ou não o FGTS, se o reconhecimento do contrato de trabalho lhe for imposto judicialmente, viola, no mínimo, o bom senso. A forma ideal de efetivamente assegurar ao trabalhador doméstico o direito ao FGTS, fosse o legislador preceituar a obrigatoriedade do recolhimento, como não o fez, deverá a doutrina e a jurisprudência caminhar na orientação de, ao menos, impor ao empregador, se o reconhecimento do vínculo empregatício for judicial, o dever de pagar os valores relativos ao FGTS, sem qualquer possibilidade de opção. A proposição ora defendida adéqua-se melhor ao justo, finalidade social de toda norma jurídica. Essa afirmativa justifica-se
“Pois o Direito não pode isolar-se do ambiente em que vigora, deixar de atender às outras manifestações da vida social e econômica; e esta não há de corresponder imutavelmente às regras formuladas pelos legisladores. Se as normas positivas se não alteram à proporção que evolve a coletividade, consciente ou inconscientemente a magistratura adapta o texto preciso às condições emergentes, imprevistas” (MAXIMIANO, 1999, p. 157).
Apesar de o legislador constituinte de 1988 ter expressamente excluído os empregados domésticos do direito ao FGTS, criando uma enorme discriminação social, ao contrário dos trabalhadores urbanos e rurais, a Lei n.º 8.036/90 dispôs em seu § 3º do art. 15, que tais empregados poderão ter acesso ao FGTS na forma da lei. Após dez anos da publicação da Lei 8.036/90, o legislativo manteve-se inerte, e o acesso dos empregados domésticos ao FGTS se deu por meio de uma medida provisória n.º 1.986/99, tendo sucessivas reedições.
Todavia, a omissão do Congresso Nacional foi suprida com a aprovação da Lei n.º 10.208/01, que converteu a Medida Provisória n.º 2.104-15, de 26/01/2001, em lei. A Lei n.º 10.208/01 acrescentou o art. 3º-A à Lei n.º 5.859/72, estendendo o FGTS ao empregado doméstico. O último citado dispositivo facultou ao empregador incluir o doméstico no FGTS, ou seja: “Art. 3º-A: É facultada a inclusão do empregado doméstico no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, de que trata a Lei n.º 8.036, de 11 de maio de 1990, mediante requerimento do empregador, na forma do regulamento”.
O empregador, portanto, não é obrigado a incluir seu empregado no FGTS. Caso faça a opção não poderá se retratar, sendo obrigado a manter o empregado no regime até o término de seu contrato de trabalho. Como já referido, a inclusão se dará por opção do empregador, que se efetivará com o recolhimento do primeiro depósito em conta vinculada, aberta para este fim específico em nome do trabalhador na Caixa Econômica Federal. O empregador ficará obrigado a depositar em conta vinculada, a importância correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração devida ao empregado doméstico no mês anterior ao recolhimento.
O recolhimento do depósito para o FGTS deve ser até o dia 07 do mês subseqüente ao que foi pago a remuneração. Não havendo expediente bancário, deverá ser antecipado para o dia imediatamente anterior em que haja expediente. O depósito para o FGTS deve ser efetuado por meio da Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações a Previdência Social (GFIP), avulsa e adquirida nas papelarias. O empregador, para fins de quitação da GFIP, deverá apresentá-la em duas vias, com a seguinte destinação: 1ª via Caixa/Banco, 2ª via Empregador.
A inscrição como Contribuinte Individual na Previdência Social poderá ser solicitada pelo próprio empregado doméstico no posto de benefício do INSS com abrangência sobre a área onde reside o empregado, mediante apresentação de: CTPS, carteira de identidade, comprovante de residência e certidão de nascimento ou casamento.
No caso de demissão sem justa causa, rescisão do contrato por recíproca ou força maior ou término do contrato de experiência, para recolhimento dos depósitos em qualquer rescisório, o empregador deverá adquirir no comércio, preencher e assinar a Guia de Recolhimento Rescisório do FGTS e Informações à Previdência Social – GRFP e efetuar o depósito em qualquer agência da Caixa ou da rede bancária conveniada.
O trabalho prestado pelos empregados domésticos no âmbito residencial dos empregadores domésticos, não obstante possuir singularidades que o diferenciam do contrato de trabalho em geral, não justifica o tratamento jurídico restritivo e discriminatório sofrido por eles, que vem ocorrendo desde a edição da Lei n.º 5.859/72, e que se agravou drasticamente com a edição da Lei n.º 10.208/01.
O acesso facultativo dos empregados domésticos ao FGTS, condicionado à vontade unilateral do empregador, contraria o texto constitucional e os princípios gerais do Direito do Trabalho, que consagra os direitos sociais dos trabalhadores – aí incluídos os domésticos – como mínimo de garantias, significando que estes são insuscetíveis de serem afastados pela vontade das partes e têm caráter obrigatório. O direito dos trabalhadores domésticos ao FGTS não pode ter caráter facultativo, tal como o previsto pela Lei 10.208/01, e sim obrigatório. No que tange ao mérito da questão, dúvidas não há quanto à necessidade de se ampliar os direitos dessa classe trabalhadora, que historicamente foi posta à margem da sociedade.
Entretanto, o que não se pode perder de vista é que, em contrapartida, o bolso da classe média será excessivamente onerado. Principalmente, quando for o caso de dispensar sem justa causa. Somos plenamente favoráveis à ampliação do rol de direitos dos empregados domésticos, dispensando, contudo, a imposição de radicalismos. Vale ressaltar que, tais direitos, se aplicados de modo desregrado, a bel prazer do empregador, sem qualquer parâmetro legal, são mais prejudiciais, hoje em dia, do que a falta de lei que obrigue o recolhimento do FGTS.
No que concerne ao argumento de que o acesso facultativo ao FGTS se justifica pelo receio do aumento de desemprego dos domésticos, em função do aumento dos custos da família, tal alegação a nosso ver não procede, porque, primeiro, o percentual de FGTS é de apenas 8% sobre o salário; segundo, porque aplicando esse raciocínio nenhuma categoria de trabalhadores lutaria por melhores salários e condições de trabalho, pelo medo de perder o seu emprego, o que não ocorre na prática. Portanto, é mais econômico cumprir a legislação, pois se o empregado doméstico não receber seus devidos direitos tem 100% de chance de ganhar na Justiça.
Por outro lado, acrescentamos que
“A Lei n.º 5.859 também não fixa multa pelo descumprimento de regras de direito material. Em direito, uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo. Ou é ou não é. Não existe meio termo. Assim, não pode ser uma faculdade, que fica à opção do empregador, ou uma obrigação compulsória, em que, a partir do primeiro pagamento, o empregador não pode deixar de depositar o FGTS. Se existe uma faculdade, o empregador deposita o FGTS quando bem entender, até pelo fato de inexistir penalidade pelo descumprimento da norma, justamente por se tratar de faculdade” (MARTINS, 2006, p. 57).
Essa alteração representaria um grande avanço para os trabalhadores da categoria em estudo nesta pesquisa, uma vez que, embora tenha alguns direitos iguais aos demais trabalhadores, encontram-se ainda marginalizada, de direito e de fato. O Congresso Nacional aprovou a ampliação do benefício para os domésticos, incluindo a obrigatoriedade no recolhimento mensal do FGTS mais a multa rescisória nos casos de despedida sem justa causa. Editada em Março de 2006, a Medida Provisória nº.284 – MP, teve como objetivo de estimular a formalização do emprego doméstico e tentou evitar a atual discriminação. A MP foi enviada e votada pelo Congresso Nacional que por sua vez, vetou este benefício de forma vexatória contribuindo ainda mais para manter a discriminação do FGTS para os domésticos. O governo até buscou uma alternativa intermediária para tentar remediar o veto da Medida Provisória que estende o FGTS aos empregados domésticos, mas a tentativa foi infrutífera, pois a regulamentação obrigatória do recolhimento do FGTS não poderia ser amenizada por outra forma.
O sonho das domésticas de ter FGTS, no entanto, não está definitivamente perdido, apesar do veto ao FGTS ter sido necessário porque não era possível retirar somente a multa de 40%. Com o novo projeto, foi excluída a multa e estabelecida à alíquota de 8% de contribuição. Uma saída poderá ser a edição de uma nova Medida Provisória que assegure o recolhimento mensal da contribuição, mas exclua a exigência da multa rescisória de 40% nas demissões sem justa causa.
Hoje, os empregadores podem descontar do Imposto de Renda – IR, os gastos com a contribuição previdenciária patronal (12%) referente a um salário mínimo mensal; o beneficio vale também para as contribuições referentes ao 13º salário e o adicional de férias. O benéfico só atinge, porém, os contribuintes que optam pela declaração completa do IR. O ponto principal da discussão sob a obrigatoriedade do recolhimento do FGTS aos domésticos, gira em torno de quais seriam os incentivos fiscais para a formalização do emprego no setor.
O incentivo da dedução no valor do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) da contribuição previdenciária paga pelo empregador doméstico não deve se restringir ao salário mínimo, com vistas a permitir que o cálculo seja feito com base naquilo que fosse efetivamente pago ao empregado doméstico. Só assim o empregador poderia auferir benefício com o aumento das despesas com seu empregado doméstico.
A lei que futuramente prever a obrigatoriedade do recolhimento do FGTS ao doméstico, não poderá ser considerada inconstitucional, pois a própria Lei Maior especifica que aqueles direitos previstos no parágrafo único do art. 7º, são direitos mínimos. Para melhor argumentar, acrescemos que
“Sua enumeração não é taxativa, mas exemplificativa, pois não está escrito no parágrafo único do art. 7º da Lei Maior que os direitos dos empregados domésticos são apenas ou somente os previstos em alguns dos incisos do art. 7º da mesma norma, permitindo que a lei ordinária estabeleça outros direitos ao doméstico” (MARTINS, 2006, p. 55-56).
O caput do art. 7º é claro quando diz: “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social” indicando que os direitos são exemplificativos. Possibilita assim que a lei ordinária disponha de outros direitos.
08 – CONCLUSÂO
Há muito tempo esta classe tem seus direitos restringidos devido aos resquícios do período da escravidão que há varias gerações já deixou de existir, devendo nossos legisladores se ater para tão ignominiosa discriminação e por fim a esta situação dando aos domésticos os mesmos direitos garantidos aos demais trabalhadores. Somos plenamente favoráveis que os direitos trabalhistas sejam estendidos aos domésticos e buscamos comprovar aqui os motivos da nossa posição.
A discriminação que persegue o empregado doméstico é fruto de uma dinâmica sociocultural que acabou relegando esse labor a uma importância subalterna, surgindo com o trabalho escravo ainda no Brasil colonial.
Esse processo mitigou o senso de importância do empregado doméstico, a ponto da categoria sentir-se desonrada por ser reconhecida como tal. Nem mesmo a Constituição Federal de 1988, amplamente baseada nos ideais de justiça, igualdade e democracia, conseguiu superar completamente a intensa maré contrária da discriminação e desprezo que anatematizam a categoria doméstica.
O trabalho prestado pelos empregados domésticos no âmbito residencial dos empregadores domésticos, não obstante possuir singularidades que o diferenciam do contrato de trabalho em geral, não justifica o tratamento jurídico restritivo e discriminatório sofrido por eles, que vem ocorrendo desde a edição da Lei n.º 5.889/72, e que se agravou drasticamente com a edição da Lei n.º 10.208/01.
O acesso facultativo dos empregados domésticos ao FGTS, condicionado à vontade unilateral do empregador, contraria o texto constitucional e os princípios gerais do Direito do Trabalho, que consagra os direitos sociais dos trabalhadores – aí incluídos os domésticos – como mínimo de garantias, significando que estes são insuscetíveis de serem afastados pela vontade das partes e têm caráter obrigatório.
Dessa forma, o direito dos trabalhadores domésticos ao FGTS não pode ter caráter facultativo, tal como previsto pela Lei n.º 10.208/01, e sim obrigatório.
Diante disso, sugere-se que a Lei n.º 10.208/01 seja revogada por outra lei emanada do Congresso Nacional, que estabeleça o direito dos empregados domésticos ao FGTS com natureza obrigatória.
Advogado. Pós graduação em Direito do Trabalho e mestrando em Direito ambiental.
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